quarta-feira, 26 de março de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

AGU faz bem em disciplinar ação da primeira-dama

O Globo

É evidente que Janja tem exercido função pública no governo, ainda que não tenha cargo formal

É oportuna a iniciativa da Advocacia-Geral da União (AGU) de impor limites à atuação do cônjuge do presidente da República nas situações em que representa simbolicamente o chefe de Estado em eventos nacionais ou internacionais. O parecer, inédito, é elaborado a pedido do próprio Palácio do Planalto, em meio a contestações à atuação da primeira-dama, Janja da Silva. As críticas se multiplicam nas redes sociais e impõem desgaste ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Elas vêm sobretudo da oposição, mas encontram eco também dentro do próprio governo e em aliados. Têm sido frequentes os relatos de gafes, falta de transparência, quebra de protocolo e interferência em assuntos do governo.

Um olho denúncia, outro em 2026 - Vera Magalhães

O Globo

Bolsonaro já age como quem traça cenários para tentar reverter, lá adiante, uma provável condenação e possível prisão

É bastante sintomático que expressões como revisão judicial, anistia, perdão, indulto ou graça sejam, há semanas, as mais usadas pelos advogados dos denunciados pela trama golpista do governo Jair Bolsonaro. Isso bem antes da sessão de ontem, em que ficou evidente a tendência de que a Primeira Turma do Supremo Tribunal torne o ex-presidente e seus companheiros réus por 5 a 0.

Versados em mensalão e Lava-Jato, representantes de algumas das mais estreladas bancas de advocacia do Brasil contam com as reviravoltas jurídicas, judiciais e políticas — de que a História está salpicada de exemplos — para apostar que seus clientes serão condenados e provavelmente presos, mas não cumprirão suas penas integralmente porque alguma maré poderá virar.

Contradição insanável - Bernardo Mello Franco

O Globo

No dia em que o Supremo começou a julgar a denúncia contra Jair Bolsonaro e seus generais de estimação, os ministros da Corte formaram maioria para condenar e cassar o mandato de Carla Zambelli. A deputada escapou de ser processada pela tentativa de golpe. Deve ser responsabilizada por outros crimes: porte ilegal de arma e constrangimento ilegal.

O episódio ocorreu na véspera do segundo turno da eleição de 2022. Após se envolver em bate-boca na rua, Zambelli sacou um revólver e saiu correndo atrás de um eleitor do PT. Só parou dentro de uma lanchonete, onde ordenou que o homem deitasse no chão sob a mira da arma. A cena de faroeste expôs a insanidade da política armamentista patrocinada pelo capitão.

Débora virou um símbolo espinhoso – Elio Gaspari


O Globo

Cena 1, janeiro de 1970: Os juízes da 1ª Auditoria do Exército leem a sentença que condena a oito anos de prisão os oito principais autores do sequestro do embaixador Charles Elbrick, ocorrido em setembro do ano anterior.

(A ditadura vivia um pico da sua fase repressiva. Carlos Marighella, patrono involuntário do sequestro, e Virgílio Gomes da Silva, participante da ação, haviam sido assassinados.)

Cena 2, março de 2025: O ministro Alexandre de Moraes condena a 14 anos de prisão a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos. No dia 8 de janeiro de 2023, ela escreveu com batom “Perdeu, mané” na estátua da Justiça em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. Moraes foi acompanhado pelo ministro Flávio Dino

Débora, mãe de dois filhos menores, está presa desde março de 2023. Ela escreveu uma carta ao ministro Moraes desculpando-se, mas ele acabou dando-lhe 14 anos. Como o ministro Luiz Fux pediu vista, o julgamento não terminou.

O efeito do consignado no humor da população - Fernando Exman

Valor Econômico

Índice de Confiança do Consumidor (ICC) de março registrou uma alta de 0,7 ponto, para 84,3 pontos, depois de três quedas seguidas

Meses atrás, um estudo publicado pelo National Bureau of Economic Research (NBER), reconhecida instituição privada apartidária sem fins lucrativos dos Estados Unidos, chamou a atenção de integrantes do governo e circulou pela Esplanada dos Ministérios. A campanha presidencial americana corria solta e o texto, na visão dessas autoridades, explicava as dificuldades enfrentadas pelo então presidente Joe Biden na disputa contra Donald Trump. Era um alerta para quem estivesse preocupado com a queda na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Intitulado “O Custo do dinheiro é parte do custo de vida: novas evidências sobre a anomalia no sentimento do consumidor”, o artigo apontava que a confiança do cidadão americano estava insistentemente reduzida, apesar do baixo desemprego e da inflação em queda, e a explicação para isso era o encarecimento do acesso ao crédito. Ou seja, uma variável que não era captada pelos índices de inflação, mas afetava diretamente a vida de milhões de famílias.

Delação divide defesa e cria dissidência na Primeira Turma - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Fux diz que delator deveria ser reinquirido e mostra que será empecilho à dominância das teses de Moraes no colegiado

Eixo da denúncia da Procuradoria-Geral da República, a delação premiada do ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, o coronel Mauro Cid, foi a questão que mais dividiu o julgamento contra o núcleo político da trama golpista. Os advogados dos acusados adotaram a linha do “cada um por si”, ora desqualificando a delação, ora usando-a em defesa de seus clientes. Já os ministros da Primeira Turma acataram a delação, mas pelo menos dois sinalizaram que poderão vir questioná-la.

Ao abordarem a delação, os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia reiteraram que “neste momento” não há elementos para decretar a nulidade do instituto. “Nove delações significa nenhuma delação”, chegou a dizer Fux, numa referência aos depoimentos de Cid, sendo o último deles depois do vazamento de uma conversa em que desabafou sobre pressões que vinha sofrendo, momento em que a colaboração esteve ameaçada de cancelamento. “Esse colaborador deveria ser ouvido novamente. Eu até gostaria de ir. Vejo com reservas”.

Batalha judicial está perdida para o bolsonarismo - César Felício

Valor Econômico

Sem alternativas, resta ao ex-presidente repetir a manobra de Lula em 2018

O julgamento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a aceitação da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 24 pessoas por golpismo, que se iniciou na terça-feira (25), é um dos maiores jogos jogados da história recente do país, com efeitos já amplamente precificados há meses. Suas vítimas não conseguiram desviar-se do destino aparentemente inexorável.

A denúncia deverá ser aceita e a ação penal, uma vez aberta, deverá levar à condenação de Bolsonaro ainda neste ano. Sua prisão é um evento previsto para o último trimestre do ano. O próprio ex-presidente previu em entrevista ao “Financial Times” ser condenado a 28 anos. Fontes jurídicas que acompanham o julgamento, distantes de Bolsonaro, acham que o ex-presidente está certo.

Há uma certa dúvida sobre o placar e a conclusão do exame da questão esta semana, em função da presença do ministro Luiz Fux no colegiado. No exame das questões preliminares levantadas pelas defesas do primeiro núcleo dos acusados, Fux sinalizou ver com muita reserva a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que contou com mais de uma versão. Cristiano Zanin, Flávio Dino e Cármen Lúcia devem acompanhar o voto do relator, Alexandre de Moraes. A eventual falta de unanimidade, contudo, não muda o prognóstico.

O batom de Bolsonaro - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Atentar contra as liberdades é o pior dos crimes que alguém pode cometer em uma República

Marco Mânlio Capitolino aspirou à realeza e acabou precipitado da Rocha Tarpeia. É o que Tito Lívio conta no livro VI da História de Roma – Ab urbe condita libri. A República condenou Mânlio, apesar de suas ações nobres, porque – movidas pela “vergonhosa paixão de reinar” – deixavam de motivar recompensa e glória para se tornarem odiosas.

Bolsonaro, como os antigos acusados em Roma, compareceu ao fórum. Sua presença não constrangeu os ministros – Lula não esteve lá quando o STF definiu que os condenados em 2.ª instância deviam ir para o cárcere, antes do trânsito em julgado.

Bolsonaro sabe o significado de seu gesto. É de manipular as redes e de explorar meias-verdades que o bolsonarismo é sempre acusado pelos adversários.

Falta ambição - Nicolau da Rocha Cavalcanti

O Estado de S. Paulo

Falta sonho, falta garra, falta sentido de urgência para enfrentar as causas dos problemas do País. E aqui não há desculpa

A falta de ambição é uma das grandes deficiências do atual governo federal. Ambição de servir, de transformar o País, de produzir mudanças profundas na vida da população. Nota-se um acostumamento com o poder. É estranho – e triste, ao mesmo tempo – ter de dizer: se a realidade social e econômica fosse exatamente igual, mas a popularidade do presidente da República estivesse em alta, a impressão é a de que estariam satisfeitos. Não haveria maiores preocupações.

Talvez alguém do campo da oposição possa questionar: “Como é possível afirmar que falta ambição ao PT? Eles querem a hegemonia do poder”. Falo de outro tipo de ambição, mais audaz e disruptivo. A ambição de que o exercício do poder tenha profundo e positivo impacto sobre a vida das pessoas no curto, médio e longo prazos.

Advogados adotam Lei de Murici e querem anular delação contra Bolsonaro - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin marcou para hoje a continuidade do julgamento, que deve apreciar o mérito da denúncia contra o ex-presidente da República e outros sete denunciados

Por se tratar de um julgamento inédito, seja porque o principal acusado de tentativa de golpe de Estado é um ex-presidente da República, seja por generais de quatro estrelas igualmente acusados serem julgados na Justiça civil, todos por intentar contra o regime democrático, vem ao caso o coronel Tamarindo, personagem histórico da Guerra de Canudos (1896-1897), no interior da Bahia. Como ele, as defesas de Jair Bolsonaro e dos demais acusados adotaram a Lei de Murici.

Trump: demolidor e despertador - Cristovam Buarque*

Correio Braziliense

Trump é um esbravejador que assume sua maldade e desperta a consciência daqueles que silenciosamente se comportam da mesma forma

Nenhum chefe de governo ameaçou a humanidade de forma tão catastrófica quanto Trump. Os presidentes de países com potencial nuclear representavam ameaça, mas não chegaram a promover hecatombe. Truman usou bombas nucleares assassinando centenas de milhares de civis, em duas cidades. Ao negar os riscos da catástrofe ecológica em marcha, incentivar a produção de petróleo, abandonar o Acordo de Paris e a participação na COP30, Trump pratica a demolição: mudanças climáticas, elevação no nível do mar, desaparecimento de cidades e países, desestruturação da agricultura, extinção em massa de vida e a depredação da civilização. Mas desperta a opinião pública para a realidade da crise mundial.

Contas com o passado – Rodrigo Craveiro

Correio Braziliense

As nações que enfrentaram anos de chumbo devem usar a democracia como farol para iluminar a verdade e assegurar a reparação a familiares e vítimas das masmorras

Olhar para o passado para que ele não se repita no presente. É dever sagrado de toda a nação preservar o Estado de Direito como joia rara. Aquelas que enfrentaram anos de chumbo devem usar a democracia como farol para iluminar a verdade e assegurar a reparação a familiares e vítimas das masmorras. Acertar as contas com a história é essencial para garantir que o horror não se repita. Também para que os mortos pelo regime militar descansem em paz. Na segunda-feira, entrevistei dois sobreviventes da ditadura argentina e um homem que tinha apenas dois anos quando testemunhou o assassinato dos pais. Depois de quase meio século, tudo o que pedem é justiça. É exatamente isso o que nós, brasileiros, devemos cobrar das nossas autoridades.

Bolsonaro larga a mão de todos - Mariliz Pereira Jorge

Folha de S. Paulo

Ex-presidente rifaria até os filhos se puder posar de injustiçado, de mártir

Nenhuma surpresa de que Jair Bolsonaro siga abandonando aliados pelo caminho quando não precisa mais deles. Nesta terça (25), deu mais um empurrão em Carla Zambelli rumo ao ostracismo político —não que ela não mereça, mas não é a primeira vez que ele a culpa pela derrota na eleição. A atitude apenas reforça que o ex-presidente rifaria até os filhos se puder posar de injustiçado, de mártir.

A declaração de hoje é um aceno a seus cupinchas para que não se empenhem em salvar o mandato da deputada, se confirmada a sua condenação pelo STF, pelas acusações de porte ilegal de arma e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo. A Constituição estabelece que a Câmara deve analisar casos assim, transitados em julgado. Até lá, Bolsonaro já deve ter sido julgado e preso, mas não sem deixar um rastro de destruição.

A extrema direita pagará o custo dos abusos de Trump - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Eleitor moderado repensará seu apoio a candidatos semelhantes em seus países

Há boas notícias para candidatos, partidos e movimentos da direita radical, a começar pelo fato de que Donald Trump voltou a governar os Estados Unidos. Além disso, a extrema direita segue crescendo eleitoralmente nas grandes democracias das Américas e da Europa. Le Pen, por exemplo, aparece liderando as pesquisas de intenção de voto na França para 2027, enquanto no Chile —que recentemente viveu uma primavera progressista— multiplicam-se agora as candidaturas de extrema direita, inclusive em disputa interna sobre quem é mais radical.

No caso brasileiro, as pesquisas indicam que os que votaram na extrema direita continuam, em grande medida, prontos para repetir esse voto. E todas as esperanças de desradicalização, assim como as promessas de reconciliação nacional, já não existem ou não dão qualquer indício de que possam ser cumpridas. Isso quer dizer, no mínimo, que a ascensão da extrema direita ainda não atingiu seu teto e que há espaço para expansão.

Bolsonaro acabou? - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Existe uma categoria de políticos carismáticos que podem dizer e fazer barbaridades sem perder o apoio dos eleitores mais fiéis

A essa altura, podemos dar como favas contadas que Jair Bolsonaro será condenado a uma longa pena de prisão. Sua carreira política acabou? Adoraria responder afirmativamente à pergunta, mas a experiência recomenda certa cautela.

Lula, que também parecia um caso perdido após ser preso, com condenação por corrupção em três instâncias, voltou e reassumiu a Presidência. Isso não é exclusividade brasileira. Napoleão Bonaparte, derrotado na Batalha de Leipzig e exilado em Elba, também deu um jeito de voltar.

A situação de Bolsonaro, porém, me parece mais difícil que a de Lula e Napoleão. Ao contrário do que ocorreu com o petista, o capitão reformado será julgado pelo STF, o que significa que não existe corte superior que possa depois anular tudo, como é padrão por aqui.

A história em julgamento - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Os acusados de golpe são, sobretudo, traidores do pacto que resultou na anistia de 1979

Imperfeita, mas a possível para abrir caminho à transição democrática, a anistia de 1979 senta-se agora no Supremo Tribunal Federal na figura de familiares de Vladimir Herzog e Zuzu Angel, vítimas da ditadura militar, para assistir ao julgamento de pessoas acusadas de romper o pacto de quatro décadas atrás.

peça que começou a ser examinada denuncia 34 pessoas por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado de Direito, organização criminosa armada, dano e deterioração do patrimônio público.

Um verdadeiro manual de traição à reconstrução de uma democracia que completa 40 anos. É muita coisa e, se comprovadas de modo bem consistente as acusações, não há que se falar em punições excessivas, muito menos em anistia. Esta foi pactuada lá atrás e vilipendiada por gente inconformada com o resultado de uma eleição.

Poesia | E agora José - Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Roberta Sá - Me erra