terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

É urgente reformar a Previdência de estados e municípios

O Globo

Em 63% das prefeituras e 37% dos estados, regras do funcionalismo são mais brandas que as federais

Num cenário de envelhecimento da população causa preocupação que as regras de aposentadoria estabelecidas para os servidores da União na reforma da Previdência de 2019 sejam seguidas em menos da metade das prefeituras (37%) com regime previdenciário próprio e em apenas 17 das 27 unidades da Federação (63%). Todos os demais entes federativos adotam regimes menos rigorosos, como verificou estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) noticiado pelo GLOBO. O estudo foi feito pelos pesquisadores Rogério Nagamine e Bernardo Schettini, levando em conta critérios como idade mínima de aposentadoria e outras mudanças introduzidas pela reforma.

Extubação plena da democracia brasileira: a conciliação política começa por cima - Paulo Fábio Dantas Neto

Com frequência, nos atuais tempos em que a democracia brasileira se sustenta e reconfigura em alta tensão com valores tradicionais da nossa república, tenho me lembrado de um texto de Raul Francisco Magalhães sobre traços republicanos presentes nos primeiros passos da construção oitocentista do estado e da sociedade nacionais no Brasil. “A república estava lá, mas a democracia não ou jamais fomos ibéricos” foi um trabalho apresentado ao XXXV Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), em outubro de 2011 (ver anais do Encontro).

Até onde sei, o autor - que não conheço e de quem, por negligência minha, não li mais nada, além do texto citado - é professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, assim como Rubem Barboza Filho, este, um interlocutor e amigo, autor do livro “Tradição e artifício: iberismo e barroco na formação americana”, obra preciosa, publicada em 2000, pela Editora da UFMG, leitura imprescindível para quem pesquisa ou busca ter uma compreensão sobre a formação social brasileira e da Ibero-América, notadamente em suas dimensões política e cultural.  A alusão a Rubem Barboza Filho é imperativa ao evocar o texto de Magalhães porque parte importante deste é controvérsia respeitosa e qualificada com outro precioso texto daquele autor, publicado no ano anterior (Barboza Filho, R. “A modernização brasileira e o nosso pensamento político” - Perspectivas, São Paulo, v. 37, p. 15-64, jan./jun. 2010).

As voltas que o mundo dá - Merval Pereira

O Globo

“O fim indolor da inflação ter sido uma marca do PSDB foi algo que o PT não conseguiu perdoar nos 20 anos seguintes e colocou os dois partidos em polos opostos. Nas últimas quatro décadas o Brasil continuou tropeçando nas finanças

A política se move por sensações, das quais o medo é a mais importante. O cidadão vota por medo de perder o emprego, medo de perder benefícios, medo de mudanças radicais, medo de continuar sem perspectivas e assim por diante. Às vezes, como no caso do Pix, ou dos celulares em 2002, esse sentimento não é captado pelos políticos. Outras, como no caso do Bolsa Família ou do crédito consignado, responde a uma necessidade reprimida do cidadão comum e torna-se ferramenta eleitoral poderosa.

Lula está fora da corrida para reinventar o Estado – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A questão de fundo não é a existência das empresas estatais, mas sua real necessidade, a rentabilidade dos ativos públicos, o modelo e a qualidade da gestão das empresas

presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não se deu conta de que há uma corrida mundial para reinventar o Estado, com o objetivo de modernizar a economia, na qual a eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, foi uma reação política desesperada dos republicanos à iminente perda de hegemonia da economia mundial e às dificuldades de o Partido Democrata dar respostas adequadas aos impactos da nova economia no tecido social, como de resto a maioria dos líderes das democracias representativas do Ocidente. A China e outros países asiáticos, da pequena Cingapura à populosa Índia, estão levando grande vantagem em relação ao Ocidente.

Não se trata de uma volta aos modelos nacionalistas autárquicos, mas da busca de integração competitiva à economia mundial. O próprio slogan do governo, União e Reconstrução, é a síntese dessa visão atrasada de Estado. Ontem, por exemplo, ao visitar a Feira de Negócios da Indústria Naval e Offshore Brasileira, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, Lula reiterou um viés nacional-autárquico de compreensão da economia, na qual o setor estatal teria um papel predominante no desenvolvimento. Em tom de campanha eleitoral, criticou as tentativas de privatização das estatais brasileiras e atribuiu essas iniciativas ao avanço da extrema direita no país. Ele também lamentou a "imagem negativa" da Petrobras durante a Operação Lava-Jato.

Cartas do BC e a inflação do ano - Míriam Leitão


 Globo

Projeção para a inflação dos próximos meses não é boa. Não é a disparada que houve em outros momentos, quando chegou a dois dígitos, mas ficará acima de 5%

inflação vai ser um problema para as famílias e o governo ao longo de todo o ano e talvez o Banco Central tenha que escrever duas cartas se explicando. Fevereiro terá um número bem ruim. Estas são as más notícias. As boas são que há indicações de queda de preços de alimentos no atacado e no varejo, principalmente em óleos, suínos e leite. Do ponto de vista político, a inflação será explorada fortemente pela oposição, mas um olhar pelos dados dos últimos anos mostra que a alta de preços de alimentos foi muito mais pesada no governo passado.

Como intimidar jornalistas – Pedro Doria

O Globo

Neste ano sofri quatro cancelamentos. Um foi puxado pelos bolsonaristas, outro veio do MBL. Mais dois de militantes de esquerda. Cancelamentos fazem parte da vida cotidiana de quem está no debate público em democracias. Para quem cancela, a coisa dura um segundo. É escrever um tuíte, um comentário embaixo duma foto ou vídeo, de repente uma mensagem privada. Para o cancelado, é o sequestro completo de sua vida digital. O e-mail e todas as postagens em todas as redes sociais são dominados. Cada foto no Instagram, cada comentário feito nalgum canto é tomado por uma horda agredindo. Às vezes, foi o caso de meu cancelamento bolsonarista deste ano, a coisa dura um dia ou dois. Noutras, como ocorreu na semana passada pela esquerda anti-Israel, ao longo de uma semana inteira não é possível se manifestar nas redes. O espaço está 100% ocupado pela turba que tem por objetivo calar e intimidar. Se você diz algo, é alimento para mais ataques. Não tem solução que não esperar o tempo correr, deixar assentar. Nesse cancelamento em particular, houve algo de inédito: uma diplomata brasileira da ativa esteve entre os que mobilizaram o ataque a mim e a um grupo de jornalistas em visita a Israel. Diplomatas, ao menos em tese, não participam de ações para intimidar a imprensa.

A polarização passa bem, obrigada - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Datafolha mostra que é a oposição radicalizada que tem protagonizado o desgaste de Lula, o que tanto obriga o “centro” a se pendurar no bolsonarismo quanto empurra o governismo para o outro pólo

Na noite de quinta passada, o diretor de um grande banco fez um jantar para 12 pessoas reunindo, em torno do presidente de um grande partido do Centrão, seu líder na Câmara e mais dois deputados, gestores de grandes fundos de investimento, o dirigente de uma instituição financeira, além do presidente no Brasil de uma gigante mundial em tecnologia e de uma grande indústria nacional.

O dirigente, que tem três ministros no governo, nunca encontrou o presidente da República - “Se passar pela minha frente talvez nem me reconheça”. Não pretende marchar com ele em 2026, embora o reconheça como favorito na disputa, mas tampouco quer seguir com o bolsonarismo. Espera, porém, que o ex-presidente dê seu aval a um dos candidatos do que chama de “centro”. Precisa, para isso, que ele permaneça inelegível e não queira lançar um nome de sua família.

Menos de 24 horas depois daquele jantar, o Datafolha trazia um cenário que mostrava o tirocínio deste dirigente. A pesquisa que mostrou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fundo do poço trouxe também a fotografia de um casamento indissolúvel entre quem quiser ocupar o centro e o bolsonarismo.

Pouso suave - Mario Mesquita*

Valor Econômico

A conjuntura aponta, sim, para uma desaceleração econômica em 2025. Mas não, pelo menos por ora, para uma parada súbita neste início de ano

As discussões sobre conjuntura têm focado, neste início de ano, nas perspectivas para a atividade econômica. O debate se divide entre os que contam com um pouso relativamente suave da economia e os que atribuem grande probabilidade a uma parada súbita.

Para dar contexto, vou definir “parada súbita” como uma piora da taxa de crescimento trimestral superior a 1 ponto percentual e com dois trimestres consecutivos de contração do PIB. Tivemos cinco episódios desde 2002. Dois são atípicos porque ocorreram na esteira de graves crises globais, em 2008 e 2020. Os outros três foram basicamente determinados por fatores domésticos. O primeiro, na virada de 2002 para 2003, evidenciou as consequências econômicas - aceleração inflacionária e queda da renda - do severo estresse financeiro ocorrido nos trimestres anteriores. O segundo, em 2014, e o terceiro, em 2015, ocorreram na Grande Recessão brasileira, que durou do segundo trimestre de 2014 ao quarto trimestre de 2016.

Projeto 2025: roteiro para governos anticrise climática - Daniela Chiaretti

Valor Econômico

Plano de think tank conservador dos EUA está pavimentando os passos anti-ambientais de Trump

Nos primeiros minutos do debate presidencial de setembro, a candidata democrata Kamala Harris avisou o público: “Hoje vocês ouvirão o mesmo velho e cansado manual, um monte de mentiras, queixas e xingamentos”. Seguiu: “Vão ouvir um plano detalhado e perigoso chamado Projeto 2025, que o ex-presidente pretende implementar se for eleito novamente”. O então candidato republicano Donald Trump apressou-se em refugar a afirmação. “Não tenho nada a ver com o Projeto 2025. Isso está aí. Eu não li. Não quero ler, propositadamente. Não vou ler.” Se Trump não mentiu, alguém em seu governo leu e está seguindo à risca o calhamaço de 922 páginas de sugestões e ações para o próximo presidente republicano. Na área ambiental, o caminho está sendo trilhado passo a passo. É um roteiro para governos anticrise do clima que estão surgindo pelo mundo.

O comércio não se resume a Trump - Rana Foroohar

Valor Econômico

O mundo dos negócios e do comércio está mudando de maneiras que não têm relação com as ameaças tarifárias do presidente dos EUA

O vaivém das ameaças tarifárias de Donald Trump está agitando os mercados dos Estados Unidos e irritando tanto aliados como adversários. Entretanto, vale lembrar que muitas das mudanças no comércio global e nas cadeias de abastecimento já estavam em andamento há algum tempo e têm pouca relação com as artimanhas do presidente americano. Além disso, as grandes tendências nem sempre são as que parecem à primeira vista.

Tomemos, por exemplo a ideia de “nearshoring”. Esse movimento está, de fato, acontecendo na América do Norte, onde uma relação comercial mais estreita entre os EUA, México e Canadá nos últimos anos reduziu a dependência da China (o que, naturalmente, levanta a questão de por quê Trump iria querer tumultuar algo que está funcionando bem). No entanto, no âmbito global, a distância geográfica média do comércio aumentou cerca de 10 quilômetros por ano ao longo da última década, segundo uma nova pesquisa do McKinsey Global Institute (MGI). A distância média que um dólar em transações comerciais percorre agora é de cerca de 5.200 km.

Militares cá, golpistas lá - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

A credibilidade das Forças Armadas e o julgamento do golpe, de Bolsonaro e de generais

No ano do julgamento da tentativa de golpe, a dias do parecer da PGR sobre os golpistas e na véspera da ida do presidente Lula a uma cerimônia da Marinha no Rio, nesta segunda-feira, pesquisa Atlas apontou que 72% dos ouvidos não confiam nas Forças Armadas. Mesmo militares que consideram esse porcentual exagerado admitem que a imagem da instituição vem sofrendo desgaste e que nenhum outro presidente foi tão pernicioso para as FA do que o capitão insubordinado Jair Bolsonaro.

“Quando a política entra por uma porta no quartel, a ordem e a disciplina saem pela outra”, diz a máxima jogada no lixo por Bolsonaro, que entupiu o Planalto de generais e acentuou privilégios da carreira que um dia foi a sua. Enquanto “comprava” militares no varejo, ele infiltrava a política nos comandos e nas tropas de uma forma jamais vista após a redemocratização.

O que explica a queda de Lula? - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

É preciso conquistar a confiança para que as pessoas vejam mais o bem do que o mal

A relação do governo Lula com a sociedade azedou. Em dezembro, foi a opinião do mercado. O vídeo do ministro Haddad misturando corte de gastos com isenção do imposto de renda foi a gota d’água da confiança dos investidores, que tiraram dólares do Brasil a uma taxa recorde. Em janeiro, foi a opinião popular, dessa vez pelo vídeo do deputado Nikolas Ferreira sobre o Pix. Era esperado algum efeito, mas o tombo revelado pelo Datafolha surpreendeu.

Apenas com os dados socioeconômicos seria difícil explicar essa piora. Pobreza e miséria atingiram os menores níveis da história, segundo o IBGE. O desemprego caiu para 6,2%. Há quem diga que o desemprego baixo é uma miragem criada pelo Bolsa Família, que tiraria pessoas da procura por emprego. Não é o que os dados mostram: tanto a subutilização de mão de obra quanto o número de desalentados estavam em queda.

Lula tem um problema - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Queda de popularidade do presidente, seja aguda ou estrutural, força governo e outros agentes a se reposicionarem

Se até o mês passado a grande dificuldade de Lula era não conseguir que alguns bons indicadores econômicos se convertessem em popularidade, ele agora precisa lidar com um problema bem mais grave, que é a acentuada deterioração das avaliações positivas de seu governo, inclusive em coortes historicamente simpáticas ao petista.

Só o tempo dirá se estamos diante de um movimento agudo ou de algo mais estrutural, que reduziria as chances de a esquerda vencer o pleito presidencial de 2026, eventualmente fazendo com que o próprio Lula desista de concorrer à reeleição.

Lula reza no altar do Alcolumbre - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Para agradar ao senador-chefe, presidente não hesita em desqualificar o Ibama

Entre respeitar o Ibama e agradar ao presidente do Senado, Luiz Inácio da Silva (PT) não tem dúvida: sacrifica a reputação do instituto no altar de Davi Alcolumbre (União-AP). Isso enquanto cresce a rejeição aos atos do governo ante as agruras da vida.

Fazia um bom tempo que o chefe da nação não falava sobre a exploração de petróleo na foz do Amazonas —até que houve a troca de comando no Congresso.

Sebos: um mundo de prodígios - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Livrarias de livros velhos são uma esperança e uma contradição no país que perdeu 7 milhões de leitores

Eles brotam de buracos na parede. Como aquele que, da noite para a dia, surgiu numa ruazinha do Flamengo. Dentro, uma confusão, uma babel imersa em poeira. Mas quem se arriscasse a penetrar na caverna saía de lá com um livro ou um disco que nunca esperaria encontrar. Relíquia há tempos buscada e, por incrível que pareça, em bom estado. O preço, tão prodigioso quanto a descoberta: mais barato que uma mariola.

Poesia | Se você me esquecer, de Pablo Neruda

Música | Maria Gadu e Milton Nascimento - Paisagem da Janela