terça-feira, 1 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lula é quem mais tem a perder com o ‘nós contra eles’

O Globo

PT erra ao tentar manter aumento de impostos e ao dizer que só os mais ricos pagarão a conta

No embate com o Congresso em torno do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT optaram mais uma vez pela tática do “nós contra eles”. Em vídeos feitos para redes sociais, o “povo” carrega pesados fardos nas costas (os impostos), enquanto personagens bem vestidos, representando os “ricos”, levam pequenas sacolas simbolizando taxação leve. Mais uma vez, o governo tenta justificar sua tentativa de promover um ajuste fiscal aumentando receitas, em vez de cortar gastos. A tática usada para fustigar o Congresso é um equívoco tanto do ponto de vista econômico quanto do político.

É verdade que a estrutura de impostos brasileira é regressiva (em termos proporcionais, as faixas de renda mais alta arcam com carga menor de impostos). Pode fazer sentido, por isso, corrigir a base de cálculo do Imposto de Renda em benefício das faixas de menor renda. Mas é absurdo acreditar que a alta do IOF afete apenas os mais ricos. O tributo recai sobre empréstimos, cartões de crédito e outras operações financeiras. Seu aumento nas transações cambiais encarece importações, alimentando a inflação e punindo os mais pobres. O empréstimo rotativo do cartão, usado sobretudo pelos pobres, também fica mais caro. E saem perdendo os microempreendedores individuais (MEIs), que buscam crédito para financiar equipamentos como carrinhos de venda ou máquinas de costura.

Os bastiões democráticos - Merval Pereira

O Globo

O Congresso, mesmo com seus defeitos, tem as qualidades necessárias para ser a garantia democrática no país

O Brasil recente tem vários responsáveis por manter a democracia a salvo de usurpadores. Além da imprensa independente, o Supremo Tribunal Federal (STF), na tentativa de golpe bolsonarista, ou as Forças Armadas, que negaram apoio ao golpe, mesmo que alguns de seus integrantes estivessem metidos nele. Assim como partidos políticos de centro, ou mesmo de direita não radical, ajudaram a equilibrar o cenário político quando surgiram ameaças, como nos primeiros governos petistas.

Quando o PMDB aderiu ao petismo, havia a certeza de que eventuais tentativas de avanços autoritários seriam barradas, o mesmo acontecendo com o Centrão. O Congresso, de maneira geral, tem sido o esteio democrático, pelo simples fato de que partidos políticos não se dão bem com ditaduras. Ao mesmo tempo, nossos salvadores passaram a se achar merecedores de licenças especiais para seus privilégios e benefícios e não aceitam críticas a desvios que se mostram cada vez mais frequentes, como as emendas parlamentares ou os penduricalhos do Judiciário.

A nova política digital - Pedro Doria

O Globo

Muçulmano de 33 anos gastou seu dinheiro, principalmente, em vídeos curtos no TikTok e no Instagram

A escolha pelo Partido Democrata do deputado estadual Zohran Mamdani como seu candidato a prefeito de Nova York abre algumas conversas sobre o momento da política. Mamdani é muçulmano, bastante jovem aos 33, bem de esquerda para padrões americanos e era um completo desconhecido até uns meses atrás. Ainda assim, os filiados ao partido o preferiram ao ex-governador Andrew Cuomo, próximo da liderança tradicional democrata. Um dos aspectos mais interessantes da eleição primária pode ser o seguinte: acabou a fase Twitter das campanhas eleitorais e entramos numa fase TikTok. As duas plataformas são muito diferentes, e o predomínio de uma sobre a outra muda como pensamos a transformação das democracias pelo meio digital.

A natureza da crise não é econômica - Míriam Leitão

O Globo

Nada há de desesperador na economia que justifique tamanha gritaria política e esse clima de fim de mundo

O governo decidiu judicializar a questão do IOF por entender que houve, por parte do Congresso, uma invasão de suas competências. O Executivo pode mudar a alíquota do IOF. O Projeto de Decreto Legislativo só seria cabível caso o governo tivesse indo além das suas prerrogativas. A ideia de que isso pode aumentar a temperatura do conflito não faz muito sentido, pois já está elevada e há pouco que o governo possa fazer para amenizar o clima. Normalmente, esse ambiente político surge quando a economia está em crise. Não é o caso agora, considerando que há uma série de indicadores bons.

IOF atrai o STF para estresse entre Poderes – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A judicialização do caso do imposto é mais um episódio da crise de governabilidade estrutural entre Lula e o Congresso. Alexandre de Moraes será testado mais uma vez

A decisão de redistribuir para o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a relatoria da ação movida pelo PSol contra a sustação do decreto do IOF amplia e transfere o estresse entre Executivo e Legislativo para a Corte. Ainda mais porque o ministro é o relator das ações contra os golpistas de 8 de janeiro de 2023, que estão sendo julgadas na Primeira Turma, sendo o ex-presidente Jair Bolsonaro o mais importante dos réus. Embora a constitucionalidade da decisão do Congresso seja uma questão técnica, o que está em xeque é a relação de poder entre Executivo, Legislativo e Judiciário.

Governo dobra a aposta e vai ao Supremo pelo IOF

Por Danandra RochaWal Lima e Fabio Grecchi / Correio Braziliense

Ação será impetrada hoje pela AGU e entregue ao ministro Alexandre de Moraes para relatá-la. Mais cedo, presidente da Câmara, Hugo Motta, publicou vídeo com recados ao Palácio do Planalto deixando claro que congressistas não vão recuar

Apesar das advertências de setores do governo e do próprio PT, o Palácio do Planalto decidiu dobrar a aposta feita pelo Congresso e vai ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a derrubada do decreto que aumenta o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A Advocacia-Geral da União (AGU) protocolará hoje a ação, que será imediatamente encaminhada ao ministro Alexandre de Moraes — que analisa medida semelhante impetrada pelo PSol.

A decisão tem tudo para acirrar, ainda mais, a crise entre o Executivo e o Legislativo, e trazer o Judiciário para o ringue. O governo, porém, pretende argumentar junto aos líderes partidários do Congresso dois pontos: 1) que a medida tem base jurídica, conforme a análise feita à AGU e repassada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva; e 2) que não se trata de afrontar o Congresso, mas, sim, defender uma prerrogativa do Executivo.

Partidos negociam federações para 2026 e tentam superar divergências - Joelmir Tavares

Valor Econômico

Siglas intensificam conversas pensando em fortalecimento e sobrevivência, mas experiências fracassadas, como PSDB/Cidadania, evidenciam riscos do arranjo

A aproximação do calendário eleitoral de 2026 intensificou as negociações entre partidos para a formação de federações, como alternativa para o ganho de musculatura política ou a própria sobrevivência. Apesar da multiplicação de tratativas entre dirigentes nos bastidores, o fechamento de acordos esbarra em interesses locais e na disputa de comando. A iniciativa mais recente é a da aliança entre Solidariedade e PRD, que foi anunciada na semana passada e adotou estratégia para tentar se blindar de atritos.

No arranjo da federação, que começou a funcionar no país em 2021, duas ou mais legendas fazem uma espécie de consórcio para disputar eleições e devem atuar em conjunto, no território nacional, por no mínimo quatro anos. Na prática, cada uma mantém sua identidade, mas a atuação delas precisa ser alinhada. Hoje o Brasil tem, oficialmente, três federações: PT/PCdoB/PV, Psol/Rede e PSDB/Cidadania. Outras, no entanto, estão em processo de formação ou discussão.

Avenida sem povo escancarou estratégias - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Fracasso de público barateia o pedágio que Tarcísio terá que pagar ao ex-presidente, mas Bolsonaro aposta na eleição do Congresso para ser o fiador de quem vencer em 2026

O ato mais esvaziado do bolsonarismo desde que o ex-presidente deixou o poder foi também aquele que mais explicitou a estratégia de seu campo político. A caminho da condenação, Jair Bolsonaro evitou melindrar o STF. Preferiu se voltar contra o PT e o lulismo.

Parece convencido de sua inelegibilidade, mas não pediu voto nem mesmo para o governador de São Paulo, ao seu lado. Só quer que o eleitor lhe dê metade do Congresso e destine a outra metade para o Centrão.

O público de 12,4 mil pessoas sugere um bolsonarismo de fogo morto, mas enquanto for bancado pela maior legenda da Câmara, sua estratégia importa - até porque não mais se limita a sua autodefesa. A ausência da ex-primeira-dama, Michelle Bolsonaro, sugere que o ex-presidente não põe suas fichas no único nome viável da família.

Além da rejeição majoritária, registrada nas pesquisas, o foco na eleição proporcional é resultado também de uma opção pelo bolsonarismo de resultados. Foi a carona a parlamentares do PL como Nikolas Ferreira (MG), Cleitinho (MG), Sóstenes Cavalcante (RJ), e Paulo Bilynski (SP) que, em grande parte, garantiu a sobrevida ao fundamentalismo bolsonarista - na religião, na segurança e nos costumes da República.

As raízes socioeconômicas do Trumpismo - Luiz Gonzaga Belluzzo

Valor Econômico

Trump exprime o declínio dos valores e das ideias que inspiraram os EUA na construção da ordem mundial do pós-guerra

Avaliado em seus próprios termos e objetivos, o projeto iluminista da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, está fazendo água diante da alucinante e alucinada competição entre as lideranças contemporâneas e seus asseclas para mergulhar o planeta nos esgotos da barbárie.

O filósofo Fredric Jameson, no livro “A Cultura do Dinheiro” já advertia no início do milênio: “Os quatro pilares ideológicos, jurídicos e morais do alto capitalismo — constituições, contratos, cidadania e sociedade civil — são, hoje, vadios maltrapilhos, mas sempre lavados, barbeados e vestidos com roupas novas para esconder sua verdadeira situação de penúria”. Não podemos colher outro ensinamento dos embates travados por Trump para tornar a América Grande Outra Vez.

Peço licença ao leitor para retomar considerações a respeito da Grande América, o país que emergiu dos sofrimentos das Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial.

Dados ou dogmas? O Brasil na encruzilhada - Luiz Schymura

Valor Econômico

Autoridade dos dados não vem apenas de planilhas precisas, mas de um equilíbrio delicado entre rigor científico, confiança política e uso pela sociedade

Um sistema de estatísticas de qualidade tem papel central no mundo contemporâneo. Não por acaso, pois na democracia de massas não há agenda nacional legítima sem alicerce estatístico. Na verdade, sem dados, a democracia vira um cabo de guerra de narrativas (exemplo: negacionismo da pandemia). As estatísticas representam o único campo de diálogo no qual governo, oposição e sociedade podem debater fatos. Contudo, é preciso frisar que a autoridade dos dados não vem apenas de planilhas precisas, mas de um equilíbrio delicado entre três pilares: rigor científico, confiança política e uso pela sociedade. Quando uma dessas frentes falha - seja por manipulação, isolamento técnico ou descrédito popular -, os dados perdem poder. Por conta disso, a autoridade dos dados não é dada: deve ser conquistada e mantida a cada dia.

Quem o Congresso derrotou - Jorge J. Okubaro

O Estado de S. Paulo

Ao contrário do que pareceu, o Congresso não protegeu a maioria da população ao derrubar o decreto de aumento do IOF

Uma interpretação conveniente para a preocupante derrota que o Congresso impôs ao governo na semana passada, ao derrubar com grande rapidez e facilidade o decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), é a de que, mais uma vez, os interesses da população foram protegidos. De fato, com a decisão – cuja constitucionalidade é tema de controvérsia –, senadores e deputados evitaram um aumento da tributação. E devolveram ao Executivo a tarefa de realizar o ajuste das contas especialmente pelo lado das despesas.

É preciso, no entanto, examinar qual é a base de cálculo do tributo e, assim, quem seria afetado. O aumento incidiria sobre operações financeiras como câmbio, compras com cartões internacionais e crédito para empresas. É difícil imaginar que a maioria da população viesse a ter sua segurança financeira comprometida com isso. Mas, certamente, haveria contribuintes afetados. Não é difícil imaginar qual é a parte da sociedade que realiza tais operações com intensidade suficiente para que um aumento do IOF afete suas finanças pessoais ou corporativas. Por isso, ao contrário do que pareceu, o Congresso não protegeu a maioria da população. Derrotou-a.

Sem paixão, sem esperança - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

2026 aponta para a direita radical contra uma direita não radical travestida de centro

Na crise de inércia que assola Brasília e se acentua nesta semana, todos disputam força, poder e espaço, sem compreender que não há vencedores, só vencidos, e o maior exemplo veio do domingo na Avenida Paulista, onde Bolsonaro pôde sentir ao vivo o declínio de sua liderança e relevância. Nem 13 mil pessoas, para quem sacudia o País com multidões acachapantes?

A força mobilizadora de Bolsonaro está se desmilinguindo a olhos vistos, como a do PT e do próprio presidente Lula há muito mais tempo, desde mensalão e petrolão. Não há mais líderes capazes de atrair povo nas ruas, não há mais paixão, crença, confiança. Tudo somado, a esperança evaporou?

Ou repensamos as emendas ou adotamos o parlamentarismo - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Seja qual for o governo, ele precisará encontrar propostas suas que convirjam com a maioria do Congresso

O governo é o defensor abnegado de gastos sociais e do bem público, enquanto o Congresso, com sua sede por emendas, defende os interesses privados escusos do "andar de cima". Tem sido essa a tônica dos discursos de apoio ao governo Lula em meio às derrotas que tem sofrido nas mãos dos parlamentares. Na realidade, tanto os sempre crescentes gastos do governo quanto as emendas parlamentares atendem a setores da população (andar de cima e de baixo) e estão sujeitos à corrupção.

Deixando de lado o discurso maniqueísta, cabe reconhecer que há sim uma relação cronicamente conflituosa entre Congresso e Executivo. De uns anos para cá, o lado mais forte tem sempre sido o Congresso. Quem tentou antagonizá-lo —DilmaBolsonaro em seu primeiro ano de governo— levou a pior.

Na dúvida, censure - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Regulamentação de redes criada pelo STF é pouco clara e deverá promover exclusão preventiva de postagens

Se há um tema que não me comove, é o das redes sociais, que não uso. Do mesmo modo que não entendo como alguém pode gostar de sexo masoquista, não entendo como uma pessoa pode desperdiçar um bem escasso como o tempo com telas de rolagem infinitas que alternam entre irrelevâncias e disparates.

O mundo precisa de mais edição e não de menos. Eu ao menos gasto uma boa soma de dinheiro com a assinatura de publicações cujos editores selecionam para mim material de leitura que seja importante e tenha qualidade.

Estou ciente, porém, de que seres humanos variam enormemente em gostos e preferências. Assim como aceito sem problema que masoquistas extraiam prazer da dor, também aceito sem problema que pessoas dediquem suas vidas às redes sociais, se assim desejarem.

Pacto não escrito entre Poderes - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Legislativo, Executivo e Judiciário deixam intacto o que interessa de fato a uns e aos outros

Nessa série de atitudes passivo-agressivas entre os três Poderes —vide corte de gastos do Executivo, supersalários do Judiciário e aumento de cadeiras no Legislativo—, há uma evidência em forma de pacto não escrito: nenhum deles interfere nos interesses corporativos e/ou ideológicos do outro.

O Parlamento eleva despesas, o governo propõe, mas não trabalha efetivamente pelo fim dos privilégios de magistrados, e o Supremo Tribunal Federal faz de conta que não é com ele, aludindo, quando convém, ao princípio da não interferência.

O principal alvo de Alcolumbre e Motta é Dino; Lula, o bônus - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Com fome de poder e dinheiro, Congresso age de maneira disfuncional

Quando o roubo é rotineiro, fácil de executar e há por trás dele uma rede de proteção, os cuidados para ocultar o dinheiro diminuem. Pense nos políticos acostumados a guardar bufunfa viva para comprar apartamentos. Usavam como esconderijo panelas, meias, cuecas, até as nádegas.

Hoje qualquer lugar serve. Na sexta (27), a PF achou maços de dinheiro —no total, R$ 3,2 milhões— espalhados num guarda-roupa ao deflagrar a quarta etapa da operação Overclean, cujo objetivo é desarticular organizações criminosas envolvidas no desvio de emendas parlamentares. Ligados ao deputado Félix Mendonça (PDT-BA), três prefeitos foram afastados.

Partido Comunista do Chile terá protagonismo inédito após vitória de Jeannette Jara nas primárias

Rafael Carneiro / O Estado de S. Paulo

Militante do partido desde 1999, a esquerdista tem um perfil mais moderado e poderá enfrentar embates com a sua sigla

SANTIAGO - A escolha de Jeannette Jara como candidata governista nas eleições presidenciais do Chile, que serão realizadas no final do ano, marcam um feito histórico. Pela primeira vez, desde a redemocratização, em 1990, o Partido Comunista terá um candidato para disputar o principal cargo do Executivo. No último domingo, 29, a ex-ministra do governo de Gabriel Boric obteve 60,16% dos votos, derrotando com facilidade os seus adversários.

Fundado em 1922, o Partido Comunista do Chile tem sua origem ligada aos movimentos trabalhistas e sociais do início do século 20, à difusão da filosofia política marxista e à Revolução Russa, de 1917. Após o fim da ditadura militar, quando foi considerado ilegal pelo governo de Augusto Pinochet, o partido ressurgiu no cenário político avançou de maneira lenta. Em 1999, fez oposição à Concertação (antiga coalizão de centro-esquerda), em 2010 conquistou cadeiras no parlamento e somente em 2014 conseguiu integrar um governo. Isso ocorreu no segundo mandato de Michelle Bachelet por meio da coalizão Nova Maioria. Ainda assim, sem protagonismo. Oito anos depois, o partido esteve na base que ajudou a eleger Boric.

As aventuras de Daniel na Cova da Democracia - Vagner Gomes*

“Uma das obras mais antigas no cânone do pensamento político, A República, de Platão, escrita por volta do ano 400 a.C., oferece uma avaliação franca da centralidade das mentiras para a política. Platão defendeu o que chamou  de ‘mentira nobre’ para justificar o que, de outra forma, poderia ser considerado injustificável: uma ordem social desigual. Seu argumento era que apenas algumas pessoas são adequadas para governar. (…)”

Simon Tormey, Populismo: uma breve introdução. P. 158.

A literatura brasileira se enriquece com a publicação de Esquema de Jessé Andarilho. Literatura e antropologia política se entrelaçam numa história que impacta por expor como as camadas populares, sob as margens das políticas públicas, exercem uma luta pela sobrevivência na constante recorrência ao “jeitinho brasileiro”. Temos um romance que nos faz reencontrar o clássico Carnavais, Malandros e Heróis (1979) de Roberto DaMatta no personagem Daniel Piloto que de motorista de transporte alternativo ascende ao universo da política sempre por caminhos distantes da honestidade.

A interpretação da ascensão política do voto bolsonarista na Zona Oeste carioca por duas eleições seguidas é um desafio que ainda precisa ser mais bem pesquisado pelos especialistas em comportamento político e eleitoral. Entretanto, nessa ficção, há alguns indícios etnográficos que os investigadores têm condições de mensurar. Assim como Nestor Duarte (1902 – 1970) nos permitiu uma interpretação sobre o vaqueiro no sistema político baiano no romance Gado Humano (1937), Jessé Andarilho deixa indícios de que a mencionada “polarização afetiva” seria um mito carnavalizado num universo em que a variável constante é o conservadorismo da sociedade brasileira.

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Poesia | Restos de carnaval, de Clarice Lispector

 

Música | Antonio Nobrega - SEM ANISTIA - vídeo gravado no Sesc Pinheiros 2025