sábado, 26 de abril de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Prisão de Collor é decisão correta diante de evidências

O Globo

Para evitar justiçamento ou impunidade, é fundamental o respeito a todos os ritos jurídicos

Em razão de um pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes, o plenário do Supremo Tribunal Federal ainda examinará em sessão presencial a decisão do ministro Alexandre de Moraes que determinou a prisão do ex-presidente e ex-senador Fernando Collor de Mello por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, crimes revelados pela Operação Lava-Jato. Na sessão virtual, ela já conta com maioria de seis ministros. Trata-se de uma decisão correta. A Justiça ofereceu todos os caminhos possíveis para Collor se defender, e as evidências reunidas ao longo do processo justificam a prisão. Diante delas, causaria espanto se mais esse caso da Lava-Jato não desse em nada.

Em 2023, Collor foi condenado a oito anos e dez meses de prisão, sob a acusação de participar de um esquema de corrupção na BR-Distribuidora. As investigações foram aprofundadas depois de delações premiadas do doleiro Alberto Youssef, do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró e do empresário Ricardo Pessoa. As denúncias foram corroboradas por provas recolhidas pela Polícia Federal. Esgotados todos os recursos, Collor foi detido na madrugada desta sexta-feira, em Maceió (AL), e aguardará preso a decisão do plenário.

Batalhas identitárias - Marco Aurélio Nogueira*

O Estado de S. Paulo

A radicalização identitária é desafiadora para a democracia, pois dificulta a construção de consensos e entendimentos

Não é de hoje que o tema das identidades deixou de ser um problema pessoal para se converter em agenda de engajamento político.

O avanço dos direitos humanos, a fragmentação social, a força do antirracismo e das lutas feministas foram se entrelaçando com a necessidade de modelar a face com que os indivíduos se mostram ao mundo. Ser consciente de suas raízes socioculturais e de suas escolhas, para poder expressá-las livremente, passou a ser aspiração de milhões de pessoas. Encontrar uma identidade virou a tradução disso, sobretudo no terreno do gênero, da opção sexual, da raça e das religiões. A ideia de pátria também voltou a vibrar, insuflada pelas pregações da extrema direita.

Por caminhos variados, as buscas identitárias entraram por partidos e governos. Foram além de grupos e pessoas, ganharam foro regional e local, político e cultural.

Precisamos dar voz aos invisíveis - Pablo Ortellado

O

Globo

Antagonismo, na verdade, é puxado por pequenas minorias, grupos ativistas de no máximo 5% da população

Nos últimos meses, venho liderando uma ampla pesquisa que investiga a natureza da polarização política no Brasil. Aproveito o espaço desta coluna para compartilhar alguns entendimentos e resultados preliminares desse trabalho, que ajudam a desenhar um retrato mais preciso do conflito que atravessa nossa sociedade.

A polarização política parece envolver toda a sociedade, mas o antagonismo, na verdade, é puxado por pequenas minorias, grupos ativistas de no máximo 5% da população, ladeados por segmentos “semiativistas”, que compõem outros 15%. Entre esses dois polos, há uma grande maioria silenciosa, silenciada, de aproximadamente 60% do Brasil — são os invisíveis.Essa maioria — moderada e um pouco desinteressada de política — se torna invisível pela agitação ativista dos polos nas mídias sociais, que terminam se fazendo passar pelo todo. Quando dividimos mentalmente o Brasil entre petistas e bolsonaristas, não apenas representamos o país de maneira imprecisa, mas bloqueamos também qualquer discussão de propostas matizadas e independentes, porque acreditamos que não contemplariam grupos que erroneamente acreditamos majoritários.

Bizarrices - Eduardo Affonso

O Globo

Como se sentirão os trans ao deparar com os adjetivos transitório e intransigente ou com o substantivo trânsfuga?

É pena que o macarthismo linguístico esteja perdendo força, e a sanha censória dos puros de coração (e frágeis de cérebro) vá se consolidando como apenas mais uma daquelas esquisitices que volta e meia assolam a Humanidade, deixando como legado um rastro de vergonha alheia. Coisas como o mullet, as ombreiras, a calça saruel, a gravata com estampa de personagem de desenho animado, os Crocs, o bigodinho fino, a palavra “presidenta” — e a patrulha woke.

Quase nada é tão ruim que não possa piorar: a barba desenhada dos cantores sertanejos, os dentes fosforescentes das celebridades, os atuais três Poderes da República. Mas algumas coisas ainda tinham fôlego para degringolar (e nos divertir) um pouco mais.

Trump enfrenta choque de realidade – Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Só a reação interna pode deter o presidente americano. Além da sabedoria e da paciência milenares dos chineses

Da posse de Trump até ontem, o valor das companhias americanas listadas em Bolsas caiu cerca de 10%. É coisa de trilhões de dólares. Afeta principalmente as empresas que têm cadeias globais de produção, as maiores vítimas do tarifaço.

Mas, se a tendência foi claramente de queda nesse período, a característica principal do mercado foi a volatilidade. A partir não apenas de fatos, mas especialmente das declarações de Trump.

Esta semana foi assim. Começou bem pessimista, repercutindo ainda as falas do presidente ameaçando engrossar com a China e demitir o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central), Jerome Powell, se ele não reduzisse imediatamente a taxa de juros.

Ações desabaram.

É nosso dever lutar contra a anistia - José Dirceu*

O Globo

Projeto só tem um objetivo: livrar Jair Bolsonaro e sua camarilha de covardes de responder pelo crime de alta traição

Parece mentira, mas tem apoio na Câmara dos Deputados a proposta de anistiar os golpistas e os participantes do ataque e destruição dos símbolos da República e da democracia, os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Salta à vista o absurdo de deputados e deputadas proporem anistia para os que depredaram o mesmo plenário onde pretendem que se aprovem a impunidade e a cumplicidade com um golpe de Estado.

Todo o resto é agravante: os atentados de 12 e 24 de dezembro, o risco de uma tragédia no Aeroporto Internacional de Brasília e, por fim, a destruição das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Podemos ver os desdobramentos do plano golpista, culminando com o Punhal Verde Amarelo e a participação dos kids pretos, integrantes das Forças Especiais do Exército sediados em Goiás, cuja missão seria eliminar o presidente da República, o vice e um ministro do STF. Simples assim.

As festas de arromba de Brasília - Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Duas reportagens de Levy Teles, neste Estadão, deram conta dos embalos de quarta à noite na Brasília delirante. A elite política bebendo destilados à larga no dia em que o País tomara ciência do golpe bilionário ao INSS.

Hugo Motta abriu as portas para reunir Lula e os líderes partidários, servidos vinhos de mais de R$ 1 mil e a cafonice (gostosa) da moda, uísque japonês. Isso, madrugada de quinta adentro. Convescote em cujos barris se pactuaria o anunciado pela manhã: empurrada para frente – pelas panças fermentadas – a análise do requerimento de urgência do projeto de lei da anistia.

Projeto delirante da anistia, pela impunidade a Bolsonaro, agenda única da oposição – mesmo ante a descoberta, pelo Brasil do mundo real, do assalto a aposentados e pensionistas. O líder do PL não esteve no jantar para Lula. Foi ao festão de Marcos Pereira, o presidente do Republicanos. E soltou o verbo, sabedor do que se brindava na residência oficial da presidência da Câmara.

Em 100 dias, o fim de 100 anos de domínio - Fareed Zakaria

O Estado de S. Paulo

Cortes em pesquisas e ataques a universidades estão entregando a liderança global para a China

À medida que o governo Trump inunda a zona do euro com sucessivas mudanças radicais, suas tarifas têm recebido mais atenção. Mas a política que pode acabar custando ainda mais aos EUA a longo prazo é o ataque da Casa Branca às universidades e à pesquisa em geral.

Os EUA lideram o mundo em ciências há tanto tempo que é fácil acreditar que este recurso sempre foi uma das forças naturais do país. Na realidade, no século 19 e no início do século 20, Washington foi mais seguidor do que líder. Industriais britânicos frequentemente reclamavam que empresas americanas lhes roubavam tecnologias e violavam suas patentes. Nas primeiras décadas do século 20, o país que conquistou o maior número de Prêmios Nobel em Ciências foi a Alemanha – com um terço de todas as premiações. Em seguida, veio o Reino Unido, com quase 20%. Os EUA receberam apenas 6% dos Prêmios Nobel em Ciências.

Motta freia anistia em estratégia a conta-gotas - Adriana Fernandes

Folha de S. Paulo

Presidente da Câmara, porém, errará se não incluir a pauta fiscal

Sob forte tiroteio nas últimas semanas, o presidente da Câmara, Hugo Motta, conseguiu ganhar tempo ao estancar a pressão pela votação do requerimento de urgência do projeto de anistia aos envolvidos nos ataques golpistas de 8 de janeiro.

Motta conquistou fôlego político ao convencer os líderes da maioria dos partidos (exceto PL e Novo) a se posicionarem contra acelerar a tramitação. Isolou o partido de Jair Bolsonaro e, por enquanto, a anistia não se transformou na pauta prioritária do Congresso, como queria a oposição bolsonarista.

A bomba atômica econômica - Rodrigo Zeidan

Folha de S. Paulo

Trump comprou uma briga com Jerome Powell que não tem como ganhar

Trump comprou uma briga que não tem como ganhar. Jerome Powell tem mais poder que ele, pois o Fed detém a bomba atômica econômica: o controle sobre os juros americanos. Se os membros do banco central dos EUA resolverem jogar os juros para a estratosfera, o dólar voltará com tudo, mesmo que isso cause crise gigantesca lá e no resto do mundo.

Tempo de mudança - André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

O governo se contenta em ser uma administração mediana, sem grandes projetos, capaz apenas de anunciar ações populistas para garantir votos na próxima eleição. Os jovens vão mudar esse cenário

A sucessão presidencial é o momento de crise no regime democrático. Pode durar alguns dias ou demorar meses, mas crise acontece. O presidente Lula anunciou no início deste ano que o período eleitoral estava começando. Com essa decisão, chamou a crise para si e a alojou no Palácio do Planalto. Os condimentos estão todos lá: uma reforma ministerial que não anda, deputado que recusa o cargo de ministro e, para temperar, uma brutal crise de corrupção no INSS, instituição que comanda o destino de milhões de pessoas necessitadas de apoio por idade ou necessidade médica.  O desastre está na porta. E o presidente já superou eventuais dúvidas: ele é candidatíssimo à Presidência da República.

A sucessão presidencial, no caso atual, indica também uma sucessão geracional. Ninguém mais fala da Nova República, que se instalou depois da Assembleia Constituinte. As principais realizações foram positivas. Acabou a hiperinflação, ocorreu razoável abertura de sua economia, privatizou o que foi possível, criou agências governamentais e ainda conseguiu chegar a uma lei de responsabilidade fiscal. Foram providências importantes, mas que já se perderam na memória popular. As pessoas olham para frente. A juventude tem os próprios projetos.

'O Grande Gatsby' explica Trump - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Obra-prima de Scott Fitzgerald dá pistas para entender o caminho dos EUA até o buraco

"O Grande Gatsby" completou cem anos outro dia —10 de abril para ser exato— e continua como se tivesse chegado às livrarias nesta semana, estalando de contemporaneidade. Um tipo de mágica que só os verdadeiros clássicos, por resistirem ao tempo, oferecem.

A obra de F. Scott Fitzgerald torna-se uma experiência inédita a cada releitura. O relato da obsessão de Jay Gatsby, gângster disposto a reverter o passado por amor à namorada da juventude, Daisy Buchanan —cuja voz "soava como dinheiro"—, hoje pode dar algumas pistas para compreender a tragédia em curso que é o governo Trump.

Ceticismo político - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Polarização protege líderes de denúncias, como a entrevista que precipitou impeachment de Collor em 1992

Fernando Collor de Mello está preso. Por corrupção. Não como consequência de atos cometidos durante sua Presidência (1990-92), mas por material mais recente —um dos poucos braços da Operação Lava Jato que não foi anulado pelo STF—, dos tempos de senador (2007-23).

Collor, como se sabe, sofreu impeachment, isto é, foi condenado politicamente pelo Senado, mas escapou da condenação penal. Em 1994, a maioria do STF entendeu que as provas apresentadas eram insuficientes para um veredicto de culpado.

A Igreja fechada - Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Reformas de papa Francisco ficaram quase circunscritas ao cenográfico

"Mãe não é estado civil", explicou, deplorando os preconceitos contra mães solteiras. "Quem sou eu para julgar?", indagou, referindo-se à prática da Igreja de emitir condenações aos gays. Francisco será lembrado como um papa que cultivou a empatia com as pessoas comuns, com a vida humana como ela é. No lugar de editos imperiais sobre o céu e o inferno, a virtude e o pecado, escolheu a humildade da dúvida. Quis empurrar a Igreja para fora do Palácio, na direção das ruas. Suas reformas, contudo, ficaram quase circunscritas ao âmbito simbólico ou cenográfico.

Francisco enfrentou a resistência dos tradicionalistas para, com sucesso parcial, abrir caminho à comunhão de divorciados que voltam a se casar. Empenhou-se na missão espinhosa de curar a ferida dos escândalos de pedofilia na Igreja, mas não atacou as raízes da abominação. Seu reformismo morno contrasta com as emoções suscitadas pela figura de um papa avesso à santidade ostentatória.

A doença, o diagnóstico e a cura - Marcus Pestana

Há tempos venho alimentando uma aguda sensação de desesperança. Na quarta-feira, dia 16, foram publicados o 99º. Relatório de Acompanhamento Fiscal da Instituição Fiscal Independente e o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2026 (PLDO/2026) pelo Governo Federal. Ambos apontaram a morte das finanças públicas à médio prazo, mas, neste caso, não houve anúncio da ressureição.

O país está gravemente doente. Não é uma doença terminal ou aguda. Definitivamente, não estamos à beira do abismo. Nem de perto nos assemelhamos à combinação de crises econômicas e humanitárias de países assolados por conflitos armados e guerras civis. Não será uma morte súbita. Um infarte ou um AVC grave. Estamos sofrendo de um mal crônico, degenerativo, progressivo. E a sociedade e as instituições parecem anestesiadas. O diagnóstico é frouxo, ralo. E o primeiro passo para buscar a cura sempre é a consciência plena do quadro e um diagnóstico amplo e profundo.

O papa da compaixão - Luiz Gonzaga Belluzzo*

CartaCapital

Contra o “consumismo do sagrado”, Francisco abraçava os fundamentos comunitários do cristianismo

Assim como as encíclicas Rerum Novarum, de Leão XIII, e Mater et ­Magistra e Pacem in Terris, de João XXIII, em suas peregrinações apostólicas, ­Francisco, sem meias-palavras, cuidou das vicissitudes e alegrias da vida cristã no mundo contemporâneo comandado pelo poder do dinheiro. Na edição de 17 de maio de 2018, o L’Osservatore Romano registra a divulgação do documento Oeconomicae et pecuniariae quaestiones elaborado pela Congregação para a Doutrina da Fé. O texto de 16 páginas reúne “considerações para um discernimento ético acerca de alguns aspectos do atual sistema econômico-financeiro”.

O documento foi apresentado na sala de imprensa pelo arcebispo Luis Francisco Ladaria Ferrer e pelo cardeal Peter ­Kodwo Appiah Turkson. Já na introdução, o texto revela seu propósito de avaliar a supremacia dos mercados financeiros – os estercos do Diabo – e suas consequências sobre a vida de homens e mulheres que habitam o mundo dos vivos. “A recente crise financeira poderia ter sido uma ocasião para desenvolver uma nova economia mais atenta aos princípios éticos e para uma nova regulamentação da atividade financeira, neutralizando os aspectos predatórios e especulativos e valorizando o serviço à economia real. Embora muitos esforços positivos tenham sido realizados em vários níveis, sendo os mesmos reconhecidos e apreciados, não consta, porém, uma reação que tenha levado a repensar aqueles critérios obsoletos que continuam a governar o mundo. Antes, parece às vezes retornar ao auge um egoísmo míope e limitado no curto prazo, que, prescindindo do bem comum, exclui dos seus horizontes a preocupação não só de criar, mas de distribuir a riqueza e de eliminar as desigualdades, hoje tão evidentes.”

O evangelho de Francisco - Sergio Lirio*

CartaCapital

Reformista e estadista, Bergoglio reavivou as origens do cristianismo

Jorge Bergoglio passou por uma última provação antes do derradeiro suspiro. O papa recebeu no Vaticano o vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance, convertido ao catolicismo durante o pontificado do argentino, mas símbolo de tudo aquilo que o argentino combateu ao longo dos 12 anos à frente da Igreja. Os relatos oficiais dão conta de um encontro cordial entre os dois, como era de se imaginar, dadas as naturais simpatia e serenidade de Francisco e as exigências diplomáticas do cargo. Apesar de ter recebido Donald Trump no primeiro mandato (só Bolsonaro não conseguiu uma audiência) e merecido do presidente norte-americano um elogio burocrático – “era um bom homem” –, o argentino era a antítese do atual ocupante da Casa Branca e de seus aliados. “Não é um cristão”, definiu o pontífice, em 2016, a respeito do magnata republicano. Em fevereiro, diante das deportações de imigrantes, chamou de “vergonha” o plano do governo dos Estados Unidos. “O que é construído com base na força, e não na verdade sobre a igual dignidade de cada ser humano, começa mal e terminará mal”, vaticinou.

“Não é o papa, mas Jesus, que os coloca (os pobres) no centro”, afirmou, ao rebater a pecha de comunista

Poesia | Pátria Minha - Vinicius de Moraes

 

Música | Paulinho da Viola - Pecado Capital