sábado, 4 de janeiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

8 de janeiro, o nosso "Dia da Infâmia"

Correio Braziliense

Em 8 de janeiro de 2023, uma horda de radicalizados, mobilizada por agitadores profissionais, invadiu e depredou as sedes dos Três Poderes, declarando guerra à democracia brasileira

Em 8 de dezembro de 1941, o então presidente Franklin Roosevelt proferiu aquele que ficou conhecido como o "Discurso da Infâmia", em uma sessão conjunta do Capitólio. Vinte e quatro horas antes, o Japão atacara as bases militares norte-americanas em Pearl Harbor, no Havaí, e nas Filipinas — em declaração de guerra aos Estados Unidos e ao Império Britânico. Em 8 de janeiro de 2023, uma horda de radicalizados, mobilizada por agitadores profissionais, invadiu e depredou as sedes dos Três Poderes, declarando guerra à democracia brasileira.

Naquele domingo, na redação deste Correio Braziliense, os jornalistas se reuniram entre aturdidos com o vandalismo e desconfiados de que o ataque não era gesto isolado de extremismo político. A única certeza que tinham era de que estavam diante de um momento tristemente histórico. Aos poucos, foi ficando claro que aqueles ensandecidos eram parte de uma sequência programada de agressões e tumultos que vinha desde o segundo turno da eleição presidencial, em outubro de 2022.

A Frente Democrática ainda está aqui - Vagner Gomes de Souza*

Dedicado a Maria Lucia Teixeira Werneck Vianna (1943 – 2024) in memorian.

Nos idos dos finais dos anos 70 o saudoso Luiz Werneck Vianna debatia sobre os caminhos da oposição a Ditadura Militar no Teatro Casa Grande (RJ) numa mesa ocupada pelo atual presidente da República. Lá pelas tantas, houve uma grata polêmica entre ambos, pois Lula de forma a tentar denunciar a modernização conservadora brasileira coroada em Vargas afirmou que o “AI 5 do trabalhador era a CLT”. Werneck Vianna, que já tinha lançado a primeira edição do clássico Liberalismo e Sindicato no Brasil (1976), rebateu ao ser firme em afirmar que o AI 5 do trabalhador era o AI 5.

Essa lembrança histórica sobre as origens do debate com o sindicalismo de resultados pautado pelos interesses sociais que emergia nos anos 70 em muitas frentes sociais recoloca a necessidade de uma moderação da “Grande Política” ao se debater temas relativos a República e a Democracia. Muito se deve perceber sobre os processos de transição em oposição a revolução que poderíamos classificar como a origem da “Revolução das Batalhas Identitárias”.

A polarização como doença social – Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Nosso problema não é a polarização do discurso dos políticos, mas a esmagadora polarização social

Viradas de ano são intervalos dedicados a mensagens aspiracionais utópicas. Ninguém as leva a sério, inclusive seus autores. Previsivelmente, este 2025 começou com o chamado, dirigido aos políticos, pelo fim da polarização. A súplica não será atendida —mas, de qualquer forma, erra o alvo.

O discurso polarizador tornou-se estratégia política: um cálculo frio sobre ganhos eleitorais. Não é de agora. "Nós contra eles" forma uma gramática da política populista desde o século 19. O PT a exercita há décadas –e chegou ao poder nas suas asas. Bolsonaro e os seus a conduziram até um ápice, na tentativa de preparar a ruptura da ordem democrática. Nenhum dos campos rivais desistirá da ferramenta, ao menos enquanto ela produzir os resultados almejados.

O burocrata irreverente - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Sua estátua fica em Copacabana, mas o canto do poeta no Rio era o vão de pilotis do Palácio Capanema

Todo mundo sabe – principalmente os ladrões de óculos – que a estátua de Carlos Drummond de Andrade fica na avenida Atlântica. Obra do artista Leo Santana inspirada em foto de Rogério Reis, foi inaugurada em 2002, no centenário do poeta. Uma escolha de lugar perfeita, o que nem sempre ocorre com homenageados. Drummond está sentado num banco, de pernas cruzadas e de costas para a praia. Morando havia muitos anos entre Copacabana e Ipanema, já não se espantava com o mar.

Vamos parar de aplaudir – Pablo Ortellado

O Globo

Aproveitando que o ano político ainda não começou, gostaria de convidar o leitor a refletir sobre um assunto controverso da nossa vida cultural: o aplauso de pé. Quem frequenta o mundo dos espetáculos certamente conhece a regra implícita de etiqueta: depois da apresentação, não importa a qualidade do que foi entregue, o público aplaude de pé. Não aplaudir, ou apenas aplaudir sentado, é visto como rude, muito rude.

Peças horrorosas, que se tornaram fracassos retumbantes, são invariavelmente aplaudidas de pé. Antes, o público graduava sua resposta. Ia do aplauso curto e protocolar, passava pelo mais detido e chegava ao entusiasmado. Apenas quando algo realmente extraordinário e singular tivesse acontecido, o público oferecia o aplauso de pé, recebido pelos artistas como manifestação de reconhecimento e distinção por um trabalho excepcional. Quando e por que perdemos esse importante senso de proporção?

Emplacando 2025 – Eduardo Affonso

O Globo

Deveria haver indicações da última saída antes dos territórios sob controle da milícia ou do narcotráfico

Eduardo Paes emplacou nesta semana seu quarto mandato como prefeito da Mui Leal e Heroica Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. E haja mesmo lealdade e heroísmo nos cariocas (e agregados) para viver neste balneário, com flecha perdida vindo de tudo quanto é lado.

O tetra-alcaide não tem poderes para combater a violência. O ônus é do governador, que comanda (?) as polícias Civil e Militar. Não quer dizer que não haja ações a seu alcance. Uma delas é, literalmente, emplacar a cidade.

Poderia começar pelas placas das ruas. As que existem são poucas, diminutas, ilegíveis para quem vem de carro e precisa virar num logradouro cujo nome só se revela quando é tarde demais para dar seta e mudar de faixa ou mandar parar a van. Isso reduziria, se não a violência, pelo menos o estresse no trânsito.

Pragmatismo brasileiro: negociar com Trump – Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

O Brasil terá mais dificuldades para encontrar outros mercados se houver restrições a nossos produtos nos Estados Unidos

Nos diversos discursos em que ameaçou aumentar as tarifas de importação para níveis punitivos, o presidente Donald Trump citou o Brasil apenas uma vez, quase de passagem. Disse, no meio de um discurso sobre vários temas:

— O Brasil cobra muito. Se eles querem nos cobrar, tudo bem, mas vamos cobrar a mesma coisa.

Não deu detalhes, ao contrário do que fez nos casos de ChinaMéxico e Canadá, ameaçados com aumentos brutais de tarifas (60%, no mínimo, para produtos chineses, 25% para mexicanos e canadenses). Esses três países são os alvos preferenciais, por serem os maiores exportadores para os Estados Unidos.

O ano dos 150 anos - Eugênio Bucci

O Estado de S. Paulo

Na virada, além de jurar mais empenho nos exercícios físicos, eu e mais outras poucas pessoas mentalizamos votos de que a imprensa tenha futuro

Hoje, dia 4 de janeiro, este matutino completa 150 anos de existência. A data sesquicentenária imprime um toque singular às festividades do réveillon, que ainda rumorejam no final de semana. Para alguns de nós, foi uma virada diferente, sem prejuízo da monotonia dos fogos de artifício, dos comensais em chinelas de dedo e das mensagens torrenciais no WhatsApp. Foi diferente porque, além de jurar mais empenho nos exercícios físicos e de torcer para que germine milagrosamente algum dinheiro no bolso de cada qual, eu e mais outras poucas pessoas mentalizamos votos de que a imprensa tenha futuro. Para acreditar que é possível, buscamos inspiração na história desta “folha diária” (expressão usada na primeira página da primeira edição, em 1875), que nasceu com o nome de A Província de São Paulo, ainda no período do Império, para defender os ideais republicanos. Sim, este diário nasceu contra o establishment – e, pouco depois de o Império cair, afastou-se do Partido Republicano. O jornalismo guarda distância do poder.

A instituição e o servidor público - Marcus Pestana

O Prêmio Nobel de Economia 2024 foi concedido aos economistas Acemoglu, Johnson e Robison, do MIT e Universidade de Chicago, que dedicaram seus estudos ao processo histórico de formação e mutação das instituições e seu papel no processo de desenvolvimento. Para eles, a distância entre o êxito e o fracasso reside, essencialmente, na qualidade das instituições e das regras que presidem o funcionamento do jogo de poder e das relações entre Estado e sociedade.  

O Brasil, a duras penas, vem avançando seu quadro institucional. Muito foi feito desde a redemocratização e o Plano Real. Há um esforço para deixar no passado o histórico de insegurança jurídica, quebra de contratos, moratórias, intervenções estatais arbitrárias, mudanças da regra do jogo com ele em andamento.

As ameaças de Trump - André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

Trump ameaça, mas, no extremo, aceita negociar. Não vai à guerra, pretende fazer bons negócios para suas empresas e seus protegidos

O ano de 2025 pode ser o das grandes revelações. Boas ou más, depende do ponto de vista, mas a chegada da direita norte-americana, obtusa e retrógrada, ao poder em Washington terá o poder de esclarecer muita coisa. Trump se insinua como uma espécie de vingador do tempo, capaz de com uma ou duas canetadas restituir os Estados Unidos aos melhores momentos de sua história. São tentativas autênticas, porém sem qualquer fundamento na realidade. Ele vai se embaraçar nos problemas do dia a dia, nas questões menores e nos grandes problemas mundiais. Os americanos não estão mais sozinhos na liderança do mundo.

Poesia | Mais no menos - Marcelo Mário de Melo

(Poema inaugural de 2025)

Ano novo/vida velha 

rolando no corredor

no mais menos do que mais

no mais que ficou atrás

no menos posto adiante

na estrada que encolhe. 


É preciso estar atento

a esta clara redução  

como aquele passageiro 

ante o apito do trem

na urgência do embarque. 

 

Viagem curta exige 

que se reduza a bagagem 

e não se consuma o tempo 

sobre mapas complicados 

e caminhos obscuros.

Música | Maria Bethânia, Zeca Pagodinho - Sonho Meu