segunda-feira, 29 de maio de 2017

Definição de regra será essencial para medir força de Maia em indireta

Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro e Luísa Martins | Valor Econômico

BRASÍLIA - A força eleitoral do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na eventual eleição indireta para substituir o presidente Michel Temer em caso de cassação ou renúncia do pemedebista pode ser reduzida a depender do colégio eleitoral que será estabelecido, avaliam técnicos legislativos e políticos. Esse impasse é um exemplo da queda de braço que deverá ocorrer na regulamentação do processo, que hoje traz mais dúvidas do que certezas.

Além de contar com a possibilidade de distribuir cargos e recursos como presidente interino, cargo que ocuparia por até 30 dias, Maia parte na frente dos adversários, na avaliação de congressistas, por contar com trânsito maior entre os deputados, que, pela lógica, seriam a maioria dos votantes - são 513 deputados para apenas 81 senadores.

A regra sobre o colégio eleitoral, contudo, não está definida. A Constituição Federal diz apenas que, em caso de vacância de presidente e vice-presidente da República nos dois últimos anos do mandato, a eleição será feita em 30 dias pelo Congresso na forma da lei - que nunca chegou a ser editada.

A lei mais próxima (4.321/1964), usada como parâmetro na ausência de norma atual, foi aprovada para a eleição indireta do general Humberto Castelo Branco como primeiro presidente do regime militar. Também serviu para a eleição de Arthur da Costa e Silva em 1966. Os outros três presidentes militares foram escolhidos com base em outra lei, que exigia voto aberto, assim como na eleição de Tancredo Neves.

Em estudo de 2011 que está servindo como base para as discussões do corpo técnico do Congresso, o ex-consultor legislativo Ricardo Nunes de Miranda sustenta, contudo, que o modelo unicameral, em que o voto dos senadores e deputados tem peso igual, não foi incorporado pela Constituição. Ele cita comentários dos juristas Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins nessa linha.

"A Constituição Federal de 1988, quando disciplina o funcionamento do Poder Legislativo, não se refere em momento algum ao plenário do Congresso e sim ao plenário de suas Casas, como não há referência à apreciação pelo Congresso Nacional e sim à apreciação pelas duas Casas do Congresso. Da mesma forma, não há a previsão de sessão do Congresso e sim de sessão conjunta das duas Casas", diz o estudo. O regimento comum também faz a diferenciação.

Em todos os artigos da Carta Magna e dos Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a única menção ao sistema unicameral é para a revisão constitucional de 1993.

Todas as pautas analisadas pelo Congresso desde 1988, como vetos presidenciais e as leis orçamentárias, são votadas separadamente por deputados e senadores. Se a Câmara derruba um veto, mas o Senado mantém, vale esta última decisão. Se uma das Casas aprova um projeto, mas a outra rejeita, ele é arquivado.

É o sistema bicameral, com uma casa de origem e outra revisora. Com isso, o peso dos senadores, que são 81, é proporcionalmente maior do que dos deputados, que são 513. No caso de uma eleição indireta com múltiplos candidatos não há regra e a maioria dos técnicos - inclusive o autor do estudo - defendem um colégio único, para evitar que cada Casa escolha candidato diferente.

A diferença pode alterar a definição de quem comandará o país no mandato tampão e deve causar disputas. No modelo unicameral, por exemplo, o PMDB conta com um quarto dos votos entre os senadores, mas só 14% no Congresso todo. Um grupo de senadores já tem se mobilizado nos bastidores para fazer prevalecer o modelo de dupla votação.

Esse imbróglio pode ser aproveitado por candidato com mais apoio no Senado, mas menos trânsito na Câmara, "equilibrar" o jogo. Um dos favoritos dos tucanos, o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), tem contra ele, justamente, o pouco apoio no Centrão da Câmara e nanicos, por onde Maia circula com mais desenvoltura.

Também há discussões sobre se o voto deve ser aberto ou secreto. Em discussão em 2009, por causa da eleição indireta em Tocantins, o Supremo Tribunal Federal (STF) ponderou que os dois modos são válidos e a decisão cabe ao Congresso. A Lei de 1964 determina o voto secreto.

Outros questionamentos são se regras das eleições regulares, como prazo mínimo de um ano de filiação a partido político e seis meses fora de cargos públicos serão válidos. A tendência é reduzir esses prazos, na avaliação de técnicos e parlamentares, mas a mudança também deve ser alvo de disputa porque pode deixar de fora parte nomes como o do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), ou integrantes do Judiciário como o ex-ministro Ayres Britto (sem partido).

Os únicos exemplos de eleições indiretas desde a redemocratização mostram cenário tortuoso para definir as regras. Em três semanas, a Assembleia Legislativa do Tocantins aprovou duas leis para regulamentar a eleição - a primeira foi contestada no STF e revogada - e uma resolução. No Distrito Federal, a eleição indireta foi marcada por ações judiciais. Num primeiro momento, todas as dez chapas inscritas foram impugnadas e a assembleia teve que alterar as regras para permitir uma definição.

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