Há expectativa de que a migração dos capitais externos rumo ao Brasil se intensifique se a política econômica do novo governo conseguir passar pelos testes políticos que a aguardam no Congresso e, com isso, a taxa de câmbio se aprecie muito e volte a ser um problema. As chances da revoada acontecer são dadas pela imensa massa de capitais disponível às voltas com rendimentos nulos ou negativos nos países ricos, que estão à procura de melhores resultados. A oferta está concentrada por ora nos países emergentes e, em particular, no Brasil, desde que deixe a recessão para trás.
Mas há outros roteiros menos prováveis que podem amenizar a apreciação do real. No plano doméstico, as reformas estão longe de ser um passeio e as incertezas econômicas a ela associadas não se esvairão tão cedo. No plano externo, as ameaças de novo aumento da taxa de juros, sempre desmentidas pela realidade, são um fator potencial de instabilidade para os fluxos de capital para os emergentes. Além dessas hipóteses conhecidas, há outra, que prescinde de juros em alta nos EUA.
Com o rápido avanço das aplicações em bônus emergentes de governos e empresas - que se acelerou e atingiu US$ 76,6 bilhões nos últimos três meses - surgiram alertas de que há um colapso nesse mercado sendo gestado. O motivo: não há bônus emergentes em quantidade suficiente para atender ao apetite dos investidores, se eles se eles de fato se mostrassem ávidos (FT, 6 de novembro). Ainda que o estoque de títulos emergentes seja de US$ 18,5 trilhões, só uma pequena parcela dele está acessível aos investidores estrangeiros, cuja participação é tímida nos mercados de dívida em moeda local.
Se os grandes fundos de pensão dos países desenvolvidos resolvessem de uma hora para outra alocar 2% ou 3% de seus ativos em busca de bons retornos, não haveria títulos para suprir essa demanda, estima o BofA Merrill Lynch. Como resultado, os rendimentos desses papéis, hoje expressivos, declinariam. A média dos bônus emergentes paga 6%, com Rússia (8,1%) e Índia (7%) no topo, e o Brasil com 4,4%.
Mas, ainda que um boom de investimentos em títulos da dívida e renda fixa no Brasil e demais emergentes não ocorra, suas moedas podem permanecer moderadamente apreciadas, desde que não ocorram turbulências intensas nos mercados externos.
A onda de fortalecimento do dólar, que antecedeu a elevação dos juros nos EUA em dezembro e se estendeu um pouco depois disso, perdeu vigor. E continua a haver uma enorme discrepância entre o que os mercados esperam para a evolução futura dos juros e as perspectivas dos próprios membros do Fed. A gangorra dos números da economia americana voltou a se inclinar pela moderação do crescimento, reiterada pela criação de vagas de trabalho menor que a esperada em julho, a queda das atividades no setor de serviços (a maior em 6 anos) e a perda de vigor na produção industrial.
Há possibilidade de que os juros acabem ficando aonde estão por um bom tempo ou até caiam. A mais longa, e fraca, recuperação americana pode estar chegando ao fim - e desaguando em uma recessão. O JP Morgan estima que a probabilidade disso ocorrer em dois anos é de 60% e, em três anos, de 80%.
À indefinição americana somam-se preocupações crescentes com as políticas monetárias não convencionais na zona do euro e no Japão, que não têm dado resultados convincentes na promoção do crescimento e elevação da inflação. O núcleo da inflação nos países europeus que adotam a moeda única foi de 1,1% nos últimos 7 anos, enquanto que os juros negativos adotados pelo BCE estão enfraquecendo bancos já fragilizados por empréstimos não pagos. Os limites do impensável estão sendo atingidos, quando empresas como Henkel emitem títulos de médio prazo com rendimentos negativos. O BCE, que já tem em seus cofres € 1 trilhão em títulos de dívida, ou 10% do PIB da zona do euro, não pode estender muito o prazo de suas compras para além de março de 2017, porque haverá escassez de papéis à venda. O Japão já sinalizou uma mudança e pode fazer o caminho de volta nos juros negativos, isto é, os juros tendem a não ser tão baixos quanto antes. A recuperação europeia e japonesa tende a continuar anêmica no médio prazo.
Todos esses fatores complicam a aposta em um dilúvio de dólares no Brasil, embora a tendência atual à apreciação não deva se reverter até que, e se, os EUA movam para cima os juros. Sérios reveses no ajuste fiscal, por outro lado, trarão desvalorizações selvagens.
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