quinta-feira, 27 de março de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Fatos justificam que Bolsonaro seja considerado réu

O Globo

Apenas as reuniões em que ele tentou aliciar os chefes militares já bastariam para embasar acusações

Tendo usufruído amplo direito de defesa, Jair Bolsonaro é agora réu. Os cinco integrantes da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) foram unânimes em aceitar a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra ele e os demais acusados de tramar um golpe de Estado. O caso é histórico. Nunca antes um ex-mandatário foi acusado formalmente de tentar acabar com o Estado Democrático de Direito. Há provas graves e contundentes. A solidez delas é suficiente para que Bolsonaro seja julgado. Se condenado, a pena máxima poderá chegar a 43 anos de prisão. Desde agora até o julgamento, é preciso sobretudo haver esforço para descontaminar o processo da influência política. O mais sensato é se ater às provas.

Basta rememorar a cronologia dos fatos apurados pela Polícia Federal (PF) para entender a gravidade dos crimes atribuídos ao ex-presidente e àqueles que a PGR incluiu no “núcleo crucial” do golpe — os oito declarados réus. A acusação de que houve tentativa de ruptura democrática está documentada e se apoia, sobretudo, na sequência de reuniões entre Bolsonaro e os então chefes militares em dezembro de 2022. O objetivo das reuniões, segundo a PGR, era convencer os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica a participar da intentona.

Enfim, réu - Merval Pereira

O Globo

Não culpar Bolsonaro pela tentativa de golpe seria cegueira deliberada, só aceitável para seus seguidores mais fanáticos 

A patética tentativa do ex-presidente Jair Bolsonaro de eximir-se de culpa da tentativa de golpe de Estado de que foi acusado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) mostra que, finalmente, começa a cair a ficha de que ele está mesmo inelegível e não poderá concorrer à Presidência em 2026. Seu vitimismo chega a ser ridículo. As alegações que brandiu como se estivesse de volta ao cercadinho do Alvorada foram meias verdades contadas por um político acuado pelos fatos. Nada do que falou à guisa de defesa mudou a percepção generalizada de que o golpe de Estado o teve como líder incontestável.

Chegou a insinuar que explicaria por que pensou em editar um ato excepcional como resposta à derrota para Lula nas eleições de 2022, mas não consumou a promessa, talvez por não ter argumentos que justificassem a medida extrema. Não havia razão para estados de exceção pelo simples fato de que seu adversário de esquerda vencera a eleição, a não ser a obsessão de denunciar fraudes na votação eletrônica jamais comprovadas.

Malu Gaspar – A arena agora é política

O Globo

Assim que foi aceita no Supremo a denúncia contra os oito primeiros acusados de participação na trama golpista que redundou no 8 de Janeiro, Jair Bolsonaro deu início à fase seguinte da batalha, com uma entrevista-pronunciamento de quase uma hora que lembrou as falas raivosas do final de seu governo —justamente o período em que ele mobilizava assessores e aliados para tentar achar alguma forma de não passar a faixa a Lula.

Todo o cardápio golpista foi exposto ali, das suspeitas sem fundamento sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas ao argumento um tanto esdrúxulo de que “discutir hipóteses de dispositivos constitucionais não é crime”. Além de confirmar os depoimentos dos ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica a respeito das tentativas de convencê-los a aderir a um golpe de Estado, Bolsonaro admitiu que queria decretar estado de sítio ou algo parecido no Brasil, logo depois de perder as eleições. Não o fez porque não teve apoio de quem tinha a força armada para mantê-lo no poder.

O réu, os réus e o golpe de Estado - Míriam Leitão

O Globo

O STF quebrou um paradigma no Brasil: o que sempre protegeu os golpistas. Agora Bolsonaro e seus generais são réus

“Nós sabemos o que foi viver com ruído debaixo de nossos pés”, disse a ministra Cármen Lúcia. Ela deu ontem o quarto voto pela aceitação da denúncia que tornou réu o ex-presidente Jair Bolsonaro e seu quartel general. Por “ruído debaixo dos pés”, ela se refere ao golpe sendo gestado. Para entender o que houve no Brasil é preciso ver o filme em ordem inversa, explicou. O 8 de janeiro só é compreensível se voltarmos a fita para ver como a democracia estava sendo desmontada em todos os atos descritos na peça da procuradoria-geral da República. Ao fim de três sessões na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, quebrou-se um paradigma no Brasil: o que sempre protegeu golpistas.

Dialética de Fux confronta positivismo de Moraes no julgamento de Bolsonaro - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O ministro do Supremo questionou a dosimetria das penas, a validade da delação premiada de Mauro Cid e o enquadramento a priori de todos os réus nos mesmos crimes

Ao votar na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira, a favor do relatório do ministro Alexandre de Moraes, que acolheu a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais sete acusados de tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023, o ministro Luiz Fux fez um novo contraponto ao entendimento da maioria dos colegas e, enigmático, anunciou que fará uma interpretação “dialética” do processo contra os oito réus, entre os quais o ex-presidente e quatro oficiais generais.

Fux também votou a favor da transformação dos acusados do 8 de janeiro de 2023 em réus. São eles Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin; Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; e os generais de Exército Augusto Heleno, ex-ministro do GSI; Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da defesa; e Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, além de Bolsonaro e do tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência do Mauro Cid, que fez delação premiada.

Banco dos réus desnorteia Bolsonaro - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Estreitam-se as alternativas para o ex-presidente não mofar na cadeia

O acolhimento da denúncia contra o ex-presidente era tão previsível que a reação desnorteada de Jair Bolsonaro sugere o estreitamento das saídas de que dispõe para não mofar na cadeia.

Depois de sua defesa militar na ausência de vínculos entre Bolsonaro e a tentativa de golpe, o ex-presidente confirmou reunião com os comandantes militares para discutir a minuta golpista, apresentada pelo ministro Alexandre de Moraes nesta quarta como indício de materialidade da denúncia.

Dos EUA, o blogueiro Paulo Figueiredo, foragido da Justiça brasileira e elo dos bolsonaristas com a extrema-direita americana, lamentou o “comportamento errático” do ex-presidente: “[Bolsonaro] cag... tudo (...) É um ótimo homem, mas um péssimo estrategista. Não é à toa que estamos nessa m... de dar gosto”.

O julgamento ainda vai tomar seis meses, mas uma condenação deixaria três saídas para Bolsonaro: a eleição de um aliado que o indulte, a eleição de uma bancada de senadores que alcance o quórum de 2/3 para o impeachment de ministros do STF e uma pressão americana redobrada contra a Corte.

Incerteza global e custos mais caros da dívida - Assis Moreira

Valor Econômico

Custos de refinanciamento da dívida dos governos e das empresas estão aumentando

As tensões geopolíticas e as enormes incertezas provocadas por Donald Trump de volta à Casa Branca impactam também nas perspectivas já difíceis dos mercados mundiais de títulos da dívida, soberana ou corporativa. Os níveis de endividamento dos governos e das empresas aumentaram - assim como o custo da dívida está ficando mais salgado. E isso quando as grandes tendências macroeconômicas exigem um volume de investimento sem precedentes, que em grosso será financiado por endividamento.

Poucas escolhas - William Waack

O Estado de S. Paulo

A situação política de Bolsonaro não se altera fundamentalmente com o julgamento

O problema de Jair Bolsonaro é ser mais forte do que admitem seus adversários, e mais fraco do que ele mesmo julga ser. Como réu por tentativa de golpe de Estado essa situação não se altera fundamentalmente. Ele tem no momento enorme peso eleitoral, mas não o suficiente para definir sozinho a próxima votação.

O que mais ilustra esse fato é a postura dos possíveis candidatos dentro do espectro de centro-direita, que abrange confortável maioria no eleitorado. Eles dizem a boca pequena que Bolsonaro só pensa em si mesmo e em sua família, mais atrapalha do que ajuda, e está desacreditando vários setores. Mas nenhum o critica em público, temendo perder votos.

Entre as metas e o IPCA, crescer é uma miragem - José Serra

O Estado de S. Paulo

Com uma taxa de juro mantida, de forma já perene, num patamar real tão elevado, não haverá desenvolvimento

Embora todas as vozes do mercado financeiro joguem a culpa das instabilidades da economia brasileira na política fiscal, o futuro do Brasil merece uma discussão menos ideológica. Não que eu ache que o fiscal está bem, não está. Só que um país maduro não pode ficar elegendo bodes expiatórios e deixar de ver o conjunto da economia e da política econômica.

Temos uma trajetória de elevação da taxa Selic, o juro básico da economia. A taxa está sendo elevada para reduzir a escalada inflacionária esperada desde 18 de setembro de 2024. Esta reunião do Copom elevou a Selic de 10,5% ao ano para 10,75%. Neste momento, as expectativas de mercado, capturadas pelo Boletim Focus, indicavam IPCA de 3,95% para o ano de 2025. Já as projeções divulgadas na ata do Copom falavam em 3,7%.

Naquele setembro de 2024, o Copom enunciava um novo ciclo de expansão da Selic, embasado nas considerações de que: “O cenário, marcado por resiliência na atividade, pressões no mercado de trabalho, hiato do produto positivo, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas, demanda uma política monetária mais contracionista.” ( transcrito da ata da reunião de 18/09/2024).

Federalismo e Imposto de Renda - Felipe Salto

O Estado de S. Paulo

O debate sobre a reforma do IR é apenas mais um capítulo do pacto federativo destrambelhado que mantemos no Brasil

O governo acertou ao apresentar um projeto para o Imposto de Renda. À parte questões de redação e jurídicas, que não são menores, o equilíbrio entre o custo da maior isenção proposta e a tributação adicional sobre os mais ricos é um princípio fundamental.

O risco reside no Congresso Nacional. A síndrome do dinheiro que brota em árvore está cada vez mais forte no Parlamento brasileiro. Basta ver o caso da desoneração da folha, que foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). O tema segue em aberto até agora, depois das medidas insuficientes apresentadas pelo Congresso para a compensação do custo da desoneração.

No caso da proposta do Imposto de Renda, a aprovação nos termos propostos pelo Poder Executivo teria o condão de reduzir a regressividade na tributação da renda no Brasil. Tributa-se menos quem ganha menos e mais quem ganha mais. A direção é certa.

O golpe e herdeiros de Bolsonaro - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Governador de São Paulo diz que capitão das trevas, seu líder, provará que é inocente

Jair Bolsonaro e comparsas vão ser processados. Não deveria ser assim. Se o capitão das trevas tivesse sido deposto da Presidência da República por meio de um processo de impeachment, não teria sido capaz de tentar um golpe, pelo menos não de dentro do Palácio do Planalto.

Entre outros crimes cometidos ou tentados até então, Bolsonaro anunciou em um comício, no 7 de Setembro de 2021, que não haveria eleição em 2022 a não ser nos termos dele e que não cumpriria decisões do STF.

A pressão após o julgamento - Adriana Fernandes

Folha de S. Paulo

Por ora, a tendência é o Congresso se associar, mas sem dar de bandeja a taxação dos milionários

decisão do Supremo Tribunal Federal de tornar réus Jair Bolsonaro (PL) e outros sete acusados de integrarem o núcleo da trama golpista acirra a polarização, reforça a busca de união dos partidos de direita em torno de uma candidatura do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos SP) ao Planalto e joga mais pressão do presidente Lula na agenda de medidas para aumentar a sua popularidade.

Lula queria fechar o apoio neste ano, mas o julgamento de Bolsonaro deixa ainda mais distante essa movimentação política. Terá de limitar o apoio à governabilidade no Congresso em 2025, o que já será uma vitória.

Os reacionários e a reforma do Imposto de Renda - Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Não é difícil encontrar os argumentos da retórica reacionária nas objeções ao projeto de lei

Economista e um dos grandes intelectuais do século 20, Albert Hirschman (1915-2012) publicou em 1991 "The Rhetoric of Reaction", que viria a ser traduzido para o português como "A Retórica da Intransigência". Nessa joia de inteligência e erudição, em menos de 200 páginas ele identifica três argumentos típicos da oposição reacionária a propostas de reforma progressistas: as alegações de perversidade, futilidade e ameaça.

Assim, para os refratários às mudanças, uma reforma seria "perversa" por agravar o problema que pretenderia resolver; "fútil" por não levar a qualquer resultado palpável; e "ameaça", ao colocar em perigo outro objetivo, valor ou realização duramente conquistados.

Para ilustrar as teses da perversidade, futilidade e ameaça, Hirschman utilizou exemplos tirados da história, como a crítica de pensadores conservadores à Revolução Francesa de 1789; ao estabelecimento do sufrágio universal; e ao advento de políticas de bem-estar social. Mas não é difícil encontrar os argumentos da retórica reacionária em muitas das críticas negativas ao projeto de lei que trata de mudanças no Imposto de Renda, formulado pelo ministro Fernando Haddad e encaminhado ao Congresso pelo presidente Lula há uma semana.

Poesia | Esqueça o presente, veja a realidade, de Fernando Pessoa

 

Música | Edu Lobo e Mônica Salmaso - Valsa brasileira