segunda-feira, 5 de agosto de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Alta na letalidade policial em SP é preocupante

O Globo

Por décadas, o estado reduziu a criminalidade e as violações da polícia. Não deve fugir desse padrão

Um ano após a polêmica Operação Escudo, na Baixada Santista, o número de pessoas mortas pela polícia de São Paulo ainda cresce. No final de julho de 2023, um policial da Rota, sigla de Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, a tropa de elite da PM, foi morto no litoral paulista. Nos 40 dias seguintes, 958 pessoas foram presas e 28 morreram. De lá para cá, as mortes prosseguiram. No primeiro semestre, foram registradas 301 em todo o estado, alta de 94% na comparação com o mesmo período do ano passado. A letalidade policial voltou a níveis anteriores à expansão do uso de câmeras corporais nos uniformes.

O fato deveria servir de alerta ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). A mensagem de que é permitido aos policiais o descontrole do uso da força e as tentativas de barrar métodos de fiscalização correm o risco de elevar as acusações de crimes cometidos por agentes da lei e contaminar avanços na segurança pública duramente conquistados. Todo o país acompanha o que acontece em São Paulo.

Fernando Gabeira - Um passarinho contou a Maduro que ele venceu

O Globo

Ninguém acredita na apuração Mandrake da Venezuela, exceto o PT e parte da esquerda

Fiz as malas pensando na fronteira com a Venezuela. Pacaraima. Mas a fronteira fechou na véspera da eleição. Conheço a cidade. Teria pouco a fazer com a fronteira fechada. Paro no bar da rodoviária, mesmo sem ser carnívoro, como no único restaurante da cidade, a Churrascaria do Negão.

Tudo isso estaria vazio com a fronteira fechada. Algumas vezes, vou para o lado da Guiana, visitar Raposa Serra do Sol. Fico em Uiramutã, um nome sonoro, mas um lugar bem pequeno.

Fiz as contas e decidi que não valia investir. Preferi acompanhar passo a passo a eleição por meio da internet. O site TalCual Digital estava direto no tema, com dezenas de colaboradores independentes em todo o país e no exterior.

Talvez tenha uma fascinação infantil pela Venezuela, do tempo em que ouvia Harry Belafonte cantar: Matilda, Matilda, Matilda, she take me money and run Venezuela. Foram muitas viagens, principalmente para ouvir refugiados. Isso me trouxe uma ansiedade parecida com a que se vivia por lá. Será que, desta vez, cai o chavismo, voltam os que saíram, ficam no país os jovens que querem sair por falta de perspectiva? 

Demétrio Magnoli - O PT, no espelho da Venezuela

O Globo

A democracia sempre foi, para a esquerda, uma indecifrável esfinge

Menos de 24 horas depois de concluída a fraude eleitoral venezuelana, uma nota da direção do PT reconhecia como legítima a reeleição do ditador Maduro. Uma vez mais, como de costume, o PT revelava sua duplicidade fundamental, conciliando a defesa da democracia no Brasil com o apoio sistemático às “ditaduras companheiras” no exterior.

A democracia sempre foi, para a esquerda, uma indecifrável esfinge. Se, de acordo com as tábuas do dogma, o futuro da humanidade é o socialismo, e se a ferramenta que lhe abre as portas é a revolução, o que fazer com a democracia representativa?

Os partidos comunistas do passado ajuntavam sempre o adjetivo “burguesa” ao substantivo “democracia”, para esclarecer que sua defesa circunstancial da ordem democrática tinha caráter exclusivamente tático. As liberdades públicas serviriam apenas para facilitar a organização do partido que impulsionaria o movimento revolucionário. A “democracia burguesa” funcionaria como etapa transitória rumo à ditadura do proletariado. É fácil — mas equivocado! — enxergar nisso as raízes da duplicidade petista.

Marcus André Melo – A sina da Venezuela

Folha de S. Paulo

A autocratização começou há 8 anos: que fatores impedem uma saída negociada para Maduro?

A conversão do autoritarismo eleitoral chavista em autocracia plena não ocorreu agora, mas em 2015. Tratei da Venezuela historicamente aqui. Quando perdeu a maioria legislativa, Maduro deflagrou o processo de dissolução da Assembleia Nacional. Maduro mobilizou a Suprema Corte de maioria chavista para impedir a posse de deputados que garantiriam o quórum constitucional oposicionista. Depois mobilizou a Corte para a dissolução da Assembleia, o que ela fez.

A medida, no entanto, foi revertida, o que levou Maduro a convocar uma Assembleia Constituinte (que a oposição boicotou), que finalmente decretou a esperada dissolução. Ela também destituiu a Procuradora Geral do cargo, retirou a imunidade do presidente da Assembleia, Juan Guaidó; e cancelou os registros dos principais partidos da oposição, impedindo-os de participar das eleições. Tudo isso levou à crise de 2019.

Lygia Maria - O governo da Venezuela é uma ditadura de esquerda

Folha de S. Paulo

Quem nega esse fato solapa a ciência política e despreza a crise humanitária que assola o país

O governo da Venezuela é uma ditadura. Não importa que Lula, seu assessor Celso Amorim e o PT afirmem o contrário. O regime de Nicolás Maduro não preenche nenhum dos requisitos de uma democracia, a começar pelas eleições farsescas, como a realizada no domingo (28).

Além de se recusar a divulgar as atas do pleito, o governo interferiu na disputa ao impedir candidaturas da oposição e coagir eleitores.

Como em toda ditadura, o aparato policial do Estado persegue jornalistas e dissidentes. No Índice de Liberdade de Imprensa da ONG Repórteres sem Fronteiras, a Venezuela é a 159ª colocada entre 180 nações.

César Felício - Eleitorado sem religião cresce entre os jovens e se posiciona à esquerda

Valor Econômico

Contingente é maior nos grandes centros

Não é apenas o voto evangélico que cresce no Brasil. De maneira menos estudada, também cresce paulatinamente o segmento da população que se declara sem religião. E, assim como o evangélico, este eleitor tem um padrão bastante definido, orientado em direção oposta ao conservadorismo.

A tendência do crescimento do segmento sem religião vem se delineando há 40 anos. No censo de 1980, apenas 1,6% afirmavam não serem religiosos. Em 1991, já eram 4,7%. Em 2000 este percentual pulou para 7,4%. Em 2010 houve uma desaceleração e foram 8%. Os dados do censo de 2022 sobre esse tema ainda não estão disponíveis, mas levantamentos nacionais feitos pelo Datafolha e pela Quaest neste ano mostraram um percentual entre 10% e 14%. Mas esse contingente cresce nos grandes centros.

Bruno Carazza - Grato pela confiança; voltem sempre

Valor Econômico

Emendas orçamentárias e confiança dos cidadãos elevam chances de reeleição de prefeitos

O ano de 2016 foi um ano difícil para os prefeitos. A tempestade perfeita que desabou sobre a política brasileira, numa conjunção de ventos desfavoráveis que começaram a soprar com as jornadas de junho de 2013, ganharam impulso com a Lava Jato e haviam feito de Dilma Rousseff sua primeira vítima, finalmente tinha chegado nas cidades de todo o país.

Como meteorologistas, institutos de pesquisa captam as condições de temperatura e pressão para indicar a situação de momento da política, mas o acúmulo dos dados ao longo dos anos nos permite verificar os eventos climáticos que afetam uma dada região.

O instituto Ipec, desde os tempos que a equipe comandada por Márcia Cavallari estava abrigada no extinto Ibope, afere o Índice de Confiança Social, pesquisa quantitativa que mede a confiança da população em duas dezenas de instituições públicas e privadas - de partidos políticos ao corpo de bombeiros, passando por Forças Armadas, bancos e meios de comunicação.

Sergio Lamucci - Medidas de controle estrutural de gastos seguem em falta

Valor Econômico

Incertezas sobre a trajetória futura das contas públicas pressionam o câmbio e os juros de longo prazo

Os resultados fiscais seguem desconfortáveis e as incertezas sobre a trajetória das contas públicas permanecem elevadas, ajudando a explicar em boa parte o dólar na casa de R$ 5,70 e os juros de longo prazo acima de 6% ao ano, descontada a inflação. A situação não é explosiva no curto prazo, mas o déficit público é muito alto e as despesas obrigatórias crescem a um ritmo insustentável, apontando para o aumento contínuo do endividamento do governo. Esse quadro impõe obstáculos a uma queda sustentada dos juros, o que afeta o ritmo de crescimento da economia e piora o desempenho fiscal. Além disso, um cenário incerto para as contas públicas se torna ainda mais delicado quando o ambiente externo é de maior aversão global ao risco como o atual, desfavorável a países emergentes como o Brasil.

Simon Johnson* - Como criar mais empregos de qualidade

Valor Econômico

EUA, Reino Unido, França e vários outros países europeus precisam urgentemente fazer investimentos estratégicos em tecnologias-chave e manter-se à frente de concorrentes geopolíticos cada vez mais agressivos

Em muitos países, a inovação e os bons empregos têm ficado cada vez mais concentrados em poucos lugares. Algumas grandes cidades têm se saído bem, mas muitas regiões se sentem deixadas para trás. Nos Estados Unidos, no Reino Unido, em muitos lugares da Europa e em cada vez mais partes do mundo, descobrir como resolver essas disparidades se tornou uma questão crucial.

Desde, pelo menos, a crise financeira mundial de 2008, a frustração generalizada com a estagnação das perspectivas econômicas tem alimentado formas cada vez mais perigosas de raiva em países desenvolvidos. Com demasiada frequência, isso tem levado a políticas econômicas autodestrutivas, como o Brexit ou a promessa de Donald Trump de capturar e deportar dos EUA todos os imigrantes não autorizados - uma medida que, de imediato, reduziria a força de trabalho americana em cerca de 5% e provavelmente faria toda a economia do país ter uma retração do mesmo tamanho.

Carlos Pereira - Ameaças apenas retóricas ao STF

O Estado de S. Paulo

Só quando o STF decide sobre emendas é que a preferência de uma Suprema Corte menos ativa se fortalece

Diante de uma atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) cada vez mais preponderante na política brasileira, tem sido muito comum a Suprema Corte receber várias críticas de que estaria cruzando o sinal ao, supostamente, invadir a seara de outros Poderes.

O desenho institucional do legislador constituinte, de ter um STF forte (controle constitucional, recursal e criminal para atores políticos com foro privilegiado) e com capacidade de controlar o Executivo desviante estaria em xeque.

Embates entre o STF e o Legislativo têm se tornado cada vez mais frequentes. Mas tais conflitos não têm se traduzido em ações concretas do Legislativo no sentido de restringir os poderes outrora delegados pelos próprios legisladores ao STF. Na realidade, as ameaças de retaliação do Legislativo ao STF têm sido basicamente retóricas.

André Gustavo Stumpf - Oportunidades perdidas

Correio Braziliense

Presenciamos uma tragédia da esquerda na América Latina, que vive ainda no tempo em que Che Guevara tentava fazer a revolução nas selvas da Bolívia. É uma perda de tempo e de oportunidades sem tamanho

O homem é o homem mais suas circunstâncias, de acordo com Ortega y Gasset, pensador espanhol. As instituições também são confrontadas por suas circunstâncias. O Partido dos Trabalhadores (PT), criado em São Paulo, nos anos 1980 do século passado, por líderes metalúrgicos com apoio explícito de uma ala da Igreja Católica, sempre se distinguiu por assumir uma postura de esquerda, mas conviver bem com empresários. Afinal, trabalhadores e patrões precisam conversar e negociar, mesmo que seja sob pressão de greves. O PT tentou fugir do antigo modelo getulista de aderir ao governo e dizer amém ao presidente.

Mas sua trajetória foi marcada por erros, que se inscreveram para sempre na sua história. O comando expulsou os deputados que assinaram a Constituição de 1988, considerada demasiadamente burguesa. O partido virou as costas para o símbolo maior da redemocratização do país. Depois, decidiu não aderir ao Plano Real, reduzido, segundo seus exegetas, a mero expediente para influir nas eleições presidenciais. Na realidade, foi esse plano econômico que liquidou a hiperinflação no país. Os jovens não sabem o que é hiperinflação, fenômeno que obrigava o consumidor a gastar seu salário quando o recebia. Os preços aumentavam todos os dias.

Carlos Benedito Martins, Felipe Maia* - Intelectuais ainda têm influência nos debates públicos?

Folha de S. Paulo

A figura de intelectual público, simbolizada por pessoas com amplo repertório cultural, destreza na escrita e na interação com o público e disposição para se engajar em discussões que mobilizam a sociedade, ganhou popularidade no século 20, tendo em Jean-Paul Sartre uma de suas mais célebres expressões. Nas últimas décadas, contudo, mudanças sociais, sobretudo na produção e difusão de conhecimento nas universidades, acarretaram o declínio desse modelo e apontam novas modalidades de intervenção intelectual

Ao escrever sobre a representação do intelectual, Edward Said destacou que sua imagem foi moldada pelo caso do capitão Alfred Dreyfus, durante o qual o romancista Émile Zola mobilizou diversos homens de letras —sim, quase todos, homens— em uma causa política e moral que colocava em questão os fundamentos e a dinâmica da República francesa.

Em vista disso, o intelectual, na visão de Said, teria como missão confrontar ortodoxias, atuar de forma crítica na sociedade e agir com base em princípios universais. Essa categoria social surgiu no final do século 19, em um contexto de transformações sociais, como o processo de urbanização na Europa, o desenvolvimento de universidades e a industrialização da imprensa e da atividade editorial.

Esses eventos contribuíram para a formação de um espaço público aberto a debates políticos e culturais e, igualmente, propiciaram a autonomia da esfera da produção intelectual. Assim, os escritores e os artistas puderam se libertar da chancela de diversas modalidades de mecenato e passaram a viver de seus trabalhos e a se inserir na arena pública, ao lado de professores universitários, cientistas e profissionais liberais.

Pablo Spinelli[1] - O tiro esquecido na História

A atriz Fernanda Torres escreveu em uma crônica que está no seu segundo livro[2] que ao contrário de americanos (e nós) que ficaram por anos diante da Netflix esperando os episódios de House of Cards, uma série sobre os bastidores da política com intensa carga dramática, aqui, nossa cultura televisiva e cinematográfica não aborda com a mesma visceralidade os dramas da política institucional. E ainda sugere que o PMDB, atual MDB, serviria de grande mote para tramas muito mais ligadas ao pensamento de Maquiavel do que ao jardim da infância da moralidade binária entre o bem e o mal.

Aproveitando o mote, cumpre concordar e dialogar com a atriz que concorda com o signatário que faltam bons roteiros brasileiros sobre o drama pequeno-burguês no nosso cinema. Em 1993, a Rede Globo fez um dos maiores investimentos financeiros, tecnológicos e artísticos na adaptação da obra-prima literária de Rubem Fonseca[3]Agosto.

Ricardo José de Azevedo Marinho* - A Venezuela & Nós

Conheci vários venezuelanos e venezuelanas migrantes em outubro de 2021, por conta da conferência livre organizada pela Escola Estadual Fazenda Paraíso, em Espera Feliz, numa etapa preparatória para a construção do 1º Plano Estadual de Políticas Públicas para Refugiados, Migrantes, Apátridas e Retornados de Minas Gerais. Foi uma iniciativa cidadã muito impressionante.

Para um carioca acostumado ao frenesi metropolitano, participar daquele evento democrático naquela cidade foi como estar ao vivo em um filme de Nelson Pereira dos Santos.

Os anos de grande crescimento econômico para a Venezuela já eram coisas de um passado longínquo. A Caracas que ostentará arranha-céus urbanos que se cruzavam de forma caprichosa não existe mais.

Poesia | Eram ramos tufados, cheios...de Johann Wolfgang Von Goethe

 

Música | Xande canta Caetano, com Hamilton de Holanda - Qualquer Coisa