O Globo
Logo mais saberemos se Deus voltou a ser
brasileiro. Com Bolsonaro inelegível, as eleições de 2026 podem não contar
com Lula da
Silva. Sem um nome competitivo, o PT parece vislumbrar o final de sua dinastia.
Imagine: 2027 sem Lula, Bolsonaro ou o PT.
Não é torcida. São os fatos trazidos pelas pesquisas reveladoras de um novo
Brasil — e também pela Justiça. Ao que tudo indica, quando a primavera vier, o
pai de Jair Renan poderá encontrar as bem merecidas grades.
Nesse provável cenário, a corrida presidencial do próximo ano deverá ser a primeira desde a redemocratização sem os personagens fundamentais que capitanearam a luta contra a ditadura. Sejam Haddad, Ciro, Tarcísio, Caiado, Ratinho ou Zema, todos são políticos do período democrático. Com pé na direita ou esquerda, ganhando ou perdendo, passaram por eleições. À direita, a distinção se dá entre quem mata mais ou diz que mata menos. À esquerda, é o ritmo de modernização do Estado que marca o passo.
Parece pouco, mas não é. Significa que
presenciamos o final de uma visão (e prática) ideológica construída ainda sob a
existência da União Soviética, nos eflúvios da Guerra Fria nascida no
Pós-Guerra e, do outro lado, com uma ação política baseada no extremismo da
negação. No caso da esquerda, representada por Haddad ou Ciro Gomes,
ambos parecem desprezar a palavra de ordem da Causa que norteia ainda hoje o
Partido dos Trabalhadores. Vale lembrar que a Causa, de cepa revolucionária,
tendo o PT em tela, há muito se transformou apenas em ocupação patrimonialista
em benefício do coletivo do partido. Haja vista o olho cioso com que indicam os
integrantes dos diversos tribunais.
Não ter um PT competitivo e um Lula da Silva
chamuscado pelo novo Brasil é uma chance para a renovação da própria esquerda,
na vitória ou na derrota. O resultado de 2022 pode ser creditado ao desespero
da população em fugir de Bolsonaro. Foi, no entanto, o cadafalso de Lula e de
seu partido, ao exibir as armas de sempre — as bolsas sociais e as isenções.
(Atenção: assim como os treinadores gaúchos, que afundaram o futebol
brasileiro, eles insistirão na mesma fórmula populista de distribuir benesses.)
O apoio ao impeachment de Dilma Rousseff,
além de ser político, era um protesto contra um modelo de Estado (de caráter
getulista, estatista e sindicalista) ultrapassado, de costas para a nova
realidade trazida pela robotização dos meios de produção e pelas novas
tecnologias. Lula da Silva quis voltar (e quase perde), não para salvar a
democracia, como alega, mas para salvar sua biografia manchada pela prisão. Não
por acaso, chegou ao governo sem qualquer plano de ação, de gestão ou palavra
amiga, como notam as pesquisas.
O atual mandato paga por seus erros
políticos. O maior deles, preferir o PMDB ao PSDB. Em
sua luta freudiana contra Fernando Henrique, procurou ser o único expoente de
peso à esquerda. Só atiçou a direita. O mensalão, como instrumento de
cooptação, provou sua preferência pelo fisiologismo e sua identificação com um
projeto de país mantenedor das oligarquias. Embora soubesse ser beneficiado,
portanto sabia que mentia, tachou a gestão tucana de “herança maldita”. Ao
assumir no pós-Bolsonaro, aí sim um descalabro, enroscou-se e até perdeu a
vontade de vituperar palanques afora, como fizera nos outros mandatos.
Acabrunhou-se. Para quem se dizia metamorfose ambulante, deixar setores
importantes do país nas mãos deslumbradas de Janja e do sestroso Rui Costa
cobrará seu preço no varejo imediato.
Pior: a falta de substância da gestão petista
ainda contamina o espectro político. A ausência de ideias facilita o jogo para
a direita, que não se vê chamada a construir um projeto em resposta, nem ao
menos em reação. Joga no vácuo. Qual seria a proposta de Zema para a questão da
queda de natalidade que deverá impactar o mercado de trabalho? O que Caiado tem
a dizer sobre as terras raras de Minas e Pará quando se pensa em segurança
nacional? Será que os planos educacionais de Tarcísio se restringem à criação
de escolas cívico-militares? São questões que não precisam ser respondidas,
tampouco serão, porque Lula 3 não pensa nelas. Embora o futuro do país, entre
continuar a ser extrativista ou buscar uma modernidade econômica, nelas esteja
desenhado, aí não encontra eco para deixar a inação.
Parece insistência: a Coreia do Sul,
em poucas décadas, gerou conhecimento que deu em LG, Samsung etc. Em tempo
semelhante, os Lulas 1 e 2 resultaram na JBS, um abatedouro
de bife. Não é um elogio. A carne de laboratório já está a caminho.
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