quarta-feira, 7 de maio de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Analfabetismo funcional persistente é vexame nacional

Folha de S. Paulo

Estudo mostra desempenho pífio até entre formados no ensino médio; é preciso valorizar os modelos integral e técnico

É vexatório que quase um terço dos brasileiros entre 15 e 64 anos viva no mundo das letras e dos números praticamente no escuro.

O índice de 29% de analfabetos funcionais nesse estrato em 2024 reflete a ineficiência histórica das três esferas de governo na gestão da educação, que impacta a qualidade de vida dos indivíduos e o desenvolvimento do país.

O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), calculado pela ONG Ação Educativa, mostra queda do início da série história, em 2001, quando marcou 39%, até a estagnação em 27% entre 2009 e 2015. Depois houve alta para 30% em 2018 e, agora, uma redução pífia de um ponto percentual.

A categoria engloba desde os que não conseguem ler palavras ou um número de telefone (analfabetismo absoluto), que representam 7% no indicador recente, até os 22% que leem e escrevem, mas não compreendem textos longos nem fazem contas maiores (analfabetismo rudimentar).

Opinião do dia - Montesquieu*

É preciso observar que o que chamo de virtude na república é o amor à pátria, isto é, o amor à igualdade. Não é absolutamente virtude moral, nem virtude cristã, é virtude política; e essa é a mola que faz mover o governo republicano. Chamei, portanto, de virtude política o amor a pátria e à igualdade.”

*Montesquieu (1689-1755), ‘Do espirito das leis’, p.31, Editora Nova Cultura, 2005

Um baluarte de Lula 3.0 - Paulo Celso Pereira*

O Globo

Ao disputar a eleição de 2022 sem apresentar um programa para o país, tendo como única meta o combate ao golpismo e ao desmonte promovidos por Bolsonaro, Lula semeou o marasmo de seu terceiro governo

Era novembro de 2011, e o governo Dilma Rousseff chegava ao fim de seu primeiro ano marcado pela “faxina” contra ministros apanhados em acusações diversas de “malfeitos”. Cinco já haviam caído quando as primeiras reportagens envolvendo um esquema de corrupção no Ministério do Trabalho, comandado à época por Carlos Lupi, vieram à tona. Em vez de sindicatos de aposentados, os protagonistas eram ONGs, e as fraudes que hoje totalizam bilhões de reais ainda se contavam nos milhões.

Reportagens mostraram que assessores de Lupi eram acusados ora de cobrar propina de ONGs que realizavam programas de qualificação profissional financiados pelo governo, ora de fazer vista grossa a outras entidades notoriamente enroladas e alvo dos órgãos de fiscalização.

Apagão geral na crise do INSS - Vera Magalhães

O Globo

Nem Lula nem sete ministros têm saída para ressarcir lesados por golpe e ninguém sabe de onde sairá o dinheiro

À medida que as semanas passam e novos detalhes são revelados no escândalo dos descontos ilegais de aposentados e pensionistas do INSS, vê-se um governo completamente perdido em todas as frentes: na contenção política dos estragos e, sobretudo, no caminho para indenizar quem foi roubado na mão grande naquilo que é

Desde que o caso veio à tona, do presidente aos técnicos do órgão, todo mundo tenta apenas ganhar tempo, sem entender que, para quem vai olhar o contracheque e descobre que há meses ou anos vem havendo desconto de seus vencimentos sem ter autorizado, o que bate é desespero.

A velha ordem econômica está morta - Martin Wolf

Valor Econômico

Era em que os EUA podiam agir como captador e consumidor de última instância, testada nos anos 1980 por Japão e Alemanha, se tornou impraticável política e economicamente

Como quem está de fora da guerra comercial entre Estados Unidos e China quer que ela acabe? Eles gostariam que ambos saíssem derrotados.

Sem dúvida, a abordagem de Donald Trump é muito pior do que apenas sua incoerência intelectual: ela é letal para qualquer ordem global cooperativa. Algumas pessoas gostam de achar que um desmoronamento desse “globalismo” seria até desejável. Do meu ponto de vista, é tolice imaginar que um mundo comandado por “grandes potências” predatórias seria superior ao que temos agora. Ainda assim, embora o protecionismo de Trump tenha que sair derrotado, o mercantilismo chinês não pode sair vencedor, pois ele também criaria grandes dificuldades mundiais.

A mensagem da China para a comitiva de Lula a Pequim - Fernando Exman

Valor Econômico

Deve-se esperar um intenso trabalho nos bastidores dos chineses junto às autoridades brasileiras, em meio à guerra tarifária iniciada pelos EUA

Para os aficionados em registrar momentos históricos marcados por ironia e simbolismo, não passará batido que o chefe do departamento de sanções dos Estados Unidos desembarcou em Brasília nestes dias, justamente enquanto o governo brasileiro finalizava os detalhes da visita de Estado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China.

Pode-se dizer oficialmente que ele está no Brasil para discutir questões de segurança. E que, ademais, a recente reunião entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o secretário de Tesouro dos EUA, Scott Bessent, é um marco positivo na construção de pontes de alto nível nas relações bilaterais. Mas, não passaram batidas a comemoração de parlamentares da oposição e a sua torcida para que dessa visita do americano pudesse surgir algum desconforto para o governo e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

É com esse pano de fundo que Lula viaja a Pequim na semana que vem, colocando o Brasil como interlocutor estratégico do presidente chinês, Xi Jinping, na América Latina. No mês passado, por exemplo, Lula chegou a oferecer ajuda para agendar uma reunião entre o presidente do Chile, Gabriel Boric, e o líder do país asiático. Citou que a fluidez no diálogo Brasil-China seria um facilitador para tentar a intermediação.

Guerra comercial, empregos no Brasil - Tiago Cavalcanti

Valor Econômico

Regiões especializadas em indústrias afetadas pela política comercial da China em relação aos EUA apresentaram crescimento relativo do emprego formal e da massa salarial entre 2016 e 2021

No dia 2 de abril, o presidente americano Donald Trump promoveu o chamado “Dia da Libertação” nos Estados Unidos, quando anunciou um tarifaço sobre produtos importados.

As tarifas adicionais foram definidas com base em uma fórmula linear bisonha, vinculada ao percentual do déficit comercial dos Estados Unidos com cada país. Para nações com as quais os EUA registram superávit, como o Brasil, ou déficit inferior a 10%, foi estabelecida uma tarifa mínima de 10%. O objetivo declarado era incentivar a reindustrialização e estimular o emprego no país.

Segundo Trump, os EUA vinham sendo “enganados” por países que aplicam tarifas elevadas sobre produtos americanos ou com os quais o país mantém déficits comerciais, como se o comércio internacional não trouxesse benefícios para os americanos.

O fim dos padres ‘da libertação’? - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Cada vez mais idosos, os padres ‘dos anos 1970’ dão lugar aos ‘novos padres’, mais jovens e tradicionais

Frei Betto completou 80 anos. Em 2024, foi homenageado em Havana. Vestia um boné do MST e posou para foto ao lado de estudantes de Medicina. Meses depois do dominicano, padre Julio Lancellotti, o carmelita da Pastoral dos Povos de Rua de São Paulo, completou 76 anos. E, na semana passada, encontrou um jovem sacerdote, o frei Gilson, de 38 anos, assim como ele um fenômeno na internet – Lancellotti tem 2,2 milhões de seguidores no X e Gilson, 9,3 milhões.

Foi então que o sacerdote, que ao lado de Betto é um símbolo da Igreja progressista, a da opção preferencial pelos pobres, disse ao Estadão. “Eu que sou mais velho tenho uma teologia mais ligada ao (Concílio) Vaticano 2.º. E os jovens uma teologia mais tradicional. Quando eu tinha a idade dele ( Gilson) essa teologia era dos mais idosos. Agora, são os mais velhos que têm uma teologia mais inter-religiosa, mais aberta para o mundo. Os da minha geração éramos mais afinados com o papa Francisco do que os mais jovens.”

O Copom e o complexo fim do ciclo - Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

O desafio do Copom é avaliar quão inflacionário ou recessivo será o tarifaço dos EUA

Parece até simples o dilema que o Copom terá pela frente ao fim da sua reunião de hoje, conforme a maioria dos analistas: será a derradeira alta do atual ciclo de aperto monetário ou ainda haverá um último ajuste em junho? A taxa final da Selic ficará em 14,75% ou 15%?

O desafio com que se depara o Copom é exatamente o mesmo de outras autoridades monetárias do mundo, que é avaliar quão inflacionária ou recessiva será a política de tarifas de importação adotada por Donald Trump. Como não dá para antecipar desde já a decisão final sobre o nível tarifário que será cobrado de cada país, em especial da China, diante das muitas idas e vindas do presidente americano, o que resta, neste momento, são apenas incertezas.

Fraudes do INSS não têm solução fácil para ninguém – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A retaliação, ao governo, de Ciro Gomes e dos deputados do PDT, em solidariedade a Carlos Lupi, não era esperada pelo Palácio do Planalto, que continua na berlinda

O escândalo do INSS ganhou vida própria, e ninguém sabe ainda como nem quando essa tunga no bolso dos aposentados e pensionistas se resolverá. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva esperava encerrar o desgaste do governo com a demissão do ministro da Previdência, Carlos Lupi, presidente nacional do PDT, e sua substituição pelo secretário-executivo da pasta, o ex-deputado Wolney Queiroz (PDT), mas a crise continua.

Lupi pediu demissão do Ministério da Previdência Social na última sexta-feira, após a operação da PF e da CGU que revelou fraudes no INSS. O então presidente da autarquia, Alessandro Stefanutto, foi afastado sumariamente do cargo. O novo ministro da Previdência, Wolney Queiroz, indicado por Lula, foi alvo das críticas do ex-ministro Ciro Gomes (PDT), presidenciável da legenda, que faz oposição ferrenha ao presidente Lula e não tem apoio da bancada de deputados do PDT.

A diversidade indecente - Cristovam Buarque*

Correio Braziliense

Pela abolição, brancos e negros tornaram-se iguais perante a lei, mas ricos e pobres continuam a ter direitos diferenciados, graças ao acesso desigual à educação plena e de qualidade

Em excelente artigo publicado no Correio Braziliense, o ex-ministro Raul Jungmann apresenta sua visão sobre a importância moral e a necessidade social de combater preconceitos e promover a diversidade — respeito e aceitação do outro, pela cor da pele, orientação sexual, religião ou gênero. Apesar da qualidade e relevância, o artigo manteve a tradição de ignorar o "rendismo": a discriminação ao acesso a bens e serviços essenciais conforme a renda da pessoa (comida, educação, saúde). Tampouco menciona que, aplicado à educação, esse preconceito é a principal causa dos outros preconceitos.

Governo perdido na crise do INSS - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Lula 3 ainda improvisa, quer devolver dinheiro roubado sem saber como e crise aumenta

Parte do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende devolver de modo antecipado o dinheiro roubado de aposentados e pensionistas do INSScomo noticiou esta Folha. Tentaria recuperar o prejuízo depois, fazendo a quadrilha devolver o fruto da roubança —hum.

Tal providência ajudaria também a colocar um esparadrapo na sangria de imagem provocada pela facada do escândalo. É no que acreditam pessoas próximas de Lula, a turma do Planalto, digamos assim.

Parte do governo Lula acha que isso não chega a ser uma má ideia, pois não é uma ideia. Além de dúvidas sobre os meios legais de implementação da medida, não se sabe qual o tamanho do esbulho, quem tem direito a receber o que foi roubado, como serão definidos os critérios para tomar tal decisão, como será o processo (governo decide? Lesados podem recorrer?), qual período de descontos entrará no cálculo etc. A providência pode resultar em confusão e insatisfações extras. Foi imprudência vazar o plano, diz esta parte do governo.

Nos braços da maioria silenciosa - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Quem sustenta opiniões que se creem majoritárias alimenta intolerância e incapacidade de lidar com a complexidade

Há uma ilusão curiosa —e muito difundida— segundo a qual a maioria, ainda que silenciosamente, quer as mesmas políticas, valoriza os mesmos princípios, enxerga o país do mesmo jeito que a gente. Essa convicção subjetiva de que nossas ideias são majoritárias, mesmo quando não são, é bem conhecida na psicologia social e atende pelo nome de viés de falso consenso.

É um viés cognitivo, ou seja, uma tendência psicológica automática que faz com que projetemos nossas características e preferências sobre o coletivo. Progressistas tendem a superestimar a adesão da sociedade —ou da melhor parte dela— aos seus valores; conservadores estão convictos de que o Brasil profundo é conservador como eles.

A esquerda tem certeza de que a massa compartilha sua visão de mundo, seu conceito de justiça e sua ideia do papel do Estado; a direita tem certeza de que qualquer pessoa lúcida e bem informada não tem dúvida alguma sobre a superioridade da sua agenda e de suas políticas. Sim, a mente costuma nos pregar esta peça: a de que os outros é que são minoria —as pessoas sensatas pensam como nós.

Direita constrói sua frente ampla – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Enquanto Lula oscila, adversários seguem firmes na montagem do plano de união em 2026

Governantes com direito à reeleição, regra geral, não antecipam a desistência de disputar o segundo mandato porque isso reduz a tão falada expectativa, essencial ao exercício do poder. Promessas de que ficarão só um período são de utilidade restrita às conveniências de campanhas.

Luiz Inácio da Silva (PT) já fez os dois movimentos e, no curso do governo, tem oscilado entre eles. Ora indica que pode não ir, ora assegura que irá como em recente em reunião com parlamentares aos quais se disse "candidatíssimo".

100 dias de estilhaçamentos - Ricardo Marinho*

O 100º dia de Donald Trump no cargo passou. Eles não foram silenciosos, nem foram prudentes e muito menos gentis. Na verdade, nada disso era esperado. Ele chegou ao poder anunciando o som e a fúria tal como viu William Faulkner (1897-1962) na sua fina leitura de Macbeth, de William Shakespeare (1564-1616), não apenas para seu país, mas para o mundo inteiro. Ele ameaçou mudar tudo e acabar com as guerras. A invasão da Ucrânia pela Rússia, pela qual os invadidos foram incompreensivelmente culpados, terminaria em 24 horas, e o massacre em Gaza seria resolvido com a expulsão da população palestina e a construção de um resort no Mediterrâneo.

Nos Estados Unidos da América (EUA), ele governaria sem consultar ninguém, vingando os supostos abusos infligidos à sua nação durante 80 anos pelo resto do mundo com tarifas, deportando os estrangeiros e derrubando os intelectuais que trabalham nas universidades, perigosos berços do pensamento democrático e liberal.

Ney Inclassificável - Vagner Gomes*

Não é possível estabelecer os limites de linhas para definir a carreira de Ney Matogrosso. Portanto, é melhor o denominar como um ser humano universal em tempos das cobranças por uma identidade por vezes censora. Esse é o desafio do roteiro do filme “Homem com H” dirigido e roteirizado por Esmir Filho que apesar de seu premiado “Os Famosos e os Duendes da Morte” (2009) agora ganha um reconhecimento do grande público por uma perfeita escolha de elenco com destaque para Jesuíta Barbosa.

Uma obra sobre o amadurecimento de um artista num contexto das transformações inacabadas de uma sociedade que testemunhou uma modernização conservadora. O centro-oeste brasileiro, que será o novo eldorado da expansão do agronegócio e das forças conservadoras no século XXI, é caracterizado em cada tabefe que um Ney criança recebe no início do filme. Cenas fortes que emocionam o público pela coragem em expor as raízes de nossas contradições históricas.

A sociedade sem classes: o caso da experiência tupi – Ivan Alves Filho*

Ao analisar a desagregação da sociedade tupi, no nosso litoral, no decorrer do século XVI, vali-me de uma leitura do mito da Terra Sem Males, o qual demonstrava que havia um conflito de interesses entre os dois setores que mais gozavam de prestígio no interior das tribos, isto é, os guerreiros e os sacerdotes. Os primeiros tendiam a reforçar o poder central, rechaçado pelos últimos. 

Na verdade, esse conflito revelava que havia uma cobiça em marcha e que ela partia de um setor minoritário dos tupi, uma vez que a tribo já conseguira gerar um excedente considerável, e sobretudo estocar os seus alimentos. 

Poesia | Parada do velho novo, de Bertolt Brecht

 

Música | Mariana Aydar canta "Zé do Caroço" com Leci Brandão