segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

O que Lula deseja com a reforma ministerial? - Bruno Carazza

Valor Econômico

A política mudou e trocas no comando das pastas não trazem mais os mesmos resultados de antigamente

A novela se arrasta por meses e muita tinta e saliva já foram gastas para analisar as possíveis trocas que Lula pretende fazer na Esplanada dos Ministérios. Com mais da metade do seu terceiro mandato transcorrida, popularidade em queda e diante de uma mudança nos postos de liderança da Câmara e do Senado, o presidente tenta montar um quebra-cabeça que prepare seu governo para uma disputa eleitoral cada vez mais próxima.

São três os principais motivos pelos quais os presidentes da República realizam amplas reformas nos seus ministérios.

Há as trocas previsíveis, que ocorrem a cada dois anos, pois a legislação exige que os políticos se desencompatibilizem dos seus cargos no Executivo no início das campanhas eleitorais. Geralmente envolvem a substituição dos titulares das pastas que querem se candidatar por integrantes do segundo escalão, sem grandes mexidas no balanço de poder. Não é o caso atual.

Existem ainda as reformas desesperadas, realizadas em meio a crises que ameaçam a sobrevivência do governo. No seu primeiro mandato, a popularidade de Lula foi seriamente abalada pelo escândalo do mensalão, que por muito pouco não levou à abertura de um processo de impeachment contra o petista. Na época, Lula entregou nacos ainda maiores de poder ao PMDB, nomeando Saraiva Felipe para o Ministério da Saúde e Silas Rondeau para o comando da pasta das Minas e Energia. Lula ainda contemplou na reforma o PP do então presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, indicando Márcio Fortes para o Ministério das Cidades. Todas essas pastas eram controladas pelo PT à época.

Sem nenhum grande escândalo que venha a colocar em risco a continuidade de seu governo, a atual reforma ministerial de Lula se classificaria no terceiro grupo, aquele das mudanças visando melhores resultados na gestão e a ampliação dos apoios partidários no Congresso.

Na sua primeira passagem pelo Palácio do Planalto, Lula realizou uma ampla mudança ministerial com pouco mais de doze meses de mandato. Naquela ocasião, mexeu em peças do próprio PT em duas áreas estratégicas da gestão (com Patrus Ananias no lugar de José Graziano no programa de combate à fome e Tarso Genro substituindo Cristovam Buarque na Educação) e ainda abriu espaço para a entrada do PMDB na sua base de governo, entregando ao partido dois ministérios - Comunicações, com o deputado Eunício Oliveira, e Previdência, para o senador Amir Lando.

Caminhando para a reta final do terceiro mandato, Lula tem interesse em aprimorar a governabilidade, melhorar a avaliação da sua administração e construir uma coligação forte para 2026. Esses objetivos, contudo, são de difícil alcance simplesmente com a redistribuição de pastas entre partidos e a troca de titulares.

Embora tenha sido vitorioso na aprovação da reforma tributária do consumo e de boa parte da agenda econômica do ministro Fernando Haddad, o desempenho legislativo do governo Lula apresenta sinais preocupantes. Tome-se por exemplo a apreciação das medidas provisórias, instrumento “imperial” colocado à disposição dos presidentes para legislar sem aprovação prévia dos parlamentares. Das 106 MPs editadas desde 01/01/2023 com tramitação encerrada (existem outras 25 pendentes), Lula só conseguiu converter 21 em lei - uma taxa de sucesso de 19,8%, a menor desde 2001. O atraso na aprovação do orçamento de 2025 é outra evidência das limitações da base de apoio do governo no Congresso.

Mas é de se perguntar de que valeria uma reforma para azeitar a articulação com o Congresso se, analisando a agenda prioritária do governo encaminhada aos novos presidentes da Câmara e do Senado no início do ano legislativo, vê-se pouca ambição para além da reforma da tributação da renda, com a isenção de quem ganha até R$ 5 mil mensais e o aumento da cobrança de imposto sobre os mais ricos.

Lula também almeja, com a reforma, reforçar os laços com partidos do Centrão para construir uma boa coligação majoritária em 2026. No entanto, com os deputados e senadores tendo a liberdade de transferir milhões de reais em emendas parlamentares para seus redutos eleitorais sem a ingerência do Poder Executivo e os bilhões em recursos do fundão eleitoral colocados à disposição dos dirigentes partidários para gastar na campanha, é muito pouco provável que a redistribuição de ministérios seja decisiva para o jogo eleitoral do ano que vem.

Por fim, Lula também pretende mudar o comando de seus principais ministérios para ampliar a “colheita” de resultados das políticas públicas e programas sociais de sua gestão à medida em que se aproxima a eleição presidencial. Nesse caso, mostra-se um movimento bastante arriscado trazer para dentro do Palácio do Planalto uma figura como Gleisi Hoffmann, que tem sido uma das vozes mais críticas das medidas adotadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na condução da economia do país.

Vê-se, portanto, que embora os objetivos de Lula com a reforma ministerial sejam claros, os resultados podem ser inócuos ou até contraproducentes.

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