domingo, 7 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Antonio Gramsci* (Grande política – pequena política)

“Grande política (alta política) — pequena política (política do dia a dia, política parlamentar, de corredor, de intrigas). A grande política compreende as questões ligadas à fundação de novos Estados, à luta pela destruição, pela defesa, pela conservação de determinadas estruturas orgânicas econômico-sociais. A pequena política compreende as questões parciais e cotidianas que se apresentam no interior de uma estrutura já estabelecida em decorrência de lutas pela predominância entre as diversas frações de uma mesma classe política. Portanto, é grande política tentar excluir a grande política do âmbito interno da vida estatal e reduzir tudo a pequena política (Giolitti, baixando o nível das lutas internas, fazia grande política; mas seus súcubos, objeto de grande política, faziam pequena política). Ao contrário, é coisa de diletantes pôr as questões de modo tal que cada elemento de pequena política deva necessariamente tornar-se questão de grande política, de reorganização radical do Estado. Os mesmos termos se apresentam na política internacional: 1) a grande política nas questões relacionadas com a estatura relativa de cada Estado nos confrontos recíprocos; 2) a pequena política nas questões diplomáticas que surgem no interior de um equilíbrio já constituído e que não tentam superar aquele equilíbrio para criar novas relações.”

*Antonio Gramsci (1891-1937). Cadernos do Cárcere, v.3. p.21. Civilização Brasileira, 2007.

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Abertura comercial terá efeito imediato na produtividade

Por O Globo

Acordo Mercosul-UE e redução do tarifaço de Trump são cruciais para sanar deficiência crônica do Brasil

Nos últimos cinco anos, a renda per capita cresceu 1,7% ao ano no Brasil. O principal motor do avanço foi a queda no desemprego. Em outubro, ele caiu a 5,4%, nível mais baixo da série histórica iniciada em 2012. Mas é impossível o desemprego seguir caindo de forma indefinida sem gerar pressão inflacionária. A situação atual da economia expõe, ao mesmo tempo, o limite das políticas de estímulo ao consumo e a dificuldade crônica do Brasil de enfrentar sua maior deficiência— a improdutividade.

Quem substituirá Tarcísio? Por Merval Pereira

O Globo

Assim como Bolsonaro, o senador Flávio não tem experiência de gestão de coisa nenhuma, e, diferente do pai, não tem votação própria, depende do apoio dele para se eleger qualquer coisa.

A partir da decisão do ex-presidente Bolsonaro de indicar seu filho Flávio para candidato à presidência da República, abre-se um caminho para aqueles que conseguirem substituir o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas na preferência da classe média e do mercado financeiro, que já mostrou sua preocupação com a fragilidade de Flávio e a vantagem que o presidente Lula ganha com uma escolha tão desastrada para disputar com ele.

Só o fato de que a família Bolsonaro pretende fechar entre os seus as decisões da campanha eleitoral retira da candidatura a possibilidade de ampliar sua penetração em outros setores da sociedade. Os candidatos alternativos à polarização entre lulistas e bolsonaristas terão um espaço ampliado à direita e ao centro, pois a preferência por Tarcísio de Freitas indica que o que esse nicho eleitoral buscava era um candidato competitivo que tivesse o apoio de Bolsonaro, mas que fosse distante o suficiente dele para ter autonomia de voo quando governasse.

Pesadelo Zero Um, por Bernardo Mello Franco

O Globo

Candidatura do Zero Um divide as direitas e vira pesadelo para Faria Lima e Centrão

A Faria Lima sonhou com Tarcísio de Freitas e acordou com Flávio Bolsonaro. O capitão frustrou quem esperava que ele entregasse seu espólio de votos a um político com outro sobrenome. Na sexta-feira, Jair informou à praça que o candidato é o Zero Um.

Só quem não conhece o ex-presidente acreditou que ele facilitaria o jogo para o consórcio que une os donos do PIB ao Centrão. Bolsonaro nunca deu bola a partidos, acordos ou expectativas alheias. Sempre agiu pela lógica do clã. No poder, descartou e humilhou aliados que atravessaram o caminho dos filhos. Na cadeia, deixa claro que só confia na prole.

O poder da blindagem, por Elio Gaspari

O Globo

Gilmar blinda Supremo, Toffoli tranca o Master e CPMI não ouvirá Lulinha

Houve um tempo em que o poder de uma pessoa podia ser medido pela sua capacidade de abrir portas. Hoje, mede-se também pela sua capacidade de fechá-las. Depois da demolição da Lava-Jato esse movimento era previsível, numa escala menor.

1 - Gilmar blinda o Supremo:

Num espaço de poucos dias, o ministro Gilmar Mendes passou a tranca no direito dos cidadãos de abrir processos de impedimento de juízes do Supremo Tribunal Federal. De agora em diante, só quem pode fazer isso é o procurador-geral da República.

Pode parecer que o ministro queira blindar o tribunal diante da possibilidade de a oposição conseguir no que vem o número de senadores capazes de impedir os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino. Parece e é isso mesmo.

O Orçamento sequestrado, por Míriam Leitão

O Globo

O Congresso captura parte expressiva do Orçamento, prejudica a governabilidade e distorce o funcionamento da democracia

O presidente Lula disse que o Orçamento foi sequestrado. E foi. O presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que as emendas são uma prerrogativa do Congresso. E são. O erro está no valor exorbitante a que as emendas chegaram e no modo como são usadas pelo Legislativo. O montante de R$ 50 bilhões é uma distorção institucional. O fato de a Comissão Mista de Orçamento ter aceitado emendas de Eduardo Bolsonaro e Alexandre Ramagem é uma aberração. É preciso olhar além da briga cotidiana.

Lula falou que 50% do Orçamento foi sequestrado. Na verdade, é 50% dos recursos disponíveis, não do Orçamento como um todo, claro. Mais de 90% do dinheiro vai para despesa obrigatória ou tem destinação estabelecida na Constituição. Sobra pouco, e é esse restante que está em disputa.

Sem poesia nem rima, por Dorrit Harazim

O Globo

Trump faz do combate à imigração sua arma política mais potente neste segundo mandado. Demoniza o ‘outro’

A história talvez seja apócrifa, mas é boa. Conta-se que, quando Sam Goldwyn decidiu investir na versão para cinema de “The children’s hour”, primeira obra de dramaturgia da americana Lillian Hellman, ele foi avisado pelos executivos da MGM de que, na peça, as protagonistas eram lésbicas. Temiam, portanto, que os censores da indústria cinematográfica da época impusessem restrições. O chefão de Hollywood, segundo a história, deu de ombros e foi em frente:

— Qual o problema? Façam com que as protagonistas sejam albanesas.

Não sendo americanas, não manchariam a ficção nacional.

Donald Trump tem se alimentado com voracidade desse artifício, produzindo um cruel roteiro de entretenimento pessoal: a criação de inimigos imaginários para consolidar seu poder interno. O histórico de insultos a cidadãos de “países de merda” ou do “Terceiro Mundo”, como gosta de adjetivar, é antigo em Trump e sempre lhe rende manchetes. Também o surto de nativismo cru e asco humano dirigido contra somalis na semana passada, durante uma reunião ministerial na Casa Branca, atingiu o objetivo: obnubilou o restante do noticiário. (Só esqueceram de lhe avisar que Iman, a supermodelo nascida em Mogadíscio e ícone do mundo fashion, fez seu patrimônio líquido de US$ 200 milhões como imigrante nos Estados Unidos.)

Lula na Sapucaí, o “dedazo” de Bolsonaro e o desfile do “bloco de sujos”, por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Na política, um sistema de pesos e contrapesos preserva a cooperação institucional. A independência entre os Poderes parece ter perdido esse equilíbrio silencioso. Falta harmonia.

Não é que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não mereça um enredo de escola de samba, pois sua vida romanesca serve até para a teledramaturgia. Mas a estreia da Acadêmicos de Niterói no Grupo Especial em 2026, conduzindo pela Sapucaí um enredo que celebra sua trajetória pessoal, é um caso típico de culto à personalidade, que só não é comparável ao estilo norte-coreano porque lá a sociedade foi militarizada e, aqui, é carnaval. Não seria nada mais justo se 2026 não fosse um ano eleitoral.

A avenida transforma líderes em alegorias, memórias em canto coletivo e contradições nacionais em poesia. O processo político não é um desfile na Sapucaí, porém, as escolas de samba nos dão um ensinamento precioso para a política, que nos faz muita falta nesse momento de estresse entre os Poderes. Toda grande escola, para desfilar na avenida, precisa de um diretor de harmonia, alguém capaz de garantir que o conjunto avance sem “atravessar” o samba e abrir grandes espaços na pista.

A faixa e a cela: o Brasil que transforma presidentes em réus, por Christiany Fonseca*

Correio Braziliense

A prisão de ex-presidentes passou a compor o noticiário como se fosse previsão de chuva. Por que tantos presidentes transitam tão perto da ilegalidade?

No Brasil, a Presidência da República é a única função em que o ocupante sobe a rampa como monarca imaginário e, ao final, desce as escadas da história como investigado ou até como preso. É um cargo que oferece pompa, aparato oficial e plateia permanente, mas que devolve, inevitavelmente, o espelho mais cruel do poder: aquilo que o presidente fez quando acreditou que o país dormia. Aqui, o poder não transforma. O poder revela.

Da redemocratização para cá, sete presidentes chegaram ao topo do sistema político. Quase a metade terminou descobrindo o Estado sob outra perspectiva, a de quem conhece a burocracia não pela liturgia do cargo, mas pelas engrenagens do processo penal. Isso não é coincidência, não é azar estatístico e não é acidente histórico. É um ritual brasileiro que se repete com precisão irritante. Celebramos a posse como se fosse um épico nacional e assistimos ao pós-mandato como um inevitável acerto de contas.

Não a Flávio é sim a Tarcísio, por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Rejeição a Flávio e ao sobrenome Bolsonaro desencadeia campanha pró Tarcísio

O tímido lançamento do senador Flávio Bolsonaro à Presidência, por ele próprio, numa mera notinha, deixa dúvidas se é para valer ou não, racha a direita e é comemorado pelo lulismo. Tudo somado, o principal efeito foi o oposto do desejado pela família: deflagrar uma campanha de setores políticos, econômicos e financeiros a favor de Tarcísio Gomes de Freitas. O não a Flávio é o sim a Tarcísio contra Lula.

Como levar a sério um lançamento feito pelo próprio interessado, numa nota desenxabida, no fim tarde de uma sexta-feira? A primeira impressão foi natural: isso não é sério, foi só para conter a onda pró Michelle, enquanto é tempo. Ou seja, movimento preventivo.

Anúncio de candidatura de Flávio freia outros nomes da direita e deve beneficiar Lula, dizem analistas

Por Lilian Venturini e Ma Leri / Valor Econômico

Já um nome menos associado a Jair Bolsonaro, a depender do cenário, impõe mais dificuldades ao atual presidente

São Paulo - O lançamento da pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à Presidência da República deve ter como efeito inicial um freio nas articulações de outros nomes da direita para 2026. O processo, no entanto, pode acabar favorecendo a formação de quadros independentes do bolsonarismo, avaliam cientistas políticos ouvidos pelo Valor. Há a leitura, ainda, de que o cenário -- se confirmado -- seria mais vantajoso para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve tentar a reeleição.

"É um banho de água fria em alguns candidatos. Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo] dizia que não era candidato, mas se movia como se fosse. O anúncio significa um freio de mão nesse processo, paralisa. Vai levar alguns dias, se não semanas, para avaliar se é definitivo ou não, que jogo é esse, se tem negociação, o que está por trás. Empaca o ritmo da direita", afirma o cientista político Carlos Melo, professor do Insper.

Indicação de Flávio Bolsonaro divide governadores da direita e acelera debates sobre 2026

Por Victoria Neto / Valor Econômico

Em comum, destacaram que o processo eleitoral ainda está em construção e que as definições devem amadurecer nos próximos meses

Rio - O anúncio de Flávio Bolsonaro (PL-RJ) de que ele foi indicado pelo pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, para disputar a Presidência da República dividiu reações entre governadores do Sul e Sudeste. Enquanto os filiados ao PL declararam apoio imediato à decisão, outros afirmaram respeitar a escolha, mas defenderam que seus partidos devem manter projetos próprios – caso de Ratinho Júnior e Eduardo Leite (ambos do PSD) e Romeu Zema (Novo). Em comum, destacaram que o processo eleitoral ainda está em construção e que as definições devem amadurecer nos próximos meses.

As declarações foram dadas em coletiva neste sábado (6), no encerramento da 14ª edição do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud), no Rio. O evento foi realizado na capital fluminense desde quinta-feira (4), sob a presidência do governador do Estado, Cláudio Castro (PL).

Bolsonaro cobra o preço final das escolhas da direita, por Igor Gielow

Folha de S. Paulo

Lançamento da candidatura do senador Flávio em 2026 empareda Tarcísio e o centrão, deixando ambos sem opção boa

Se renunciar ao bolsonarismo, campo assumirá traição; se ficar com ele, ganha a radioatividade apontada no Datafolha

A redemocratização brasileira é marcada por contradições. Se o país e o Congresso que o espelha são reinos do conservadorismo de baixa extração, o poder federal passou 20 anos nas mãos de pessoas mais à esquerda, ainda que só nominalmente.

O fastio que emergiu nas ruas de 2013 e em sua mutação à direita em 2016 desaguou no bolsonarismo, que aproveitou-se da implosão do sistema político via corrupção e Lava Jato para propor um novo paradigma —farsesco e golpista, como se provou.

Se no começo apenas militares saudosos da ditadura embarcaram no projeto, logo ele encantaria setores da finança e do empresariado e, principalmente, ganharia tração popular. Alquebrado, o sistema tradicional e a esquerda assistiram à ascensão do hoje prisioneiro Jair Bolsonaro (PL).

Se 'Flávio 26', e finança azeda, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Líderes de centrão e direitas ainda tentam entender o que se passa com os Bolsonaros

Tombo de sexta no mercado foi exagero, mas preços financeiros devem piorar um tanto

Assim que soube de "Flávio 26", a maioria dos donos do dinheiro vendeu ações, reais e títulos da dívida pública. Foi o maior paniquito em quatro anos, com juros e dólar em alta forte. É óbvio medo de que "Flávio 26" facilite Lula 4. Mas suponha-se que Flávio Bolsonaro viesse a aparecer bem nas pesquisas. "O mercado" voltaria a se animar, aceitando assim qualquer coisa que não seja Luiz Inácio Lula da Silva?

A hipótese por ora é improvável e a pergunta pode parecer piada, mas dá o que pensar nas dificuldades do governo em 2026 e de um possível Lula 4.

A velha escuridão que nos segue, por Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Isso se aplica ao momento presente da escuridão que nos segue desde a formação moderna do país

Velhice aqui pautada não é o amadurecimento biológico; é o fato institucional sem a necessária renovação existencial

Diz um provérbio russo que peixe começa a feder a partir da cabeça ("ryba is galovy gniot", para conferência dos cultores da língua). Como em todo provérbio, há um jogo entre a significação aparente e o sentido oculto. Isso se aplica ao momento presente da escuridão que nos segue desde a formação moderna do país: o julgamento de generais, almirante e oficiais menores não é só fato inédito nas Forças, mas também atestado de velhice de uma casta, entranhada como um alien nas vísceras da República.

Caso de família, por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Candidatura de Flávio parece mais um jogo de equilíbrio de forças nas internas do clã Bolsonaro

'Seu Jair' corre o risco de ver sua liderança contestada abertamente pela direita insatisfeita

Não parece ter sido coincidência: na terça-feira (2), Michelle Bolsonaro derrota os enteados no lance do veto à aliança do PL com Ciro Gomes (PSDB) no Ceará; na sexta (5), o primogênito Flávio Bolsonaro diz que recebeu do pai sinal verde para se lançar candidato a presidente pelo partido.

A aparência é muito mais de um jogo de equilíbrio das forças familiares do que propriamente do lançamento de uma candidatura para valer, daquele que representaria a direita na disputa com Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O presidente seria o maior beneficiário dela e, portanto, deve estar achando ótimo.

Flávio candidato prova que a direita errou, por Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Ex-presidente sinaliza que prefere manter identidade autoritária do movimento a ceder espaço para direita tradicional

Indicação de filho mais velho mostra que movimento bolsonarista resiste à absorção pelo centrão

Com a indicação de Flávio Bolsonaro como seu candidato à Presidência da República, Jair tenta soldar as rachaduras em seu círculo familiar. Mais do que isso, tenta preservar a identidade autoritária e populista de seu movimento, resistindo às tentativas de absorção pelo centrão.

Desde o início de sua carreira política, Bolsonaro administra sua máquina política como uma empresa familiar. É fácil entender por quê: seus filhos nunca tiveram qualquer capital político independente do pai; se não o obedecerem, Jair os condenará ao ostracismo político e, pior, à necessidade de arrumar emprego.

Poesia | Aos que vierem depois de nós - Bertolt Brecht, Tradução Manuel Bandeira

 

Música | Simone - Tô Voltando

 

sábado, 6 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Antonio Gramsci

“Referências ao senso comum e a solidez de suas crenças encontram-se frequentemente em Marx. Contudo, trata-se de referências não à validez do conteúdo de tais crenças, mas sim a sua solidez formal e, consequentemente, à sua imperatividade quando produzem normas de conduta. Aliás, em tais referências, está implícita a afirmação da necessidade de novas crenças populares, isto é, de um novo senso comum e, portanto, de uma nova cultura e de uma nova filosofia, que se enraízem na consciência popular com a mesma solidez e imperatividade das crenças tradicionais."

Antonio Gramsci (1891-1937), Cadernos do Cárcere, 4ª Edição, v,1, p.118. Editora Civilização Brasileira, 2006.

 

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Descaso com crise fiscal contamina Orçamento de 2026

Por O Globo

Acordo entre Congresso e governo amplia gastos em ano eleitoral, desprezando custo para o país

O descaso do governo e do Congresso com a crise fiscal ficou flagrante na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026 aprovada nesta semana. É como se, em Brasília, as leis gravitacionais que regem a economia tivessem sido revogadas, e a classe política vivesse num universo paralelo, onde as despesas pudessem subir até a estratosfera, o dinheiro crescesse feito mato em meio à grama da Praça dos Três Poderes, e o contribuinte estivesse sempre disponível para arcar com tudo, sem custo para o crescimento e o desenvolvimento do país.

O Judiciário mais forte do mundo, por Thaís Oyama

O Globo

Faz tempo que ‘forte’ deixou de ser adjetivo inocente. Passou a servir de aposto a políticos como Trump, Putin, Orbán, Erdogan

Alexandre de Moraes disse que “não há no mundo Poder Judiciário tão forte quanto o do Brasil”. O devaneio napoleônico do ministro do STF foi proclamado em evento nesta semana para explicar à plateia por que motivo o Judiciário sofre ataques contínuos de seus “inimigos”. É, segundo Moraes, uma reação proporcional à grandeza da instituição — que ele poderia ter enaltecido como “atuante", “independente”, “inquebrantável” ou outra dezena de adjetivos de que seu vasto vocabulário de juiz certamente dispõe. Preferiu dizer que é porque o Judiciário brasileiro é “forte” — segundo ele, o mais forte das galáxias.

Faz tempo que “forte” deixou de ser um adjetivo inocente. Na tradição da ciência política que fala em “Estados fortes” e “Estados fracos”, os Estados Unidos da Guerra Fria eram o modelo de Estado fraco, por ser descentralizado e baseado no sistema de freios e contrapesos. O Estado forte por excelência era a União Soviética: centralizado, opaco, autoritário.

A crise mais urgente, por Flávia Oliveira

O Globo

O país sempre foi território hostil às pessoas do sexo feminino, mas a brutalidade alcançou patamar inaceitável neste 2025

A despeito do esforço dos homens dos Poderes em buscar holofotes para o permanente estado de crise entre Executivo, Legislativo e Judiciário, não há nada mais urgente no Brasil do que a epidemia de violência contra mulheres. O país sempre foi território hostil às pessoas do sexo feminino, mas a brutalidade alcançou patamar inaceitável neste 2025, em que agressões e assassinatos, em vias públicas, são filmados e exibidos em looping sem que Lulas, Alcolumbres, Mottas e Gilmares interrompam as picuinhas de Brasília em socorro ao grupo populacional que é maioria na população, no eleitorado e no comando das famílias. O Ministério da Justiça registra quatro feminicídios, sete homicídios, 196 meninas e mulheres vítimas de estupro a cada dia. E o país segue funcionando como se violentadas elas não fossem.

Quatro mortes e uma prisão, por Eduardo Affonso

O Globo

Instituições psiquiátricas, não para prender, dopar ou isolar, mas para socorrer, teriam salvado João e Gerson de si mesmos

Os personagens desta crônica se chamam Leona, Layse, Allane, Gerson e João. Deveria haver também um anjo, mas este só costuma aparecer nas narrativas sobrenaturais, e estamos no Brasil, no âmbito do surreal. Desses cinco, quatro estão mortos — e a sobrevivente continua condenada à prisão perpétua, sem ter jamais cometido crime algum.

Layse e Allane morreram por ser mulheres — o que, pela legislação, não é conduta passível de pena capital. Mas calhou de seu caminho profissional cruzar o de João, que padecia de uma doença severa e não tratada — cujo nome foi tão banalizado que perdeu a gravidade: misoginia.

Flávio Bolsonaro se lança à Presidência com aval do pai

O Globo

Por Luísa MarzulloLauriberto PompeuGabriel Sabóia e Jeniffer Gularte 

Centrão frustrado, apoio da família e silêncio de Tarcísio: tudo sobre o anúncio da candidatura de Flávio Bolsonaro

Senador diz ter sido escolhido por Bolsonaro para disputar o Planalto em 2026

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou nesta sexta-feira (5) ter sido escolhido pelo pai, Jair Bolsonaro, para concorrer à Presidência da República em 2026. Com o movimento, o ex-presidente passa a centralizar, da cadeia, o projeto político de parte da oposição, além de frustrar partidos do Centrão, que buscam uma união em torno do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na sexta, dirigentes de partidos como PP, União Brasil, Republicanos e PSD avaliavam que a indicação de Flávio, caso seja concretizada, irá isolar o bolsonarismo, levando essas legendas a adotar a neutralidade no ano que vem.

O entendimento, contudo, é que esse cenário pode ser revertido. Integrantes desses partidos acreditam que Flávio não possui musculatura para decolar em uma campanha presidencial e a iniciativa servirá para testar o sobrenome Bolsonaro na pré-campanha. Essa é a mesma leitura do Palácio do Planalto, que por enquanto comemora a desarticulação da direita.

Ungido pelo pai, Flávio Bolsonaro anuncia pré-candidatura, por Vinicius Doria

Correio Braziliense

O filho de Jair Bolsonaro, preso na Polícia Federal, anuncia candidatura à Presidência da República e diz que conta com a bênção do ex-presidente. Mercado, que torce por Tarcísio, reage, com Bolsa caindo 4,31% e dólar subindo a R$ 5,43

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou, nesta sexta-feira (5), que será o nome da família na disputa à Presidência da República, no ano que vem. Ele assegurou a aliados que a decisão foi tomada pelo pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, que o orientou a viajar pelo país para consolidar a pré-candidatura. A escolha foi definida na última terça-feira, após Flávio visitar o pai na Superintendência da Polícia Federal em Brasília, onde cumpre pena de 27 anos de prisão por liderar uma conspiração golpista.

"É com grande responsabilidade que confirmo a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de nação. Eu não posso, e não vou, me conformar ao ver o nosso país caminhar por um tempo de instabilidade, insegurança e desânimo. Eu não vou ficar de braços cruzados enquanto vejo a esperança das famílias sendo apagada e nossa democracia sucumbindo", anunciou Flávio, em uma rede social.

Convocação à classe média, por Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo

É essencial que as faixas mais altas da classe média ponham mãos à obra, dando a partida para uma grande reforma de fora para dentro

Caros leitores e leitoras, penso que o Brasil tem condições de resistir a Lula e ao senador Davi Alcolumbre (União-AP), um de cada vez, mas aos dois juntos, francamente, me parece difícil.

O sr. Alcolumbre, atual presidente do Senado Federal, encarna à perfeição uma das facetas tragicômicas do nosso presidencialismo. Um único membro do Congresso ameaça derrubar ladeira abaixo todo o ajuste fiscal que a duras penas vem sendo feito. Por quê? Ao que me consta, porque ficou melindrado por Lula não lhe ter dado ciência prévia do nome que pretendia indicar, como de fato indicou, para o Supremo Tribunal Federal (STF). No sistema parlamentarista, como todos sabem, o comportamento do senador Alcolumbre seria razão suficiente para o chefe de governo (o primeiro-ministro) solicitar ao chefe de Estado (o presidente da República) a dissolução da vigente legislatura e convocar novas eleições. Tal decisão nem precisaria ser consumada. A simples ameaça levaria no mínimo 400 congressistas a enquadrar o nobre senador pelo Amapá. Digo mesmo que essa hipotética situação nem faria sentido, porque o presidente do Senado, ciente da possibilidade da convocação de eleições antecipadas, não adotaria tal comportamento.

Populismo penal, Miguel Reale Junior

 O Estado de S. Paulo

A exasperação das penas não leva a qualquer efetiva intimidação. Mais importante do que a dureza da pena prometida é a certeza de sua aplicação

O publicitário Roberto Medina, criador do Rock in Rio, foi sequestrado em 6 de junho de 1990, mantido em cativeiro até o pagamento de resgate.

A relevância social da vítima levou à reação do Congresso Nacional, editando a Lei dos Crimes Hediondos, Lei 8.072/90, que qualificava como hediondo o crime de extorsão mediante sequestro, cuja pena seria cumprida em regime fechado. As extorsões mediante sequestro, todavia, aumentaram após a edição da lei.

Mas o populismo penal prevalecia. A cada crime impactante, nova lei repressora. O assassinato de Daniela Perez levou a se criar movimento nacional reclamando-se maior rigor na apenação do homicídio, atendido pela Lei 8.930/1994, ao introduzir o homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos.

O autoritarismo virtuoso de Gilmar, por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Não há dúvida sobre o que fez Gilmar Mendes. Tomou prerrogativa do Congresso e desarranjou o sistema de freios e contrapesos para interditar qualquer possibilidade de processo de impeachment contra ministro do Supremo. Não deixará de ser forma de proteção a minoria. Tudo pela democracia. Blitz corporativista que apregoaria como se promovida em defesa do equilíbrio entre Poderes.

Sob o espírito do 8 de janeiro permanente, que já autorizou censura em nome de nos proteger de golpe eternamente à espreita, Mendes – de modo a salvaguardar o estado democrático de direito – criou um estado de direito específico para ministro do STF. Forjada modalidade de proteção à autonomia que garante a independência do Poder tornando-o inalcançável.

Senador dá troco em Michelle e prejudica economia de Lula, por Raquel Landim

O Estado de S. Paulo

Os dirigentes do PL repetem que, se Jair Bolsonaro indicou, está resolvido: o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) é o candidato do partido à Presidência da República. Mas será mesmo?

Tem muita gente colocando em dúvida por alguns motivos.

Primeiro, o timing. O anúncio veio após uma briga pública na família Bolsonaro em que os irmãos saíram humilhados pela madrasta Michelle Bolsonaro. Ser o escolhido pelo pai como candidato à Presidência parece o troco perfeito. Segundo, a maneira. O senador diz ter consultado o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e ter comunicado o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). Mas foi um anúncio sem pompa e circunstância. Por uma nota na imprensa e depois uma publicação nas redes.

Terceiro, o aval. Flávio visitou Jair Bolsonaro na terça-feira na sede da Polícia Federal, onde o ex-presidente cumpre pena. Na quinta-feira, quem esteve por lá foram Michelle e Laura. Em que momento Jair passou o bastão?

O drama familiar do bolsonarismo, por Juliana Diniz

O Povo (CE)

Ela tem se mostrado mais carismática, ativamente engajada com os eventos do partido por todo o país, falando em nome de um Jair Bolsonaro agora inteiramente ausente, recolhido à prisão

A aliança entre o bolsonarismo e o grupo político de Ciro Gomes está em estado de espera desde que Michelle Bolsonaro deixou claro seu descontentamento em visita ao Ceará. Como escreveu Gualter George, é surpreendente que um político dado a respostas prontas tenha engolido a rejeição pública em silêncio.

Eduardo e Flávio Bolsonaro tentaram reagir e André Fernandes até ensaiou uma resposta, invocando a liderança de Jair. A verdade é que, com o líder preso e filhos tão incapazes, coube a Michelle Bolsonaro ocupar uma posição estratégica dentro do campo.

Ex-presidente tenta manter controle da direita diante de racha públicos na família, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Anúncio vem na esteira de movimento de independência de Michelle Bolsonaro

Candidatura do senador não agrada ao centrão e dificultaria vitória sobre Lula, mas poderia engajar militância bolsonarista

Três hipóteses podem explicar o anúncio do senador Flávio Bolsonaro (PL) como o indicado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a corrida presidencial de 2026.

A primeira delas, mais certeira, diz respeito à tentativa de Bolsonaro de manter sua influência e controle sobre a direita mesmo da prisão.

O anúncio desta sexta-feira (5) vem em um momento em que se escancaram os rachas no grupo —desde os ataques do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) até a união dos filhos do ex-presidente contra a madrasta, Michelle Bolsonaro (PL).

Nesse sentido, a indicação de Flávio é um recado para mostrar quem manda e um direcionamento para unir a direita sob a tutela de Bolsonaro.

Dois presidentes na prisão, por Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo

Lula preso de 2018 definiu estratégia clara para o PT

Bolsonaro preso de hoje administra o caos que engolfa seu movimento político

conflito crônico entre Michelle Bolsonaro e seus enteados eclodiu à luz do dia, destroçando a aliança do PL com Ciro Gomes no Ceará. O episódio ilumina um contraste: o Lula preso de 2018 definiu uma estratégia clara para o PT; o Bolsonaro preso de hoje administra o caos que engolfa seu movimento político.

Da sua sala na PF de Curitiba, Lula orientou as narrativas da resistência. À sua sombra, o PT insistiu na lenda do golpe parlamentar para esquivar-se das responsabilidades pelo fracasso do governo de Dilma Rousseff. Seguindo a linha traçada pelo líder, vestiu-se de vermelho, firmou alianças restritas ao campo da esquerda e enfrentou a batalha desigual.

O voo de Michelle, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Presidente do PL Mulher reprovou publicamente aliança no Ceará a despeito de orientação do partido e aval de Bolsonaro

Se antes Jair conseguia tolher independência da companheira, hoje está isolado, fragilizado e depende de Michelle

Quando tinha 17 anos, Carlos Bolsonaro recebeu uma ingrata missão do pai: derrotar a mãe, a então vereadora Rogéria Bolsonaro, nas eleições para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

Primeira mulher de Jair Bolsonaro, Rogéria se elegeu vereadora em 1992. Sua candidatura havia sido encampada pelo marido, com a premissa de que ela deveria consultá-lo e seguir suas orientações.

Eduardo Paes sai da sombra, por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Prefeito entra de vez na campanha ao Palácio Guanabara em 2026

Principal adversário está preso, acusado de vazar informações de operação contra o CV

A impressão é que de vez em quando Eduardo Paes se lembra de que será candidato a governador do Rio de Janeiro em 2026. Na verdade, ele trabalha na sombra, como gosta.

Gato escaldado pela derrota em 2018, procura fazer alianças no interior do estado, onde sua rejeição é maior do que na capital, e, sobretudo, negociar o voto evangélico, tarefa nada fácil para quem tem um perfil abertamente carnavalesco. Em 2022, o bolsonarismo levou, à exceção do Rio, a maioria entre as mais importantes prefeituras fluminenses.

Messias no Supremo, por Pedro Serrano

CartaCapital

A indicação favorece o propósito de chancelar novas etapas do processo de amadurecimento do Judiciário como instrumento democrático

A indicação de Jorge Messias, advogado-geral da União, ao Supremo Tribunal Federal ocorre em um momento singular da história do Poder Judiciário no Brasil. Sufocada pelo autoritarismo do Executivo durante o período ditatorial, nossa Corte, mesmo durante a retomada da democracia, seguiu atada a ditames de uma elite conservadora que, invariavelmente, se agarra à manutenção de seus privilégios nas tratativas de poder no País. Por longo tempo, muitos, equivocadamente, enxergaram o Judiciário como um apêndice do Executivo, algo característico de regimes totalitários. Com o fim da ditadura, nossa Corte aos poucos precisou retomar a ciência de seu verdadeiro papel de guardiã dos princípios constitucionais de um Estado Democrático de Direito.

A democracia ameaçada, por Marcus Pestana

No século XX, tínhamos convicções e princípios sólidos – seja qual fosse a matriz de pensamento de nossa preferência – sobre o horizonte estratégico a perseguir. Não ficou pedra sobre pedra. “Tudo que é sólido desmancha no ar”. Socialistas viram sua utopia esfarelar junto com a poeira do Muro de Berlim. Liberais depararam-se com a falta de Estado gerando, em 2008, a maior crise global do capitalismo desde a Grande Depressão de 1929. Socialdemocratas assistiram o Welfare State encontrar seus limites fiscais.