quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Recorde de queimadas demonstra fracasso do Brasil no combate ao fogo

O Globo

Clima não é único vilão responsável pela área devastada. Faltou ação do governo quando era mais necessário

Um relatório do MapBiomas traduz em números a sensação que os brasileiros experimentaram no ano passado, quando cidades ficaram envoltas em fumaça. Em 2024, as queimadas destruíram 30,8 milhões de hectares, quase 80% acima de 2023. Foi a maior devastação desde o início da série histórica, em 2019 — área comparável à Itália. O fogo consumiu mais floresta que o desmatamento.

Do total queimado, 73% era vegetação nativa, principalmente formações florestais. A Amazônia foi o bioma mais atingido, com 17,9 milhões de hectares perdidos, mais que a área incendiada em todo o país em 2023. No Cerrado, foram destruídos 9,7 milhões de hectares. O Pantanal perdeu 1,9 milhão, e a Mata Atlântica 1 milhão. No rol dos estados mais atingidos, o Pará, futura sede da Conferência do Clima da ONU (COP30), aparece no topo, com 7,3 milhões de hectares, seguido de Mato Grosso (6,8 milhões) e Tocantins (2,7 milhões). Os três estados respondem por 55% da área queimada.

O futuro em jogo - Merval Pereira

O Globo

Lula chega à beira dos 80 anos constatando que talvez não possa concorrer à reeleição, olha para o lado e não vê quem possa substituí-lo

O presidente Lula demonstrou mais uma vez que é maior que o PT e que tem visão política mais realista do que aqueles que o cercam, acostumados a viver à sua sombra, resignados a depender dele para ganhar eleições. Ao chamar a atenção de seus ministros e principais assessores para a necessidade de montar um esquema que possibilite a vitória em 2026 sem que necessariamente seja ele o candidato do partido, Lula colocou na mesa problemas difíceis de resolver a curto prazo, muito por causa dele mesmo.

Líder personalista que passou a vida bloqueando a renovação partidária por não querer ninguém a fazer-lhe sombra, Lula chega agora à beira dos 80 anos constatando que talvez não possa concorrer à reeleição, olha para o lado e não vê quem possa substituí-lo eleitoralmente.

Foi ele a lembrar que, além da idade avançada, os imprevistos acontecem, como o defeito no avião presidencial que teve de sobrevoar o aeroporto por cinco horas para poder fazer um pouso de emergência ou a queda no banheiro que quase lhe tirou a vida, na descrição dramática que fez na reunião ministerial. Interessante lembrar que, quando outros escreveram ou especularam sobre essa hipótese, foram acusados de etarismo, bolsonarismo e outros ismos. Quando Lula fala, é o quê?

O antídoto do governo Lula para começar a reverter estrago da crise do Pix - Malu Gaspar

O Globo

A campanha publicitária encomendada pelo governo Lula para defender o Pix, que vai ao ar nos próximos dias, vai mirar especificamente o segmento do eleitorado que mais sentiu o impacto das mudanças na fiscalização de transferências a partir de R$ 5 mil e da forte campanha da oposição contra elas: os trabalhadores autônomos, empreendedores e informais.

Fontes que tiveram acesso às discussões com as agências afirmam que o material será protagonizado por pessoas com esse perfil. A ideia é aproveitar o pretexto de defender a confiabilidade do Pix para começar a colocar em prática uma estratégia de aproximação com esse segmento do eleitorado.

Além de ser tradicionalmente desconfiado do governo, esse público foi o mais impactado pelo vídeo do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) – que sugeriu, num vídeo que teve 324 milhões de visualizações, que a gestão Lula pretendia usar as informações sobre a movimentação para cobrar mais impostos e penalizar ainda mais os informais.

Governo Lula continua batendo cabeça na economia - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Tabelar preços de alimentos é uma maldição, o último estágio da perda de controle da inflação, depois do congelamento de tarifas públicas e preços dos combustíveis

Não tem como não lembrar do velho samba de Noel Rosa: “Quem é você que não sabe o que diz?/Meu Deus do Céu, que palpite infeliz!”. Mais uma patacoada do governo na área econômica, depois de uma semana em que foi nocauteado nas redes sociais com a história da fiscalização do Pix, por uma onda de fake news contra o governo, por causa de uma zelosa instrução normativa da Receita: o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, empoderado como se fosse um primeiro-ministro, anunciou que o governo federal fará “intervenções” para reduzir o preço dos alimentos.

Como Trump alveja a soberania tributária dos países - Assis Moreira

Valor Econômico

Um acordo para taxação das gigantes da Internet já tinha fracassado na OCDE, e a situação agora complicou mais

Donald Trump terminou seu discurso de posse como novo presidente dos Estados Unidos, na segunda-feira (20), avisando que "nada se interporá em nosso caminho porque somos americanos".

No mesmo dia, anunciou uma avalanche de decisões, marcadas pelo isolacionismo. Uma delas procura desmantelar a vasta reforma do sistema tributário internacional negociada na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Alveja na prática a soberania dos outros países e busca ditar as regras do jogo conforme a exclusiva conveniência dos EUA.

Trump não se preocupa com a ordem internacional baseada em regras e nem em alimentar sua rede de aliados, e quer exercer seu poder por dominação econômica, medo e força, como definiu o "New York Times". No caso da tributação global, essa é uma ilustração a mais.

Por que devemos chamá-lo de fascista - Eugênio Bucci

O Estado de S. Paulo

Estratégia de Trump é desmantelar a democracia, perseguir os estrangeiros, insuflar o nacionalismo. Como Hitler e Mussolini

Donald Trump é fascista? Há quem diga que não devemos qualificá-lo dessa forma. A cientista política Wendy Brown, por exemplo, acha que o autoritarismo que tem crescido no nosso tempo é de outra natureza. Em 2022, numa entrevista para o site Nueva Sociedad, ela apontou distinções entre a ditadura de Benito Mussolini e os regimes atuais de extrema direita. Segundo ela, as autocracias do século 21 “nascem da racionalidade neoliberal” e se diferenciam do fascismo clássico por serem “autoritárias no âmbito político e libertárias nos assuntos da vida civil e pessoal”.

Eu não discordo de Wendy Brown. Existem autocratas na atualidade que não ligam a mínima para temas como casamento gay. Se alguns são machistas furibundos, e Donald Trump é um deles, outros não adotam o moralismo misógino do velho Duce. Existem até líderes de extrema direita que são lésbicas declaradas.

Trump e o 'privilégio exorbitante' do dólar - José Serra

O Estado de S. Paulo

O debate sobre a ‘desdolarização’ da economia global e a ‘multipolaridade’ do SMFI já tinha emergido antes da eleição americana, mas ganhou impulso desde então

Desde a campanha presidencial, Donald Trump reafirmou seu compromisso com a hegemonia do dólar como divisa-chave do sistema monetário e financeiro internacional (SMFI). Ou seja, o dólar desempenha a função de moeda internacional, sendo predominantemente utilizado como meio de pagamento, unidade de conta e reserva de valor fora das fronteiras nacionais.

Após a eleição, Trump intensificou suas exigências, ameaçando aplicar sanções comerciais (especialmente na forma de tarifas de 100%) contra países que abandonassem a moeda americana, inclusive os países dos Brics, que aventaram a possibilidade de criar uma moeda alternativa ao dólar nas duas últimas cúpulas – Johannesburgo (2023) e Kazan (2024).

Crise autoinfligida - William Waack

O Estado de S. Paulo

Lula 3 está trilhando uma rota fiscal insustentável

Desde sempre historiadores tentaram resumir em poucas palavras o fenômeno de decisões políticas (e/ou militares) que levaram a grandes desastres, embora claramente previsíveis. Duas obras de enorme sucesso foram “A Marcha da Insensatez”, de Barbara Tuchman (de Troia ao Vietnã), e “Os Sonâmbulos”, de Christopher Clark (como a Europa “tropeçou” para dentro da Primeira Guerra Mundial).

Não há nada de sonâmbulo na marcha de Lula 3 no caminho da insensatez fiscal, que arrisca provocar uma crise política justamente quando seria menos desejável – isto é, num cenário eleitoral. Ao contrário, o presidente não transmite em privado ou em público qualquer sinal de que entenda a questão fiscal como insustentável.

A principal assessoria econômica do Ministério da Fazenda produz avaliações do seguinte teor: “nós estamos no caminho certo da consolidação, uma consolidação fiscal feita com baixíssimo desemprego, crescimento econômico, distribuição de renda e combate à pobreza. Sempre foi nosso objetivo: conduzir uma política econômica capaz de consolidar as contas públicas ao mesmo tempo que promove o crescimento e a distribuição de renda”.

Lula e a procura do ponto G - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Em 2007, durante a visita do presidente George W. Bush ao Brasil, o presidente Lula chegou a dizer que buscava “o ponto G nas relações do Brasil com os Estados Unidos”.

Bush passou a impressão de que não entendeu bem o que Lula quis dizer com esse “ponto G”, mas as burocracias interpretaram que se tratava de encontrar certo equilíbrio na administração dos interesses recíprocos nem sempre convergentes que, ao mesmo tempo, não dispensasse efeitos satisfatórios.

O presidente Donald Trump, que acaba de tomar posse, mostrou que não faz questão do uso da linguagem diplomática. Declarou, na Casa Branca, que “o Brasil precisa mais dos Estados Unidos do que os Estados Unidos precisam do Brasil”. É postura que complica a procura do tal “ponto G” pelo presidente Lula, que declarou antes do fim da disputa eleitoral a sua preferência pela candidata Kamala Harris.

Salário perde da inflação da comida, faz tempo - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Apesar de altas recentes de renda, poder de compra de alimentos caiu em 5 anos

O governo anunciou que pretende tomar medidas a fim de conter a inflação dos alimentos. Para tanto, faria algum acerto para diminuir custos de supermercados.

Pelo menos no curto prazo, não há como o governo conter preços de modo relevante sem fazer bobagem, sem atirar no próprio pé. Seria possível reduzir custos do comércio, dizem, por meio de mudanças nas regras sobre prazo de validade de alimentos, de normas trabalhistas, da permissão de venda de remédios sem receita, de custos do sistema de pagamentos. Quem sabe consigam alguma mudança de pequena ordem, mas não há garantia de que mesmo essa redução modesta chegue aos preços, a depender do mercado em questão, da demanda, da política de preços das redes de lojas, da concorrência etc.

Em tese, se não inventarem bobagens, o esforço não pode ser desmerecido, claro. O governo corre o risco, porém, de criar expectativas que não se realizem ou de naufragar por motivos alheios à vontade de todos os envolvidos (dólar, demanda mundial, condições climáticas etc.). Depois de fracassos de público, como o "imposto das blusinhas" e a guerra de mentiras do Pix, é arrumar sarna para se coçar. Mais importante é entender um pouco mais dos motivos da insatisfação.

Pode acontecer aqui de novo ou nunca mais? - Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

STF deve fazer mais e melhor, mas não sozinho

A reeleição de Trump dispara muitos alarmes na precária democracia norte-americana e no mundo. Apreensão com climasaúdetransição energética, desigualdade, hegemonia plutocrática, corrupção, governança global multilateral e decência humanitária chegou a outro patamar.

Se a credencial democrática já era duvidosa em país com sistema eleitoral que suprime voto de parte do povo e poder corporativo ilimitado para influenciar eleições e políticas públicas (financiando ambos os lados), agora a ciência política pode se sentir mais confortável para classificar o regime de "autoritarismo competitivo".

A última dúvida é saber como vão funcionar os "freios e contrapesos". Sabe-se que Trump têm hoje mais capacidade para barbarizar. Tem maioria nas duas casas do Congresso, a Suprema Corte foi convertida ao servilismo anti-constitucional já no primeiro mandato e se esmera em revogar sua jurisprudência das liberdades civis.

Sobra alguma autonomia nos judiciários estaduais e federal, e nos governos subnacionais. Sobra a esperança de que a história e o acaso aprontem algo de bom, que o determinismo pessimista possa falhar dessa vez.

Termômetro para Trump 2 - Ricardo Della Coletta

Folha de S. Paulo

Governo Lula deve ter em março amostra do que esperar das ações de Trump

O governo Lula (PT) deve ter no início de março uma amostra do que esperar das ações de Donald Trump para a América Latina.

No dia 10 do mês, os países da OEA (Organização dos Estados Americanos) selecionam um novo secretário-geral para um mandato de cinco anos. O vencedor substituirá Luis Almagro, uruguaio cuja gestão dividiu opiniões na entidade por uma postura antichavista que lhe rendeu elogios da direita e alienou governos de esquerda.

Os americanos sempre mantiveram uma forte influência na OEA —sediada em Washington— por enxergarem na entidade um mecanismo pelo qual podem buscar legitimar suas políticas para o continente.

Nova ordem no Planeta Vermelho - Ruy Castro

Folha de S. Paulo

Marte é o deus da Guerra. Portanto, é Marte acima de tudo e Trump, seu marechal, acima de todos

Donald Trump tomou posse como presidente de MarteElon Musk, o homem mais rico do Universo e com grandes interesses no Planeta Vermelho, será o seu mentor, o cérebro por trás do trono, quase um presidente putativo. Com isso, podemos ter certeza de que Trump cumprirá suas promessas de campanha: "Vamos fazer Marte grande de novo!", "Marte em primeiro lugar!", "Vamos nos orgulhar, vamos ser fortes, vamos vencer como nunca!" Perguntado sobre a sua relação com a Lua, foi taxativo: "Não precisamos dela!"

Poesia | Chuva de caju, de Joaquim Cardozo

Como te chamas, pequena chuva inconstante e breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza? Maria?
Entra, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios aromáticos.
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos viveiros
E em noites de lua cheia passam rondando os maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quer te chames Tereza ou Maria.

Música | Mônica Salmaso - O velho Francisco (Chico Buarque)