domingo, 8 de junho de 2025

Opinião do dia – Antonio Gramsci* (a força das ideias)

“O homem ativo de massa atua praticamente, mas não tem uma clara consciência teórica desta sua ação, a qual, não obstante, é um conhecimento do mundo na medida em que o transforma. Pode ocorrer, aliás, que sua consciência teórica esteja historicamente em contradição com o seu agir. É quase possível dizer que ele tem duas consciências teóricas (ou uma consciência contraditória): uma, implícita na sua ação, e que realmente o une a todos os seus colaboradores na transformação prática da realidade; e outra, superficialmente explícita ou verbal, que ele herdou do passado e acolheu sem crítica. Todavia, esta concepção “verbal” não é inconsequente: ela liga a um grupo social determinado, influi sobre a conduta moral, sobre a direção da vontade, de uma maneira mais ou menos intensa, que pode até mesmo atingir um ponto no qual a contraditoriedade da consciência não permita nenhuma ação, nenhuma escolha e produza um estado de passividade moral e política. A compreensão crítica de si mesmo é obtida, portanto, através de uma luta de “hegemonias” políticas, de direções contrastantes, primeiro no campo da ética, depois no da política, atingindo, finalmente, uma elaboração superior da própria concepção do real. A consciência de fazer parte de uma determinada força hegemônica (isto é, a consciência política) é a primeira fase de uma ulterior e progressiva autoconsciência, na qual teoria e prática finalmente se unificam.”

*Antonio Gramsci (1891-1937). Cadernos do Cárcere, v.1. p. 103. Civilização Brasileira, 2006.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Momento é propício para acordo Mercosul-EU

O Globo

Com Trump na Casa Branca, europeus têm argumento persuasivo para convencer setores resistentes

Em tempos de instabilidade no comércio mundial, o encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron em Paris deveria dar impulso à ratificação do acordo entre o Mercosul e a União Europeia (UE). Finalizado em dezembro de 2024, o texto precisa ser aprovado pelos Estados envolvidos. A entrada em vigor do acordo seria a melhor resposta ao protecionismo do presidente americano Donald Trump. Exportadores europeus e do Mercosul teriam a chance mútua de explorar novos mercados em momento que o maior do mundo fecha suas portas. Diante de incertezas crescentes, os dois blocos têm condição de sedimentar uma parceria estratégica que demonstre o valor não apenas econômico, mas também estratégico do livre-comércio.

A negociação do acordo teve início em 1999. Já na largada, ele foi alvo de ataques de lobbies em ambos os lados. Na América do Sul, os protecionistas temiam a competição da poderosa indústria europeia. Na UE, os principais opositores foram os agricultores, em especial os franceses, receosos da competitividade do agronegócio em países como Brasil, Argentina e Paraguai.

Partidos revigorados - Merval Pereira

O Globo

As reformas de 2017 já proporcionaram efeitos virtuosos para o sistema partidário, diminuindo a hiper fragmentação (hoje o número de partidos efetivos é o mesmo que existia durante o governo Fernando Henrique Cardoso, 9, avaliam) e aumentando a disciplina interna

Há luz no fim do túnel. O cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas no Rio, considera questionável a tibieza dos partidos políticos brasileiros, que venho criticando, como uma das causas do empobrecimento de nossa democracia. Em pesquisa sobre os impactos das reformas na legislação eleitoral e partidária de 2017, com a criação do fundo eleitoral, o fim das coligações nas eleições proporcionais e a cláusula progressiva de desempenho, que desenvolve em colaboração com Matheus Cunha, cientista político da Universidade Federal de Pernambuco, procura demonstrar que não apenas a fragmentação partidária “diminuiu drasticamente”, como também a lealdade e disciplina partidárias “aumentaram vertiginosamente”.

Desafio intelectual na política é romper o dogmatismo e a intolerância - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Nossos intelectuais estão apartados da política ou aderiram à intolerância ideológica; é preciso repensar seriamente o Brasil na nova ordem mundial e oferecer um rumo às elites política e econômica

Em quase todos os momentos importantes da história do Brasil, alguns intelectuais se destacaram pelo esforço de produzir uma síntese da realidade do país e inspiraram as suas respectivas gerações a levarem adiante um projeto de nação. Não foi pouca coisa, num país no qual a primeira universidade foi criada apenas em 1920, a Universidade do Rio de Janeiro (com a união da Escola Politécnica à Escola de Medicina e à Faculdade de Direito), pela necessidade de conceder o título de doutor honoris causa ao rei Alberto I da Bélgica.

Fazem parte dessa constelação, entre outros, Sérgio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil –1936), com seu estudo sobre a formação do caráter nacional; Gilberto Freyre (Casa-Grande & Senzala –1933); Caio Prado Júnior (Formação do Brasil Contemporâneo -1942); Celso Furtado (Formação Econômica do Brasil –1959); Raymundo Faoro (Os Donos do Poder -1958); e Nelson Werneck Sodré (História da Burguesia Brasileira – 1964).

Petra Costa e seu Apocalipse nos Trópicos - Elio Gaspari

O Globo

A cineasta Petra Costa, autora do celebrado “Democracia em Vertigem”, concluiu seu novo filme. Chama-se “Apocalipse nos Trópicos” e trata do crescimento das igrejas evangélicas, desembocando no bolsonarismo, para deslizar na derrota eleitoral de 2023 e nas cenas do 8 de janeiro. O Brasil passou por momentos apocalípticos e vai bem, obrigado. O longa-metragem estreia no Rio e em São Paulo no dia 3 de julho.

No mesmo estilo contido de seu filme anterior. Petra relembrou dias que hoje parecem esquecidos e estão encapsulados em volumes de processos sobre as tramas golpistas de 2023/2024. Neles, projetos apocalípticos como o Plano Punhal Verde Amarelo, acabam reduzidos a fanfarronadas de generais palacianos. Com a colaboração de Anna Virginia Balloussier, foram entrevistados líderes evangélicos, como o pastor Silas Malafaia.

Notícias de uma guerra particular - Bernardo Mello Franco

O Globo

Ególatras, presidente e empresário usam suas próprias redes para trocar insultos e ameaças

O Salão Oval ficou pequeno demais para Donald Trump e Elon Musk. O presidente do país mais poderoso do mundo e o homem mais rico do planeta pareciam inseparáveis. Agora se tornaram inimigos viscerais, que trocam insultos e ameaças em público.

A aliança trincou no fim de maio, quando Musk começou a criticar o novo plano de gastos da Casa Branca. O mal-estar virou barraco nesta quinta-feira, após Trump sugerir que o dono da Tesla ficou irritado porque ele cortou o subsídio aos carros elétricos.

“Estou muito decepcionado com o Elon. Eu o ajudei muito”, afirmou o republicano. “Sem mim, Trump teria perdido a eleição. Que ingratidão”, devolveu Musk.

Tapas e beijos – Dorrit Harazim

O Globo

Trump e Musk têm estatura comparável. Quem destruir o adversário destruirá a si também

Seria um pastelão de garotos mimados fossem outros os protagonistas, outras as armas. Mas a espetaculosa pancadaria de quinta-feira opôs o ego e o poder do presidente dos Estados UnidosDonald Trump, ao ego e ao poder do titã bilionário Elon Musk. Coisa grande, portanto. Tratando-se de dois espécimens doentiamente fissurados pelo próprio umbigo, o rompimento vinha sendo dado como inevitável desde a meteórica junção das duas grifes. O que ninguém previu, porém, foi a vertiginosa sucessão de golpes. De parte a parte foi uma erupção dos demônios que hibernam em cada um. Não houve nocaute, nem poderia haver. Trump e Musk têm estatura (física até) comparável. Quem destruir o adversário destruirá a si também.

O domínio sobre os privilégios do poder – Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Musk acreditou que todos os seus interesses seriam atendidos pelo governo

Os bastidores do rompimento entre Donald Trump e Elon Musk são material para estudo de caso das armadilhas por trás do desmonte do Estado e da deslegitimação das instituições. As críticas de Musk agravam os temores acerca da política econômica de Trump e dividem o eleitorado conservador.

Antes de entregar a chave de ouro da Casa Branca a Musk, na sua despedida do governo, dia 30, Trump recebeu um dossiê que mostrava que Jared Isaacson, indicado pelo dono da Space-X para administrar a Nasa, foi doador de campanhas democratas.

Tanto Trump quanto Musk fizeram doações para campanhas democratas no passado. Mesmo assim, Trump chamou Musk e disse que não ia nomear Isaacson, bilionário amigo dele, cuja empresa Draken faz serviços de treinamento para as forças armadas americanas.

O apagão logístico dos Correios – Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Os Correios passam por rápido processo de sucateamento patrimonial e operacional. Seu último balanço acusou prejuízo líquido de R$ 1,7 bilhão apenas no primeiro trimestre deste ano e patrimônio negativo de R$ 6,1 bilhões. É o maior rombo entre as estatais federais.

Seus dirigentes acionaram a velha maquininha de lenga-lengas para tentar explicar um desastre que não vem de anteontem. Põem a culpa na “taxação da blusinhas”, o imposto de importação de pequenas encomendas de até US$ 50. E ainda se queixam da queda brutal na entrega de correspondências, produzida pela mudança de hábitos: ninguém mais manda cartas nem despacha telegramas pelo correio; prefere usar o e-mail ou, então, o WhatsApp. Até mesmo a remessa de boletos é feita digitalmente. Estamos diante de uma reviravolta estrutural desse segmento que deveria ter empurrado os Correios para a modernidade – e não para um apagão patrimonial e logístico.

Falta planejamento e sobra desperdício - Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

O governo tende a funcionar, no dia a dia, como se a noção de planejamento embutisse apenas um jogo verbal

Com vento a favor, proteção dos anjos e algum empenho do empresariado, a economia brasileira poderá crescer pouco mais de 2% neste ano – 2,4%, segundo estimativa oficial – e sobre isso nem vale a pena especular, segundo a sabedoria da Roma antiga. “Carpe diem, quam minimum credula postero”, aconselhou o poeta Horácio em sua ode a Leuconoe. Algo como: aproveita o dia de hoje, porque pouquíssimo podes confiar no amanhã. Mas até na antiguidade havia algum planejamento, como indica, por exemplo, o desenho das cidades, ou como se observa na organização militar, nas fortificações, na distribuição populacional e na estocagem de alimentos. Coisas do passado?

China e EUA x minerais 'raros' - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Falta de terras-raras chinesas poderia parar montadoras americanas e pioraram crise entre os dois países

Desde maio, fábricas de autopeças e veículos americanas dizem ao governo deles e a jornais que estão à beira de interromper a produção por falta de terras-raras, 17 elementos químicos importantes para a produção de peças e aparelhos eletrônicos e elétricos e muito mais. Europeus também se queixam da escassez.

No final de maio, Donald Trump foi à sua rede social dizer que os chineses barravam exportações de terras-raras e, assim, descumpriam a trégua de Genebra. Nessa cidade suíça, em 12 de maio, chineses e americanos haviam acertado a suspensão de 90 dias na guerra comercial, a fim de negociar acordo maior.

Cansaço de bonitões e valentões - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Pesquisa mostra brasileiros fartos da velha cantilena repetitiva e narcísica de Lula e Bolsonaro

O presidente da República aparece cercado de adversários por todos os lados na última pesquisa Quaest/Genial que projeta cenários para 2026. Empata com a maioria, fica pouco à frente de uns dois menos votados e, no juízo de 66% dos consultados, não deveria se candidatar à reeleição.

Situação difícil, definitiva até não fosse o imponderável um personagem presente e atuante na política. O Luiz Inácio da Silva (PT) apontado na pesquisa é diferente daquele que olha para si e vê um "bonitão" escolhido pelo divino para ser a redenção do Nordeste e a salvação da pátria.

Vinte anos do mensalão - Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Mas o que aconteceu com os partidos de direita que o PT, segundo Jefferson, comprava?

Há vinte anos, o então deputado Roberto Jefferson deu entrevista a esta Folha denunciando o mensalão. Segundo Jefferson, o governo Lula estaria pagando uma mesada para parlamentares que votassem a favor de suas propostas no Congresso.

escândalo que se seguiu modificou profundamente a política brasileira, mas a maior parte do público ainda não percebeu seus desdobramentos.

Em seu livro "Nervos de Aço" (Record, 2006), Jefferson deu mais detalhes sobre o que estava denunciando. Nos governos de direita, partidos como o PTB recebiam ministérios ou a chefia de órgãos públicos e ali cobravam suborno ("caixa dois") das empresas que faziam negócios com a administração pública.

Brasilidade é apelo forte à nação - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Às elites cevadas no usufruto patrimonialista do Estado não importa o que mudou em termos de classes

Em meio à impressão desoladora de que o país possa estar perdendo o trem da história por decomposição de um Estado cansado, carente de profunda transformação subjetiva e objetiva, a dinâmica nacional revela-se animadora. São fatos de superestrutura, despercebidos nas análises de macroestrutura, eventualmente corretas, mas alheias à rica totalidade do ser social, que inclui criatividade de formas de vida e de formatividade estética.

Pelo menos é o que acorre à mente depois de assistir ao espetáculo extraordinário de João Bosco e seu quarteto, em que se reaviva o sentimento de brasilidade, invocado por Machado de Assis no século 19. Nada do nacionalismo fechado das autocracias, mas comunhão afetiva com o território. Antes, as performances de Chico, Gil, Caetano e Betânia nos palcos já pareciam ultrapassar a categoria show de entretenimento para se configurarem como convocações à partilha da alegria coletiva que ajuda a definir brasilidade. Ao mesmo tempo, filmes como "Ainda Estou Aqui", "O Agente Secreto" e "Malês" renovam a projeção do cinema nacional.

Crimes na rua Londres - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Livro esmiúça história da prisão e posterior soltura de ditador chileno Augusto Pinochet em passagem por Londres

Philippe Sands é um autor extraordinário. Ele pega temas áridos e potencialmente aborrecidos, como o direito internacional, os ilustra com histórias cujo fim todos já sabemos, como a prisão e posterior soltura do ditador chileno Augusto Pinochet em passagem por Londres, e consegue transformar isso num livro que lemos com a mesma avidez com que se devoram novelas de detetives.

Em parte, Sands consegue esse efeito porque de fato faz um trabalho de detetive. Ele vai fundo em suas pesquisas, descobrindo personagens secundários que vão revelando novas facetas, às vezes inesperadas, da trama principal. E ele confere gravidade humana e densidade dramática a esses personagens.

Presidente Lula conversa com a imprensa em Paris

 

Crônica | Peladas, de Armando Nogueira

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Música | Alceu Valença - Coração Bobo