quarta-feira, 9 de abril de 2025

O ‘mau militar’ e o Alto-Comando - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Ao apoiar o ataque à honra dos generais, Bolsonaro obriga os governadores a dizer se estão com o líder

Era para ser mais um comício para salvar Bolsonaro. Um grupo de sete governadores compareceu ao palanque do ex-presidente de olho nos votos que o inelegível espargirá sobre a cabeça de seu eleito. Há ainda os que acreditam que ele terá uma solução republicana, em vez da dinástica, para o destino da direita.

Tudo parecia mais uma vez tomar o rumo da discussão sobre quantos milhares foram à Paulista e se as ruas seriam suficientes para influenciar os gabinetes parlamentares na distante Brasília. Quem foi ao comício no domingo encontrou um público eclético, assim como os oradores que se revezavam no palanque. Tudo corria como o esperado até um pastor tomar o microfone. Disse o homem: “Cadê esses generais de quatro estrelas, do Alto-Comando do Exército? Cambada de frouxos, cambada de covardes, cambada de omissos. Vocês não honram a farda que vestem. Não é para dar golpe, não, é para marcar posição”.

No dia seguinte, em vez de repúdio, o pastor ganhou o apoio de Bolsonaro. E o silêncio de governadores, como o de São Paulo, Tarcísio de Freitas, ele também capitão do Exército – turma de 1996 da Academia das Agulhas Negras. Pode-se perguntar: afinal, o que Tarcísio pensa dos generais ultrajados?

Alguém sabe de onde vem essa mossa do pastor? Ele parecia fazer exatamente aquilo que procurou negar: incitar um golpe.

Querer que o poder militar dite o que o poder civil deve ou não fazer é subverter a ordem e a lei, pregar a sedição, a baderna, e tornar letra morta o controle civil objetivo, transformando a República em um estado pretoriano.

É desconhecer aquilo que Oliveiros Ferreira escreveu em Elos Partidos. “Na Força Armada não há essa distinção entre o ‘legal’ e o ‘moral’. A conduta ajusta-se ou não aos padrões militares.” Já o que define as ações civis e as do Estado é a legalidade. A mossa do pastor vem de Bolsonaro.

O ex-presidente sempre esteve em conflito com a legalidade republicana e com os valores da caserna. Não é por outra razão que Ernesto Geisel o definiu como “um mau militar”. Ao atacar pela enésima vez a honra do Alto-Comando – que nem é mais o mesmo que lhe cortou, em 2022, o caminho da ruptura, tentada em seguida por meio de um golpe de coronéis contra generais –, Bolsonaro revela desprezo pelo nosso Exército. Para ele, este só tem mesmo serventia se estiver a serviço de seus interesses.

De Bolsonaro e do pastor ninguém espera mais nada no Forte Caxias. Não deveria ser surpresa o que aconteceu para os governadores que o acompanharam no palanque paulista. Ao tentar salvar sua pele, o ex-presidente pouco se importa se é motivo de novos constrangimentos. Mas quem o acompanha sabe muito bem com quem divide a mesa.

 

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