domingo, 2 de fevereiro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Queda em novos registros de armas foi um avanço

O Globo

Mas governo ainda precisa tratar de reduzir arsenal enorme em poder da população

É boa notícia a redução de 30% nas licenças para porte de armas e de 11,6% nos novos registros, verificada no ano passado pela Polícia Federal (PF). De 2023 para 2024, as autorizações para porte caíram de 2.469 para 1.727, enquanto a concessão de novos registros baixou de 28.402 para 25.097, segundo dados do Sistema Nacional de Armas (Sinarm), da PF.

Os números demonstram o acerto das restrições à compra, à posse e ao porte de armas implantadas no início do atual governo, depois do derrame armamentista ocorrido no anterior, sob o equivocado pretexto de aumentar a segurança da população. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que, entre 2018 e 2022, apenas os registros para armas de colecionadores, atiradores desportivos ou caçadores (CACs) foram multiplicados por sete vezes, chegando a quase 800 mil. Era preciso interromper a tendência.

Fim de um ciclo? - Merval Pereira

O Globo

Um sinal de que o presidencialismo de colisão está no fim é a distinção feita por Lira entre apoio eleitoral e para governar 

Um sinal de que o presidencialismo de coalizão está no fim, e que o governo Lula está abalado, é a definição dada pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira do que seja o apoio dos partidos a um governo: apoio para governar é diferente de apoio eleitoral, disse ele. O que significa avisar que os partidos que fazem parte da estrutura governamental não se consideram necessariamente obrigados a apoiar uma candidatura presidencial em 2026 que “esteja afundando”.

Além de deixar no ar que o governo está mal, mostra uma mudança no equilíbrio dos Poderes. No presidencialismo brasileiro, o presidente da República é eleito diretamente com o apoio de diversos partidos, que idealmente formarão o governo. Mas como dificilmente, para não dizer nunca, o eleito terá a maioria do Congresso, tem que formar coalizões, muitas vezes, para não dizer quase sempre, incoerentes com o papel que os partidos assumiram na campanha presidencial.

Nova geração assume o comando do Congresso – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Para alguns caciques do Congresso, chegou a hora de resolver a contradição entre um sistema de governo presidencialista e uma constituição parlamentarista

A eleição de Davi Alcolumbre (União-AP) e de Hugo Motta (PR-PB) ao comando do Senado e da Câmara, ontem, respectivamente, no contexto de uma ampla coalizão de partidos, que vai do PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao PL, representa também uma mudança de geração na elite política do país, que consolida a hegemonia dos políticos do Norte e Nordeste na Casa, com uma orientação fortemente vinculada aos partidos do Centrão.

Alcolumbre, que volta ao comando de Senado, tem 47 anos e foi eleito com uma votação consagradora, obtendo 73 votos, apenas três a menos do que o mais longevo e mais importante político que presidiou a Casa depois da redemocratização, o ex-presidente José Sarney (MDB). Fez uma carreira meteórica, pois chegou à Casa em 2015 e quatro anos depois se elegeu presidente do Senado pela primeira vez, o mais jovem da história. Judeu de origem marroquina, sua família é dona de postos de gasolina, emissoras de tevê (Band e SBT) e negócios agropecuários (terras, pecuária, papel e celulose). 

Aos 35 anos, Motta ascende ao comando da Câmara, como o mais jovem presidente da Casa. Entretanto, tem 21 anos de mandato de deputado federal eleito pela Paraíba. Sua cultura política é a das velhas oligarquias nordestinas, adquirida na convivência com o avô, Nabor Wanderley da Nóbrega, que foi prefeito de Patos, e seu pai, Nabor Filho, que é o atual prefeito, pela quarta vez. A avó materna, Francisca Mota, foi deputada estadual por seis mandatos e, também, foi prefeita da cidade.

Alcolumbre, Motta e as barbas de molho - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

No ‘novo Congresso’, economia, redes sociais, IA, segurança e militares. E paz entre Poderes?

Inversão no Congresso: Davi Alcolumbre será na presidência do Senado o que Arthur Lira foi na da Câmara e Hugo Motta será na da Câmara o que Rodrigo Pacheco foi na do Senado. Ou seja, Alcolumbre terá muita força e um poder muito maior para chantagear, ops!, negociar com o governo e Motta tende a ser mais cauteloso ao dar um passo tão grande na carreira política – tomara que não um passo maior que a perna. Mas Motta não estará sozinho. Foi apadrinhado por Lira e grande aliado de... Eduardo Cunha.

Alcolumbre (União BrasilAP) e Motta (RepublicanosPB) têm muitas diferenças, mas ambos fortalecem ainda mais o já tão poderoso Centrão e ambos estão embolados nas investigações do Supremo sobre desvios de emendas parlamentares esquisitonas. Logo, o Centrão está no comando, mas o ministro Flávio Dino está a postos e o fator emendas tende a dar limites à audácia do Congresso.

Indústria nacional volta a ter destaque - Geraldo Alckmin*

O Globo

O Brasil tem um chão de fábrica sólido. Essa base nos permitirá avançar em novos mercados e diversificar nossa produção

A indústria nacional voltou a ocupar lugar de destaque no crescimento do PIB brasileiro no ano passado. Para aqueles que gostam de aferir os resultados do governo, uma boa notícia: o parafuso está apertado, e a máquina tornou a funcionar.

Números, sem contexto, são apenas cifras. Mas, quando uma política pública produz resultados palpáveis, os algarismos traduzem a eficácia de programas bem construídos, como temos visto desde 2023, com o governo do presidente Lula.

A indústria, em geral, cresceu 3,2% até novembro do ano passado, puxada por bens de consumo duráveis (como televisores, geladeiras e móveis), que tiveram crescimento de 10,7% no acumulado de janeiro a novembro de 2024, em relação a 2023.

A produção de bens de capital (máquinas e equipamentos) cresceu 8,8% no mesmo período, e a indústria de transformação como um todo deverá encerrar 2024 com ganho de 3,7%, maior soma em dez anos, e registrou o valor recorde de US$ 181,9 bilhões em exportações. A produção da agroindústria havia crescido 2,2% nos 11 primeiros meses de 2024, melhor desempenho nesse intervalo desde 2010.

Em defesa das Forças Armadas: militares fora da política - Raul Jungmann*

Correio Braziliense

Temos condições mais favoráveis para estabelecer regras capazes de contribuir para a despolitização das Forças Armadas e, com apoio destas

Uma questão democrática latente no Brasil hoje é a participação dos militares na política, sobretudo após os acontecimentos que culminaram no 8 de janeiro e suas consequências. Estudo anterior a esses episódios, do professor Pedro Kelson, mestre em cultura política e capital social, constatou que, em 11 democracias protagonistas da cena global, candidaturas de militares da ativa são proibidas.

Na França, Alemanha, Bélgica, Espanha, Itália, Portugal, Reino Unido, Estados Unidos, Uruguai, Argentina e Chile, essa é uma restrição comum, algumas, agravadas por mais condicionantes. 

O Brasil, como está, permanece não só à margem desse padrão, como indiferente ao próprio histórico político, que recomenda o mesmo caminho desses países. Daí a importância da aprovação da chamada PEC dos Militares, em tramitação no Senado, que veta candidaturas para cargos políticos a militares da ativa.

Trump age com método no segundo mandato – Dorrit Harazim

O Globo

O objetivo maior e final é assumir controle pleno, sistemático e duradouro da máquina federal

Que ninguém se engane: há método no caos imposto por Donald Trump a seu país e ao mundo neste segundo mandato. Não significa que, ao final, ele chegará aonde quer.

Sua primeira temporada na Casa Branca (2017-2021) já havia sido caótica, mais por despreparo e escasso conhecimento de como funciona a máquina governamental. À época, o foco do novato na Presidência era outro — Trump priorizou consolidar sua cumplicidade com os seguidores raiz, os desgarrados da sociedade. Como método, usou e abusou do escárnio compartilhado, da zombaria pública, do linchamento verbal.

“A crueldade os encheu de satisfação e orgulho, fez com que se sentissem próximos uns dos outros”, escreveu em 2018 o jornalista Adam Serwer no ensaio “A crueldade como objetivo”, sobre o impacto da chegada de Trump ao poder.

O grande mico do 20 de janeiro de Donald Trump - Elio Gaspari

O Globo

O que a China fez com os bilionários americanos das big techs e com Donald Trump foi uma malvadeza histórica.

No dia 20 de janeiro, o novo presidente anunciou em seu discurso de posse: “A partir de agora, terminou o declínio americano” e prometeu o início de uma “Era de Ouro” para o país.

Entre os convidados, aplaudindo-o, estavam os bilionários Elon (Tesla) Musk, Mark (Meta) Zuckerberg, Jeff (Amazon) Bezos, Tim (Apple) Cook, Sundar (Google) Pichai e Sam (Open-AI) Altman.

Com jeito de quem não queria nada, naquele dia, a empresa DeepSeek, do chinês Liang Wenfeng, soltou seu aplicativo de inteligência artificial R1. Em seguida, republicou um artigo de 22 páginas assinado por 193 autores (todos chineses) e a estrutura do seu programa.

O R1 da DeepSeek foi lançado no dia da posse de Trump de caso pensado. A China já fez coisa parecida em 2023, às vésperas de uma visita da secretária do Comércio dos EUA.

Trump e a burrice histórica - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Wall Street Journal diz que política comercial trumpista é 'a mais burra da história'

"A guerra comercial mais burra da história" era o título de um editorial do "Wall Street Journal" (WSJ). Critica os aumentos do imposto de importação de Donald Trump sobre produtos de Canadá, México e China.

O WSJ não é suspeito de ser antitrumpista. Mas não bebe sopa fervendo de dólares rasgados. Tributar importações a rodo não faz sentido prático, pragmático ou teórico para quase ninguém. Mas é disso que se trata, de discussão econômica?

O programa de Trump suscita debates sobre aumento de ineficiências e de inflação, de alta de juros e do dólar, de prejuízos para o PIB de aliados. Anima ou requenta discussões sobre desglobalização comercial, que já são bem exageradas, porém.

Cultura costura fios desatados - Míriam Leitão

O Globo

A cultura tem feito o que a política e o judiciário não conseguiram: costurar um país marcado por feridas não curadas

A cultura tem feito o que a política e o judiciário não conseguiram, o encontro do Brasil com a sua história. Volto de férias com o Brasil falando ainda em contas públicas, Donald Trump colocando em prática o seu extremismo e uma ameaça chinesa rondando as empresas americanas de alta tecnologia. Assuntos em pauta, certamente. Mas quero hoje falar de “Ainda estou aqui", de “Lady Tempestade” e de Marina Colasanti. O cinema, o teatro e a literatura nos colocam de frente para o que é essencial.

O belo “Ainda estou aqui” tem permitido um diálogo de gerações sobre temas nunca devidamente tratados no Brasil. Há algo na genial direção de Walter Salles, na perfeita atuação de Fernanda Torres, no talento de Selton Mello. Há algo no mar do Leblon, no ambiente familiar, no clima dos anos 1970, na trilha sonora que permanece. Meu neto Daniel, de 15 anos, disse que queria ver o filme com a família, mas todos já haviam visto. Fomos quatro pessoas, de três gerações diferentes — o pai, a irmã e os avós —, acompanhá-lo. Já tínhamos visto, mas o convite era encantador. No final, ele contou que quer rever porque precisa anotar as frases que foram ditas naquela época, mas poderiam ter sido ditas hoje.

Identidades mortas a caminho - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Esse fascínio atemorizado pela morte decorre de uma alergia à vida, por um mal-estar civilizatório insuperável

A maior preocupação da plutocracia que acaba de chegar ao poder com Trump é hoje a imortalidade. Jeff Bezos, da Amazon, pesquisa o elixir da juventude, enquanto Sergey Brin e Larry Page, donos da Google, concentram-se numa startup ("Calico") cujo objetivo é "matar a morte". Mas há colaterais de menor porte: movidos por achados arqueológicos, cientistas vêm se declarando prontos para ressuscitar animais extintos, do mamute ao pássaro dodô. O DNA das fezes e do vômito de dinossauros é o caminho técnico.

O dodô existia até o século 17 nas ilhas Maurício, no Índico, desaparecendo 100 anos após a chegada dos humanos. Anacronismo vivo, semelhante a um pombo de um metro de altura, tinha asas, mas não voava, não tinha medo de humanos, nem sequer de marinheiros esfomeados. Foi caçado até o último exemplar, mas ficou como símbolo da indiferença suicida. Ressuscitar o extinto é só uma variável dos projetos de extinção da morte.

Governo se perde no lero-lero – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Na primeira entrevista já no molde da nova comunicação, Lula mais enrolou que esclareceu

Quando se ouve presidente e ministros falarem sobre o que se pretende fazer em Brasília para baixar o preço dos alimentos vem à mente o personagem Rolando Lero. Aquele que, ao não saber a resposta à pergunta do professor Raimundo, enrolava o mestre com um entra e sai de frases vazias. Está assim o governo desde que se deu conta do efeito nefasto da inflação no humor das pessoas.

Nem se pode dizer que tenha acordado tarde, pois quando o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) diz que ainda "é cedo" para a população fazer uma avaliação justa de sua gestão, sugere apenas um leve despertar. A crise do Pix provocou uma sacudida no sono gostoso do negacionismo, a queda de popularidade com perda expressiva de apoio no Nordeste fez tremer as bases, mas não foi suficiente para um alinhamento de posições.

E agora, Kassab? - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Chefe do PSD se distancia de Lula porque sonha em ser o 'kingmaker' que fará de Tarcísio presidente

Na semana passada, Gilberto Kassab (PSD-SP) se distanciou do governo Lula. Em um desses eventos de rico, disse que Lula não é favorito na próxima eleição presidencial e que Fernando Haddad é um ministro fraco.

Não seria nada de mais, não fosse por dois motivos.

Em primeiro lugar, Lula está prestes a oferecer ao PSD, partido de Kassab, ministérios importantes. Ainda não sabemos quais, mas não deve ser coisa pequena. A esperança de Lula é usar a reforma ministerial para fechar alianças para 2026. Se Kassab já estiver fechando com o outro lado, a reforma ministerial já começará meio esquisita.

Em segundo lugar, Kassab tem fama de bússola que sempre aponta para o lado vencedor. Se largar Lula, pode ser sinal de fraqueza do petista.

Kassab também pode estar se aventurando em um jogo que nunca jogou.

Quem é a direita da direita que apoia Trump na Europa - João Gabriel de Lima

Folha de S. Paulo

Ultradireitistas veem na proximidade com presidente americano uma chance de ganhar influência e promover-se para eleitorado

[RESUMO] A volta de Donald Trump ao poder marca um realinhamento na direita global, notadamente na Europa, onde a fragmentação do espectro político avança junto com seu poder de influência. O autor sustenta que grupos posicionados à direita da direita tradicional buscam, na proximidade com o presidente americano, formas de promoção ideológica. Com posturas mais radicalizadas e sem respostas para problemas complexos, esses grupos, assim como Trump, também miram sua retórica contra os imigrantes.

A posse de Donald Trump rendeu selfies entusiasmadas no Instagram de vários líderes europeus. Em uma dessas fotos, o presidente americano aparece sorridente ao lado de Giorgia Meloni. "Estou certa de que a amizade entre nossas nações e os valores que nos unem continuarão a reforçar a colaboração entre Itália e Estados Unidos, enfrentando juntos os desafios globais e construindo um futuro de prosperidade e segurança para nossos povos", escreveu a primeira-ministra italiana.

No perfil de Meloni, há um vídeo de Trump em que ele define a premiê como "uma líder e pessoa fantástica" e outra foto de ambos com a legenda "prontos para trabalhar juntos".

O espanhol Santiago Abascal, líder do partido político Vox, ecoou o discurso de Trump em uma de suas postagens. "Felicidades aos defensores da liberdade e do senso comum no mundo inteiro. Este é o nosso momento." Os dois políticos aparecem na foto com o polegar para cima.

Casado com uma influenciadora, Lidia Bedman, Abascal fez uma cobertura completa do evento. Em uma sequência de vídeos com imagens de Washington ao fundo, chama o premiê espanhol Pedro Sánchez de charlatão, ataca os "burocratas de Bruxelas" e abraça efusivamente o presidente argentino Javier Milei.

A selfie de Tino Chrupalla, um dos líderes do partido político alemão AfD (Alternativa para a Alemanha), teve como cenário a festa de Trump dentro da arena Capitol One. Ele escreveu sob a foto: "Podia-se sentir o otimismo e a esperança em um presidente que cumpre imediatamente as promessas eleitorais e quer proteger o interesse dos cidadãos, da mesma forma que nós nos preocupamos com os interesses dos cidadãos alemães".

Em sua posse, Trump pouco falou de assuntos internacionais —"América primeiro!"—, mas abriu um precedente ao convidar vários líderes estrangeiros para uma festa à qual tradicionalmente só comparecem americanos. Com o gesto, demarcou quem seria sua turma no mundo.

Da América Latina, foram convidados Javier Milei, o presidente salvadorenho Nayib Bukele e o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que não pôde comparecer por ter tido o passaporte retido pela Justiça. Um olhar sobre os líderes europeus, como Meloni, Abascal e Chrupalla, deixa mais claro, no entanto, o perfil dos escolhidos por Trump.

Parlamento Europeu é ocupado por partidos que agrupam siglas de diferentes países. O maior deles é o PPE (Partido Popular Europeu), de direita, à qual pertence a presidente da Comissão Europeia, a alemã Ursula von der Leyen, e a presidente do próprio Parlamento Europeu, a maltesa Roberta Metsola. A esquerda se agrupa no guarda-chuva S&D (Socialistas e Democratas), ao qual pertencem os premiês da Espanha, Pedro Sánchez, e da Alemanha, Olaf Scholz, que disputa a reeleição em pleito marcado para o dia 23 de fevereiro.

Poesia | O Rio - João Cabral de Melo Neto

p> 

Música | Quando fevereiro chegar - Geraldo Azevedo