- O Estado de S. Paulo
• No atual cenário econômico, mudanças no Fundo de Garantia podem ser problemáticas
O governo parece disposto a mudar o Fundo de Garantia. A intenção pode ser boa, mas a proposta tende a produzir distorções, algumas delas maiores do que as que se pretende evitar.
Melhor começar em 1966. O que havia antes era o regime de estabilidade no emprego, que o trabalhador obtinha após dez anos de trabalho na mesma empresa. A principal distorção desse estatuto era a de que o empregador tendia a demitir seu funcionário pouco antes de se completarem os dez anos, para que sua empresa não se sujeitasse a enorme passivo trabalhista. E havia também o problema de que o empregado estável tinha tendência a encostar o corpo e a se tornar mais estorvo do que colaborador.
Entre as reformas decididas pelo governo militar esteve o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, o FGTS, criado em 1966. A ideia foi corrigir as distorções do regime de estabilidade e formar, em nome de cada trabalhador, um fundo com a contribuição mensal da empresa, correspondente a 8% do salário bruto. O Fundo ajudaria, assim, a aumentar a poupança nacional. Esses recursos poderiam ser sacados pelo trabalhador em caso de demissão sem justa causa, na aposentadoria, no financiamento de casa própria e em casos de graves dificuldades financeiras. Enquanto permanecesse no Fundo, os recursos rendiam correção monetária (depois, Taxa Referencial de Juros – TR) mais juros de 3% ao ano. O sistema era opcional, o trabalhador que preferisse continuar no esquema anterior poderia fazê-lo. Com o tempo, a adesão foi praticamente total, enquanto os estáveis foram se aposentando.
O sistema passou a ser fator de alta rotatividade da mão de obra, na medida em que o trabalhador se interessou em sacar seu fundo para complementar o orçamento. O baixo retorno também estimulou os saques porque a maioria das aplicações financeiras proporciona remuneração melhor. A caderneta de poupança, por exemplo, que paga pouco, rende o dobro dos juros (6% ao ano) oferecidos pelo FGTS. E, com isso, o Fundo deixou, também, de criar poupança nacional, porque ficou sujeito a saques desmontadores.
A nova ideia é restringir os saques apenas à aposentadoria, transformar o FGTS em espécie de fundo de aposentadoria complementar, supostamente para que possa pagar remuneração melhor.
São pelo menos dois os inconvenientes técnicos. O primeiro é o de que tira acesso do trabalhador a um fundo de reserva quando mais precisa de recursos, que é o período em que está desempregado. O segundo é o de que não convém misturar FGTS com aposentadoria. São coisas diferentes, especialmente quando a proposta é usar os recursos do Fundo para financiar seguro-desemprego. E fundos compulsórios de aposentadoria complementar tendem a ser mal administrados, mesmo levando-se em conta a possibilidade de migração de administradora pelo titular da conta (portabilidade), o que, por si só, não garante melhor remuneração.
A questão mais grave é a oportunidade. Mexer no FGTS agora, quando a economia está estagnada e há quase 12 milhões de desempregados, é criar ruídos demais em matéria sobre a qual não há segurança que se apresente como avanço nas relações de trabalho.
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