segunda-feira, 22 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Biden fez bem em desistir de candidatura

O Globo

Com ele no páreo, derrota democrata era quase certa. Agora partido tem nova oportunidade

Joe Biden precisou de quase um mês para se convencer do óbvio. Depois do desempenho constrangedor no debate com Donald Trump em junho, até tentou permanecer no páreo em busca da reeleição em novembro. Deu entrevistas tentando disfarçar o declínio, fez discursos negando que desistiria, ligou para doadores e chamou congressistas à Casa Branca. Nada funcionou. Deputados e senadores democratas continuaram exigindo a desistência. A queda nas doações de campanha e nas pesquisas enfim o persuadiu. Ainda se recuperando da Covid-19, Biden acabou neste domingo com as especulações e tomou a decisão acertada. “É do interesse do meu partido e do país que eu desista e me concentre apenas no cumprimento de meus deveres como presidente no que me resta de mandato”, afirmou em carta aberta. Em seguida, numa rede social, apoiou o nome da vice-presidente, Kamala Harris, como candidata democrata.

Com Biden no páreo, a derrota era quase certa. Agora, o cenário muda. Embora a desistência esteja longe de significar vitória do Partido Democrata, traz oportunidade para uma candidatura com mais chance de derrotar Trump. Antes, o partido precisa chegar a consenso sobre o novo candidato. Dois cenários são possíveis. O primeiro é o nome ser escolhido em votação virtual antes da convenção de agosto em Chicago. O segundo é uma convenção disputada, de desfecho imprevisível.

Preto Zezé - Municípios precisam entrar na discussão sobre a violência

O Globo

Cidadão comum vive na cidade. Sua vida é a rua onde mora, seu território e sua percepção

A violência novamente dominou as preocupações dos brasileiros. E, se dermos uma volta no país, veremos que, grosso modo, os recursos têm sido destinados à construção de prisões (o Brasil já é a terceira população carcerária mundial). Prende-se muito e de maneira que não produz resultados efetivos na redução dos índices.

Munição, armamentos, efetivo, viatura e prisões têm sido o cardápio diante de uma população apavorada e de gestores acuados ante o avanço de grupos armados dominando territórios, estabelecendo gestão acima e contra o Estado democrático. Os gastos são imensos nesse aspecto, gastos não submetidos à avaliação da sociedade sobre eficácia.

Bruno Carazza - O pente fino e o faroeste fiscal

Valor Econômico

Para além de bloqueios e contingenciamentos, há um problema fiscal solenemente ignorado no Brasil

Pressionado por uma situação fiscal difícil, com o arcabouço fazendo água e em meio a uma avalanche de memes divulgados à direita e à esquerda criticando seu “ajuste pelo lado da receita”, Fernando Haddad e sua equipe econômica divulgam nesta segunda-feira sua proposta de bloqueios e contingenciamentos para tentar atingir a meta de déficit zero até o fim do ano.

Alguns números já foram antecipados, mas não é bom esperar nada de estrutural sendo anunciado, para além de medidas paliativas e o engodo do “pente fino” em despesas, esse emplasto utilizado pelos políticos quando não querem se indispor com cortes efetivos nos gastos.

Fernando Gabeira - Violência e torta de maçã nos EUA

O Globo

Tiros contra Trump acabaram atingindo a Ucrânia, o esforço contra o aquecimento global e os imigrantes

A violência é tão americana quanto a torta de maçã. Ouvi isso pela primeira vez numa entrevista do escritor Norman Mailer. Não sei se a frase é uma invenção dele ou era um dito popular. Mailer, pessoalmente, era bastante agressivo e se meteu em inúmeras brigas.

Observando a História dos Estados Unidos, vemos confronto em muitos momentos. Com os índios, os mexicanos e, mais tarde, os negros, que não foram apenas escravizados, muitos morreram por tortura, espancamento e assassinato.

No meio do século XIX, os Estados Unidos viveram uma guerra civil violenta. Em sua História, quatro presidentes já foram assassinados, sem contar figuras como Bobby Kennedy e Martin Luther King Jr. O homem que tentou matar Ronald Reagan queria impressionar a atriz Jodie Foster.

Demétrio Magnoli - A conquista – e os conquistadores

O Globo

Incompetência eleitoral dos democratas, que perdurou ao menos até ontem, pode custar caro

Os nomes históricos não estavam lá: George Bush, Mitt Romney, Mike Pence. No segundo dia da Convenção Republicana de Milwaukee, um a um, os antigos desafetos de Trump ajoelharam e declararam lealdade: Marco Rubio, Ted Cruz, Ron DeSantis, Nikki Haley. A convenção pode ser descrita como espetáculo da unidade. A descrição mais precisa é outra: a celebração da conquista.

O velho Partido Republicano — conservador, moderado e liberal — não existe mais. Em Milwaukee, assistiu-se ao desfecho de uma trajetória iniciada durante o mandato presidencial de Trump. O movimento Make America Great Again (Maga), nacionalista, populista e ultraxenófobo, fincou sua bandeira no pátio da fortaleza republicana. Lincoln, Theodore Roosevelt, Reagan? Os ícones do passado foram soterrados pela cavalgada dos conquistadores.

Humberto Saccomandi - Desistência de Biden dará novo ânimo à eleição nos EUA e pode ameaçar Trump

Valor Econômico

Decisão inédita e tardia de Biden da corrida à Casa Branca joga a disputa eleitoral americana em terreno absolutamente desconhecido

presidente dos EUA, Joe Biden, desistiu neste domingo (21) de uma candidatura à reeleição que não deveria nem ter começado. As duas questões vitais para os democratas agora são: quem será o candidato presidencial e se terá chances de derrotar o republicano Donald Trump. Isso só ficará mais claro nas próximas semanas. A decisão inédita e tardia de Biden joga a disputa eleitoral americana em terreno absolutamente desconhecido.

O Partido Democrata falhou em aceitar sem oposição a disposição de Biden de, aos 81 anos, concorrer à reeleição. A questão principal não é se Biden conseguiria ganhar de Trump, como vinha sendo o argumento de muitos democratas que pediam um novo candidato. O mais importante era que o presidente muito possivelmente não teria condições físicas, e talvez nem mentais, de governar a maior potência global por mais quatro anos.

Edward Luce - Aconteça o que acontecer, democratas farão História

Financial Times / Valor Econômico

Joe Biden é o primeiro presidente dos EUA a desistir de tenta a reeleição desde 1968

Joe Biden fez história. O presidente mais velho dos Estados Unidos também se tornou o primeiro a renunciar voluntariamente ao poder desde Lyndon Johnson em 1968 e, antes disso, provavelmente George Washington em 1796. Sua decisão de renunciar ao cargo de candidato, que ocorreu após semanas de atormentado debate no Partido Democrata sobre suas habilidades cognitivas em declínio, também provavelmente proporcionará mais novidades históricas.

Seu apoio a Kamala Harris, sua vice-presidente, provavelmente garantirá a primeira candidatura presidencial de uma mulher não branca. Se ela vencer uma convenção disputada no mês que vem, Harris iniciaria as eleições gerais oficiais com chances quase iguais de derrotar Donald Trump.

Embora Biden tenha demorado a ouvir o coro crescente de democratas seniores, os grandes doadores e os meios de comunicação clamavam por tomar essa decisão. Ele deixou tempo suficiente para que os democratas se unificassem em torno de Harris, ou de outro candidato, até a convenção do partido em Chicago, no próximo mês.

David Brooks - O que os democratas precisam fazer

New York Times /O Estado de S. Paulo

O MAGA é uma espécie de marxismo de direita, que vê luta de classes como algo definidor da política

Em 2016, o movimento Faça a América Grande de Novo (MAGA), de Donald Trump, era apenas um slogan – ou, na melhor das hipóteses, um espasmo de ressentimentos e instintos sobre questões como a imigração. Nos últimos oito anos, pesquisadores, ativistas e políticos transformaram o MAGA em uma visão de mundo, uma visão de mundo que agora transcende Donald Trump.

Em todo o mundo ocidental, os partidos de direita deixaram de ser partidos das elites empresariais e se tornaram partidos da classe trabalhadora. O MAGA é a visão de mundo que está de acordo com essa realidade em transformação. Ele tem suas raízes no populismo ao estilo de Andrew Jackson (sétimo presidente dos EUA, um dos fundadores do Partido Democrata, criticado pelo tratamento de indígenas e deslealdade política), mas atualizado e mais abrangente. É a visão de mundo que representa uma versão dos interesses da classe trabalhadora e oferece respeito a esses eleitores.

Lourival Sant'Anna - Uma nova corrida presidencial começa nos EUA

O Estado de S. Paulo

A única certeza, neste momento, é a de que os democratas se livraram de um enorme peso

O cronômetro foi zerado. Uma nova corrida presidencial começa, com a desistência de Joe Biden e o endosso de sua vice, Kamala Harris. Dificilmente o nome dela será desafiado no Partido Democrata. A escolha do vice na chapa de Harris é o novo capítulo que determinará os rumos da disputa.

A desistência de Biden elimina o duplo ônus, para os democratas, de sua presença na cédula eleitoral: a rejeição que ele sofre do eleitorado, comparável somente à de Trump, e o seu desempenho desastroso em aparições públicas.

Agora, o mesmo ônus, por razões diferentes, fica exclusivamente com os republicanos: a conduta divisiva de Trump, que frustra muitos independentes e republicanos moderados, e a forte rejeição a seu nome.

Carlos Pereira -- Cooperação apenas para sobreviver

O Estado de S. Paulo

Estratégia mista de cooperar com o Legislativo e confrontar o Judiciário foi útil para Bolsonaro

Políticos de perfil autocrata, sejam eles de esquerda ou de direita, governam quase que invariavelmente confrontando as instituições que lhes impõem restrições.

No jantar de lançamento do livro “Por que a democracia brasileira não morreu?”, que aconteceu na semana passada no restaurante Cícero Bistrot, em Lisboa, o Ministro Gilmar Mendes do STF, com quem tivemos a honra de interagir como debatedor no evento, destacou que o ex-presidente Jair Bolsonaro manteve estratégias distintas para lidar com o Legislativo e com o Judiciário.

Camila Rocha - Reacionarismo e invasão de terras

Folha de S. Paulo

Hoje existem no Congresso 20 projetos de lei que integram o chamado 'pacote anti-MST'

Após o fracasso da CPI do MST, grupos ruralistas reacionários buscam promover uma nova ofensiva no Congresso. Hoje existem 20 projetos de lei que integram o chamado "pacote anti-MST", dada a pretensão explícita em criminalizar esse e outros movimentos sociais.

Três projetos já tramitam no Senado, entre os quais o projeto de lei 2.250/2021, que classifica como terrorismo a invasão de terras quando praticada com finalidade de provocar terror social ou generalizado; o PL 2.869/2023, que propõe o aumento de penas com objetivo de coibir invasões, sobretudo aquelas que ocorrerem em áreas rurais ou locais ermos; e o PL 709/2023, que propõe que ocupantes e invasores de propriedades sejam proibidos de acessar benefícios sociais e tomar posse em cargo ou função pública.

Marcus André Melo - Direita radical na Europa

Folha de S. Paulo

Entender o paradoxo exige examinar regras diferentes para o mesmo eleitorado

O RN liderado por Marine Le Pen quase dobrou o número de votos (37%) nas eleições legislativas francesas. No entanto obteve apenas 20% das cadeiras. Algo que já ocorrera antes. Em 2017, o partido, antes de mudar o nome, amealhou 13,3% (1º turno) e 8,5% (2º turno) dos votos e apenas 1,3% (8 em 577) das cadeiras.

Na última eleição britânica, o Reform Party foi o terceiro partido mais votado (14,3% dos votos), mas obteve apenas cinco cadeiras (0,7% do total). Em 2015, foi ainda pior: com 12,6% dos votos ficou com apenas 0,15% das cadeiras (isso mesmo, uma cadeira em 650).

A melhor forma de compreender o paradoxo é examinando o efeito de regras diferentes para o mesmo eleitorado.

Igor Gielow - Teimosia de presidente força partido a tomar uma decisão rápida

Folha de S. Paulo

Ato do presidente revela tanto o risco da insistência quanto a impotência ante o populismo

O ato de contrição final das cinco décadas de carreira política de Joseph Robinette Biden Jr. não poderia ser mais melancólico, até por inevitável.

Isolado devido à Covid-19, ele comunicou ao mundo que deixa a corrida presidencial contra um reenergizado Donald Trump a meros 107 dias do pleito —nunca antes isso havia ocorrido tão perto da eleição.

A desistência demonstrou duas coisas. Primeiro, que líderes precisam saber a hora de parar, por bem ou mal. O Partido Democrata não se renovou. Biden, 81, demorou três agônicas semanas para render-se ao óbvio.

Isso pode lhe custar caro: se não resolver lançar um George Clooney, para ficar no ator que simbolizou o grito pela saída de Biden, a missão de derrotar Trump ficará ou com a anódina vice, Kamala Harris, ou algum dos governadores não testados da sigla.

Lúcia Guimarães - Democrata não deveria ter esperado tanto e põe legado em risco

Folha de S. Paulo

Democrata insistiu numa postura sebastianista em que se imaginou o único capaz de salvar os Estados Unidos do genuíno horror que será uma segunda presidência Trump

Não era preciso ter esperado tanto. O melhor presidente americano dos últimos 60 anos colocou em risco seu legado. É fácil fazer análise de espelho retrovisor, mas o fato é que Joe Biden, o mais velho chefe de estado eleito, aos 77 anos, devia ter cumprido antes sua alegada intenção de sair do cargo ao final deste ano, depois de um governo genuinamente transformador para a vida dos americanos.

Ou o recado que ele passou –uma candidatura de um só mandato em dezembro de 2019— , quando sua vitória parecia francamente improvável, era apenas uma forma de aquietar aliados preocupados com sua idade?

Poesia | Calma, de Fernando Pessoa

 

Música | Vanessa da Mata - 'Faltando um pedaço'(Djavan)