
Com o título "O Sexto Membro Permanente ? O Brasil e a Criação da ONU", conta, com base em documentos, alguns inéditos, pesquisados tanto em arquivos nos Estados Unidos como no Brasil, como reivindicamos pela primeira vez a inclusão como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, que estava para ser criado de acordo com uma minuta aprovada na Conferência de Dumbarton Oaks, em 1944, "Propostas para o Estabelecimento de uma Organização Internacional Geral".
A tese de Eugênio Vargas Garcia é de que os EUA assumiram a dianteira do processo em parte porque seus aliados estavam ocupados demais para investir tempo e recursos em atividades de planejamento que não fossem voltadas para fins militares imediatos.
"Por um momento, a Grã-Bretanha travou quase sozinha a guerra contra a Alemanha nazista e a URSS suportou uma luta titânica de vida ou morte na frente oriental. Geograficamente distante das zonas de batalha, os EUA não tiveram seu território continental atacado durante o conflito. Eram, possivelmente, o refúgio mais seguro para conferências internacionais e conclaves do gênero", analisa em seu trabalho.
Entre outras fórmulas aventadas na época, o estudo mostra que Roosevelt acalentava a ideia de implantar um sistema chamado por ele de "tutela dos poderosos" já que, em sua avaliação, os mecanismos de consenso e participação universal da Liga das Nações não teriam funcionado. "Era preciso lançar mão de expedientes mais drásticos" .
Em discurso de 1944, Roosevelt sublinhou que o propósito supremo das Nações Unidas podia ser expresso em uma única palavra: "segurança". Este, aliás, era um ponto de sólido consenso entre os Três Grandes, ressalta Eugênio Vargas Garcia.
"Muito mais praticantes do que teóricos da Realpolitik, Roosevelt, Churchill e Stalin estavam de perfeito acordo quanto à prerrogativa dos poderosos de gerenciar a ordem internacional nos seus termos".
O plano a que se chegou em Dumbarton Oaks poderia ser visto, segundo o estudo, como uma versão fortalecida da Liga das Nações, controlada pelos Quatro Policiais (Estados Unidos, Rússia, China e Reino Unido). O Quinto Policial seria a França.
Mais tarde, na Conferência de Yalta, definiu-se a fórmula para a votação no Conselho de Segurança: a) cada membro do Conselho teria um voto; b) as decisões em questões processuais seriam tomadas pelo voto afirmativo de sete membros; e c) as decisões em todos os outros assuntos seriam tomadas pelo voto afirmativo de sete membros, inclusive os votos afirmativos de todos os membros permanentes. Neste texto, explica o trabalho, estava embutido o poder de veto.
Roosevelt instruiu sua delegação em Dumbarton Oaks a sugerir que o Brasil fosse considerado como o sexto membro permanente, uma possibilidade que ajudaria a "reforçar a posição do Brasil" na América do Sul.
Modelo de "bom vizinho", o Brasil era visto em Washington como parceiro confiável e "aliado fiel".
No entanto, analisa a tese de Eugênio Vargas Garcia, essa concordância de Roosevelt não foi uma iniciativa meticulosamente preparada nem chegou a ser amadurecida previamente nos círculos decisórios norte-americanos.
O presidente Vargas tinha a expectativa de que as aspirações do país seriam satisfeitas, como reconhecimento devido pela colaboração que o Brasil havia prestado aos Aliados.
Segundo a tese, o respaldo de Washington - particularmente de Roosevelt - era esperado como parte da "aliança preferencial" que haveria entre os dois países, pelo menos na visão do Rio de Janeiro.
O Brasil chegou a apresentar proposta de emenda à Carta para conferir à América Latina representação permanente no Conselho, na esperança de que, se aprovada, o país fosse indicado naturalmente, mas não obteve êxito.
O pesquisador ressalta que o presidente Franklin Roosevelt, que se havia empenhado pessoalmente em favor da China, vencendo as objeções de Churchill e Stalin, era quem melhor poderia levar adiante sua intenção de criar mais uma cadeira permanente, mas sua morte, pouco antes da Conferência de São Francisco, eliminou em definitivo essa possibilidade.
A posição do governo dos EUA, ressalta o estudo, evoluiu de 1944 para 1945, com marcante queda no interesse em reforçar o Brasil como seu principal aliado na América do Sul e no Hemisfério Ocidental, linha que havia sido seguida por Roosevelt.
Quando a Conferência de Yalta teve lugar, a conjuntura já havia, em parte, mudado, destaca Eugênio Vargas Garcia: a guerra se aproximava do fim, o perigo maior havia passado, e esquecida a importância estratégica que o Brasil teve na luta contra o Eixo (bases aéreas no Nordeste) ou na contenção da Argentina "antiamericana".
Quando Truman assume, não era mais imperativo cultivar a amizade de Vargas ou tolerar abusos de seu regime personalista.
Para Getúlio Vargas, magoado e decepcionado, não haveria sinal maior de ingratidão, mas o estudo demonstra que ele teve contra si situações políticas que não controlava: problemas internos o obrigaram a desviar seus esforços da questão internacional, e a morte de Roosevelt roubou-lhe um aliado inestimável.
FONTE: O GLOBO
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