quinta-feira, 8 de maio de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lula trai memória da 2ª Guerra ao celebrar vitória com Putin

O Globo

Brasil não deveria endossar a versão mentirosa do conflito usada pelo russo para justificar agressão contra Ucrânia

É um erro a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de participar, ao lado do russo Vladimir Putin, das celebrações do Dia da Vitória, que marca o 80º ano do triunfo sobre a Alemanha nazista na Segunda Guerra. Além de Lula, assistirão ao desfile militar na Praça Vermelha o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, e o cubano, Miguel Díaz-Canel. Nenhum líder de democracia ocidental relevante aceitou dar apoio público ao responsável pela invasão da Ucrânia, maior agressão militar em solo europeu desde justamente o final da Segunda Guerra.

Esquerda de resultados - Maria Hermínia Tavares

Folha de S. Paulo

Ineficiência dos governos de turno também alimenta a extrema direita

A ascensão da extrema direita na Europa e na América reavivou o debate sobre os impasses enfrentados pelas correntes de centro esquerda ou de esquerda, em declínio eleitoral. Dos dois lados do Atlântico Norte, os progressistas perdem voto entre seus eleitores tradicionais, muitos dos quais têm migrado para partidos situados no extremo oposto do espectro político. Esse deslocamento varia de tamanho conforme o país. Mas tem porte suficiente para alimentar intensas discussões entre socialistas e social-democratas europeus, bem como entre democratas americanos.

Os críticos situam o problema nos programas e no discurso político progressistas. Ao focalizar temas de reconhecimento e de comportamento —as questões "identitárias", combustível das chamadas guerras culturais—, os partidos estariam alienando os trabalhadores menos educados, com níveis de renda também menores, atitudes mais conservadoras e outras preocupações cotidianas.

Lucidez dos extremos no rechaço ao aumento da Câmara - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Psol, de um lado, e PL e Novo, do outro, lideraram oposição à proposta que agride o senso comum

É devastador o vídeo em que o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) coloca o escândalo no INSS no colo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O deputado abandonou o tom histriônico com o qual discursava de peruca. A fala comedida, em tom mais grave, é acompanhada por uma música de fundo de dosada dramaticidade enquanto seu cabelo vai ficando grisalho e as feições envelhecem.

Enquanto Nikolas, sem contraponto, entretinha as massas digitais com mais um petardo bem dirigido contra o governo, a Câmara aprontou mais uma. O projeto de lei da deputada Daniela Cunha (União-RJ), que aumenta a Casa de 513 para 531 deputados, passou por 270 votos a 207 e uma abstenção. É uma folga e tanto para um projeto que, em todos os prismas, é indefensável.

Deputados dos dois extremos, Psol, de um lado, e PL e Novo, do outro, foram aqueles que exibiram mais lucidez no ataque a um projeto que consegue, de uma só vez, aumentar o número de parlamentares e agravar a distorção na representação.

O PCC entra na agenda Brasil-EUA - Assis Moreira

Valor Econômico

Classificação da facção criminosa como grupo terrorista traria efeitos colaterais graves para o país

A agenda bilateral do Brasil com os EUA/Trump 2.0 inclui agora outro tema sensível: o Primeiro Comando da Capital (PCC), o mais perigoso grupo criminoso do país e que se expande globalmente.

Donald Trump assinou ordem executiva recentemente incluindo na lista de Organizações Terroristas Estrangeiras (FTOs) do Departamento de Estado seis cartéis de droga do México e as gangues latino-americanas MS-13, originária de El Salvador, a Tren de Aragua, originária da Venezuela, e grupos criminosos do Haiti.

Para a Casa Branca, os cartéis internacionais são “uma ameaça à segurança nacional além daquela representada pelo crime organizado tradicional”, com atividades que abrangem “convergência com atores extra-hemisféricos, desde organizações designadas de terrorismo estrangeiro até governos estrangeiros antagônicos”, por exemplo.

Marasmo político - Merval Pereira

O Globo

Como a crise promete permanecer no centro do debate político, a corrupção, que nas pesquisas de opinião já não aparecia como problema prioritário para a população, voltará a ser tema de campanha

Nada indica que teremos mudanças com a eleição do ano que vem, no sentido de que não existe no horizonte um nome que possa quebrar a polarização entre petistas e bolsonaristas. Apesar dos momentos difíceis por que passa, Lula dá sinais de que se candidatará à reeleição, convencido pelas pesquisas de opinião de que vencerá qualquer adversário, mas, sobretudo, confiante de que Bolsonaro não deixará crescer grama onde um potencial candidato da direita tentar pisar sem seu consentimento.

A incerteza ditou os juros - Míriam Leitão

O Globo

O dilema no Brasil é a inflação alta apesar dos juros altíssimos, o dos Estados Unidos é como enfrentar a instabilidade do governo Trump

Incerteza foi a palavra usada nos comunicados do Banco Central do Brasil e do Federal Reserve para explicar suas decisões. Aqui, a taxa Selic subiu para 14,75%, nos Estados Unidos os juros não foram reduzidos e permanecem entre 4,25% e 4,5%. E o futuro? Aqui houve alguma indicação de que os juros não devem subir mais, mas nada muito garantido. Nos Estados Unidos, o presidente do Fed, Jerome Powell, disse não ter pressa em baixá-los. O que significa que a tensão com Donald Trump vai continuar. E a incerteza.

A crise de 2015 dez anos depois, o que aprendemos? - Benito Salomão*

Correio Braziliense

A Grande Crise Brasileira teve uma resposta da política econômica atípica, o que deve ter contribuído muito para a sua deterioração e o seu prolongamento

Em 2025 se completam 10 anos desde a Grande Crise Brasileira (GCB), que produziu cicatrizes profundas no tecido social e consequências macroeconômicas com as quais o país lida até hoje. Embora tenhamos convencionado denominá-la como crise de 2015, ela teve início  no segundo trimestre de 14, segundo o Comitê de Datação de Ciclos da Fundação Getulio Vargas (Codace-FGV).

O Codace também calcula que, ao longo das últimas décadas, o Brasil apresentou 10 ciclos recessivos. Então, por que a GCB merece destaque especial? A resposta é: devido a sua atipicidade. Ao observarmos o padrão das crises econômicas do Plano Real para cá, as recessões observadas tiveram um padrão bem definido, eram curtas e relativamente brandas (à exceção da crise da pandemia, em 2020). A GCB, por sua vez, foi aguda na intensidade, apresentando, segundo o Codace, queda de 8,1% da atividade entre o pico e o vale, além de ser longa na duração — ao todo, 11 trimestres consecutivos entre 2014 e 16.

Moscou não crê em lágrimas, 80 anos após derrota do nazismo - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O encontro de Lula com Putin segue a linha de independência da política externa brasileira, mas acontece num contexto muito diferente de outras ocasiões, por causa da guerra da Ucrânia

O escritor judeu-russo Ilya Ehrenburg Grigoryevich era um veterano jornalista quando acompanhou a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), com a experiência de repórter que cobriu a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Amigo de Jorge Amado e Pablo Neruda, teve várias obras traduzidas no Brasil, entre as quais, A queda de Paris, que descreve a ocupação da França pelos alemães, e Moscou não crê em lágrimas, que narra a resiliência russa. Ehrenburg foi o primeiro escritor a denunciar os números do Holocausto, no Livro negro, com relatos de judeus sobreviventes da Polônia e da antiga União Soviética sobre os campos de concentração.

Com o fim da guerra, porém, foi muito criticado porque tratou todos os alemães como “boches” durante a guerra, não distinguia um agente da Gestapo do adolescente mandado para a frente de batalha como bucha de canhão: “Vamos matar. Se você não tiver matado pelo menos um alemão um dia, você teve desperdiçado aquele dia… Não conte dias; não conte milhas. Conte apenas o número de alemães que você matou…”, chegou a dizer, num artigo intitulado Morte aos alemães. O exército de Hitler foi parado às portas de Moscou e, depois, derrotado na sangrenta batalha de Stalingrado, que marcou o início da derrocada militar do líder nazista. Morreram na guerra 20 milhões de soviéticos.

Lula em Moscou: o lado errado da História - Ricardo Rangel*

O Globo

Lula, alvo de uma tentativa de golpe de Estado, vive elogiando e defendendo a democracia, mas suas ações contrariam suas palavras

Não é novidade que a democracia liberal está ameaçada. Nunca, desde a derrota do nazifascismo em 1945, a extrema direita esteve tão forte, e ela está por toda parte: Trump, Le Pen, Orbán, Bolsonaro etc. Recentemente, o segundo lugar nas eleições alemãs ficou com a extremista Alternativa para a Alemanha (AfD), e o vencedor teve dificuldade para formar um governo (na última vez em que um cenário parecido ocorreu, em 1930, ele abriu caminho à ascensão de Hitler).

A situação internacional tampouco é fácil. Há a ameaça do imperialismo militar russo, os riscos da eventual hegemonia econômica da ditadura chinesa e o fogo amigo. Trump rasga a Constituição como quem troca de roupa, defende extremistas estrangeiros, desorganiza o comércio internacional.

A celebração do aniversário de 80 anos da vitória na Segunda Guerra Mundial, nesta semana, é simbólica: serve como alerta contra os riscos do extremismo e faz parte da luta da democracia pela sobrevivência. Lula poderia festejar em qualquer lugar — inclusive no Brasil, de onde se ausenta em demasia —, mas escolheu Moscou. Haverá quem diga que faz sentido, já que a antiga URSS era nossa aliada contra o nazismo. Mas o Brasil entrou na guerra por causa dos Estados Unidos e sempre combateu sob o comando de generais americanos. Nunca tivemos contato com os russos.

Tapa na cara - William Waack

O Estado de S. Paulo

Os gestos são a substância do que Lula faz em Moscou e Pequim

Há certo consenso sobre o que se impõe a potências médias como o Brasil em meio à nova desordem mundial. Na linguagem acadêmica, trata-se de manter uma “neutralidade pragmática” em função de “inteligência estratégica”.

Significa manter-se fora do eixo principal de conflito geopolítico entre EUA e China, evitando aderir a um dos lados. E olhar para oportunidades com um sentido estratégico, para bem além de ganhos comerciais de curto prazo – que são, no fundo, as “migalhas” que caem do tabuleiro no qual brigam os gigantes.

As guerras de autodestruição de Trump - José Serra

O Estado de S. Paulo

Guerrear contra um oponente que não tem poder de fogo poderia ser uma boa estratégia de Trump. Mas não é esse o caso da China

Agora temos pouco mais de 100 dias de governo Trump, e sabemos que jamais poderíamos chamar esse mandatário de monótono. Em verdade, são 100 dias que mais parecem ter durado uns três anos e tornam o governo Biden algo longínquo em nossa percepção do tempo.

Se os 100 dias foram agitados, o futuro parece nos reservar a incerteza. Todos eles parecem alicerçados numa forma de fazer política e buscar poder que norteiam o comportamento de Donald Trump. Esta é a sua maneira de conduzir o governo: ameaçar com a guerra para se posicionar de forma privilegiada.

25 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal - Felipe Salto

O Estado de S. Paulo

Falta o compromisso político efetivo em torno da responsabilidade fiscal e da busca pelo equilíbrio permanente das contas públicas

A Lei Complementar n.º 101, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), completou 25 anos no dia 4 de maio. É tempo de retomar o seu espírito original.

O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso conseguiu melhorar muito a institucionalidade fiscal. Promoveu a renegociação das dívidas estaduais e municipais, por meio da Lei n.º 9.496/1997, estabeleceu metas para o resultado primário (aquele que não inclui os juros da dívida) e aprovou a LRF, a partir do estudo das melhores experiências internacionais.

José Roberto Afonso foi figura central daquele processo, do ponto de vista da concepção técnica e elaboração da proposta. A importância do episódio pode ser comparada ao da aprovação da Lei Geral de Finanças Públicas, a de número 4.320, em 1964, ainda no governo João Goulart.

A abrangência dessas legislações é nacional, incidindo sobre Estados, municípios e União. A LRF estipulou limites para o comportamento dos gastos com pessoal, obrigou a transparência nos atos da administração pública, por meio de relatórios de gestão e de acompanhamento da execução orçamentária, estabeleceu parâmetros e metas para os indicadores fiscais e trouxe as bases para uma política fiscal mais coesa, inclusive do ponto de vista federativo.

Mais riscos, mais juros - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

O Comitê de Política Monetária já havia anunciado no comunicado da última reunião que não aumentaria os juros básicos (Selic) na mesma proporção em que aumentou nas duas últimas reuniões, de um ponto porcentual ao ano, por vez. Esta alta seria de magnitude menor. Acabou por optar nesta quarta-feira, por decisão unânime de seus diretores, por um aumento de 0,5 ponto porcentual, para 14,75% ao ano.

Desta vez, não indicou nem mesmo a direção da Selic a ser adotada nas reuniões de 18 de junho e de 30 de julho. Preferiu deixar tudo em aberto porque, no momento, atua na escuridão produzida pelo tarifaço e pelos desdobramentos da guerra comercial decretada pelo presidente Donald Trump.

Juros altos a perder de vista - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Banco Central leva Selic a 14,75%, fala ainda mais de incerteza e de risco para inflação

Nos últimos dois meses, disseminou-se a tese de que o Banco Central poderia deixar a Selic abaixo de 14,75% –no início do ano, se discutia se taxa básica chegaria perto de 16%. Qual a ideia? A economia do mundo perderia ritmo, preços de commodities cairiam, o dólar ficaria bem-comportado, graças em parte a Donald Trump.

"Então". No comunicado em que anunciou a Selic em 14,75%, o BC não deu sinal de que vá encerrar a campanha de alta de juros. Não deu pista do que vai fazer. Disse que a incerteza é maior, assunto a que destinou trechos extensos do texto, que aliás ficou bem parecido com o do Fed, BC dos EUA.

Logo, é possível mais um aumento de 0,25 ponto percentual, com Selic a 15%. O BC vai tatear no escuro sob céu turvo. Houve ligeiro indício de que Selic vá ficar alta por tempo mais prolongado, caindo talvez só passado o primeiro trimestre de 2026.

Jurista público não leiloa opinião jurídica - Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

Constituição brasileira tem o privilégio de José Afonso da Silva, 100 anos

Jurista público não é produto num livre mercado. Não é vedete nem lobista, não dedica tempo à adulação de autoridade. Não vai a encontros nem subscreve atos disparadores de conflitos de interesse. Não só porque recusa o oba-oba da bajulação gratuita, mas porque entende e respeita a ética da profissão. Sabe que o problema não desaparece quando a promiscuidade se normaliza.

Jurista público não aceita vender opinião jurídica da qual discorda, não oferece consultoria jurídica para o fim da democracia e não se deixa envolver em festivais juspornográficos contra a dignidade da profissão. Não aceita oferta para mudar de lado e não negocia valores políticos ou monetários.

Entende que elaborar argumento jurídico exige tanto fibra intelectual quanto independência moral. Sabe que a profissão jurídica privada precisa enfrentar a tensão incontornável entre o interesse particular em honorários e o compromisso sincero com a democracia constitucional e o interesse público. E que a carreira jurídica estatal obedece a tetos, não só éticos, mas remuneratórios.

Poesia | Nem sempre sou Igual, de Fernando Pessoa

 

Música | Carlos Lyra - E era Copacabana