sábado, 25 de abril de 2009

Uma escola melhor pode consertar até o Congresso

Fernando Abrucio
DEU EM ÉPOCA

O mundo vem passando por intensas mudanças tecnológicas, no campo da comunicação e no processo da democratização do poder. Constantemente temos a impressão de que várias das instituições atuais não conseguem acompanhar tão retumbante transformação. É difícil mudar isso rapidamente. No longo prazo, essa frustração poderá ser reduzida criando uma nova mentalidade nas pessoas que comandarão as organizações sociais mais relevantes.

Nesse processo, as escolas ocupariam papel fundamental. Mas será que elas estão preparadas para cumprir a tarefa de criar a ponte para o futuro?

Isso só será possível se, além de ter qualidade, elas conseguirem se tornar atraentes para os alunos. Uma pesquisa realizada pelo professor Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), revela que boa parte dos jovens brasileiros abandona os estudos principalmente porque o atual ambiente escolar não lhes interessa. Há ainda motivações econômicas e relacionadas à falta de qualificação do ensino público, mas o maior fator de repulsão é o desinteresse por continuar frequentando as escolas. Esse resultado é preocupante porque a evasão escolar se concentra nos mais pobres. E a educação é a melhor forma de romper o ciclo de pobreza e exclusão.

A explicação para esse processo envolve várias causas. Parte do desinteresse dos jovens constrói-se na própria família. Pesquisas recentes do Ibope mostram que são exatamente os pais mais pobres e menos escolarizados que dão as notas mais altas à qualidade da educação. Isso decorre da percepção de que seus descendentes terão mais escolaridade que eles, além de alimentação, maior segurança (particularmente nos centros urbanos) e até mais renda. Para além desses fatores, eles não conseguem enxergar a relação entre qualidade do ensino e a mudança da vida de seus filhos. O trabalho de Marcelo Neri constata que são poucos os jovens carentes que veem a escola como um veículo para mudar sua vida ou para dar conta dos seus anseios. Tal percepção nasce, em boa medida, da fragilidade do sistema público de educação no Brasil.

Se acertarmos na educação, os jovens poderão mudar as organizações antigas que resistem às inovações

Vale a pena acompanhar os estudos internacionais e brasileiros que mostram como melhorar a educação. Fico aqui com os aspectos mais citados pela literatura. Primeiro, a qualidade de um sistema escolar não pode ser maior que a de seus professores, portanto a seleção dos docentes e sua capacitação contínua é peça-chave. Segundo, é preciso ter um sistema de incentivos que motive o professorado a melhorar seu desempenho. Terceiro, a comunidade precisa participar da educação de seus filhos, acompanhando e cobrando as escolas.

Um quarto fator reside no papel dos gestores escolares, fundamentais para coordenar e liderar a transformação das práticas pedagógicas. Por fim, o sucesso de tudo isso depende de uma avaliação ininterrupta das práticas educacionais, pois sabemos muito pouco ainda das reações dos principais interessados: os alunos, principalmente os adolescentes e jovens, cujo universo parece bem mais interessante que o discurso de seus professores.

O que está em jogo, no fundo, é como aliar os novos modelos institucionais e pedagógicos com o envolvimento dos principais atores do sistema escolar: professores, pais e alunos. Tal desafio será discutido no dia 27, em seminário na FGV, no Rio de Janeiro. Estarei por lá e deixo aqui a síntese da minha exposição (ou provocação). As pesquisas têm avançado no conhecimento dos fatores de fracasso ou sucesso educacional, mas sabemos muito pouco sobre o que querem e o que poderia conquistar os jovens brasileiros, particularmente os mais pobres. Se acertarmos na educação desses alunos, eles serão preparados para mudar as organizações antigas que sobrevivem a um mundo em intensa transformação – como é o caso do Legislativo brasileiro e de sua insistência em manter práticas patrimonialistas que resistem à passagem do tempo.

Fernando Abrucio é doutor em Ciência Política pela USP, professor da Fundação Getúlio Vargas (SP) e escreve quinzenalmente em ÉPOCA

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