terça-feira, 7 de janeiro de 2025

O Que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Ordem judicial para investigar israelense foi descabida

O Globo

Justiça brasileira extrapolou sua competência em caso de soldado reservista que já saiu do país

A decisão da Justiça Federal de acatar pedido feito pela Fundação Hind Rajab, uma ONG pró-palestina, para que Yuval Vagdani, um soldado reservista israelense de 21 anos de férias na Bahia, fosse investigado sob a suspeita de ter cometido crimes de guerra na Faixa de Gaza foi descabida. O soldado deixou o Brasil no fim de semana, mas o episódio ficará marcado como um excesso do Judiciário local. Coube ao Ministério Público Federal (MPF) explicar que Vagdani não era residente no Brasil e, segundo o Direito Internacional, o Juízo Federal carece de “competência para analisar o tema”.

Em petição feita em dezembro, os advogados Maira Pinheiro e Caio Patricio de Almeida, contatados pela Hind Rajab, pediram apuração na seção judiciária da Bahia. “Após cumprir seu serviço militar como membro do 432º Batalhão das Brigadas Givati e, de maneira sorridente e debochada, documentar a própria participação no cometimento de crimes de guerra, o noticiado [Vagdani] viajou com amigos e encontra-se neste momento em Morro de São Paulo, conforme registro publicado por ele próprio na rede social Instagram em 25 de dezembro de 2024”, escreveram os advogados.

Feliz Ano Novo - Merval Pereira

O Globo

“Ainda estou aqui” leva aos cinemas do país milhões de brasileiros para conhecer uma parte de sua História que lhes tem sido negada por anos a fio

A explosão de alegria que a vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro nos proporcionou tem diversos significados, como uma hipotética revanche da mãe, Fernanda Montenegro, que, na opinião de Glenn Close, e de todos os brasileiros, deveria ter ganhado o Oscar de melhor atriz em 1999 pelo filme “Central do Brasil”, em vez de Gwyneth Paltrow. O reconhecimento mundial de um ícone brasileiro, assim como foi com Vini Jr. sendo escolhido o melhor jogador do mundo pela Fifa, sempre levanta o astral de um país como o nosso, se debatendo há anos entre tapas e beijos para se equilibrar como uma sociedade justa e o menos desigual possível.

Mas o que o filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, tem de mais edificante é levar aos cinemas do país milhões de brasileiros para conhecer uma parte de sua História que lhes tem sido negada por anos a fio. Especialmente uma juventude que, nascida já na redemocratização, não aprende na escola o que se passou antes de nascerem.

Contra a marcha da insensatez - Paulo Hartung

O Estado de S. Paulo

A prescrição recomenda fugir das armadilhas da repetição de erros, do desperdício das lições da História e da cegueira em face da racionalidade

Há exatos 40 anos à disposição dos leitores, o livro A Marcha da Insensatez: de Troia ao Vietnã, da historiadora norteamericana Barbara W. Tuchman (1912-1989), porta mensagem atualíssima àqueles que conduzem os destinos de nações e, também, àqueles com responsabilidades sobre o fazer político-institucional. Sua análise centra-se no fato de que, ao longo dos tempos, repetem-se ações governamentais que se voltam contra o interesse dos próprios governos e de seus governados, numa prevalência da insensatez sobre a prudência.

No livro, a autora pergunta: “Por que os detentores de altos cargos agem tantas vezes de forma contrária ao que a razão aponta e o interesse próprio esclarecido sugere?”. As repostas variam, conforme cada caso, mas o grande valor dessa abordagem é apontar que impulsos guiam, História afora, uma marcha da insensatez persistente e onipresente – e quiçá nos fazer enxergar nossa própria realidade; descobrir se também estamos na trilha dos insensatos (falta de racionalidade e bom senso), em vez de seguirmos na marcha da prudência (qualidade de quem age cautelosa e racionalmente para evitar más consequências dos seus próprios atos).

Maledicência - Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

No dia 23 de dezembro de 2024, Flávio Dino suspendeu o pagamento de emendas de comissão. Já o fizera em agosto, num período em que a distribuição estava limitada pela Justiça Eleitoral. A nova suspensão, coincidente com o início do recesso parlamentar, viria logo depois de o governo aprovar o seu pacotinho fiscal. A cronologia dos atos sugere. O ministro suspendera o movimento em agosto, quando emendas não podiam ser pagas. Suspendeu-o novamente em dezembro, coincidindo com o começo das férias no Congresso – e após o governo ter aprovado seus projetos no Parlamento.

Só pode ser suspenso de novo o que fora liberado. Liberado em 2 de dezembro. Mesmo com a evidência de que a Lei Complementar 210 afrontava as determinações do Supremo.

Gastança e especulação -Luiz Gonzaga Belluzzo

Valor Econômico

Nas profundezas do processo de criação de valor e geração de rendimentos está o demônio da liquidez

Esparramados nos jornais e salpicados nos debates televisivos, editoriais, artigos e matérias de economia tocam o realejo da “gastança” e da “especulação”.

Começamos com a gastança. Marx, Keynes e Schumpeter desvendaram entre as funções dinheiro sua forma capitalista de riqueza-potência, a ponte que enseja a passagem para o futuro.

Ademais de um meio de circulação de mercadorias e ativos existentes, o dinheiro em sua forma capitalista é, sobretudo, uma aposta na geração e acumulação de riqueza futura, o que envolve a aquisição de meios de produção com o propósito de capturar um valor monetário acima do que foi gasto. Se não há aposta na criação de riqueza futura, não há gasto e, se não há gasto, o circuito da renda monetária fenece.

Crédito e dívida são essencialmente formas de criação de moeda como riqueza potencial. Isso significa que, no capitalismo, o dinheiro não se limita a facilitar a troca de mercadorias e serviços, mas engendra sistematicamente a multiplicação de ativos na economia. Assim devemos considerar a construção de uma nova fábrica ou as apostas nos mercados futuros que cuidam da flutuação de preços dos ativos subjacentes, tais como commodities, juros e câmbio. Sempre de olho no futuro.

2025 deve ter idas e vindas na agenda fiscal - Luiz Schymura

Valor Econômico

Tudo leva a crer que o ano será de muita turbulência, fazendo com que as expectativas dos agentes econômicos fiquem muito voláteis

O ano de 2025 se inicia trazendo muitas indagações sobre o caminho da economia política internacional. Não por acaso, há muita atenção e preocupação com as consequências para a economia brasileira. Como destaca meu colega Bráulio Borges, a incerteza sobre a política comercial dos EUA quase quadruplicou entre agosto e novembro, atingindo o maior nível já registrado desde 1960, quando tem início a série histórica do indicador baseado em notícias (Monthly TPU index). Estudo usando esse indicador aponta que aumentos da incerteza comercial global geram impacto negativo bem evidente no investimento privado.

A IA de 2025 não é como a do ano passado – Pedro Doria

O Globo

Dois jogadores podem fazer com que este ano de 2025 seja bem diferente no terreno da inteligência artificial. Um já era conhecido, mas deu mesmo as caras nas últimas semanas de dezembro. O outro, para quem não acompanha esse mundo com a lupa, parecerá ter surgido do nada. É uma IA chinesa, a DeepSeek, que, tendo sido treinada apesar dos muitos limites tecnológicos impostos pelos Estados Unidos, parece que em várias funções é superior ao GPT. Com duas diferenças relevantes: foi treinada com muito menos dinheiro e é livre. Qualquer um pode baixar, usar, sem custos.

Oito de Janeiro de 2023 jamais pode ser esquecido - Jorge Messias

O Globo

A sociedade brasileira demonstrou o apego ao regime democrático. E atribuo isso à resposta institucional firme

Há dois anos testemunhamos uma série de acontecimentos que constará dos anais da sociedade brasileira como um dos mais sombrios momentos da nossa democracia.

Acompanhamos atônitos o intolerável! Extremistas inconformados com o resultado eleitoral levando adiante um ataque contra as instituições republicanas, atentando, mais precisamente, contra a democracia brasileira.

Não foram meras investidas às sedes dos Poderes da República. Na verdade, foi uma tentativa violenta de tomar o poder, em afronta, afinal, ao Estado de Direito.

Também não foram acontecimentos isolados, mas o que aconteceu no 8 de Janeiro de 2023 foi o clímax de eventos decorrentes do processo de radicalização política, alimentado pela disseminação de notícias falsas, desinformação e discursos de ódio, que se apresentaram como ameaças reais à nossa estabilidade democrática.

Eliane Cantanhêde – De alma lavada

O Estado de S. Paulo

O Globo de Ouro de Fernanda Torres, a três dias do segundo ano do 8/1, é um troféu à democracia

O Globo de Ouro da nossa Fernanda Torres e o próprio lançamento de Ainda Estou Aqui lavam nossa alma brasileira e vêm num momento muitíssimo especial, com o mundo tomando rumos preocupantes e o Brasil comemorando a resistência da nossa democracia e alertando para o risco que todos corremos de um golpe de claro viés militar.

Fernanda mobilizou o Brasil e surpreendeu o mundo ao encarnar a grande guerreira Eunice Paiva e trazer o troféu justamente três dias antes de o aterrorizante 8 de janeiro de 2023 completar dois anos. Um prêmio para o talento incontestável de uma atriz incrível, com uma mãe incrível e de uma família incrível, mas também para nós, brasileiros.

O filme de Walter Salles, estrelado também por Selton Mello, impecável no papel de Rubens Paiva, já seria fantástico em qualquer época, mas é especialmente oportuno ao enaltecer a resistência quando o País comemora a vitória da democracia. A Polícia Federal investigou e o Supremo Tribunal Federal vem punindo com rigor os atos e os criminosos que vandalizaram o Planalto, o Congresso e o próprio STF. E a investigação e as punições não acabaram.

Consagração de Fernanda Torres celebra a democracia – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Ainda estou aqui é um exemplo da história como presente, quando o ex-presidente Bolsonaro e um grupo de militares são acusados de tentativa de golpe de Estado

Na sequência do ano novo, um rito de passagem no qual as esperanças se renovam, o Brasil se ufana com a merecidíssima conquista do Globo de Ouro de melhor atriz por Fernanda Torres, protagonista do filme Ainda estou aqui, de Walter Salles, sucesso de bilheteria no Brasil e da crítica mundial.

O filme não repetiu o feito de Central do Brasil, do mesmo diretor, que ganhou o Globo de Ouro em 1999, mas redimiu a não premiação de Fernanda Montenegro, sua protagonista, diva da cultura brasileira — numa das melhores interpretações de sua carreira no cinema —, que aparece no final do filme, quando a matriarca da família Paiva já estava com Alzheimer.

Foi bonito ver ícones do cinema mundial, como Kate Winslet e Tilda Swinton, reverenciarem a vitória de Fernanda Torres, o que significa o reconhecimento também da qualidade do nosso cinema pela Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood, a meca da industrial cinematográfica mundial. Uma vitória da cultura brasileira e, ao mesmo tempo, um resgate da nossa história política.

Eunice, Fernanda e a luta contra o esquecimento - Patrícia Machado*

Correio Braziliense

A história de Eunice Paiva, vivida intensamente por Fernanda Torres, nos lembra que a memória é um campo de batalha onde o esquecimento e a impunidade precisam ser confrontados

Em uma das cenas mais emblemáticas protagonizadas por Fernanda Torres em Ainda estou aqui, da areia da praia a personagem Eunice Paiva olha para a rua enquanto a família feliz se reúne para uma fotografia. Fernanda não diz nada, mas, com um olhar expressivo, que se direciona para longe da câmera, antevê o futuro. Ali, a personagem pressente o que está por vir. A passagem de um veículo do Exército pela orla da praia de Ipanema contrasta com o dia ensolarado e anuncia tempos trágicos para a família Paiva e para o Brasil.

Hoje, o país comemora a vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro, que encarnou a história de uma mulher que foi vítima da ditadura militar. Para além das lutas políticas de Rubens e Eunice, o filme foca em um momento que sintetiza os efeitos de uma política autoritária que perpetua a impunidade. Na sala de cinema, assistimos aos policiais invadirem a casa de um deputado, homem de classe média alta, e o levarem embora, sem nenhuma explicação. Rubens Paiva nunca mais retorna. Os responsáveis pelo crime não foram punidos, o corpo de Rubens nunca foi encontrado e a justiça não foi feita. Uma história que grande parte do país desconhecia ou simplesmente esqueceu.

Democracia não é o que você pensa - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Direita deve rechaçar negacionismo das urnas, e esquerda precisa evitar associar oposição a ameaça democrática

A diplomação do próximo presidente americano transcorreu sem incidentes. As urnas só são contestadas —como no 6 de janeiro de 2021— quando Trump perde. Ou quando Bolsonaro perde. Nesta quarta, no 8 de janeiro, será nossa vez de lembrarmos a versão brasileira do pastiche americano.

Em 21 de março de 2022 escrevi nesta Folha: "De uma coisa podemos ter a mais tranquila certeza: caso perca as eleições, Bolsonaro tentará desacreditar as urnas e causar tumulto, numa reedição da invasão do Capitólio americano em janeiro de 2021" na coluna "O Telegram tem o direito de ignorar a Justiça brasileira?". Dito e feito. Não era uma previsão arriscada. A estratégia era explícita.

Aqui, como lá, fomos submetidos a meses de mentiras sobre as urnas, vindas sempre do mesmo grupo. Depois da derrota, o fanatismo precisou de uma catarse. Lá, acreditaram que poderiam impedir a diplomação na marra. Aqui, que a quebradeira dos prédios públicos provocaria uma intervenção militar.

STF brinca com o casuísmo - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Corte não tem controle sobre a forma como a sociedade interpreta suas decisões e por isso precisa fugir de polêmicas menores

Se há algo que nenhum autor controla, é a forma como será interpretado. Karl Marx provavelmente ficaria chocado com o caráter autoritário dos regimes que proclamavam agir segundo suas ideias. O projeto marxista, afinal, era um plano de emancipação, não de subjugação, da humanidade.

E a forma como cada texto, palavra ou gesto é interpretado depende muito do ambiente circundante. Se em tempos de paz social dá para travar debates públicos sobre questões polêmicas de modo razoavelmente maduro, em momentos de grande polarização afetiva ocorre o inverso. Aí, tudo o que fuja a um juramento de lealdade total a um dos lados na contenda será visto como manifestação de apoio ao outro polo.

Dino mexeu num vespeiro - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

A cada decisão de Dino, ficam mais claras as ilegalidades no uso das emendas

A cada movimento do ministro Flávio Dino no universo das emendas parlamentares, ele nos mostra que mexeu num ninho de marimbondos dos mais perigosos.

Recentemente foram um projeto militar e organizações não governamentais, mas já estão implicados órgãos do Executivo, prefeituras, deputados, senadores e respectivos apaniguados.

A Polícia Federal está no encalço desse pessoal, cujas atividades há muito estavam a requerer controle. Convém pontuar que Flávio Dino não está à frente do assunto por vontade própria.

O bloco dos inelegíveis - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Colecionador de escândalos e inquéritos, Washington Reis é o candidato do bolsonarismo à sucessão de Cláudio Castro

Com a desculpa de agir em nome da liberdade ou da pátria, certos políticos se movimentam num reino independente, onde só a sua lei vale. Na hora de gerir o que na verdade é um negócio particular, não há diferença entre legalidade e ilegalidade. Comportam-se como gângsteres.

inelegibilidade, por exemplo, tornou-se uma virtude. Inelegível, mas insistindo em candidatar-se, Bolsonaro quer um companheiro de condição para governar o Rio a partir de 2027: Washington Reis, secretário de Transportes de Cláudio Castro. Este, por coincidência, está ameaçado de ficar inelegível e de ter o mandato cassado.

Em 2016, Reis foi condenado no STF a sete anos de prisão por crime ambiental ao fazer um loteamento clandestino em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, seu reduto eleitoral. Apesar da sentença, não cumpriu pena. Ele diz ter meios jurídicos para derrubar o impeditivo, embora tenha sido obrigado a abandonar a chapa de Castro em 2022.

Viva a arte, viva o cinema brasileiro - Guto Rodrigues

Estou muito feliz com a consagração de Fernanda Torres, como melhor atriz, no Globo de Ouro, um momento histórico inesquecível. A arte e a ética corrigem as deformações e a insanidade da vida, não joga pra debaixo do tapete, os crimes dos algozes da ditadura, não se conformam com o "melhor é deixar pra trás".

Eunice Paiva, interpretada por Fernanda Torres, traz tanta verdade, tanta leveza e serenidade. Uma frágil mulher desafia e desvela a face oculta e monstruosa da ditadura, nos revelando que não é possível deixar que se exaltem torturadores, assassinos como o ídolo de Bolsonaro, Coronel Ustra.

A veneranda Eunice Paiva, interpretada por Fernanda Montenegro, em cena curta, sem fala, acometida pelo Alzheimer, expressa em seu rosto, ao ouvir reportagem sobre seu marido Rubens Paiva, que nem a doença que destrói as funções cerebrais conseguiu apagar sua triste perda.

Parabéns, Fernandinha Torres, minha lindinha, 25 anos depois, você com sua grandeza e simplicidade completa a jornada que sua mãe iniciou também, com Walter Sales.

O fascismo que governou, recente, o nosso país e tentou acabar com a cultura e diminuir e desvalorizar seus artistas, ocasionando por desgosto, a perda do ator Flávio Migliaccio, para o suicídio.

Com a vitória de Fernanda Torres a arte e a ética dão a volta por cima e o colocam em seu lugar de desprezo, insignificância e repulsa. Ditadura nunca mais! Viva a arte, viva o cinema brasileiro!

Poesia | Fernanda Torres- Necrológio dos desiludidos do amor, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Claudionor Germano e Spok Frevo