quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Alta dos gastos parafiscais alimenta incerteza

O Globo

Despesas fixas por fora do Orçamento deverão dobrar ou triplicar neste ano, alcançando pelo menos 1% do PIB

A forte expansão do gasto público desde a volta do PT ao Planalto é responsável não apenas pelo aumento do endividamento público, mas também pela alta dos preços — apesar de a inflação de janeiro ter ficado em 0,16%, melhor resultado do mês desde o Plano Real, o acumulado em 12 meses continua acima da meta (4,56% ante 4,5%). Talvez esse seja o motivo mais evidente para o cidadão comum dar atenção ao desarranjo fiscal. Merecem especial atenção aquelas despesas que, apesar de crescentes e recorrentes, não entram oficialmente no Orçamento. Conhecidas como parafiscais, incluem o financiamento de políticas públicas por fundos estatais, sua exclusão dos cálculos do arcabouço fiscal, o incentivo artificial ao consumo pelos bancos públicos, investimentos de estatais ou aumento do crédito subsidiado pelo BNDES com fins e garantias duvidosos e toda sorte de “criatividade contábil”.

Fuga para a frente? - Vera Magalhães

O Globo

Ideia de uma 'fuga para frente' a partir de um grande acordo esbarra em dificuldades nos casos envolvendo Bolsonaro

As últimas semanas têm sido pródigas em balões de ensaio com saídas para lá de heterodoxas para resolver impasses políticos, judiciais ou institucionais. Das condenações do 8 de Janeiro à expectativa diante da iminente denúncia de Jair Bolsonaro, ex-ministros, militares e outros assessores pelas tratativas para um golpe ainda antes da posse de Lula, passando pelo imbróglio das emendas, muita gente parece empenhada em desenhar uma “fuga para a frente”, como bem definiu um observador com vista para a Praça dos Três Poderes.

A expressão, de origem francesa, costuma designar aqueles movimentos para tentar resolver um problema escondendo o passivo debaixo do tapete. Nesse balaio, sobram ideias à procura de quem as leve adiante. Pouca gente responsável pelos desígnios do Legislativo ou do Judiciário acredita que alguma delas prospere.

De Pedro II@edu para Lula@gov – Elio Gaspari

O Globo

Estimado presidente,

Li que vosmecê prepara uma reforma do ministério e resolvi lhe escrever, com um aviso amargo: as trocas de ministros são um pesadelo inútil e, ao cabo, de nada adiantam.

Imagine que, na manhã de 23 de julho de 1890, acordei bem, mas havia-me sucedido uma coisa que não acontecia havia anos. Eu havia sonhado, e mal infelizmente, com a maçada da organização ministerial. Em quase 50 anos, passei por aquilo 36 vezes.

Naquele dia, se eu não tivesse sido deposto e desterrado, teria completado 50 anos de reinado em nossa terra. A maçada da organização do ministério assombrou-me quando levava uma vida de paz e rotina na Riviera Francesa. Meus dias eram cronometrados.

Cabeças no Congresso - Cristovam Buarque

Correio Braziliense

Eliminar a vergonha de privilégios e vantagens que fazem a República democrática dar mais benefícios aos seus dirigentes do que o Império oferecia a sua nobreza

Tem se fortalecido a ideia de que política é comunicação sem necessidade de conteúdo. O governo federal mudou o encarregado de sua comunicação sem qualquer reflexão sobre a falta de propostas novas e de alianças amplas. Outro exemplo de mudar a imagem sem mudar a substância foi cobrir os parlamentares com bonés para mostrar que cada um deles tem cabeça. Não houve esforço para que o sentimento de que faltam cabeças no Congresso fosse mudado graças a debates de ideias sobre os graves problemas que o país enfrenta.

Brasil precisa de novas regras para lidar com Trump – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

As políticas adotadas por Trump confrontam a ordem econômica mundial e a institucionalidade do comércio e da cooperação internacional

Na década de 1970, com a crise da economia mundial e a falta de novas teorias para explicar o desenvolvimento de alguns países, como a Coreia do Sul, e reverter a decadência de outros, caso da Argentina, alguns economistas começaram a analisar o desenvolvimento dos países a partir de suas instituições. Um deles, o norte-americano Douglas North, um dos teóricos da chamada Nova Economia Institucional, viria a ganhar o Prêmio Nobel de Economia, em 1993, por seu trabalho sobre o papel das instituições no desenvolvimento econômico.

North argumentava que instituições — incluindo leis, normas sociais e estruturas políticas — são fundamentais para explicar o crescimento e a prosperidade das nações. Os países têm uma trajetória historicamente definida, a partir de uma matriz institucional que prima pelo equilíbrio legítimo entre as "leis formais" e "as restrições informais". As tentativas de promover mudanças institucionais abruptas, a partir da transposição das leis formais — que traduzem modelos de desenvolvimento — de um país para o outro, porém, provocaram desequilíbrios nas instituições e acabaram produzindo resultados diferentes do observado no país"exportador" do modelo.

O poder da Inversão – Roberto DaMatta

O Globo

Brutalidade promove regressão ao isolamento num planeta interligado, que sofre os efeitos da hiperconectividade

Se você acha que o tema é pedante — afinal, sou cancelado em alguns lugares —, experimente vestir uma roupa pelo avesso. Faça como eu, que vesti uma suéter pelo avesso nos Estados Unidos, país onde o mind your own business (cuide-se e não me encha o saco!) é dominante, e um colega que jamais me dera um humilde “bom-dia” parou-me no corredor para a advertir-me que eu estava com a veste pelo avesso!

— Você deve estar só... — disse em seguida, com voz tranquilizadora porque sabia o que significava estar sem o outro que nos ama, ajuda e desentorta...

O risco fiscal e a política – Zeina Latif

O Globo

Que a política encontre caminhos para candidaturas reformistas. E que apontem na campanha os planos para construir a solvência fiscal

Como se já não bastassem os desequilíbrios fiscais recorrentes, de difícil solução, pois demandam reformas constitucionais, há uma bomba fiscal se formando. Refiro-me a despesas obrigatórias da União que poderão crescer a um ritmo ainda mais rápido, até mais do que o já esperado.

Será grande o desafio do próximo presidente para iniciar o desmonte dessa bomba. Isso sob pena de inviabilizar o investimento público (ou as despesas discricionárias) e adicionar desconfiança ao já frágil regime fiscal, o que significa inflação e juros altos a perder de vista, e ameaças à governabilidade.

O próprio Tesouro Nacional estima que as despesas obrigatórias sujeitas às regras do arcabouço fiscal devem ter um crescimento real médio de 3% ao ano até 2034, acima dos 2,5% estabelecido pelo próprio arcabouço.

Divergência entre as prioridades de PT e aliados - Fernando Exman

Valor Econômico

“Modo campanha” neste início de 2025, momento em que pesquisas de opinião apontam um cenário adverso ao projeto da reeleição

A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de “ligar o modo campanha” neste início de 2025, momento em que pesquisas de opinião apontam um cenário adverso ao projeto da reeleição, expôs visões distintas entre o PT e aliados sobre o que deve ser a prioridade do mandatário.

A economia está no centro das preocupações dos petistas. Tenta-se espraiar o sentimento de que o pior em relação à inflação já passou e, portanto, o temor maior deve ser quanto ao efeito do aperto da política monetária sobre a atividade e o emprego. Nesse contexto, é citado um trecho da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central em que o colegiado aponta “como risco em um ambiente de taxas contracionistas e de piora das condições financeiras, a possibilidade de uma desaceleração doméstica mais forte do que a esperada, que poderia gerar impactos desinflacionários ao longo do tempo”.

Pressão ainda é forte em alimentos, serviços e bens industriais - Sergio Lamucci

Valor Econômico

IPCA de janeiro teve uma alta fraca, de 0,16%, mas a abertura do indicador mostra um cenário bem menos benigno para a inflação

O IPCA de janeiro teve uma alta fraca, de 0,16%, mas a abertura do indicador mostra um cenário bem menos benigno para a inflação. Os preços da alimentação no domicílio tiveram uma desaceleração, mas ainda subiram mais de 1% no mês, enquanto os serviços mais sensíveis à demanda também avançaram a um ritmo forte. Já as cotações dos bens industriais perderam um pouco de fôlego no mês passado em relação a dezembro, mas o aumento foi mais intenso do que o registrado em todos os outros meses do ano passado. Para completar, os núcleos, que buscam reduzir ou eliminar a influência dos itens mais voláteis, aceleraram mais uma vez.

Hora ruim para estratégias dúbias - Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Ano promete ser de nervos à flor da pele

“Surreal”, reagiu um integrante do governo na tarde da última sexta-feira, ao ser questionado sobre um possível reajuste do Bolsa Família, ventilado pelo ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias em entrevista à Deutsche Welle. “Expõe o presidente, que terá de dizer ‘não’”, explicou a fonte. “Não há espaço fiscal e não resolve problema da inflação.”

O comentário foi feito minutos antes de o Palácio do Planalto escalar a Casa Civil para dizer o “não”, em nota que descartou o aumento de forma categórica. A reação veio rápido, mas não impediu que o mercado reeditasse temores sobre a condução da política fiscal brasileira que infernizaram o fim do ano passado. Naquela sexta, a cotação do dólar atingiu R$ 5,79 e o Ibovespa caiu 1,27%.

A coragem que constrói a democracia - Nicolau da Rocha Cavalcanti

O Estado de S. Paulo

Em condições de extrema adversidade, José Carlos Dias exerceu a advocacia criminal de forma técnica, corajosa e criativa

No dia 10 de fevereiro, o Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp) concedeu sua maior honraria – o Prêmio Barão de Ramalho – a José Carlos Dias, cuja trajetória na defesa dos direitos humanos foi recentemente contada no livro Democracia e Liberdade (Alameda, 2024), de Ricardo Carvalho e Otávio Dias. Às vezes, fala-se que no Brasil faltam lideranças na sociedade civil. Pois bem, José Carlos Dias foi e continua sendo uma liderança no mais genuíno sentido do termo, seja por sua exata compreensão a respeito do que vale a pena lutar, seja por sua capacidade de reunir e, com seu exemplo, formar pessoas para essa luta.

Um braço de Trump no Congresso? - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Deputado se ocupa em suas redes da defesa do americano e parece esquecer até a lição de seu ídolo

As relações entre o deputado federal Eduardo Bolsonaro e a administração Trump são conhecidas. Ele faz questão de as exibir nas redes sociais. Ali, pode-se ter uma ideia do que parece a filiação aos interesses de um centro político exterior, vinculado a uma potência estrangeira.

Nos 11 primeiros dias deste mês, o filho do ex-presidente fez 163 publicações em sua conta na rede X. Destas, 63 (38,5%) defendiam Trump e suas políticas, mesmo quando afetavam interesses nacionais, como a taxação de produtos brasileiros. Em segundo lugar, o deputado se ocupou da defesa dos interesses de seu grupo político e de seu pai – 23% das publicações. Outros dois temas ocuparam Eduardo: as críticas ao STF e ao TSE (17,7%) e a oposição ao presidente Lula, com 16,5%.

O peso dos evangélicos nas eleições de 2026 – Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

Estudo de gestora mostra como aumento do voto evangélico poderá ser decisivo na eleição de 2026

Está ganhando tração entre analistas um estudo da gestora carioca Mar Asset sobre o crescimento da população evangélica no Brasil, movendo decisivamente o pêndulo do eleitorado para a direita e sinalizando que, ainda que mantida a proporção de votos que o presidente Lula recebeu de evangélicos e não evangélicos no pleito de 2022, a reeleição do petista está seriamente ameaçada em 2026.

Segundo os economistas da Mar Asset, a alteração estrutural observada na sociedade brasileira, com o crescimento da população evangélica, empurrando o perfil do voto médio em direção ao conservadorismo e à direita, “torna minoritária a probabilidade de reeleição do presidente Lula, algo que deve ser antecipado pelos mercados em algum momento de 2025”.

Sicofantas que se acham melhores que hipócritas - Rui Tavares

Folha de S. Paulo

A extrema direita faz em dobro tudo aquilo que denuncia

Quem conhece o argumentário da extrema direita sabe que uma das suas acusações mais recorrentes é a de hipocrisia. Trata-se de uma acusação curiosa: se acusamos o nosso adversário de ser hipócrita, estamos implicitamente a reconhecer a superioridade dos seus valores, pois o crime não está em acreditar em coisas erradas, mas sim em não ter um comportamento que esteja à altura das coisas em que se acredita. Se assim é, a suposta vantagem moral de quem faz a acusação não está em ser melhor do que o acusado, mas simplesmente em não se envergonhar de ser pior: ao menos não sou hipócrita!

A hipocrisia é uma constante da vida: quem nunca disse gostar do presente (repetido) de Natal que atire a primeira pedra. Não se tratando certamente de uma qualidade, é bastante melhor do que a mentira flagrante, a desonestidade, a perfídia, a perversidade. Tanto que os gregos tinham um termo para quem era pior do que hipócrita: sicofantas. Sicofanta, que vem das palavras gregas para figo (sykon) e revelar ou denunciar (phainein), é a palavra para aquele que acusa os outros de roubar figos, mas que pratica crimes muito piores do que esse.

Motta martela o cravo e a ferradura - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Deputado num dia invoca Ulysses e no outro alivia o lado dos golpistas de 8 de janeiro

O que Arthur Lira (PP-AL) tinha de incisivo na presidência da Câmara seu sucessor tem de ambíguo. Ao menos neste início de mandato, Hugo Motta (Republicanos-PB) tem se caracterizado por martelar ora o cravo, ora a ferradura.

Invoca Ulysses Guimarães (1916-1992) no "ódio e nojo à ditadura" num dia e no outro alivia o lado dos golpistas do 8/1 dizendo que vandalizaram a praça dos Três Poderes por mera arruaça. Segundo ele, por acreditarem na derrubada do governo eleito. Se a crença era na deposição forçada, o nome do jogo é tentativa de golpe, correto?

STF é implacável com golpistas do 8/1? - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Corte permitiu que mais de 500 envolvidos saíssem livres por acordo de não persecução; 375 foram condenados a penas de 3 a 17 anos

Continuo hoje com o que não coube na coluna de ontem. O STF está sendo implacável com os envolvidos no 8/1? Aqui, a resposta fica bem ao gosto do freguês.

Até janeiro, o Supremo já havia responsabilizado 902 cidadãos por participação no 8/1. Desses, 527 firmaram acordos de não persecução penal, o que significa que foram liberados apenas com o compromisso de prestar algumas horas de serviço comunitário e participar de um cursinho sobre democracia. Eles manterão a primariedade. Acho que dá para dizer que, para estes, meter-se na aventura golpista saiu barato.

A nova maioria e o autoengano progressista - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Atualmente, nenhuma posição goza de imunidade, muito menos as progressistas

"Até quando teremos que pisar em ovos ao defender nossas pautas para não provocar os eleitores de direita?"

Essa foi uma das objeções mais interessantes que me foram apresentadas nas últimas semanas. "Pisar em ovos", vocês sabem, significa agir com cautela e delicadeza para evitar conflitos, problemas ou consequências negativas.

Não foi propriamente uma pergunta, mas sim o protesto de alguém já exausto da sensação de que os progressistas deixaram de ser a maioria política e de ocupar a posição dominante na esfera pública.

A resposta óbvia seria: "Até quando este país for uma democracia, um regime em que a maioria governa".

Claro, pode-se argumentar que, sendo o Brasil governado por um presidente de esquerda, a maioria eleitoral já escolheu um lado. Mas não é bem assim. Em 2022, o eleitor brasileiro deu a Presidência a Lula, mas entregou o Legislativo à oposição, justamente em um momento em que o poder do presidente da República é minguante, enquanto o dos presidentes das casas legislativas federais é crescente.

O futuro incerto da democracia na América – Caetano Araújo e Luiz Renato*

Correio Braziliense

É imprescindível que Trump e sua equipe releiam Tocqueville, para entender que a verdadeira força de uma democracia reside na proteção equitativa de todos os seus cidadãos

A vitória recente dos republicanos nas eleições presidenciais americanas, na onda de uma plataforma política belicista em política externa e francamente autoritária em termos de política interna, faz retornar, ao debate público, uma obra clássica das ciências sociais, A Democracia na América, de Alexis de Tocqueville, publicada em 1835, após longa viagem do autor por terras da então jovem república. A obra, entre outras características, descreve com minúcia os mecanismos de freios e contrapesos institucionais que protegem as garantias e direitos individuais, prevenindo a degeneração da democracia em uma situação de simples tirania da maioria.

Poesia | Apostila, de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

 

Música | Orquestra Arruando - Banho de Cheiro (Carlos Fernando)