segunda-feira, 31 de março de 2025

O que a mídia pensa: editoriais / opinioes

Trump significa menos crescimento e mais inflação

O Globo

É sombria a conclusão de estudo da OCDE sobre o impacto da guerra comercial na economia global

A partir desta semana, carros importados começarão a pagar 25% de taxa para entrar nos Estados Unidos, dez vezes o que pagavam antes. Decretadas na semana passada, as tarifas sobre automóveis são o último lance na guerra comercial deflagrada por Donald Trump, cujo desfecho não se vislumbra. O resultado da onda tarifária já está claro. Ela terá dois impactos na economia global: mais inflação e menos crescimento. Essa é a conclusão de um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A Câmara de Comércio Americana para a União Europeia, a que estão filiadas mais de 160 empresas dos Estados Unidos que atuam no bloco, estima que a imposição de tarifas de lado a lado põe em risco US$ 9,5 trilhões em comércio e investimentos bilaterais.

Trump anunciou em novembro 10% de sobretaxa nas importações da China e, em fevereiro, 25% sobre todas as importações de aço e alumínio. Considerando as duas medidas, a OCDE estimou desaceleração no crescimento mundial de 3,2% em 2024 para 3,1% em 2025 e 3% em 2026. Mas esse é o cenário menos preocupante, em que a Casa Branca continuaria a taxar com gravames adicionais apenas produtos que não fazem parte do acordo comercial dos Estados Unidos, México e Canadá (USMCA). E não considera a última rodada sobre automóveis.

Adolescência’ expõe o machismo na rede – Fernando Gabeira

 O Globo

Pesquisadores aconselham pais, educadores, autoridades a se dar conta de que a radicalização já é realidade cotidiana

A série “Adolescência” trouxe um grande número de debates envolvendo as redes sociais. Um dos temas novos para o público brasileiro foi a menção aos incels (celibatários involuntários), subcultura muito atuante na internet que já produziu algumas tragédias.

Fui despertado para o tema pela leitura de dois livros: “Hate in the homeland: the new global far right”, de Cynthia Miller-Idriss, e “Meme wars” (guerras de memes, em tradução livre), de Joan Donovan, Emily Dreyfuss e Brian Friedberg. Pensei em escrever sobre isso quando as redes da primeira-dama foram invadidas por um jovem que, pelo que li, se declarou influenciado pelos incels. Mas, para evitar o clima de polarização, resolvi esperar nova oportunidade.

Os incels em alguns casos se consideram rejeitados pelas mulheres e culpam o feminismo. Na série, o personagem diz que 80% das mulheres se interessam por apenas 20% dos homens. Se limitassem seu discurso apenas a um lamento pela solidão involuntária, seriam inofensivos. Mas, nos Estados Unidos, já moveram grandes campanhas nas redes sociais visando a determinadas mulheres, com o objetivo de tornar sua vida infernal.

Novo consignado é ilegal, imoral e engorda – Demetrio Magnolli

O Globo

Equivale a penhora de salário ou aposentadoria. É nítida violação da lei

O FGTS, poupança compulsória do trabalhador, assim como as multas legais por demissão injustificada, já não pertence ao trabalhador. A nova modalidade do crédito consignado anunciada pelo governo confere aos bancos a prerrogativa de invadir tais direitos trabalhistas para a quitação de dívidas.

— O banco vai pegar o valor do saldo do consignado. Se está devendo R$ 20 mil, é R$ 20 mil. Se deve R$ 30 mil, é R$ 30 mil — explicou Francisco Macena, secretário executivo do Ministério do Trabalho.

No plano econômico, a iniciativa inscreve-se na lógica enunciada por Dilma Rousseff:

— Gasto é vida.

A máxima sintetiza uma visão tosca do crescimento econômico que o torna dependente da expansão dos gastos públicos e privados.

Desenvolvimento é sinônimo de crescimento econômico sustentável. Seu motor é a elevação da produtividade, que gera riqueza e espraia renda pelas empresas e trabalhadores, pelos produtores e consumidores.

O novo Minha Casa, Minha Vida precisa ser reconhecido - Jader Filho

O Globo

Programa não deve mais ser visto como sinônimo de habitação distante dos centros urbanos

Lançado em 2009 pelo presidente Lula, o programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) foi consagrado pelos brasileiros, especialmente aqueles incluídos entre os segmentos mais necessitados de nossa população, com baixa renda, moradores de rua ou de áreas de risco.

É natural que, ao longo de 15 anos, o programa tenha sido alterado e aperfeiçoado. Não deve mais ser visto como sinônimo de habitação distante dos centros urbanos. Com novo desenho legal, normativo e operacional desde 2023, os empreendimentos subsidiados não podem mais ser construídos em locais afastados e desprovidos de infraestrutura. A Lei 14.620/2023 e portarias ministeriais determinam que os imóveis sejam erguidos em áreas urbanas consolidadas, com acesso a transporte público, escolas, unidades de saúde, segurança e demais serviços essenciais.

Fragmentação protege a democracia – Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

A fragmentação no Brasil revelou-se mais eficaz contra líderes iliberais do que modelo dos EUA

Durante décadas, exaltamos as proezas da democracia americana. O sistema institucional majoritário dos EUA — presidencialista e bipartidário — era visto como um modelo a ser seguido.

Afinal, trata-se da democracia mais longeva e mais rica do mundo. Muitos ainda hoje atribuem a esse arranjo institucional o segredo do seu sucesso. A existência de um presidente, ainda que constitucionalmente limitado, amparado por uma maioria legislativa de seu partido, capaz de implementar sua agenda com poucas concessões. Soma-se a isso uma justiça ágil, eficaz e, em parte, escolhida diretamente pelos próprios eleitores.

Supersalários, o teto caído e a proposta de dúplex - Bruno Carazza

Valor econômico

Discussões sobre supersalários no Judiciário não atacam o ponto principal

Há uma semana, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, criticou na Fiesp os supersalários do Poder Judiciário. Para ele, estamos vivendo “um quadro de verdadeira desordem”, em que tribunais abusam do princípio da autonomia orçamentária para inflar ilegalmente os salários dos magistrados.

Poucos dias antes, o corregedor nacional de Justiça autorizara pagamentos mensais de retroativos pleiteados pelo TJ-SE até o limite de R$ 46.366,20 acima do teto. Na prática, essa decisão, que deve se alastrar para todo o país, institui um “teto dúplex” no Poder Judiciário - um limitando os vencimentos básicos da categoria, enquanto um valor equivalente será autorizado para o pagamento mensal de verbas “indenizatórias” e retroativos.

Assim como Gilmar Mendes, alguns magistrados e membros do Ministério Público reconhecem que os penduricalhos são uma distorção, mas argumentam que eles são necessários para contornar a defasagem do teto e a pouca distância entre os salários de entrada e do topo da carreira.

A carga tributária é recorde, mas nem assim há superávit primário - Sergio Lamucci

Valor Econômico

Por mais repetitivo que seja, a redução das incertezas fiscais passa pela disposição de diminuir a velocidade de expansão dos gastos obrigatórios

A carga tributária bruta brasileira ficou em 32,3% do PIB em 2024, o nível mais alto da série iniciada em 2010. Divulgados na sexta-feira pelo Tesouro, os números englobam a arrecadação da União, Estados e municípios, seguindo o Manual de Estatísticas de Finanças Públicas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Chama a atenção que o país não gera superávit primário (exclui gastos com juros) nem mesmo com a carga tributária superando picos anteriores, como aponta o economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero. É mais um sinal de que conter o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias é o problema incontornável das contas públicas brasileiras.

O consenso dos economistas do Boletim Focus do Banco Central (BC) é de um déficit primário de 0,6% do PIB neste ano, que será zerado apenas em 2029. A estabilização da dívida pública como proporção do PIB exige um superávit primário de 1,5% a 3% do PIB, a depender das premissas adotadas.

O poder do STF e o foro privilegiado - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Mudanças no mecanismo refletem jogo em torno de quem controla a agenda e o veto na interação entre os três Poderes

Em coluna há sete anos mencionei um diálogo que havia tido com um ministro do Supremo sobre as chances do STF aprovar, por iniciativa da Corte, a extinção do foro por prerrogativa de função de parlamentares. Sua resposta: "Você está brincando? É baixa. Foro significa poder e ninguém quer perder poder!".

O hiperprotagonismo do STF assenta-se em parte em sua jurisdição criminal, uma decisão do constituinte de 1988. Mas sua efetividade depende de regras infraconstitucionais que são função da estrutura de incentivos com que os atores se defrontam.

Em 2018, grosso modo o STF confirma entendimento desde 1999 de que o foro era restrito ao mandato e à função. Este entendimento acaba de mudar. O STF decidiu que as ações continuam na Corte mesmo após o término do mandato.

O 31 de março, o 8 de janeiro e a distopia autoritária - Rogério Sottili e Jurema Werneck

Folha de S. Paulo

Mais que um exercício de memória, relembrar 1964 é um ato de vigilância para reafirmar nosso compromisso com as instituições e as liberdades

Este dia 31 de março é diferente de todos os outros que o precederam desde 1964, quando o golpe civil-militar mergulhou o país numa ditadura que durou 21 anos. A distinção está na inédita perspectiva, aberta pela decisão do Supremo Tribunal Federal, na última quarta (26), de que deverão responder criminalmente os que engendraram, patrocinaram e incentivaram os ataques à democracia que culminaram na recidiva golpista de 8 de janeiro de 2023.

É a primeira vez que militares de alta patente, um ex-presidente e outros figurões da República se tornam réus por atentarem contra a liberdade e a democracia. A impunidade que eximiu de responsabilidade os agentes do Estado que comandaram ou cometeram atrocidades durante a ditadura militar deixou sequelas profundas no país. Seu legado de autoritarismo e barbárie permanece uma ferida aberta.

Sem anistia! - Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Congressistas deveriam levar em consideração a demanda da maioria dos brasileiros

A maioria dos brasileiros não quer anistia para golpistas. De acordo com a pesquisa realizada pelo PoderData, divulgada em 21 de março, apenas 37% da população é a favor de conceder anistia àqueles que foram presos pelo envolvimento nos atos antidemocráticos do 8 de janeiro. Mais da metade, 51% dos entrevistados, é contrária, e 12% não souberam opinar.

Nem mesmo os eleitores de Jair Bolsonaro encampam a pauta. Entre os entrevistados que votaram no capitão reformado no segundo turno de 2022, quase metade, 49%, é contrária à anistia, apenas 36% a defendem.

A anistia relacionada apenas aos crimes cometidos por Jair Bolsonaro é defendida por menos pessoas ainda. Em uma pesquisa realizada pela AtlasIntel, divulgada há um mês, em 21 de fevereiro, se perguntava especificamente: "Bolsonaro deveria ser preso, anistiado ou julgado em liberdade". Apenas 27% dos respondentes afirmaram que Bolsonaro deveria ser anistiado. Para mais da metade, 52%, o ex-presidente deveria ser preso, e 17% entendem que ele deveria ser julgado em liberdade.

A falta de apelo da anistia é perceptível mesmo entre bolsonaristas mais convictos. No último ato convocado por Bolsonaro para 16 de março, em Copacabana, no Rio de Janeiro, sua expectativa era reunir 1 milhão de pessoas, número que depois foi reduzido para 500 mil. A expectativa não poderia ser mais irreal.

Golpe de 64 permeou declarações de ministros em julgamento que tornou Bolsonaro réu

Ana Gabriela Oliveira Lima / Folha de S. Paulo

Cármen Lúcia e Flávio Dino traçam ponte com passado e relembram gravidade da ditadura militar 61 anos depois de instauração do regime

"Ditadura mata! Ditadura vive da morte", disse a ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), durante a sessão da corte na quarta-feira (26) que tornou réu o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por liderar uma trama golpista.

Antes dela, o magistrado Flávio Dino afirmou: "Golpe de Estado mata. Não importa se isto é no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois".

Ambos os ministros, ao julgarem a denúncia sobre a trama golpista de 2022, fizeram referência à ditadura de 1964, que completa 61 anos nesta segunda-feira (31). Para especialistas ouvidos pela Folha, a fala sobre o tema foi pedagógica, e o julgamento, histórico.

Além do ex-presidente, viraram réus Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin e deputado federal do PL-RJ, o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, o general Augusto Heleno, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Mauro Cid, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência da República, o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, e o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa.

Esquerda faz atos dispersos pelo país contra anistia a Bolsonaro

Mariana ZylberkanYuri Eiras / Folha de S. Paulo

Manifestação em São Paulo fez caminhada até o antigo Doi-Codi e teve presença do deputado Boulos

Neste domingo (30), a esquerda realizou atos dispersos pelo país, tendo a pauta contra a anistia aos envolvidos com os atos golpistas de 8 de janeiro como bandeira principal e defendendo a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

A organização da maioria dos atos, que seguem ao longo dos próximos dois dias, foi feita pelas entidades que formam as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular.

Em São Paulo, partidos de esquerda e centrais sindicais se reuniram na praça Oswaldo Cruz, na região da avenida Paulista. Dali, seguiram em caminhada até o antigo Doi–Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), principal centro de tortura da ditadura militar na cidade.

Convocada pelo deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) em suas redes sociais, a manifestação reuniu também outros congressistas do PSOL como Ivan Valente (SP) e Erika Hilton (SP). O Partido dos Trabalhadores (PT) foi representado pelo deputado federal Lindbergh Farias (RJ), líder do partido na Casa, e o deputado estadual Antônio Donato (SP).