quarta-feira, 9 de abril de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Maioria contrária tira fôlego de ofensiva pela anistia

Folha de S. Paulo

Segundo o Datafolha, 56% se opõem a perdão aos condenados pelos ataques de 8/1; penas exageradas merecem revisão do STF

Algumas dezenas de milhares de brasileiros foram à avenida Paulista em São Paulo, no último domingo, dispostos a defender anistia para Jair Bolsonaro (PL) —que ainda enfrentará julgamento por tentativa de golpe de Estado —e a turba que invadiu as sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023. Eles são minoria na população do país.

Datafolha apurou que 56% dos brasileiros aptos a votar se declaram contra o perdão aos já condenados por golpismo, ante 62% em dezembro. Os favoráveis passaram de 33% para 37%.

Numa sinalização mais aziaga para o ex-presidente, 52% acham que ele deveria ser preso por ter liderado planos contra o resultado das eleições de 2022 —os que se opõem ao encarceramento são 42%. A margem de erro da pesquisa, que entrevistou 3.054 eleitores entre os dias 1º e 3 de abril, é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Mesmo sem recurso a sondagens estratificadas, parlamentares, que costumam manter contato com suas bases, já haviam concluído que o ambiente não é propriamente favorável à anistia, tanto que o projeto de lei que a estabelece vem encontrando dificuldades para avançar.

A anistia virou guerrilha – Elio Gaspari

O Globo

Bolsonaro defende aquilo que condenou

Jair Bolsonaro simula que põe na mesa a carta da anistia para os condenados pelo 8 de Janeiro, mas pretende embaralhar o jogo. Ele e os demais denunciados pela Procuradoria-Geral da República são acusados de tentar um golpe de Estado no exercício de funções públicas. Nada a ver com o batom de uma cabeleireira.

As duas últimas anistias no Brasil serviram a regimes exauridos para fechar feridas da política nacional. Assim foi em 1945 e em 1979. (Durante seu governo, Juscelino Kubitschek — 1956-1961 — enfrentou dois levantes de militares aloprados e anistiou-os antes que as feridas se abrissem.)

Bolsonaro não conseguiu reunir multidões, mas foi hábil ao embaralhar as cartas, beneficiado pela bizarrice da dureza (teórica) das sentenças já proferidas.

Datafolha informa: 56% dos entrevistados são contra uma anistia para os condenados pelo 8 de Janeiro (há um ano eram 63%) e 37% são a favor (eram 31%). Noutro recorte, 36% acham que as penas impostas deveriam ser menores, e 34% acham que são adequadas, enquanto 25% acreditam que deveriam ser maiores.

A lenta queda de Juscelino - Bernardo Mello Franco

O Globo

Lula ainda não havia completado um mês no Planalto quando Juscelino Filho estreou nas páginas policiais. Em janeiro de 2023, o jornal O Estado de S. Paulo informou que o ministro das Comunicações tinha usado verbas do orçamento secreto para beneficiar uma fazenda da família no interior do Maranhão. O presidente deveria ter afastado o auxiliar, mas preferiu deixar para lá. A história se repetiria por dois anos e três meses, numa incrível sucessão de escândalos com o mesmo protagonista.

Juscelino foi acusado de ocultar patrimônio da Justiça Eleitoral. De usar avião da FAB e embolsar diárias para assistir a um leilão de cavalos. De pendurar o gerente de seu haras na folha de pagamentos da Câmara. De falsificar dados sobre voos de helicópteros custeados pelo fundo partidário. A cada suspeita, o ministro ganhou um novo voto de confiança do chefe. Mesmo quando sua permanência já se mostrava insustentável.

O passado reprimido do Brasil - Roberto DaMatta

O Globo

A impessoalidade da lei que concretiza os interesses da coletividade é para os outros e, com certeza, para os inimigos

O Brasil certamente mudou, mas somos muito incomodados por permanências contraditórias reprimidas na mudança. Testemunhos da incompetência decorrente da ausência de um olhar crítico sobre as simpatias pessoais responsáveis por um sistema jurídico kafkiano, claramente desenhado para anistiar e anular corruptos confessos e inibir conflitos de interesses. Tudo isso produz a certeza desanimadora de que leis e instituições que valeriam para todos são passíveis de particularização se o criminoso tiver o benefício de estar do nosso lado.

O exemplo mais contundente dessa afirmação é o documento que oficializa a descoberta ou achamento de nossa terra por Cabral. Nessa carta-certidão, o escrivão da frota reitera ao rei sua lealdade para, em seguida, solicitar um favor. Vale citar o original:

Tentativa de anistia reconecta frente ampla - Fernando Exman

Valor Econômico

Governo precisa dar mais atenção à política, à manutenção das forças que podem manter Lula no poder

Concebido para dar um empuxo nos índices de avaliação do governo, que se encontram em um nível que pode levar o projeto da reeleição a naufragar, o evento promovido pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República na quinta-feira (3) estava atrasado em cerca de uma hora quando uma voz solitária na plateia rompeu o burburinho. “Olê, olê, olê, olá; Lula, Lula”, gritou o militante, na expectativa de iniciar o cântico com o qual frequentemente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é recebido em solenidades públicas. Ele obteve, porém, pouquíssimas adesões.

Ficou a impressão de que a pesquisa Genial/Quaest, divulgada na véspera mostrando a difícil situação do governo, deixara parte da plateia desanimada. Vários ministros já estavam acomodados nas primeiras cadeiras do auditório. A fila ainda era grande na entrada, onde cartilhas detalhando realizações de diversas áreas do Executivo eram distribuídas em tamanho grande e de bolso. Mas a militância só inflamou para valer quando alguém teve a ideia de puxar o coro pregando que os envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), é claro, não sejam contemplados com uma anistia pelo Congresso Nacional.

O ‘mau militar’ e o Alto-Comando - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Ao apoiar o ataque à honra dos generais, Bolsonaro obriga os governadores a dizer se estão com o líder

Era para ser mais um comício para salvar Bolsonaro. Um grupo de sete governadores compareceu ao palanque do ex-presidente de olho nos votos que o inelegível espargirá sobre a cabeça de seu eleito. Há ainda os que acreditam que ele terá uma solução republicana, em vez da dinástica, para o destino da direita.

Tudo parecia mais uma vez tomar o rumo da discussão sobre quantos milhares foram à Paulista e se as ruas seriam suficientes para influenciar os gabinetes parlamentares na distante Brasília. Quem foi ao comício no domingo encontrou um público eclético, assim como os oradores que se revezavam no palanque. Tudo corria como o esperado até um pastor tomar o microfone. Disse o homem: “Cadê esses generais de quatro estrelas, do Alto-Comando do Exército? Cambada de frouxos, cambada de covardes, cambada de omissos. Vocês não honram a farda que vestem. Não é para dar golpe, não, é para marcar posição”.

Emendas parlamentares derrubam ministro das Comunicações – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O caso de Juscelino é apenas a ponta de um iceberg na Câmara dos Deputados, para a qual o ministro volta, com as prerrogativas de imunidade parlamentar

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, decidiu pedir demissão do cargo após ser denunciado por corrupção pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Suspeito de participação em esquema de desvio de verbas, a situação do ministro na Esplanada se tornou insustentável, ainda mais porque já estava exposto a desgastes desde quando foi indiciado pela Polícia Federal no ano passado. À época, ele acusou a PF de realizar uma "ação política" e questionou as ações da corporação.

Juscelino é acusado de ter desviado recursos públicos no montante de R$ 5 milhões para a cidade de Vitorino Freire, no Maranhão, cuja prefeita é a irmã dele, para asfaltar uma estrada que dá acesso a propriedades da família. A PF também apontou fraude na licitação para fazer a pavimentação. Ontem, a PGR enviou a denúncia ao gabinete do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do caso. A situação criou um enorme constrangimento para o governo. O ministro nega qualquer irregularidade.

Parem com a barbárie! - Rodrigo Craveiro

Correio Braziliense

O que acontece na Faixa de Gaza não é justiça pelo massacre de 7 de outubro de 2023 — diga-se de passagem, horrível e dantesco. É vingança cega, uma espécie de Lei de Talião que vitima civis

Vídeo 1: O jornalista está sentado, diante do computador, sob a tenda de imprensa em frente a um hospital de Khan Yunis. Ele queima. Os colegas, desesperados, jogam água sobre ele, que se parece com um boneco em chamas. Vídeo 2: Atordoado, um homem corre, segurando algo. É uma criança decapitada. Atrás, vem outro, com um menino sem as pernas. Vídeo 3: Com as sirenes e luzes acesas, um comboio de ambulâncias avança pela estrada e é interceptado a tiros, perto da cidade de Rafah, na fronteira com o Egito. Quinze paramédicos são assassinados pelos soldados. Enquanto agoniza, um dos funcionários de emergência pronuncia o shahada (juramento islâmico); também é possível ouvir uma das vítimas chamando pelo pai na hora da morte. Três vídeos que são provas cabais da barbárie cometida por Israel na Faixa de Gaza. Sem contar as fotos que chegam, quase todos os dias, pelas agências de notícias, de mães debruçadas sobre o corpo do filho, envoltas na pior dor que pode existir. 

Príncipe do samba - Irlam Rocha Lima

Correio Braziliense

Chamado de Príncipe do Samba, Paulinho da Viola lançou 35 discos e contabiliza sucessos que fazem parte da memória afetiva de incontáveis fãs

O Brasil vivia tempos de arbítrio, sob a égide da ditadura militar, quando, em 1969, Paulinho da Viola, sempre discreto, mas atento ao que ocorria em seu redor, emplacou um dos maiores sucessos de sua obra, Sinal fechado, composição vencedora da quarta edição do histórico Festival da TV Record.

Embora já fosse conhecido como um talentoso autor de samba, o que o levou a vencer aquele certame musical foi uma canção de protesto. Num dos trechos da letra, ele cantava: "Quando é que você telefona?/ Precisamos nos ver por aí/ Pra semana prometo/Talvez nos vejamos, quem sabe?".

O ex-bancário Paulo César Batista Faria recebeu o nome artístico em 1965, atribuído por Hermínio Bello de Carvalho, que o dirigiu no espetáculo Rosa de Ouro, em que dividia o palco com Clementina de Jesus, Aracy Cortes, Elton Medeiros, Nelson Sargento, Jair do Cavaquinho e Anescar do Salgueiro, no Teatro Jovem do Sesc, no bairro de de Botafogo, na Zona Sul do Rio de Janeiro.

Lula não faz nada sobre ovo e Trump. Melhor assim - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Lula falou muito desses temas, sobre o que pouco poderia fazer, mas não criou mais problema

Carestia da comida, diesel caro na bomba, atravessador do ovo, imposto de importação de Donald Trump. Desde o início do ano, o governo disse umas demagogias sobre cada um desses assuntos, mas acabou por não fazer nada. Pelo menos do ponto de vista das políticas públicas e da economia, melhor assim.

Pode ser que o povo cisme com o fato de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tanto falar sobre certos assuntos, sem notícia de ação. Mas isso é problema dos marqueteiros.

Na volta das férias de final de ano, o presidente cobrou os ministros, em reunião geral em Brasília: queria medidas para lidar com a inflação da comida, carestia que pouco tinha a ver com o governo e a respeito da qual o governo poderia fazer muito pouco.

Tarifaço de Trump é sintoma do vigarista - Rui Tavares

Folha de S. Paulo

Para o presidente americano, só há dois tipos de jogos: aqueles em que ele ganha e aqueles em que os outros jogaram sujo

Dizer, como tenho feito repetidamente nesta coluna, que não há nenhuma estratégia sofisticada por trás das ações de Donald Trump não é o mesmo que dizer que tudo é burrice e ignorância. Também não é o mesmo que dizer que as suas ações primam pela irracionalidade, o que no fundo seria pressupor que elas fossem meramente táticas, como defendem aqueles que acreditam que as tarifas de Trump são absurdas a não ser como tática negocial.

Nada disso. A minha tese é a seguinte: existe uma lógica simples que explica as ações de Trump. Essa lógica é a do vigarista com medo de ser otário.

Para quem é vigarista, como Trump tem demonstrado ser em toda a sua carreira desde que começou por não pagar a fornecedores e a tentar despejar inquilinos nos seus tempos de magnata do mercado imobiliário, todo o mundo é otário.

'Pressão das ruas' a favor de Bolsonaro está longe de se concretizar - César Felício

Valor Econômico

Pesquisas da Genial/Quaest e do Datafolha feitas na semana passada indicam que o poder de fogo dessa arma talvez seja mais fraco do que se supunha

A pressão popular é uma das poucas armas na mão que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tem para tentar a restauração de seus direitos políticos e evitar ir para a cadeia, caso seja condenado no processo por golpismo a que responde. As pesquisas da Genial/Quaest e do Datafolha feitas na semana passada indicam que o poder de fogo dessa arma talvez seja mais fraco do que se supunha, em que pese as imagens da Avenida Paulista no último domingo (6).

Direita patológica - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Governadores-candidatos do campo bolsonarista estão fazendo o contrário do que deveriam para democracia brasileira recobrar a saúde

O mundo é mesmo um lugar injusto. Enquanto a direita brasileira padece do problema de excesso de candidatos para o pleito presidencial de 2026, a esquerda amarga a velha dependência de Lula, que é um outro jeito de dizer que, sem o nome do petista na urna, ela se veria em apuros.

Se Lula optar pela aposentadoria e a esquerda se dividir entre candidatos de peso eleitoral semelhante, corre o risco de nem passar para o segundo turno.

Se olharmos para nomes individuais, também encontraremos problemas. Fernando Haddad é visto como um sucessor natural de Lula. Mas, se o presidente decidir não concorrer, será porque a economia não vai bem. E, se ela não estiver bem, Haddad, que é o ministro da Fazenda, não teria a menor chance.

Trump e o populismo tarifário com jeito de faroeste - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Na guerra das tarifas, Trump encena western moral em que a punição vale mais que a economia

Não sou capaz de opinar sobre a racionalidade econômica por trás da guerra tarifária em que Trump empenhou seu governo nos últimos dias. Deixo a dor de cabeça para quem entende de comércio internacional. Mas gostaria de examinar essa confusão do ponto de vista da política ou, mais precisamente, da comunicação política. Mesmo porque tenho a impressão de que Trump entende tanto quanto eu sobre comércio e tarifas —e é na arena das narrativas e dos imaginários que está, de fato, jogando o seu jogo.

As tarifas de Trump vão prejudicar o mundo - Martin Wolf

Financial Times / Folha de S. Paulo

Os déficits comerciais permanecerão praticamente inalterados, e o mundo apenas acabará mais pobre

Agora sabemos qual economia é a maior ameaça aos Estados Unidos depois da China: Lesoto. Atualmente, a China tem uma tarifa combinada de 54% sob o novo plano de Donald Trump. Mas, aparentemente, Lesoto merece uma tarifa "recíproca" de 50% sobre suas exportações para os EUA, logo à frente dos 49% sobre o Camboja e 46% sobre o Vietnã, seguidos por 32% sobre a Indonésia e Taiwan, 26% sobre a Índia e 20% sobre a UE. O Reino Unido escapa com 10%.

O que talvez seja mais extraordinário sobre a derrubada de quase um século de política comercial é que ninguém, aparentemente, informou ao presidente que um procedimento que coloca Lesoto no degrau mais alto faria os EUA parecerem ridículos. Mas fez —e fez isso porque esse procedimento era ridículo.

Trump não faz ideia do que desencadeou com sua guerra tarifária - Edward Luce

Financial Times / Valor Econômico

Trump prometeu em praticamente todos os discursos de campanha desencadear a guerra comercial em que estamos agora

Devemos confiar nos instintos de Donald Trump, diz Mike Johnson, presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos. Uma atitude mais sensata seria Johnson e sua bancada correrem na direção oposta.

É tarde demais para os republicanos voltarem a ser um partido normal – a fé em Trump é o princípio que os une. Mas eles ainda poderiam agir como aliados fieis, convencendo Trump a recuar do precipício. Além dos cargos que ocupam, o futuro da economia mundial e a aposentadoria de cada americano dependem disso.

Poesia | Esse desemprego, de Bertolt Brecht

 

Música | Zizi Possi e Alceu Valença - Sabiá ( Luiz Gonzaga e Zé Dantas)