quarta-feira, 12 de novembro de 2025

A nova fatura do Centrão para Lula, por Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Banco do Nordeste e Cade podem ser moedas de troca para emplacar Messias no STF

Pouco depois de chegar a Brasília, o presidente Lula foi informado de que a temperatura das articulações contrárias à indicação de Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal (STF) estava mais elevada do que a de Belém. Envolvido nos últimos dias com a Cúpula do Clima (COP-30), na capital do Pará, Lula não escondeu a irritação: decidiu dobrar a aposta.

Enquanto não anuncia que seu escolhido é Messias, no entanto, o chefe do Executivo fica refém do toma lá dá cá. Além disso, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre – fiador de Rodrigo Pacheco –, ganha crédito na conta com o Palácio do Planalto.

Diante da desconfiança em relação ao presidente da Câmara, Hugo Motta – sobretudo depois que ele indicou o deputado Guilherme Derrite, secretário da Segurança do governo Tarcísio de Freitas, como relator do projeto Antifacção –, Lula precisa cada vez mais de Alcolumbre.

Eles negam o inegável, por Rodrigo Craveiro

Correio Braziliense

O negacionismo encontra campo fértil nas redes sociais, onde se nutre das fake news e de visões reducionistas e estereotipadas do mundo.

O negacionismo soa como atestado de ignorância mesclada a insensatez.  Encontra campo fértil nas redes sociais, onde se nutre das fake news e de  visões reducionistas e estereotipadas do mundo. O negacionista é cético não por convicção, mas por influência de uma massa de manobra que prefere agir de forma desarrazoada a perceber que serve a interesses alheios. Os antivax, por exemplo, agarram-se a uma crença sem qualquer base sólida ou comprovação empírica. Acreditam numa verdade que apenas lhes convém, ainda que tal crença lhes custe a própria vida. Convencem-se de que a vacina mina o sistema imunológico ou acarreta doenças, quando é exatamente o contrário que ocorre.

Um certo ex-presidente condenado chegou a propalar em alto e péssimo som que a imunização contra a covid-19 poderia infectar a pessoa vacinada com o HIV, o vírus causador da Aids. Durante a pandemia, preferiu agir como garoto-propaganda da ivermectina e da cloroquina — comprovadamente ineficazes contra o coronavírus — a acelerar a compra dos imunizantes. Agiu como caixa de ressonância do negacionismo. Quantas pessoas não morreram por acreditar em suas inverdades?

Darcy e Raul têm razão, Cristovam Buarque

Correio Braziliense

Darcy Ribeiro e Raul Jungmann têm razão: a guerra civil precisa que o Brasil desperte e que a União adote sistemas nacionais de segurança e de escolas com qualidade igual para todos

Há 40 anos, Darcy Ribeiro alertou que, se não fizéssemos escolas, seríamos obrigados a construir prisões. Faz quase 10 anos, Raul Jungmann avisou sobre a força e os riscos do crime organizado. O Darcy construiu os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), mas o exemplo não se espalhou pelo Brasil. Raul propôs a criação de um sistema nacional de segurança, mas a ideia não prosperou. Agora, a realidade mostrou que eles estavam certos. 

Além da repulsa àqueles que deram a ordem ou puxaram o gatilho na operação policial nos complexos do Alemão e Penha, no Rio, é preciso denunciar os que foram eleitos sem entender as causas da guerra civil e sem tentar fazer o que Darcy, Raul e outros recomendam desde então. A violência é tratada como apenas problema de insegurança pessoal, escaramuças entre indivíduos. Não compreendemos as causas estruturais de uma guerra civil, nem percebemos a necessidade de o Brasil nacionalizar tanto a questão da segurança pública quanto o problema da educação básica, com ambição na qualidade e na equidade. 

Combate às facções como terrorismo: um projeto de poder autoritário, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Derrite deixou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo para levar ao Congresso a mesma política de “tolerância zero” que, na prática, enxuga gelo contra o PCC em São Paulo

O romance Investigação sobre a Vítima (Companhia das Letras), de Joaquim Nogueira, é um clássico do realismo policial brasileiro. Ex-delegado, o autor não escreve de fora do universo policial — ele o recria com o olhar noir de quem conhece o cheiro das celas, o peso do inquérito e as sombras das delegacias. O resultado é um retrato sem concessões da violência e da corrupção que atravessam o aparelho de segurança e a própria sociedade paulista.

“Você ainda acredita em justiça, Venício?”, perguntou o escrivão, acendendo o cigarro com o crachá pendurado no pescoço.

“Acredito”.

“Então é pior do que eu pensava. Aqui ninguém investiga ninguém. A gente arquiva. O resto é conversa pra boi dormir”.

Venício o encarou em silêncio.

“Teu amigo morreu porque quis ser certo demais. O sistema não gosta de gente que não pede o troco”.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Regular criptoativos ajudará a combater o crime organizado

Por O Globo

Iniciativa do BC é essencial para apertar controles sobre esquemas sofisticados de lavagem de dinheiro

Banco Central (BC) fez bem ao aumentar o controle sobre o mercado de criptomoedas. Não é novidade que, em razão das características semelhantes ao dinheiro em espécie e da facilidade de armazenamento digital, elas se tornaram o recurso preferido para lavagem de dinheiro. Não haverá como asfixiar as finanças de organizações criminosas a cada dia mais sofisticadas sem dispor de mecanismos eficazes para vigiar os criptoativos. Pelas novas regras, para prestar serviço no Brasil, as empresas que operam nesse mercado deverão obter autorização formal do BC e cumprir diversos requisitos de transparência, em tudo similares aos já exigidos de bancos e instituições financeiras. Investimentos feitos por brasileiros em criptomoedas no exterior também terão de ser informados.

Sabotagem do combate ao crime, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Derrite, secretário de Segurança de SP, voltou à Câmara para enfraquecer Estado

Iniciativa direitista teve apoio de parlamentares que queriam PEC da Blindagem

A direita está assanhada. A matança do Rio animou uma contraofensiva contra um governo Lula que se recuperava da surra que levara de 2024 a meados de 2025. Incentivou projetos de leis de segurança pública de incompetência grosseira, selvageria proposital e escandalosa malandragem.

Na maré de sangue, voltou a subir o barco da candidatura a presidente do governador de São PauloTarcísio de Freitas (Republicanos). Na frente legislativa, essa onda tenta criar um sistema de investigação mais irracional, desconecta ainda mais as polícias, sabota o poder estatal contra o crime e ajuda parlamentares a escapar da cadeia.

A batalha do momento é o projeto de lei "antifacção", que em tese dificultaria a vida das organizações criminosas, de início elaborado pelo governismo. A iniciativa foi apropriada por várias direitas. Uma, bolsonarista, que admira o Estado policial mortífero de Nayib Bukele em El Salvador. Outra, por picuinha provisória, quer impedir que braços da administração federal (polícia, Receita) possam atuar nos estados. Uma terceira quer usar o projeto para blindar parlamentares de investigações de corrupção.

Governadores chocam o ovo da serpente ao apoiar matança policial, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Estratégia busca ganhos eleitorais, mas corrói as bases da democracia liberal

Legitimar violência pode favorecer um novo outsider, mais radical e sem amarras a partidos

Com muito desembaraço, governadores de direita organizaram um espetáculo para anunciar o que chamaram de "Consórcio da Paz". Motivado pela operação policial mais letal da história brasileira, que deixou 121 mortos no Rio de Janeiro, o grupo escolheu um nome que beira a ironia na melhor das hipóteses, e o sadismo, na pior.

Parecia a oportunidade perfeita para transformar uma operação malsucedida (apenas 20% dos mandados de prisão foram cumpridos) em uma arma contra o presidente Lula. Especialmente quando aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro admitem, sob reserva, cansaço com a pauta da anistia.

Emendas avançam longe dos holofotes, por Mateus Vargas

Folha de S. Paulo

Estados e municípios reservam R$ 12,3 bi, aponta estudo, e governo federal tem emenda informal

Novo cenário desafia órgãos de controle a acompanhar sistema pulverizado e disposto a escapar da fiscalização

Verbas bilionárias indicadas por parlamentares têm avançado sobre terrenos menos expostos ao controle do Judiciário e da opinião pública.

Estudo feito por consultores da Câmara mostra que ao menos 23 unidades da Federação reservam cerca de R$ 11,1 bilhões em emendas impositivas de deputados estaduais, enquanto vereadores decidem o destino de mais R$ 1,2 bilhão em metade das capitais.

O levantamento encontrou cópias das chamadas emendas Pix em 20 estados, além de "uma diversidade de critérios" para definir o total de repasses. São situações que abrem margem para questionamentos jurídicos.

Um caminho de luz, por Ivan Alves Filho

O desenho, isto é, a forma como os corpos e os objetos se alinham no espaço, está na base de tudo. À nossa volta, não existe nada sem forma, tanto na natureza quanto fora dela, nas chamadas criações do espírito humano. O arquiteto Oscar Niemeyer, um mestre da forma, justamente, se considerava um desenhista. E era. 

As formas também possuem história, apresentando-se como mais um elemento dela. Não existe conteúdo desacompanhado de uma forma. Neste sentido, poderíamos dizer que a forma é o conteúdo da Arte. A profundidade de campo, que deixaria marcas indeléveis na pintura moderna e na fotografia, mais para frente, tem que ver com o alargamento das fronteiras trazido pelas navegações. E este alargamento se infiltra na estrutura mental dos homens, reconfigurando a nossa maneira de apreender ou ver o próprio espaço. O mundo agora é praticamente infinito para os homens. Na base desta aventura náutica se encontra o pequeno Portugal, um país que apresentou o Oriente ao Ocidente. O Brasil é resultado direto desta expansão, que a Arte tão bem captou. Na Galeria Uffizi, na belíssima Florença, podemos ter uma verdadeira aula a este respeito. 

Uma Europa fragmentada ainda pode prosperar? Por Martin Wolf

Financial Times / Folha de S. Paulo

O que antes tornou seus Estados poderosos agora pode impedir que continuem assim

Europeus criaram impérios no resto do mundo, mas não dentro do próprio continente

O que os romanos realmente fizeram por nós? No filme "A Vida de Brian", do grupo Monty Python, as respostas incluíam aquedutos, banhos e paz. Mas e se a resposta correta for: "seu império caiu"?

Em resumo, o papel transformador da Europa Ocidental na história mundial se deve à ausência de um império europeu unificado. Foi essa ausência que criou o que o historiador da Antiguidade Walter Scheidel chama de "fragmentação competitiva" da Europa Ocidental. A competição impulsionou as mudanças comerciais, intelectuais, tecnológicas, jurídicas e políticas que culminaram na Revolução Industrial. A partir daí, tudo mudou.

O benefício da fragmentação é a ideia central de "Escape from Rome" (2019), de Scheidel. O conceito não era novo, mas ele o revitalizou ao associar o progresso europeu à incapacidade de qualquer poder posterior repetir o feito de Roma. Diferentemente da China, do Oriente Médio ou da Índia, um império abrangente nunca mais retornou ao continente.

O ocaso de Trump já começou? Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Republicanos sofreram derrotas importantes em pleitos da semana passada

Inflação é uma das causas do fenômeno, que pode reaparecer nas eleições de meio de mandato

Os republicanos, liderados por Donald Trump, tomaram uma surra nas urnas nas localidades em que houve eleições na semana passada. O destaque midiático é a vitória de Zohran Mamdani em Nova York, mas o fenômeno é mais generalizado.

É verdade, como observou o presidente americano, que seu nome não constava das cédulas, mas ainda assim ele tem muito a ver com a derrota de seus correligionários. A análise das pesquisas mostra que vários grupos demográficos que votaram em Trump no ano passado agora se rebelaram contra os republicanos em boa medida por insatisfação com os rumos econômicos do país.

Poesia | Aniversário, de Fernando Pessoa

 

Música | Marisa Monte e ‪Gilberto Gil ‬ - A Paz

 

terça-feira, 11 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

CPI do Crime Organizado tem oportunidade

Por O Globo

Se condução for ‘técnica’ e não partidária, comissão poderá contribuir para enfrentar criminosos

É comum que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) se tornem palco de embates políticos, de olho nos holofotes e na opinião pública, em vez de nas respostas e soluções às questões que despertaram sua convocação. Foi por isso encorajadora a atitude do presidente da recém-instalada CPI do Crime Organizado, senador Fabiano Contarato (PT-ES). Em entrevista ao GLOBO, ele se disse comprometido com uma condução “técnica” dos trabalhos, para evitar que a CPI sirva de palanque voltado às eleições.

Relações complexas, por Merval Pereira

O Globo

Lula fez malabarismos diplomáticos para criticar o uso de forças militares na região — sem se referir diretamente a Trump

O surgimento da figura de um presidente como Donald Trump nos Estados Unidos fez com que as relações geopolíticas ficassem mais complexas, porque a maior potência militar e econômica do mundo tornou-se imprevisível, não apenas pelo comportamento de seu líder, mas principalmente pelo que parece ser sua decadência inexorável. Na cúpula da Celac, que reúne países da América Latina e do Caribe, realizada recentemente na Colômbia, o presidente Lula fez malabarismos diplomáticos para criticar o uso de forças militares na região — sem se referir diretamente a Trump —, mas ficou distante da solidariedade à Venezuela prevista pelo chanceler brasileiro, Mauro Vieira.

Otimismo cauteloso com a COP de Belém, por Fernando Gabeira

O Globo

O Brasil tem feito todo o possível e se tornou líder mundial. Temos contradições ainda, mas quem não tem?

Viajo para a COP30 com um lugar-comum na bagagem: a esperança é a última que morre. Reconheço a importância das visões catastróficas, mesmo seu alto nível de racionalidade. Mas temos de resistir, e as COPs são um dos mais poderosos instrumentos de resistência da humanidade.

Elas não têm a capacidade de resolver tudo, e seus textos para conciliar mais de 190 países são cheios de ambiguidades construtivas, frases meio vagas necessárias para aprovação coletiva. Muito do que sei sobre as COPs aprendi com Alfredo Sirkis, que foi a todas realizadas até sua morte, em 2020, e posso considerá-lo um especialista no tema.

Sirkis usou muitos anos de sua vida para aprovar uma ideia importante, monetizar a redução das emissões de carbono. Ele sintetizava sua luta na expressão: menos carbono igual a grana. Essas COPs, mesmo que não terminem com decisões retumbantes, servem para divulgar o tema, levá-lo por meio da cobertura da mídia a milhões de pessoas.

COP supera impasse inicial, por Míriam Leitão-

O Globo

A COP30 começou de forma positiva: destravou a agenda, Lula falou em superar dependência dos fósseis. E houve novas NDCs

Alívio. Foi o que sentiram os negociadores brasileiros no primeiro dia desta COP. Uma fonte resumiu assim. “Muita coisa podia dar errado e não deu. E algumas coisas que podiam dar certo, deram certo.” O primeiro fato é que as negociações começaram, porque há uma agenda. Pode parecer óbvio, mas nem sempre é assim. Há conferências em que a briga sobre o que vai ser discutido consome dias. Na noite de domingo, véspera do dia 1, Belém conseguiu destravar a pauta, que havia sido bloqueada em Bonn, na última reunião preparatória da COP30. Ao todo, são 145 itens e quatro pendências. Outra surpresa positiva foi o tom do presidente Lula, que deixou claro que é preciso encontrar o caminho para sair dos combustíveis fósseis. Isso dá à presidência da COP a autorização para encaminha-r este assunto.

IA pelo Brasil, por Pedro Doria

O Globo

Inteligência artificial é capaz de diminuir a diferença entre o trabalhador menos e o mais qualificado

Durante o ano de 2024, segundo números da McKinsey, 78% das empresas passaram a usar inteligência artificial no trabalho cotidiano. O número vem de uma pesquisa com 1.353 companhias espalhadas por 18 setores em 26 países e faz parte da edição 2025 do Relatório Anual sobre IA da Universidade Stanford. O trabalho coleciona centenas de estudos feitos no ano anterior sobre o avanço da tecnologia no mundo, organiza os dados e os apresenta a partir de uma lógica. Em 2023, 55% das empresas usavam IA. Houve, portanto, um salto. O ano passado foi o ano em que IA virou realidade no mundo corporativo. Mas os números mais incríveis do relatório não são esses, grandes porém genéricos. O que impressiona são os detalhes mais granulares sobre o impacto no trabalho. E, neles, há uma excelente notícia para o Brasil. Uma janela que se abre na direção do futuro, se soubermos adotar as políticas públicas corretas.

A quem interessa enfraquecer a Polícia Federal, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Na condição de relator do PL Antifacção, Derrite se prestará a ser um biombo para interesses parlamentares contra o combate ao crime organizado

 O deputado Guilherme Derrite (PL-SP) foi anunciado relator do PL antifacção no início da noite da sexta-feira. Duas horas depois, apresentou seu relatório. Foram tantas as mudanças no texto do Executivo que houve, nos três Poderes, quem tivesse a impressão de que o relatório estava pronto à espera de quem encarasse a tarefa.

O deputado havia se desincompatibilizado da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo para relatar o projeto do deputado Danilo Forte (União-CE) que equipara facções criminosas a organizações terroristas. Depois que ficaram claras as chances de o carimbo do país como abrigo de terroristas pressionar juros e dificultar o acesso a crédito e à atração de investimentos, este PL entrou no limbo e Derrite foi alocado para a relatoria do projeto governista.

Junto com ele, migraram também as intenções de quem pretende usar um tema de forte apelo popular para proteger seus próprios interesses. Isso ficou claro na mudança mais substantiva do relatório que é aquela que condiciona a participação da Polícia Federal na investigação e repressão do crime organizado à anuência do governador do Estado.

Casal D vive de renda e, envergonhado, agradece a Galípolo, por Pedro Cafardo

Valor Econômico

Desde 2003 a Selic sempre supera a inflação, com uma única exceção, em 2020, por causa da pandemia

Um ano atrás, saiu neste espaço a história do senhor D. Dizia que ele e a esposa, senhora D, decidiram se aposentar em 2014, quando pretendiam abrir uma pequena metalúrgica de precisão.

O senhor D, na época com 55 anos, tinha experiência nessa área em que trabalhara durante três décadas. Com o dinheiro que o casal receberia nas duas aposentadorias, incluindo FGTS, férias atrasadas e outras indenizações, ambos pensavam em abrir o próprio negócio.

Já em 2015, recebidas as indenizações, surpreenderam-se com um saldo bancário de uns R$ 3 milhões, incluindo aí a poupança própria. Felizes, tiraram dois meses de férias e deixaram o dinheiro aplicado em um fundo de renda fixa. Na volta, viram o saldo aumentado para R$ 3,060 milhões. Ou seja, haviam embolsado R$ 60 mil em dois meses sem mexer uma palha, enquanto curtiam praias.

Vendo esse ganho, bateu no casal uma enorme preguiça de enfrentar a burocracia para a abrir a metalúrgica: alugar galpão, comprar ferramentas e máquinas, contratar empregados etc. Ambos concordaram, então, em adiar os planos de empreender e [deixar o dinheiro aplicado.

COP entre o mito da queda do céu e a tragédia do presente, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Belém precisa enfrentar o autoengano dos chefes de Estado e líderes de grandes corporações; discursos inflamados e compromissos frágeis são a contradição da conferência

“Se os xamãs desaparecerem, o céu cairá. Os brancos terão matado todos eles com sua fumaça de epidemia e seus metais. Então, ele desabará porque não haverá mais ninguém para sustentá-lo. Tudo virará noite outra vez, e os espíritos das florestas e das águas se vingarão de nossa loucura”. Há um elo profundo entre esse alerta dos xamãs Yanomami — que sustentam o céu com seus cantos e rituais — e a cena devastadora do tornado que atingiu o Paraná na véspera da abertura da COP30, em Belém.

Na cosmovisão Yanomami, descrita acima por Davi Kopenawa em A Queda do Céu, o desmatamento e o garimpo ilegal não são apenas agressões materiais, mas forças que corroem o equilíbrio espiritual do mundo. Quando o homem destrói a floresta, o céu começa a desabar. Por isso mesmo, na abertura da COP30, houve tensão simbólica e política. Ao afirmar que “é momento de impor uma nova derrota aos negacionistas”, na abertura da conferência do clima, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva resgata o fio civilizatório da luta global contra a destruição ambiental e a desinformação.

Muitas divergências, poucas convergências, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Além do tarifaço, as pautas prioritárias do Brasil opõem os presidentes Lula e Trump

A semana embola as grandes polêmicas que opõem Brasil e Estados Unidos e obrigam o presidente Lula a se equilibrar entre suas visões de mundo e as de Trump, em favor dos reais interesses brasileiros: os ataques ilegais dos EUA a embarcações venezuelanas, com mais de 70 mortos, classificar organizações criminosas como terroristas, abrindo o flanco para intervenção americana, e, durante a COP-30, meio ambiente, sustentabilidade e financiamento de florestas tropicais. O tarifaço paira sobre tudo isso.

Na escapulida de Belém, onde continua a COP, para Santa Marta, na Colômbia, onde se reuniram Celac (América Latina e Caribe) e UE (Europa), Lula enfrentou a tripla pauta, digamos, antiamericana, e criticou o “uso da força militar”, as “manobras retóricas” e “as intervenções ilegais” na nossa região, para pedir paz e dar um recado claramente endereçado aos EUA e a Trump: “Democracias não combatem o crime violando o direito internacional”.

O marco de Hugo Motta, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

 Hugo Motta encarna aquele tipo ao mesmo tempo fraco politicamente – um presidente da Câmara cujos movimentos dependem de Arthur Lira e Ciro Nogueira – e formalmente poderoso, em função do cargo que ocupa. Deriva dessa condição precária, forjadora de um inconfiável, a surpreendente escolha de Guilherme Derrite para relator do projeto de lei conhecido como Antifacção.

Lembre-se de que Derrite regressava ao Parlamento – era este o texto até a última sexta – para relatar o projeto oposicionista que teria por objeto a Lei Antiterrorismo e faria a disputa política com o governista. Sobreveio a reviravolta. Pouquíssimo depois de indicado à relatoria da proposta originalmente do governo, já tinha o relatório pronto. Alguém não foi pego de surpresa.

O combate à mudança climática tem que estar acima da ideologia, por Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Mostrar que a causa ambiental não é monopólio de nenhum lado da disputa política fará com que todos saiam ganhando

Se a sustentabilidade virar tema cativo da esquerda, ela se tornará um objetivo ainda mais distante do que tem sido até hoje

mudança climática traz um desafio complexo de coordenação. A ação —ainda que custosa— de cada país ou empresa, sozinho, é inócua. Se eu me sacrifico e meu vizinho nada faz, eu terei pago um preço alto, mas no fim das contas partilharemos do mesmo resultado. Mesmo que todos façam sua parte e sejamos capazes de refrear o aquecimento da Terra, isso não gerará efeitos visíveis.

A vida apenas seguirá normalmente, e teremos evitado desastres hipotéticos que nunca se materializaram. Dos desastres climáticos que ocorrem, é impossível selecionar qualquer um deles e dizer com certeza que ele é resultado direto da mudança climática. Se ninguém fizer nada, contudo, sua frequência aumentará, o clima da Terra será mais inóspito e o resultado será catastrófico.

A meta de reduzir emissões de forma a não aumentar a temperatura da Terra acima de 1,5 °C já não foi cumprida. Em geral, uma situação dessas exige que uma autoridade imponha restrições para todos e puna aqueles que, pensando apenas no próprio ganho de curto prazo, as descumpram.

Bolsonaro pode ter um piripaque, mas não está morto, por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Ex-presidente continua a influir nas estratégias da extrema direita

Governador Cláudio Castro não dá um passo sem ouvir o filho 01

A qualquer momento Bolsonaro pode ter um piripaque, garantem seus advogados. Os riscos aumentaram depois que o STF rejeitou por unanimidade o recurso contra sua condenação —recurso baseado na tese de "desistência voluntária", a qual não deixa de ser uma admissão de que a trama golpista existiu.

Expressão antiquada, piripaque, segundo os dicionários, é um mal súbito, um surto, uma crise nervosa. Um dos sinônimos é faniquito. No caso, está relacionada à certeza de que o ministro Alexandre de Moraes irá determinar a prisão do ex-presidente na Papuda (quanto tempo ele ficará lá é outra história).

Polícia é civilização, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Mas é preciso civilizar as forças de segurança, sob pena de vê-las convertidas num Leviatã

No Brasil, há áreas em que quem exerce o monopólio da violência não é o Estado e sim quadrilhas

Quando saí em férias, Lula vivia um doce idílio com as pesquisas eleitorais, escorado no enfraquecimento do bolsonarismo e na perspectiva de aprovação de medidas econômicas populares. Mas aí veio a malfadada Operação Contenção, que resultou numa pilha de 121 cadáveres e mudou o eixo do debate nacional, que migrou da economia para a segurança pública.

A próxima leva de pesquisas indicará se o deslocamento narrativo trouxe danos à popularidade presidencial e, em caso afirmativo, qual a sua extensão. Segurança é um terreno em que a esquerda tradicionalmente vai mal. Não penso que a direita se saia melhor, mas seus equívocos estão mais em linha com os anseios populares, que é o que importa eleitoralmente.

Derrite tenta esvaziar PF para dar 'escandaloso presente de Natal a facções', diz Ministério da Justiça, por Mônica Bergamo

Folha de S. Paulo

Parecer prevê que Polícia Federal só pode ser acionada sob provocação de governadores estaduais

Deputado, que se licenciou da Secretaria de Segurança de Tarcísio de Freitas para relatar projeto, não respondeu à coluna

parecer do deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) sobre o projeto de lei antifacção está sendo considerado um "escândalo" por integrantes do Ministério da Justiça (MJ) que já se debruçaram sobre o texto.

Um dos pontos considerados mais problemáticos é o que prevê que o Ministério somente poderá determinar a atuação conjunta ou coordenada da Polícia Federal (PF) e de forças locais "mediante provocação do governador do Estado".

"É um escândalo, uma verdadeira bomba para as investigações contra o crime organizado no país", diz o secretário Nacional de Assuntos Legislativos do MJ, Marivaldo Pereira. "Na prática, Derrite quer criar barreiras à atuação da PF, condicionando sua atuação ao crivo de governadores estaduais de forma absolutamente inconstitucional. Ele está dando um presente de Natal aos líderes de facções criminosas", segue.

‘Projeto de Derrite pode excluir PF, MP e afetar operações contra o crime organizado’, diz Gakiya, por Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo

Promotor jurado de morte pelo PCC analisou durante dois dias o substitutivo apresentado por Derrite e pede que votação seja adiada para que possíveis falhas sejam discutidas e corrigidas

O promotor Lincoln Gakiya está jurado de morte pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). No último mês, a polícia descobriu mais um plano da facção para assassiná-lo. É difícil pensar em uma voz com mais legitimidade do que o promotor para analisar as mudanças que o deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) pretende fazer no projeto antifacção do governo federal. Ele estudou o texto no fim de semana e contou suas conclusões à coluna.

Acima das paixões políticas, Gakiya sabe o custo que mudanças legais podem trazer para a vida dos brasileiros e para a sua própria. Deve, portanto, ser ouvido por todos aqueles que têm honestidade de propósitos e não colocam os interesses eleitorais acima da necessidade de se aperfeiçoar a legislação para combater o crime organizado que pulou do estágio das organizações criminosas comuns para atingir aquele das organizações de tipo mafioso.

O alerta que Gakiya endereça aos parlamentares é preocupante. Ele teme que, se o substitutivo for aprovado como está, a Polícia Federal e o Ministério Público possam ser excluídos do combate ao crime organizado. Tudo por causa da redação do artigo 11 do substitutivo de Derrite, entregue menos de 24 horas depois de ele ser nomeado relator do projeto. O deputado disse à coluna que pretende ouvir os promotores e ainda pode modificar o texto.

Fatiando Amazônia: depositário fiel, nada mais! ... Por Aylê-Salassié Filgueiras Quntão*

O
apelo ufanista que, repetido insistentemente nas escolas e nas ruas, num passado não muito longínquo,  de que a "Amazônia é nossa!..." e que chegou a  levar, no Brasil,  muita gente  à prisão por excesso de ativismo , está tomando uma nova configuração em Belém.  A Conferência (da ONU)das Mudanças Climáticas (COPs),  já na sua trigésima edição,  passou a tratar a região  não apenas como um bioma tropical exclusivo, mas  como "patrimônio da humanidade", estratégico para o controle do aquecimento global . Com isso,  está  abrindo a chance para que todos os países do mundo e até as grandes empresas  possam ter  uma fatia  da região.

Alarma constatar que, a Amazônia como uma marca identitária brasileira, venha perdendo  expressão política,  na medida em que  se conclui que os países abrigados por ela não conseguem executar uma política de plena  proteção da floresta e seus povos originários. Os  números difundidos sobre a redução do desmatamento e das queimadas  não totalmente são confiáveis, em que pese  tenham sua origem no Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), uma respeitável instituição brasileira  de pesquisas espaciais. Concomitante, prega-se na COP30 a responsabilidade multilateral da proteção dos recursos da Terra , com ênfase  particular na Amazônia. 

Caio Prado Júnior refletiu sobre democracia e fascismo ao observar a 2ª Guerra

Por Folha de S. Paulo

'Qual é o denominador comum que une ingleses, americanos e russos?', indagou o historiador brasileiro

Artigo faz parte de seção que republica colunas de grande repercussão da história da Folha

Um dos maiores pensadores do Brasil, o historiador e geógrafo Caio Prado Júnior refletiu a respeito da democracia enquanto observava os países da Europa sucumbirem diante da Segunda Guerra Mundial.

"O que distingue fundamentalmente a democracia do fascismo e a grande maioria dos ingleses, americanos e russos que lutam, está perfeitamente conciente disto é que na democracia os direitos individuais não são apenas garantidos pelo Estado, mas sua defesa e guarda está nas mãos dos próprios interessados, isto é, do povo", escreveu em artigo publicado na Folha da Manhã, em 1943.

No início dos anos 1960, o jornal se fundiria com a Folha da Manhã e a Folha da Tarde para dar origem à Folha de S.Paulo.

Leia a seguir o texto completo, parte da seção 105 Colunas de Grande Repercussão, que relembra crônicas que fizeram história na Folha. A iniciativa integra as comemorações dos 105 anos do jornal, em fevereiro de 2026.

Poesia | A Criança, de Fernando Pessoa

 

Música | Nara Leão - Tema de "Os Inconfidentes" (Chico Buarque / Cecilia Meireles)

 

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Desequilíbrio fiscal esvazia Bolsa de Valores

Por O Globo

Com necessidade de manter juros altos, renda fixa é mais atraente que ações, e mais empresas fecham capital

A falta de compromisso firme do governo com o equilíbrio fiscal tem consequências negativas em toda a economia. A mais imediata é a inflação, resultado da falta de confiança que se dissemina pelo mercado. O Banco Central (BC) é então forçado a subir os juros, com isso impõe um freio ao crescimento econômico e à geração de empregos. Quando os juros ficam altos por muito tempo, os efeitos são perniciosos. Na semana passada, mais uma vez a taxa básica de juros, a Selic, foi mantida em 15% anuais. Descontada a inflação — em torno de 5,2% ao ano —, o juro real se aproxima de 10%, desempenho que tem garantido ao Brasil há um bom tempo lugar no pódio dos juros mais altos do mundo.

Guerra sem vencedores, por Preto Zezé

O Globo

Quantas creches, escolas técnicas, universidades, centros culturais, oportunidades de trabalho surgiram onde o Estado só aparece fardado?

Já passaram 18 anos desde a primeira grande invasão ao Complexo do Alemão. Quase duas décadas depois, seguimos repetindo o mesmo roteiro: o Estado entra atirando, a imprensa transmite ao vivo, as autoridades prometem “recuperar o território” — e logo a vida volta ao normal de sempre: escolas precárias, oportunidades escassas e a torneira da violência aberta.

O outro lado do normal em algumas cidades é este: tiros, bombas e corpos. Infelizmente. A manchete já não comove. É preciso mais corpos empilhados, mais câmeras, mais espetáculo.

Belém não acredita em gráficos, por Demétrio Magnoli

O Globo

As nações reunidas em Belém desviam seus olhares dos gráficos que contam a dura verdade

A COP30 realiza-se sob o signo do autoengano. Aprovará um documento sobre o fundo para florestas tropicais, impulsionado pelo Brasil, cujas fontes de financiamento permanecem incertas. Aprovará uma declaração que vincula a ação climática ao combate à pobreza. Passará, por consenso vazio, um texto demagógico sobre “racismo ambiental” que Lula ofertará a seu cortejo identitário. Algo muito menos provável é a publicação de uma declaração final da cúpula que encare o fracasso dos objetivos do Acordo de Paris (2015).

Base jurídica das COPs, o Acordo de Paris estabeleceu o objetivo de impedir a elevação da temperatura média global para além de 2oC em relação aos níveis pré-industriais e, idealmente, evitar a ultrapassagem da marca de 1,5oC. Segundo os indícios disponíveis, a declaração final escolherá o método de dissimular a constatação de que não se obterá nem mesmo o objetivo mais modesto. As nações reunidas em Belém desviam seus olhares dos gráficos que contam a dura verdade.

Não é culpa do Banco Central, por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

E então, nenhuma carta nesta mão, nada na outra, e um déficit de R$ 80 bilhões vira R$ 31 bilhões, que é igual a zero — uma proeza

Não, o Banco Central não é o culpado pelos juros altos. A culpa está no Ministério da Fazenda, responsável pelo descontrole das contas públicas, que resultam numa expansão insustentável da dívida. Mas o ministro Fernando Haddad segue os projetos do presidente Lula.

Sobram números para demonstrar esse desequilíbrio. Mas nada é mais eloquente que esta situação: o governo terá déficit expressivo neste ano, algo em torno de R$ 80 bilhões. E poderá declarar de peito aberto que cumpriu a meta legal de déficit zero.

O truque começa na flexibilização da meta. É zero, mas, sabem como é, isso de orçamento é coisa complicada de acertar, de modo que o arcabouço aceita uma margem de tolerância. O resultado pode ser um déficit equivalente a 0,25% do PIB (algo como R$ 31 bilhões) ou um superávit de mesmo tamanho. No governo, ninguém jamais pensou em buscar a meta de superávit. Seria, dizem, deixar o dinheiro sobrar quando há tantos gastos importantes a fazer.