segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Segundo governo Trump exigirá equilíbrio do Brasil

O Globo

País deve buscar novos canais de comunicação, explorar interesses mútuos e reduzir potenciais danos

O segundo mandato de Donald Trump, que começa nesta segunda-feira, causa ansiedade. As promessas e ameaças feitas na campanha e depois da eleição, se cumpridas à risca, têm o potencial de causar mudanças radicais. Na economia, Trump falou na imposição de tarifas de importação a China e países aliados, como México e Canadá. O compromisso de deportar 15 milhões de imigrantes talvez seja de difícil execução, mas não há dúvida de que o número de pessoas expulsas dos Estados Unidos crescerá. Nas relações exteriores, na política fiscal, na administração da máquina pública, em diferentes esferas Trump promete uma revolução. Muitas mudanças terão repercussões globais por canais como o mercado financeiro. Temperamental e com apoio do Congresso, o novo presidente promete ser sinônimo de instabilidade.

Diante desse cenário, o governo brasileiro deve buscar canais de comunicação, explorar interesses comuns e trabalhar para diminuir impactos negativos. Alimentar preconceitos ideológicos só provocará ruído. A melhor estratégia será buscar a construção de pontes onde for possível. O Brasil é um dos maiores mercados externos para uma quantidade grande de empresas americanas, inclusive belicosas plataformas digitais. É do interesse comum que essas companhias sigam investindo na expansão dos negócios.

Como sobreviver no mundo novo – Fernando Gabeira

O Globo

Alguns fatores da luta contra o aquecimento global convergem diretamente para uma pauta de resistência democrática

Para evitar compras supérfluas, resolvi consertar algumas roupas velhas. Por meio das redes sociais, consegui uma costureira que veio da Baixada Fluminense com sua máquina, trabalhou algumas horas e resolveu tudo.

Fiquei maravilhado com o fato de as redes sociais, além de terem importância comercial, abrirem fontes de renda para milhares de trabalhadores autônomos. Andei pesquisando, e alguns números indicam que cerca de 10 milhões de pessoas geram parte ou toda a sua renda nas redes. Numa pesquisa de 2023, mais de 60% das pequenas empresas brasileiras retiravam parte ou toda a sua renda de plataformas como Instagram e Facebook.

No momento, temos discutido muito o alinhamento da Meta ao governo Trump e a desmontagem de sua estrutura de checagem do material que veicula. Sem dúvida, um tema importante porque trata de questões políticas, democracia, liberdade de expressão, fake news e respeito à legislação nacional.

A Groenlândia na mira do Império – Demétrio Magnoli

O Globo

‘Não me comprometo com isso’, replicou Trump ao ser indagado se excluiria o uso da força para anexar a Groenlândia e o Canal do Panamá:

— Pode ser que tenhamos de fazer algo. O canal é vital para nosso país e precisamos da Groenlândia por razões de segurança nacional.

A declaração insere-se na “arte da negociação” do presidente que retorna, baseada em intimidações preliminares destinadas a extrair concessões. Mas é ameaça de uso da força para alterar fronteiras: um bombardeio retórico da fortaleza de regras que protege a ordem internacional do Pós-Guerra. Serve a Xi Jinping e Putin, que podem alegar o mesmo sobre Taiwan e a Ucrânia. A Dinamarca pertence à Otan. Uma invasão de seu território pela potência que lidera a aliança significaria o fim da Otan.

Preto Zezé - O clima da favela

O Globo

Populações de baixa renda têm menos recursos para se adaptar ou se recuperar de desastres

A crise climática é fato, e temos dados e pesquisas de sobra. Embora seu entendimento ainda seja algo distante, ela tem impactos severos nas favelas, tanto em termos sociais quanto ambientais.

As favelas — que surgem muitas vezes caracterizadas por urbanização desordenada e infraestrutura precária — têm sido impactadas de várias formas. Diante disso, após o G20 das Favelas, que pautou as maiores economias do planeta, caminha-se para o F30 (Favela 30), com o objetivo de tratar a questão ambiental, tão crucial para esses territórios.

Durante este período de chuvas e eventos climáticos extremos, as favelas são as mais atingidas por inundações e deslizamentos de terra. Isso ocorre devido à falta de um planejamento justo de distribuição da terra, que obriga populações a se alojarem em locais vulneráveis, como encostas ou regiões próximas a rios.

O preço do protecionismo de Donald Trump - Assis Moreira

Valor Econômico

As guerras comerciais poderão ser bem mais graves e mais custosas, no novo cenário geopolítico

Donald Trump retorna hoje à Casa Branca aumentando a incerteza em tempos já conturbados, crescimento econômico mundial lento, persistentes pressões inflacionárias, tensões geopolíticas, conflitos e guerras, mudanças climáticas e mudanças tecnológicas rápidas centradas na Inteligência Artificial e em outras tecnologias de ponta emergentes.

Com Trump 2.0, as guerras comerciais poderão ser bem mais graves, a se julgar pelo que ele ameaça implementar a partir desta semana, como o choque de tarifas – ele mencionou várias vezes alta de 10% a 20% sobre os produtos de todos os países, e de até 60% especificamente sobre produtos chineses.

O protecionismo de Trump é justificado por sua equipe para ao mesmo tempo ‘punir’ a China por políticas desleais e conter a expansão chinesa, reequilibrar a balança comercial, reindustrializar o país, reforçar a segurança nacional, financiar parte da prometida redução do imposto sobre o lucro das empresas, sem esquecer eventuais sanções sobre países que abandonarem o dolar como moeda de transações internacionais - como membros do Brics, grupo liderado pelo Brasil em 2025.

Quem poderá deter Donald Trump? - Bruno Carazza

Valor Econômico

Com Elon Musk e outros empresários na sua gestão, Trump espera transformar economia americana

Logo no início de seu mandato, Jair Bolsonaro nomeou José Salim Mattar para o recém-criado cargo de secretário Especial de Desestatização. Fundador da maior locadora de automóveis da América Latina, o empresário se dizia um defensor das ideias liberais e com o tempo se converteu num dos principais doadores de campanha do Brasil - em 2022 ele aportou R$ 2,9 milhões do próprio bolso na eleição, a maioria para candidatos de direita.

A ideia do superministro da Economia, Paulo Guedes, de trazer um empresário de sucesso para comandar a secretaria responsável pelas privatizações era superar as resistências da burocracia, imprimindo ao processo o ritmo e a eficiência próprios do setor privado. Com a venda de estatais e de imóveis da União, Guedes esperava gerar R$ 2 trilhões de caixa até o final do mandato.

Brasil entre riscos e oportunidades em um cenário de incertezas - Reginaldo Nogueira*

Correio Braziliense

Olhando para frente, há razões para otimismo moderado. O Brasil tem uma economia diversificada, um setor agrícola competitivo e um mercado consumidor significativo

O ano de 2025 começa para o Brasil em um contexto de desafios internos e pressões externas que testam a resiliência de sua economia. Com a inflação em alta, ajustes fiscais pendentes e um cenário global mais incerto, o país precisa equilibrar crescimento econômico e estabilidade financeira. Apesar das dificuldades, também há oportunidades para fortalecer as bases do desenvolvimento, caso decisões estratégicas sejam tomadas com foco no longo prazo.

No plano interno, a economia brasileira vive um momento de superaquecimento. O desemprego está em níveis historicamente baixos, enquanto a demanda cresce mais rápido do que a oferta, pressionando os preços. Nesse contexto, o Banco Central terá que tomar medidas para desacelerar o ritmo de crescimento em 2025 e 2026, com o objetivo de trazer a inflação de volta à meta de 3% ao ano. Esse ajuste será essencial para garantir a estabilidade econômica no médio prazo, ainda que possa gerar certo desconforto no curto prazo.

Entrevista |Fernando Limongi*: ‘Modelo de coalizão resiste, mas falta agenda a Lula’

Hugo Henud / O Estado de S. Paulo

Outro desafio para a governabilidade do petista é o fortalecimento do Congresso

O presidencialismo de coalizão – modelo que permite ao Executivo formar alianças com o Legislativo para garantir governabilidade – ainda demonstra eficiência, mesmo diante de desafios como fortalecimento do Congresso. A avaliação é do cientista político Fernando Limongi, autor de Democracia Negociada – obra que vê a negociação política como essencial para construir consensos em momentos de crises. O professor de Economia da FGV Leonardo Weller é coautor do livro.

“Quando o governo precisa fazer uma coalizão, ele vai fazer. Mas aí tem outro problema que é que o governo não sabe muito bem qual é sua agenda. Lula fala do passado. Mas como voltar? Não há o Bolsa Família ou o Minha Casa, Minha Vida como novidade”, disse Limongi ao Estadão.

Casamento por conveniência - Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

A baixa coesão partidária no Brasil é fruto da busca pela sobrevivência eleitoral

É muito comum entre eleitores brasileiros uma boa dose de frustração em relação aos partidos políticos. Muitos argumentam que os partidos não têm uma ideologia clara, não partilham de crenças comuns, nem de objetivos compartilhados. Isto é, têm baixa coesão.

No artigo “Frustrated marriage? The ideological distance of members of congress from their parties in Latin America”, os cientistas políticos João Guedes e Scott Morgenstern mostram que essa frustração não ocorre apenas entre os eleitores brasileiros, mas também é observada entre os próprios parlamentares latino-americanos.

A pesquisa deles é baseada em questionários aplicados com 1753 legisladores de 51 partidos políticos de 18 países latino-americanos entre 2010 e 2017 pelo “Observatório de Elites Parlamssentares na América Latina” (PELA).

Entrevista | Naomi Klein: ‘Trump atraiu eleitores frustrados imitando táticas da esquerda’

Walter Porto / Folha de S. Paulo

Pesquisadora argumenta que a ascensão de extremistas criou 'mundo invertido' sinistro nas lacunas do progressismo

Naomi Klein começou a ser sugada por uma crise de identidade. De início parecia só um incômodo chato, mas de repente ela se sentia sumindo no meio de um redemoinho, sem saber onde se segurar. Não se engane, estamos falando mais de política que de psicanálise.

Uma das intelectuais mais celebradas da América do Norte, a canadense era às vezes confundida com outra escritora de sucesso, Naomi Wolf. Até aí, nada anormal —as duas eram quase contemporâneas, tinham alguma semelhança física e defendiam ideias de esquerda.

Klein ficou conhecida por críticas sistêmicas ao neoliberalismo em obras como "Sem Logo" e "A Doutrina do Choque". Wolf se celebrizou por "O Mito da Beleza", um protesto contundente contra as imposições sociais ao corpo feminino.

Tudo passou a ficar bem mais estranho quando Wolf, a "outra Naomi", começou a ser rejeitada pelo campo progressista ao embasar cada vez menos suas ideias em fatos históricos e científicos, entrando numa espiral de teorias conspiratórias.

Ao ser cobrada nas redes sociais como se fosse sua homônima, Klein testemunhou de perto a metamorfose de Wolf em uma estandarte do negacionismo do clima e da pandemia. Sua contraparte virou convidada de honra no podcast "The War Room", de Steve Bannon, o estrategista-mor de Donald Trump.

Às vésperas da posse do republicano para um segundo mandato, o livro que Klein escreveu sobre sua experiência, "Doppelgänger", ilumina os métodos pelos quais o trumpismo atraiu eleitores imitando táticas da esquerda, criando um submundo de "fatos alternativos", se apresentando como mais tolerante a erros e estendendo tapete vermelho a ex-progressistas frustrados.

A autora entendeu que seu mergulho no "mundo invertido" da outra Naomi ensinava algo sobre as mudanças por que passam tantas democracias hoje, na "parte mais assustadora" de sua "jornada doppelgänger" —expressão alemã que define duas pessoas que se parecem muito.

"Não é apenas um indivíduo que pode ter um duplo sinistro; nações e culturas também os têm." O Estado incorporado pela extrema direita, segundo ela, é o "irmão gêmeo ubíquo das democracias liberais ocidentais", "versões sombrias de nosso eu coletivo".

O livro lançado há pouco no Brasil fala da sensação geral de não saber mais discernir o que é real do que não é —um sentimento difuso de desorientação, de "jet lag coletivo". Foi buscando retomar o esteio que Klein elaborou seu longo ensaio e deu essa entrevista exclusiva à Folha por videoconferência.

O Legislativo e as demandas locais - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

O Executivo também atua partidariamente nas transferências discricionárias federais aos municípios

É trivial reconhecer que as transferências do governo central para entes subnacionais são marcadas por uma lógica político-partidária. Há um conjunto de evidências empíricas considerável a respeito. Importa considerar o que há de novo em relação a estas transferências.

No passado, as transferências discricionárias federais e emendas orçamentárias beneficiaram o partido do ocupante do Poder Executivo. As transferências, inclusive, são superiores em valores às emendas. Mais importante: estão sob comando do Executivo.

Canções para um novo desafio mundial - Vagner Gomes de Souza

Dedico à gente miúda que sobrevive sem água e em busca do sorriso na comunidade de Nova Jersei, em Paciência (RJ), o nosso grito nesse artigo.

Depois do álbum “Bloco na Rua”, Ney Matogrosso, agora numa perfeita aliança vocal com Hecto, nos ensina que é necessária uma autocrítica daqueles que se consideram representantes do pensamento progressista. Só os ingênuos não compreenderiam nas 9 letras de “Canções para um Novo Mundo” um necessário manifesto contra as mazelas de um mundo em que os níveis de desigualdade social em forma espiral.

A chegada de Donald Trump no jogo mundial indica que a nova “Pax Americana” tem como propósito o aumento dos ganhos gananciosos do mundo dos negócios. A plutocracia está organizada politicamente internacionalmente enquanto as forças democráticas se deixaram envolver em pautas cada vez mais fraturadas como se fossem “ambulantes de temas sociais”.

A capacidade de selecionar e interpretar composições que nos incomodam e nos faz refletir confere ao trabalho musical de Ney Matogrosso e Hecto um peso também de reflexão intelectual que, me permitam meu saudosismo, tem maior impacto que alguns “memes”. Ouçam e se emocionem com cada música desse álbum que tem as participações de Frejat, na faixa ´Solaris´, Ana Cañas em ´O Amor Vem Antes De Tudo´ e Will Calhoun, baterista do Living Colour, na música ´Pátria Gentil´.

Poesia |Sucessão de São Pedro, de Ascenso Ferreira*

— Seu Vigário!
Está aqui esta galinha gorda
que eu trouxe pro mártir São Sebastião!

— Está falando com ele!
— Está falando com ele!

*Do livro: "Cana Caiana", José Olympio, 1939 (impresso em Recife)

Música | Canção para um novo mundo · Ney Matogrosso · Hecto