sábado, 15 de março de 2025

Entrevista | José Sarney: 'Fui um presidente marcado para ser deposto'

Naief Haddad / Folha de S. Paulo

Político maranhense lembra a chegada improvável ao poder há 40 anos e as dificuldades para conduzir a transição democrática

José Sarney tem as mãos levemente trêmulas e a voz frágil. Ao lado do enfermeiro, o ex-presidente de 94 anos caminha com dificuldade. Os fios do bigode, aparado com esmero, estão completamente brancos.

Por outro lado, seu raciocínio se mantém afiado assim como o espírito conciliatório. Na sala da sua casa em Brasília, decorada com pinturas de artistas como Cândido Portinari e Burle Marx, ou na ampla varanda, de onde se vê o lago Paranoá, Sarney recebe com frequência amigos dos mais variados espectros políticos, do presidente Lula (PT) ao ex-presidente Michel Temer (MDB).

No momento em que a reportagem chegou para entrevistá-lo, no final da tarde do último dia 7, Sarney falava por telefone com Julio María Sanguinetti, ex-presidente do Uruguai. Sanguinetti disse a ele que pretendia ir ao evento de homenagem ao político maranhense neste sábado, dia 15, em Brasília.

Em 15 de março de 1985, com a hospitalização de Tancredo Neves, cabeça da chapa eleita dois meses antes no Colégio Eleitoral, coube ao vice, Sarney, assumir a Presidência. Ele imaginava que Tancredo ocuparia o posto alguns dias depois, mas, passadas sete cirurgias, o amigo mineiro morreu em 21 de abril.

Com um ministério todo escolhido por Tancredo, Sarney deveria conduzir a transição da ditadura militar para a democracia. "Fui um presidente marcado para ser deposto, como muitos outros da história do Brasil", afirmou.

Na entrevista, ele diz se arrepender das críticas feitas a Juscelino Kubitschek, lembra a depressão que teve nos anos 1980 e comenta as acusações de favorecer deputados para que aprovassem seu mandato de cinco anos. Também se recorda da relação com os militares, analisa as razões para que o Plano Cruzado tivesse um desfecho negativo e critica a falta de lideranças no Brasil de hoje.

Instituições precisam reaprender a ouvir – Pablo Ortellado

O Globo

Vemos críticas não ser consideradas porque são percebidas como acusação moral ilegítima

A polarização não é apenas a separação da sociedade em dois campos políticos antagônicos. Com ela, vêm também a desqualificação do adversário e insensibilidade às suas críticas. Quando instituições são hegemonizadas por um dos polos, seu caráter público é comprometido porque as autoridades que as controlam sentem que não precisam responder a críticas “desqualificadas”. Precisamos entender como opera esse mecanismo e atuar em sentido contrário, para garantir que sigam funcionando de modo republicano num mundo dividido.

Esconder patrocinador só pode ter dois motivos: corrupção ou barganha política – Míriam Leitão

O Globo

A avaliação é Marcos Mendes, professor do Insper, que destaca o fato de o Brasil ser único país da OCDE em que o Executivo é obrigado a reservar parte do Orçamento para este fim

A insistência dos parlamentares em deixar brechas na nova regulamentação das emendas parlamentares mantendo a possibilidade de continuar a ocultar a identificação dos autores dos recursos de indicação coletiva só podem ter duas razões: corrupção ou o fato dos recursos estarem sendo usados para barganha política e não seria bom que o parlamentar A soubesse o quanto o B recebeu. A avaliação é de Marcos Mendes, professor do Insper, que provoca:

-Quando é interessante para o parlamentar, ele bate bumbo para divulgar que foi ele quem destinou recursos para um determinado projeto ou localidade. Se não quer ser identificado como patrocinador dessa emenda suspeita-se que haja algum mal feito.

Americanos pagarão por ataque à ordem global - Fareed Zakaria

O Estado de S. Paulo

Trump vem desfazendo o sistema internacional; posição privilegiada americana também declinará

Reviravoltas nos EUA estão sendo notadas e resultarão em revolução na política global

Cingapura joga suas cartas geopolíticas com cuidado, ao tentar manter boas relações com os EUA em uma região dominada pela China. Então, vale a pena prestar atenção quando seu ministro da Defesa diz que a imagem de Washington “mudou de libertador para grande desestabilizador, para um senhorio buscando aluguéis”. Seu premiê, Lee Hsien Loong, resumiu o desafio que o mundo enfrenta: “Os EUA não estão mais dispostos a garantir a ordem global”.

Em poucas semanas, o governo Trump pôs em prática uma revolução na política externa americana, abandonando um antigo aliado democrático, a Ucrânia, cuja segurança os EUA prometeram defender desde a assinatura do Memorando de Budapeste, há 30 anos. Agora, Trump pede uma parte da riqueza mineral da Ucrânia, que seu governo descreve como “retribuição”, em troca de apoio.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Nova manobra para manter emendas ocultas é acintosa

O Globo

Regras aprovadas pelo Congresso ferem transparência, violam acordo entre Poderes e ofendem Constituição

É um acinte a insistência do Congresso em negar aos brasileiros o direito constitucional de rastrear o gasto público. Em sessão conjunta na quinta-feira, ela ganhou um novo e triste capítulo. Senadores e deputados — num arco que foi do PL ao PT — aprovaram regras sobre emendas parlamentares que contrariam a Constituição, contrariam decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e contrariam o acordo que os recém-empossados presidentes da Câmara e do Senado haviam firmado com o STF. O texto cria uma brecha para que os padrinhos das verbas continuem incógnitos nas emendas de comissão e de bancada. Se todos os partidos presentes no Congresso, com exceção dos nanicos Novo e PSOL, são contra a transparência, não restará outra alternativa ao Judiciário senão determinar novos bloqueios das verbas. O vaivém se arrasta desde 2022 — e precisa ter fim.

A reação à resolução foi imediata. As ONGs Transparência Brasil, Transparência Internacional e Contas Abertas emitiram nota afirmando que a decisão do Parlamento criou “mais uma versão do orçamento secreto”, em clara “afronta aos princípios constitucionais da publicidade e da moralidade que orientam o processo orçamentário e às determinações do STF”. A nota ressalta que a autoria das emendas coletivas — de comissão e bancada — continuará oculta “sob a assinatura de apenas uma pessoa”, o líder partidário ou o coordenador da bancada de cada estado. Para o Instituto Não Aceito Corrupção, a norma perpetua a “distorção decorrente da possibilidade de autores de projetos de emendas se esconderem atrás das figuras de líderes partidários e de bancadas, blindando-os do escrutínio”.

Do caráter subversivo do café - Hélio Schwartsman

Folha de Paulo

Soberanos de várias partes do mundo tentaram proibir a bebida para evitar que as pessoas se encontrassem e discutissem problemas do país

Do século 16 até principalmente a segunda metade do 18, soberanos de diversas nações tentaram proibir o café. Eles fracassaram. Basta ver que, hoje, porção não desprezível da humanidade se socorre matinalmente da infusão de grãos de plantas do gênero Coffea. Mas não dá para dizer que a intuição desses reis estivesse errada.

A bebida café deu origem aos cafés, lugares onde pessoas de diferentes estratos sociais se reuniam para apreciar o líquido e conversar. Eram, portanto, do ponto de vista das autoridades, verdadeiros antros de subversão.

A recessão de Donald Trump - Rodrigo Zeidan

Folha de S. Paulo

Os EUA vão pegar uma gripe; e nós precisamos nos preparar para não pegarmos pneumonia

A latino-americanização dos Estados Unidos continua de vento em popa. Trump está causando recessão somente por sua inconsistência. Ao prometer uma coisa e mudar de ideia, ameaçar com tarifas e voltar atrás e demitir funcionários somente para recontratá-los uma semana depois, o governo Trump joga as expectativas no fundo do poço, de onde vai demorar para a economia americana sair. O modelo do Federal Reserve de previsão do PIB já aponta contração de 2,4% para o primeiro semestre.

Esse tipo de incerteza é bem comum no Brasil. Políticas que são anunciadas, mas ficam marinando no Congresso, ou ações revertidas rapidamente tornam investimentos de longo prazo menos atrativos.

Feliz ano velho - Luís Francisco Carvalho Filho

Folha de S. Paulo

Golpe de Estado não é delito trivial

É tudo ficção: a ditadura militar, a opressão, a tortura, o desaparecimento de Rubens Paiva e, agora, a tentativa de golpe de Jair Bolsonaro.

"Ainda Estou Aqui" ganha o Oscar de filme internacional e o deputado Eduardo Bolsonaro, um dos filhotes nefastos do ex-presidente e embaixador do golpismo nos EUA, chama o cineasta Walter Salles de "psicopata cínico". Para ele, o filme trata de "ditadura inexistente".

As aparências enganam. O Brasil tem sido leniente demais com golpistas.

É verdade que tem general detido preventivamente, ainda que sem rigor penitenciário, e que o STF vai analisar o recebimento da denúncia em 25 de março, mas o processo contra Bolsonaro e alguns de seus cúmplices (golpistas silenciosos desfilam impunes pela cena política como homens de bem e testemunhas de caráter) caminhou até aqui como se crime contra as instituições democráticas fosse delito trivial. Não é.

O ditador e o traidor - André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

O mundo mudou muito, mas infelizmente as discussões em Brasília não querem ou não conseguem sair do provincianismo e perceber a profunda modificação da política internacional

Na Ucrânia, bem antes da guerra, a palavra sovok, gíria local, se aplicava aos vestígios miseráveis da existência soviética, economia letárgica, burocracia corrupta, estagnação e tudo o que o governo da época representava. Esse conjunto de evidências apontava no sentido de que os jovens teriam a mesma vida medíocre, sem horizontes experimentada pelos respectivos pais. Esse entendimento permeou a sociedade, desde o pobre até o rico, e resultou em diversos tumultos e revoluções que terminaram por derrubar os governos pró-Moscou. Foi o início da confusão que desaguou na invasão do país pelas tropas russas.

40 anos da redemocratização: o sobe e desce do pluripartidarismo

Bernardo Melo e Caio Sartori / O Globo

Quatro décadas depois de Sarney assumir Presidência, Congresso caminha para voltar à fragmentação pós-ditadura; novas regras reduzem siglas, mas sem resolver crise

No ano em que se completam quatro décadas da redemocratização, o Brasil experimenta uma diminuição do número de legendas no Congresso que, já em 2026, pode reduzir a fragmentação partidária ao nível das eleições de 1986. Aquela disputa, a primeira com voto direto após a transição da ditadura militar para o regime democrático — cujo marco é a posse do primeiro presidente civil, José Sarney, em 15 de março de 1985 —, ocorreu em um contexto de abertura ao pluripartidarismo, e terminou com 12 partidos representados na Câmara. Atualmente, há 16 bancadas na Casa, incluindo três federações, e o aumento das exigências da cláusula de barreira vem levando ao menos outros cinco partidos a discutirem fusões e incorporações.

Pesquisadores avaliam que o pluripartidarismo, juntamente à Lei da Anistia e ao fim do AI-5, compôs um pacote essencial para o desmantelamento da ditadura — o bipartidarismo vigorou na maior parte do regime militar, entre 1966 e 1979. A pulverização trouxe, porém, desafios para a formação de coalizões. O país chegou a ter 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições de 2018, quando 30 siglas elegeram representantes à Câmara, o recorde do período. A partir daí, mudanças nas regras de acesso a recursos de campanha e o fim das coligações na eleição legislativa estimularam o enxugamento do total de siglas. Hoje, há 29 partidos registrados no país.

O Pânico Vermelho, parte 3 - Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Prisão de líder dos protestos anti-Israel na Universidade Columbia indica que Trump pretende produzir a terceira versão de um filme antigo

A prisão e ameaça de deportação de Mahmoud Khalil, um dos líderes dos protestos anti-Israel na Universidade Columbia, indica que Trump pretende produzir a terceira versão de um filme antigo. O Pânico Vermelho original desenrolou-se no rastro da Grande Guerra, sob o impacto da Revolução Russa e da radicalização do movimento trabalhista nos EUA. A versão seguinte foi o macarthismo, na primeira década da Guerra Fria. O filme serve para ampliar o poder estatal e acossar as liberdades públicas.

As manifestações estudantis anti-Israel de 2024 desempenharam papel instrumental no triunfo eleitoral de Trump. Na sua maioria, os participantes reagiam com horror aos bombardeios indiscriminados israelenses na Faixa de Gaza. Suas lideranças, porém, ergueram bandeiras que ecoam a estratégia do Hamas. "Palestina livre do rio até o mar", o lema perene, e imagens celebratórias dos atentados de 7 de outubro, descritos como "os palestinos voltando para casa", somaram-se a atos pervasivos de intimidação contra estudantes e professores judeus. O Partido Democrata foi visto como sócio do linguajar antissemita pois sua ala esquerda saudou os protestos.

Câmbio em marcha forçada - Luiz Gonzaga Belluzzo e Manfred Back

Muito além do “risco fiscal”, países de moeda frágil, como o Brasil, se dilaceram entre controlar a inflação e crescer

Nos idos de 1999, o nosso Brasil varonil adota o regime de câmbio flutuante. Naquele momento, não por convicção, mas por necessidade. Após uma crise aguda no balanço de pagamentos, vítima de uma fuga maciça de dólares para o exterior, no segundo semestre de 1998, o País ficou praticamente sem reservas internacionais.

Nosso Banco Central tenta defender a banda cambial, intervindo nos contratos de dólar futuro. Em 1999, o Banco Central tinha a prerrogativa de intervir no mercado futuro.

Hoje, não!

A forte desvalorização do real naquele momento promoveu a adoção do Tripé Macroeconômico. A tríade (ou mantra) rezava: regime de meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário. Nosso tripé sempre foi manco: os anos em que o Banco Central se aproximou da meta de inflação registram juro alto, atração de capitais externos, arbitragem e câmbio valorizado.

Seria o fim completo do liberalismo? - Marcus Pestana

Não se fala de outra coisa. Donald Trump é o assunto diário do momento. Nada mais gratificante para um líder famoso dos “engenheiros do caos”. Não importam verdade e mentira, consequências e danos, resistências e críticas. Desde que a imagem que se deseja construir seja fortalecida e a voracidade da bolha de seus seguidores devidamente abastecida e mobilizada, tudo se justifica. Valem bravatas estapafúrdias de péssimo gosto como a de transformar a Faixa de Gaza em resort ou ameaçar tomar a Groelândia e o Canal do Panamá. As tarifas de importação viraram ferramenta de chantagem.

A ideia de democracia é substituída por um governo movido a decretos, o que parece não incomodar a maioria republicana na Câmara dos Representantes e no Senado. E pela criação da imagem de um presidente plenipotenciário, onipresente e superpoderoso. Um verdadeiro xerife do mundo contemporâneo. Na mesa só duas opções: aderir ou receber a ira do neoimperialismo americano.

Protecionismo de Trump é um desastre – Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Quem diria que a globalização seria detonada a partir dos Estados Unidos? Pois é o que o presidente está fazendo

E essa, hein?! Quem diria que a globalização seria detonada a partir dos Estados Unidos? Pois é o que Trump está fazendo a golpes de tarifas de importação distribuídas de modo errático. Se prosseguir nessa direção, causará danos enormes aos Estados Unidos e ao mundo todo.

A perspectiva de desastre já aparece nos Estados Unidos. O índice S&P 500, que reúne ações das maiores companhias americanas, registrou alta expressiva com a eleição de Trump. O pessoal esperava um ambiente de corte de impostos e eliminação das regras que controlam os negócios. Para esse pessoal, isso de tarifas era só coisa de campanha, que Trump logo esqueceria depois de impor algumas taxas aqui e ali. Diante do modo agressivo do presidente, o mercado se assustou. Todo o ganho na Bolsa de Valores foi consumido em dias recentes.

Uma linda mulher – Eduardo Affonso

O Globo

A beleza lhe abrira todas as portas sem que precisasse pôr em prática seu talento de negociadora implacável

G.H. (iniciais meramente ilustrativas) sempre foi uma linda mulher. Isso lhe abrira todas as portas sem que precisasse pôr em prática seu talento de negociadora implacável ou dar mostras de seu caráter sem jaça. Era combativa e sagaz, porém os homens só prestavam atenção a seu bem proporcionado nariz e a seus cabelos, castanhos e naturalmente encaracolados. Para provar do que era capaz e se livrar do estigma que a beleza lhe impunha, G.H. esticou e alourou as madeixas e — num arroubo de desprendimento estético — tosou o nariz, deixando-o impetuosamente arrebitado. Queria desmantelar o patriarcado apenas com a força de seus argumentos. Converter em aliados os inimigos sem precisar recorrer aos arquetípicos artifícios da sedução, que levaram à ruína Cleópatra, Ana Bolena e Mata Hari. Ambicionava ser reconhecida em razão de sua supina inteligência, não pelo capital erótico.

Poesia | Receita de Mulher - Vinicius de Moraes

 

Música | Caetano Veloso - Sonhos