quarta-feira, 20 de novembro de 2024

O barulho dos ausentes - Bernardo Mello Franco

O Globo

Donald Trump e Vladimir Putin não saíram na foto diante do Pão de Açúcar nem provaram as caipirinhas oferecidas aos líderes globais no Museu de Arte Moderna. Mesmo assim, encontraram suas maneiras de tumultuar a reunião do G20 no Rio.

O presidente da Rússia cancelou a viagem por um motivo singelo: poderia ir em cana se pisasse em solo brasileiro. Putin é alvo de mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional. Para evitar uma surpresa indesejada, preferiu ficar em Moscou.

Apesar da distância de 11 mil quilômetros, o mandachuva do Kremlin se fez notar no Parque do Flamengo. Às vésperas do encontro, autorizou um bombardeio a centrais elétricas da Ucrânia. A ofensiva irritou países europeus e quase melou a declaração conjunta do G20.

Imigrantes e patriotas – Roberto DaMatta

O Globo

O estrangeiro não é apenas um intruso ilegal. Ele é um intrometido que idealiza e admira o país que o acolhe

Espanta-me o signo-lema que elegeu Donald Trump. O mote isolacionista e literalmente reacionário “Make America Great Again” (Torne a América grande novamente) — um slogan agressivo, explicitamente nacionalista e exclusivista no melhor estilo autocrático. O Maga (na sigla em inglês) de Trump é, sem sombra de dúvida, o primeiro degrau de um neofascismo cujo sintoma é a cruel deportação em massa de imigrantes “ilegais”. Como se fosse “legal” largar nosso lugar de nascimento — a terra por onde entramos como atores passageiros neste terrivelmente maravilhoso Vale de Lágrimas. Este vale que a ideologia trumpista quer transformar num inferno, pois imigrar é um movimento dramático, que suplanta escolhas turísticas.

O fantasma da guerra está no ar – Elio Gaspari

O Globo

Discursando no G20, Lula foi genérico:

— Não é preciso esperar uma nova guerra mundial ou um colapso econômico para promover as transformações de que a ordem internacional necessita.

Há duas semanas, o jornalista americano George Will foi específico em sua coluna no Washington Post:

— A Terceira Guerra Mundial já começou.

Will é um veterano conservador, independente e erudito. Ele lembra que a Segunda Guerra começou cronologicamente em setembro de 1939, com a invasão da Polônia pela Alemanha, depois de uma “cascata de crises”.

Àquela altura, o Japão já havia ocupado a Manchúria (1931). Some-se a isso que o Terceiro Reich já havia engolido a Áustria (março de 1938) e um pedaço da Tchecoslováquia (dezembro de 1938). A Itália atacou a Abissínia em 1935 e invadiu a Albânia em abril de 1939.

Custos e benefícios da reforma tributária - Lu Aiko Otta

Valor Econômico

Primeiro boleto da reforma tributária já vai chegar no ano que vem

Os efeitos mais visíveis da reforma tributária sobre a economia brasileira ainda vão demorar a aparecer, mas o primeiro boleto já chegou. No ano que vem, a União terá de aportar cerca de R$ 9 bilhões no Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, criado para viabilizar o fim da “guerra fiscal”. Será o primeiro pagamento para um conjunto de quatro novos fundos, numa conta que ultrapassará a marca de R$ 1 trilhão nos próximos 20 anos. É muito? Pode não ser, se forem levados em consideração os ganhos esperados na arrecadação a partir das mudanças.

Os R$ 9 bilhões deveriam estar previstos no Orçamento de 2025, que está em análise no Congresso. Mas não estão. Além disso, os projetos de lei que vão regular o funcionamento dos fundos ainda nem foram enviados ao Legislativo.

O cerco se fecha - Vera Magalhães

O Globo

Apurações sobre plano para matar autoridades se aproximam um pouco mais a cada etapa de nomes do círculo mais próximo do ex-presidente, como Braga Netto e Augusto Heleno

Se, na semana passada, o ataque de um extremista à Praça dos Três Poderes foi o ato tresloucado que explodiu as conversas para uma anistia aos golpistas do 8 de Janeiro, as revelações estarrecedoras desta terça-feira sepultam qualquer tentativa de minimizar as tentativas de supressão da democracia naquele dia e nos meses que o antecederam. Os subordinados diretos de Jair Bolsonaro urdiram o assassinato de autoridades de primeiro escalão da República para manter o ex-capitão no poder.

A gravidade do que se tem até aqui é inaudita. Mas, como as investigações insistem em demonstrar, não é possível assegurar que tenhamos chegado a todos os fatos e a todos os envolvidos na trama. Os novos depoimentos do tenente-coronel Mauro Cid — personagem que permitiu que se desenrolasse o fio da meada da tentativa de melar a eleição e empastelar a democracia — e também dos cinco presos ontem mostrarão quem mais estava no plano, a mando de quem e com que grau de anuência e deliberação de Bolsonaro e de seus ministros mais próximos.

Efeitos colaterais da Operação Contragolpe - Fernando Exman

Valor Econômico

Detalhes da trama golpista emergiram quando os principais líderes do mundo ainda estavam reunidos no Rio de Janeiro para o último dia da cúpula do G20

Deflagrada nas primeiras horas dessa terça-feira (19) pela Polícia Federal, a Operação Contragolpe tem a implicação prática e imediata, que converge com os interesses do Ministério da Defesa, de dar mais um passo na direção de separar os CPFs dos militares supostamente envolvidos na trama golpista dos CNPJs das Forças Armadas. Mas ela tem efeitos colaterais que não devem ser desprezados.

Não foi algo corriqueiro. A operação revelou uma estratégia para matar em 2022 o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Quatro militares do Exército foram presos por envolvimento na trama, além de um agente da própria PF.

Criou-se um constrangimento para os militares, em meio às discussões conclusivas sobre o pacote que será adotado pelo governo para controlar as despesas públicas.

Preparação do golpe foi do envenenamento ao atentado de táxi - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Elo entre o Planalto e os acampamentos, general Mario Fernandes coloca Bolsonaro dentro do 8/1

Os autos da Operação Contragolpe, deflagrada pela Polícia Federal na terça, relatam a preparação de um golpe de Estado dentro do Palácio do Planalto em atos que vão da ousadia do envenenamento de um presidente eleito ao amadorismo de um atentado contra ministro do Supremo Tribunal Federal por um agente que se deslocava de táxi.

O eixo da operação é o general de brigada Mario Fernandes. A recuperação de seus diálogos e das planilhas do golpe que lhe foram atribuídas mostra a degradação a que chegou o Exército nos anos que precederam a chegada do ex-presidente Jair Bolsonaro ao poder. O descompromisso com a institucionalidade foi de um oficial que comandou o batalhão de Operações Especiais, um grupo de elite do Exército, destinado a missões de alto risco.

‘Quatro linhas da Constituição é o cacete’ - Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Militares golpistas queriam acabar com o Alto-Comando do Exército por sua oposição à ruptura

A história do golpe bolsonarista ganhou uma nova face: a das mensagens entre o general Mário Fernandes e o coronel Reginaldo Vieira de Abreu, seu chefe de gabinete. Elas mostram detalhes cruciais para entender a empreitada, como a resistência do Alto-Comando do Exército.

Vieira escreveu a Fernandes, em 19 de dezembro de 2022: “Cinco (generais) não querem, três querem muito e os outros, zona de conforto. É isso. Infelizmente”. Ambos reclamavam do Alto-Comando do Exército (ACE). Queriam mudar a forma como as decisões são tomadas no colegiado, estabelecer uma chefia de Estado-Maior Conjunto, como nos EUA, e acabar com o ACE. “A lição que a gente deu para a esquerda é que o Alto-Comando tem que acabar. Se cria um general de cinco estrelas (...), mexe na promoção dos generais e só se promove, nos próximos oito anos, só um general quatro estrelas. Aí acaba essa palhaçada de unanimidade.”

Plano era matar Lula, Alckmin e Moraes – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

As evidências colhidas por STF e PF apontam que segundo documento-chave do plano, intitulado "Punhal Verde Amarelo", foi elaborado pelo general Mario Fernandes

O plano para matar o presidente Luiz Inácio lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, revelado, nesta terça-feira, pela Polícia Federal (PF), roubou a cena do último dia de reunião do G20 e tornou-se o principal assunto político de Brasília. As investigações mostram que havia, sim, um plano golpista, que seria iniciado no dia 15 de dezembro de 2022, com o sequestro e/ou assassinato de Moraes, mas foi abortado em razão de um imprevisto: a suspensão da sessão do Supremo marcada para aquele dia.

O plano para envenenar ou executor o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e assassinar o vice Geraldo Alckmin com objetivo de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder, foi descoberto com recuperação de mensagens do celular do tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens da Presidência da República. A localização dos contatos incrimina também o ex-ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, general de quatro estrelas, que foi escolhido como candidato a vice na chapa de Bolsonaro e era um dos chefes do grupo que pretendia impedir a posse de Lula. Uma das reuniões para traçar o plano, segundo a PF, teria sido realizada na casa do militar.

O Congresso e o golpe de Bolsonaro – Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Parlamentares vão continuar cozinhando projeto de anistia de ex-presidente?

ataque terrorista da semana passada teria "enterrado" as tentativas de dar cabo do plano de anistia de Jair Bolsonaro e de quem atacou as sedes dos Poderes no 8 de Janeiro —o movimento maior mesmo é de livrar Bolsonaro, da inegibilidade e do inquérito do golpe.

Talvez não enterrasse. Sem novidades, com o passar dos meses e a depender dos acordões do Congresso, sempre se pode tentar dar um jeito. O acordão de enterro da Lava Jato levou meia dúzia de anos para dar certo, de resto com a colaboração da repulsiva República de Curitiba.

Nesta terça-feira (19), o acordão para livrar a cara de Bolsonaro e comparsas levou mais um tombo. Segundo a PF, a gangue de militares do golpe planejava assassinar a cúpula da República e organizava parte da coisa sob as barbas do general Braga Netto, braço forte de Bolsonaro.

DNA militar do golpe de Bolsonaro dificulta vida da Defesa - Igor Gielow

Folha de S. Paulo

Ação da PF ocorre em meio à pressão por cortes, que atiçam antipetistas da ativa

A operação da PF que revelou o indiscutível DNA militar da trama urdida para tentar manter Jair Bolsonaro (PL) no poder no fim de 2022, incluindo ali nada menos que execuções de autoridades, atinge a área da Defesa em um momento delicado.

O ministro José Múcio está tentando driblar a demanda da Fazenda pelo ingresso da pasta no pacote de corte de gastos, e foi pressionado pelo colega Fernando Haddad, que disse que só falta a parte dos fardados para fechar a conta.

Não que uma coisa tenha a ver com a outra, é óbvio, mas no caldo de difícil cozimento que é a relação Lula-militares, tudo se retroalimenta.

Plano do golpe vestia farda dos pés à cabeça - Bruno Boghossian

Folha de S. Paulo

Preparativos de ruptura e instalação de regime de exceção foram uma operação essencialmente militar

O planejamento de um golpe para manter Jair Bolsonaro no cargo foi uma operação essencialmente militar. Integrantes das Forças Armadas fizeram preparativos para anular as eleições, sequestrar autoridades e assassinar o futuro presidente. Armaram a instalação de um regime de exceção que seria controlado pelos generais que haviam patrocinado a ascensão do capitão em 2018.

As investigações reveladas nesta terça (19) são mais uma prova de que o envolvimento de militares na trama do golpe jamais foi um fato isolado. O plano tinha a participação de integrantes das Forças Especiais do Exército. As ideias eram discutidas com generais influentes e foram levadas para dentro do Palácio da Alvorada.

Bolsonaro acabou? - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Revelações sobre trama golpista pioram situação política de ex-presidente

O tempo fechou para Jair Bolsonaro e seus acólitos. As novas revelações sobre a trama golpista mostram que o movimento avançou bem mais do que se imaginava, estava muito mais próximo do Alvorada do que se supunha e tinha características bem mais radicais também, tendo chegado a arquitetar os assassinatos de Lula, Alckmin e Moraes.

Haverá consequências em três planos, o político, o jurídico e o institucional. Na esfera política Bolsonaro já foi atingido. Não digo que está liquidado, porque em política nada é tão definitivo (vide Trump), mas acho que a partir de agora será muito difícil que ele consiga apoio para uma anistia.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Operação contra golpistas contribui para a democracia

O Globo

PF aponta vínculo entre militares de alta patente e plano para assassinar Lula, Alckmin e Moraes

São extremamente graves os fatos narrados pela Polícia Federal na investigação do plano de militares das Forças Especiais do Exército (apelidados “kids pretos”) para matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, depois da vitória de Lula sobre Jair Bolsonaro em 2022.

Foram presos pela PF quatro militares de alta patente e um policial federal. A prisão do general da reserva Mário Fernandes, secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência no governo Bolsonaro, leva as investigações à antessala da Presidência da República. Fernandes foi ministro interino e, diz a PF, imprimiu dentro do gabinete da Secretaria no Planalto um documento com o sugestivo nome Punhal Verde Amarelo, em que se tramava envenenar Lula e Alckmin.

Poesia | A uma mulher que passa, de Charles Baudelaire

 

Música | Paulinho da Viola - Dança da Solidão

 

terça-feira, 19 de novembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lei Antiterrorismo deveria incluir motivação política

O Globo

Omissão, resultado de pressão de movimentos sociais, torna legislação mais branda com a barbárie

Investigações sobre o atentado na Praça dos Três Poderes na semana passada mostram que o autor premeditou meticulosamente suas ações. Saiu de Rio do Sul (SC), alugou uma quitinete onde foram encontrados explosivos, instalou um trailer perto das sedes dos Poderes, comprou fogos de artifício, anunciou nas redes sociais seu intuito e se explodiu na frente do prédio do Supremo Tribunal Federal. Em suas redes, foram encontradas críticas ao Supremo, aos presidentes da República, da Câmara e do Senado. Foi um ato com todas as características de terrorismo. Mas não para a legislação brasileira.

O diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirma que não há respaldo jurídico para enquadrar o caso como ato terrorista. Isso porque a Lei Antiterrorismo não prevê motivação política ou ideológica. Aprovada pouco antes da Olimpíada do Rio em 2016, ela define terrorismo como prática que visa a atingir um grupo em razão do preconceito de raça, etnia, cor, religião ou xenofobia. “Não se aplica a conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe, ou de categoria profissional, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais”, diz o texto.

O mundo multipolar das potências médias - Dani Rodrik*

Valor Econômico

Cenário mais provável é um mundo em que as potências médias exerçam uma força compensatória considerável, impedindo assim que EUA e China imponham seus interesses aos outros

A ascensão da China desafiou a hegemonia incontestável dos Estados Unidos sobre a economia mundial - status do qual os EUA desfrutam desde o colapso da União Soviética. Enquanto algumas elites americanas de segurança nacional buscam manter a primazia dos EUA, outras parecem resignadas a um mundo cada vez mais bipolar. Um resultado mais provável, no entanto, é um mundo multipolar em que as potências médias exerçam uma força compensatória considerável, impedindo assim que EUA e China imponham seus interesses aos outros.

As potências médias incluem a Índia, a Indonésia, o Brasil, a África do Sul, a Turquia e a Nigéria - todas grandes economias com presença significativa na economia global ou em suas regiões. Elas estão longe de ser ricas - na verdade, representam uma parcela significativa das pessoas mais pobres do mundo -, mas também têm classes médias grandes e voltadas para o consumo e capacidades tecnológicas consideráveis. O PIB combinado (em termos ajustados pelo poder de compra) dos seis países mencionados acima já supera o dos EUA e a projeção é de que cresça 50% até 2029.

‘O mundo está pior’? - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Mesmo envolvendo o combate à fome, tema impossível de divergir, cenário internacional é desafiador

O presidente Lula, presidindo a cúpula do G20 num maravilhoso dia de sol no Rio de Janeiro e com a presença dos principais líderes mundiais, inaugura uma nova aliança global de combate à fome. Uma notícia assim, 20 anos atrás, seria a consagração máxima de um líder que ruma para a apoteose.

Neste fim de 2024, no entanto, o sentimento é outro. Apesar do dia de sol, o clima é sombrio. Foi o próprio Lula que, com muito realismo, reconheceu em seu discurso de abertura: "Estive na primeira reunião de líderes do G20, convocada em Washington no contexto da crise financeira de 2008. Dezesseis anos depois, constato com tristeza que o mundo está pior."

E por que piorou? Em primeiro lugar, porque está mais dividido. Isso faz com que seja difícil chegar a consensos sobre qualquer tema. Como falar algo relevante sobre guerras num grupo que reúne RússiaChinaEUA Europa? Melhor manter apenas um genérico apelo pela paz. Lula tem o mérito de abraçar um dos poucos temas dos quais (ainda) é impossível divergir: o combate à fome.

Salvando o mundo num feriadão - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Com sensação temporária de segurança no feriadão, cúpula internacional discute taxação dos super-ricos

O esquema em vigor no G20, com policiais estaduais e federais e tropas das Forças Armadas, foi usado pela primeira vez na Eco-92. Na época pareceu uma panaceia. Com blindados, metralhadoras e lança-morteiros apontados para a Rocinha, o carioca jamais havia desfrutado de maior sensação de segurança –expressão que virou lugar-comum na imprensa e na boca de políticos.

Depois se verificou que os registros de violência caíram na zona sul e permaneceram altos no resto da cidade. No fundo era só uma sensação regional e com prazo de validade, a qual se repete agora. Se bobear, nem isso: dois carros a serviço da Presidência foram roubados, um na quinta (14), outro no sábado (16). Foi mais ou menos assim na Rio+20, em 2012; na Jornada Mundial da Juventude, em 2013; na Copa do Mundo, em 2014; nas Olimpíadas, em 2016.

Ditos e feitos de Janja - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Atitudes de quem não tem cargo público podem, por vínculos familiares, atrapalhar ações de um governo

Rosângela Lula da Silva, a Janja, soltou um f**k you para Elon Musk, criando uma dor de cabeça para o Itamaraty. O próprio Lula, que tenta driblar vários touros ao mesmo tempo nas negociações para a declaração final do G20, teve de vir a público para pedir que ninguém xingue ninguém.

Estou terminando de ler "O Mundo", de Simon Sebag Montefiori, livro ao qual ainda dedicarei uma coluna. O autor mostra com muitos exemplos que um ponto fraco dos regimes hereditários é a variação geracional. O filho de um grande monarca pode ser e frequentemente é um completo imbecil (casamentos consanguíneos ampliam essa possibilidade).Mesmo quando o contraste não é tão gritante, um bom governante pode ter como herdeiro um sujeito sem gosto ou aptidão para o poder. Sistemas políticos em que o líder é escolhido por um seletorado estão menos sujeitos aos caprichos da loteria cósmica. E quanto mais amplos o seletorado e o rol dos candidatos, menores as chances de interesses individuais, familiares ou setoriais darem as cartas.

Descontração tem limite – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Janja ainda encarna o papel de militante que não condiz com sua atual posição

A informalidade em figuras públicas pode ser um ativo, fator de identificação popular, se bem aplicada. Ou pode deslizar para o terreno da inconveniência quando seus autores não observam os limites da compostura adequada ao lugar que ocupam.

Tem sido o caso de repetidos excessos da mulher do presidente Luiz Inácio da Silva (PT) em situações oficiais. Rosângela da Silva demonstra não ter desencarnado do papel de militante de esquerda do qual precisaria se desvincular antes de criar um problema mais sério para o governo e ao país.

Pragmatismo tomou posse antes de Trump - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Lula e Milei produzem frieza para as redes sociais e acordos para os interesses nacionais

Ao subir a rampa do Museu de Arte Moderna no Rio para ser recebido pelo anfitrião, o presidente argentino protagonizou a troca de cumprimentos mais fria da abertura do G20. Nos 20 segundos em que durou a cena, coube apenas um aperto de mão e uma foto sem sorrisos dos quatro, Javier Milei e a irmã, Karina, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a primeira-dama, Janja da Silva. Contrastou com os demais chefes de Estado. Joe Biden posou de mãos dadas com Lula e Emmanuel Macron deu até uma corridinha na rampa para abraçar o presidente brasileiro. Foi uma frieza moldada para as redes. Milei não apenas assinou tudo o que o Brasil queria como ainda fechou um acordo que Lula não conseguiu arrancar de Alberto Fernandez.

Ufa! A diplomacia venceu – Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

G-20 e Aliança Global contra a Fome e a Pobreza são ‘gol de placa’ do Brasil

Depois de escorregões na política externa e apesar do voluntarismo juvenil da primeira-dama Janja, a cúpula do G-20, que reúne as maiores economias do mundo, e a criação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que nasce com adesão de 82 países, estão sendo um grande momento e uma vitória do Brasil, portanto, do governo e de Lula.

“A Aliança Global e a própria Cúpula são um gol de placa do Brasil”, comemorou o embaixador aposentado Rubens Barbosa, que nunca foi identificado com o PT e o lulismo, mas, sim, como um diplomata profissional e pragmático, que foi embaixador em Washington no governo FHC. O mérito do gol é do Itamaraty, mas é preciso reconhecer o empenho e a habilidade política do presidente.

O pacote quase-lá - Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Falta pouco. Mais um detalhezinho. Mais um mais um detalhezinho. E então será. “Brevemente”, comunica Fernando Haddad, teremos o pacote de corte de gastos estruturais do governo Lula. Uma resposta ao aumento estrutural de gastos que o governo Lula acelerou. Estamos quase lá.

Evoluiu-se. Faltavam “dois detalhes” em 6 de novembro, “coisas realmente muito singelas para decidir” – projetava Haddad. Tinham se encerrado as conversas com os ministros, aquelas das quais saíam disparando, e havia “consenso em torno de um princípio”.

Minha primeira anotação sobre o plano para essa nova rodada de contenção de despesas é de 15 de outubro. Viria depois do segundo turno das eleições municipais. Seria um “pacote relevante”. Simone Tebet definira até a faixa dentro da qual transitaria o corte, entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões – em 2025.

Estava em curso uma blitz de propaganda para acalmar os fazedores de preços. Anunciava-se o anúncio – com o que se esperava segurar o dólar. Negativo.

No dia 17 de outubro, anotei a curiosidade de Lula ser simpático, assim se plantava, a um conjunto de medidas que – estava dito – desconhecia. Não poderia conhecer o que (ainda) inexistia.

O futuro e a Ordem dos Advogados do Brasil - Luiz Antonio Sampaio Gouveia

O Estado de S. Paulo

A OAB deve impor-se em prol da cidadania, do Estado de Direito e da liberdade, porque ela não pode ser uma ONG, um clube de serviços ou um sindicato

Advocacia dever-se-ia grafar com “a” maiúsculo por ser uma instituição constitucional, essencial à concretização da justiça. Equivocam-se os que a redigem com “a” minúsculo porque diminuem sua expressão simbólica no quadro em que concorre para efetivação da Constituição com instituições públicas, como a magistratura, o Ministério Público e a Defensoria Pública, e a reflexão que se pode extrair desse contexto é própria do momento em que se realizam eleições para os quadros dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

As primeiras instituições de ensino do Direito formavam bacharéis a atender à demanda do Estado, como, por exemplo, as escolas de São Paulo e do Recife. A Advocacia enquanto instituição privada não se personificava juridicamente e fora parceira menor da magistratura e da promotoria, enquanto a maior parte dos bacharéis não integrantes do serviço estatal dirigiam-se à política. As entidades de congregação da Advocacia (do século 18 ao início do século 20) nem eram de representação ou disciplina legais para os advogados. Mas eram associações que denominados institutos mais se dedicavam à reunião de seus pares objetivando a cultura jurídica sobretudo livremente do poder.

Discussão necessária - Jorge J. Okubaro

O Estado de S. Paulo

O confronto dos custos dos benefícios dos militares com os dos trabalhadores civis deixa muitas indagações

A discussão sobre a necessidade de mudanças no sistema de proteção social dos militares pode criar mais problemas para o governo. Ao escolher um político com boas relações na cúpula das Forças Armadas para ocupar o Ministério da Defesa, o presidente Lula da Silva recebeu fortes críticas de companheiros do PT. Mas parecia ter aquietado um braço do Estado com o qual seu partido nem sempre mantém entendimento fluente. A comparação dos gastos com “o conjunto integrado de direitos, serviços e ações, permanentes e interativas, de remuneração, pensão, saúde e assistência” dos militares (como a legislação define o sistema de benefícios sociais e previdenciários desses profissionais) com o custo da Previdência dos servidores civis e dos demais trabalhadores, porém, mostrou disparidades tão gritantes que assustam. E podem gerar atritos políticos.

Sementes envenenadas - Merval Pereira

O Globo

Existe um clima violento na política brasileira que precisa ser contido. A tentativa de golpe em 2023 e este atentado agora não podem ser vistos como normais. É preciso uma reação contundente, para evitar repetição e que esse clima tome conta do país

Comparar o atentado a faca sofrido pelo candidato Bolsonaro na campanha presidencial de 2018 com o da semana passada em Brasília, quando o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) foi mais uma vez atacado por bombas caseiras, é misturar alhos com bugalhos. Os dois atentados terroristas foram perpetrados por indivíduos conhecidos como “lobos solitários”, mas os contextos são completamente diferentes. No de Bolsonaro, não havia nenhum clima de radicalização na campanha que estimulasse o assassinato do candidato, ao contrário. Era Bolsonaro quem insuflava a violência durante seus discursos.

O atentado recente, em contraste, está claramente ligado aos acontecimentos de janeiro de 2023, quando hordas de manifestantes, com a conivência das forças policiais, avançaram sobre a Praça dos Três Poderes a fim de depredar os prédios simbólicos da República — Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo —, numa demonstração de força que prenunciaria o golpe de Estado.

A IA chegou a um limite? – Pedro Doria

O Globo

Tudo o que está na internet e pode ser usado para treinar os modelos já se esgotou

Os meses passam, e não há notícia de GPT 5, de Claude 3.5, de Gemini 2. Os atuais LLMs, modelos de linguagem de grande porte, estão na terceira geração. A expectativa da iminência de uma quarta é grande — mas temos poucas pistas de como vai seu desenvolvimento. Ou ao menos tínhamos poucas pistas. Na semana passada, três veículos de imprensa trouxeram a informação de que há dificuldades nas três companhias — OpenAI, Anthropic e Google. Dificuldades que ninguém esperava.

Primeiro foi The Information, o site ultraespecializado que cultiva as melhores fontes no Vale do Silício. Orion, a nova versão do GPT, tem ficado superior à versão atual. Mas numa escala de melhoria bastante inferior. O salto da versão 2 para a 3 foi enorme, da 3 para a 4 maior. Esta 5 parece estar aquém. É razoavelmente melhor em texto, mas para código de programação não parece ser tão superior. Como a informação para o site foi em off, não há muitos detalhes.

Os avanços do Brasil no G20 - Míriam Leitão

O Globo

A soma de avanços globais, como o combate à fome e a citação dos super-ricos, consolida o sucesso da presidência brasileira no G20

A presidência do Brasil no G20 veio construindo consensos e avanços concretos durante o ano todo. Mesmo assim, o dia de ontem foi intenso. A crise provocada pelo ataque russo à Ucrânia levou o G7 a pedir a reabertura da declaração conjunta, já fechada, e o Brasil resistiu. Aceitou depois incluir duas palavras que não alteravam o texto. A Argentina criou problemas em vários pontos que já estavam acordados e não queria fazer parte da Aliança contra a Fome. Depois, recuou e disse que não atrapalharia o consenso. O presidente Lula tinha pedido para manter-se o dia inteiro na sala e ficou até sair o comunicado conjunto.

Lula ri por último na reunião do G20 – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O presidente brasileiro defendeu a taxação de operações financeiras de super-ricos, para financiar o combate às desigualdades

Se não houver nenhum imprevisto grave ou ninguém falar besteira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já pode comemorar o seu sucesso pessoal na reunião do G20, o grupo dos países mais ricos do planeta, com a adesão da Argentina à Aliança contra a Fome e a Pobreza, num documento final que fala em reforma do Conselho de Segurança da ONU, taxação de super-ricos e combate ao aquecimento global. Recalcitrante, o presidente argentino, Javier Milei, havia criticado o texto, mas voltou atrás depois de exaustivas negociações entre os diplomatas que articularam a declaração do grupo.

A unanimidade do encontro a favor do combate à fome e à pobreza é uma vitória pessoal de Lula. São 82 países, entre os quais os mais ricos do mundo, e 148 organizações internacionais, instituições financeiras e ONGs que apoiam a iniciativa, uma bandeira de Lula desde o primeiro mandato.

Poesia | A VIDA, de Mário Quintana

 

Música | Os Amantes" - com Demônios da Garoa, Paulo Miklos e Roberta Sá.

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Apenas a regulação robusta disciplinará plataformas digitais

O Globo

Falta às redes sociais transparência no fornecimento de dados e na exibição de publicidade, conclui estudo

À medida que cresce a dependência de grandes plataformas digitais, também aumenta a urgência de maior transparência em seus serviços. Isso é particularmente verdade no Brasil, de acordo com estudo recente do NetLab, laboratório vinculado à Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

O estudo avaliou as plataformas por meio de dois índices. O primeiro mediu a transparência no fornecimento de dados, o segundo na exibição de publicidade. Submetidas à avaliação, as principais plataformas apresentaram resultados sofríveis. Nenhuma alcançou o nível ideal. No Índice de Transparência de Dados, o YouTube obteve melhor pontuação (63,2 pontos na escala de 0 a 100), patamar apenas satisfatório. Facebook (53,6) e Instagram (52,1) apresentaram desempenho regular. O WhatsApp recebeu uma pontuação mínima de 1,5 ponto, revelando grave falta de transparência. No Índice de Transparência de Publicidade, a Meta — dona de Instagram, Facebook e WhatsApp — obteve melhor pontuação (49,8), mesmo assim nível apenas regular. Em seguida, Telegram (22,8), Linkedin (18,3) e Google (8,2) apresentaram nível precário.

A arte de perder eleições - Fernando Gabeira

O Globo

Nem sempre considero decisões acertadas apenas por ser majoritárias. Alemães e italianos já se equivocaram

Eu já deveria ter esquecido as eleições nos Estados Unidos. Torci por Kamala Harris, perdi. Perdi eleições municipais, estaduais e federais. Uma fora do Brasil não é nada. Se houver algo em Marte, farei minha aposta.

A energia inicial, milhões de dólares arrecadados entre pequenos doadores, me impressionou. Pensei que a alegria da campanha e seu olhar para o futuro bastariam. Hoje, percebo que havia uma raiva e uma frustração que o otimismo superficial não resolve. Trump interpretou bem, venceu.

Sempre tiro o chapéu para os vitoriosos e respeito as decisões majoritárias. Mas esse é meu limite. Nem sempre as considero acertadas apenas por ser majoritárias. Alemães e italianos já se equivocaram, com mais entusiasmo.

Mulheres contra a ditadura – Miguel de Almeida

O Globo

Numa única tacada, deputada tirou o Brasil da Pré-História, levando-o ao centro do século XXI

Por causa de uma conjunção astral (!) favorável, do tipo que ocorre uma vez a cada século, o brasileiro consegue enxergar seu horizonte sem a lente das cotas identitárias. Em duas mãos de sorte:

1) A deputada Erika Hilton, do PSOL de São Paulo, apresentou proposta para diminuir a carga semanal de trabalho. A parlamentar trans legislou para toda a sociedade, e não apenas para um grupo;

2) “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, conta a história de uma heroína brasileira. Desta vez, o audiovisual tupiniquim, contaminado às tampas pelas guerras culturais, abandonou o viés racial e de gênero para mostrar uma personagem humana, e não esquemática. Alguém de carne e osso. Não é tese nem arte engajada. Cinema puro. Na narrativa, não há ninguém mal-humorado cumprindo cota. Baita filme.

Numa única tacada, Erika tirou o Brasil da Pré-História, levando-o ao centro do século XXI e para longe da mão dos sindicalistas e das plataformas do fundo eleitoral. Mesmo o sempre amuado Geraldo Alckmin arrepiou o semblante. Um ar novo cruzou o ambiente. Até então, diante da chegada das novas tecnologias e da vizinhança da IA, os governantes ainda não conseguiram formular qualquer política pública eficaz. Sindicalizar não vale.

A sociedade desmente deputados e senadores - Bruno Carazza

Valor Econômico

Regime de emendas parlamentares não necessita apenas de transparência - ele deveria ser extinto

O Senado Federal deve concluir nesta semana a votação de um novo regramento para a execução das emendas parlamentares ao Orçamento. Trata-se de exigência do ministro Flávio Dino, que atendendo a um pedido do Psol no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7697, suspendeu a execução das dotações definidas por deputados e senadores, as famosas emendas impositivas.

Na liminar concedida em 14 de agosto, Dino estabeleceu a distinção entre “orçamento impositivo” - aquele no qual a execução das despesas pelo governo federal deve seguir a destinação estabelecida pelos congressistas - e “orçamento arbitrário”, regime que melhor caracteriza a forma como as emendas vêm sendo cumpridas até hoje: “Incompatível com a ordem constitucional a execução privada [do parlamentar autor da emenda] e secreta do orçamento público”.

Embasando sua decisão em trabalhos de economistas como Marcos Mendes, Fabio Giambiagi, Paulo Hartung e Felipe Salto, Dino sustou a aplicação de recursos alocados por meio de emendas impositivas até que os poderes Executivo e Legislativo estabeleçam novos procedimentos para sua execução.

Endurecimento na responsabilização das redes sociais - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet no Supremo Tribunal Federal, marcado para o dia 27 deste mês

A primeira repercussão concreta das bombas que explodiram na quarta-feira (13) na Praça dos Três Poderes, matando seu detonador, Francisco Wanderley Luiz, não deve se dar sobre a anistia pelos crimes do 8 de janeiro - que já foi adiada com a perspectiva de uma longínqua comissão especial na Câmara dos Deputados - mas, sim, sobre o julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet no Supremo Tribunal Federal, marcado para o dia 27 deste mês.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, revelou sua expectativa em relação aos reflexos das bombas sobre o tema. “Aqueles que defendem a democracia devem se unir para que haja uma responsabilização e uma regulamentação das redes sociais, não é mais possível esse envenenamento constante”, disse, ao comentar sua explosão na quinta-feira (14) no Conselho Nacional do Ministério Público. Além das mensagens veiculadas por Francisco Wanderley antes do atentado, o “envenenamento” a que se refere o ministro, pode ganhar outra dimensão com a decodificação do celular do homem-bomba que foi recolhido pela Polícia Federal.