A discussão sobre os problemas que a democracia vem enfrentando em diversas partes do mundo, que a revista inglesa The Economist analisa em sua mais recente edição, coloca em primeiro plano o conceito mesmo de democracia. A revista inglesa atribui a decadência da democracia, entre outros fatores, ao sucesso do capitalismo de Estado na China.
No campo político, por exemplo, o presidente da Rússia Vladimir Putin (e não primeiro-secretário, como escrevi ontem) continua jogando pelas regras democráticas que ele manipula.
A revista inglesa, aliás, ironiza o fato de Putin ter sido nos últimos anos duas vezes primeiro-ministro e duas vezes presidente. Em entrevistas recentes e artigos, Putin deixa claro que os grandes conglomerados estatais serão os coordenadores da transição econômica para a alta tecnologia de que a Rússia precisa para competir globalmente.
À medida que na Rússia a classe média vem crescendo, as reivindicações aumentam, e as críticas à corrupção se difundem na sociedade. Mas o controle pelo governo do Parlamento e do sistema judiciário, o que caracteriza um hiperpresidencialismo próximo de uma ditadura disfarçada devido ao controle ou intimidação dos meios de comunicação, da mesma maneira que ocorre na Venezuela, impede que a insatisfação crescente se transforme, pelo menos até o momento, em uma reação mais concreta para barrar a ascensão de Putin.
A China, por sua vez, tem apresentado em diversos fóruns internacionais, através de acadêmicos chineses e estrangeiros, uma visão de democracia bastante crítica, muitas vezes correta, e ideias bastante criticáveis sobre o que seria a democracia ao estilo chinês.
A revista The Economist cita algumas delas, como a de Zhang Weiwei da Universidade Fudan, que diz que a democracia destrói o Ocidente por institucionalizar o bloqueio das atividades congressuais, como tem ocorrido nos Estados Unidos, e permitir que líderes de segunda classe como George W. Bush cheguem à Presidência da República.
Já Yu Keping da Universidade de Beijing diz que a democracia dificulta decisões simples e dá margem a que políticos populistas, mas de boa lábia enganem o povo.
Daniel A. Bell, canadense professor de Teoria Política da Universidade Tsinghua, e Yan Xueton, reitor do Instituto Internacional de Estudos da mesma universidade, discorreram em Davos no Fórum Econômico Mundial, e eu já escrevi aqui, sobre o confucionismo, que define que o governo deve servir ao povo e ter como prioridade a moralidade, e o legalismo, que prioriza a punição e o forte controle do país.
O canadense Bell considera que a China, ao buscar essa força moral de sua liderança, pode caminhar para a implantação de um sistema político que não será a democracia como nós a conhecemos no Ocidente, mas uma meritocracia que fará com que os escolhidos para o Parlamento possam representar realmente a vontade do povo e não apenas os que têm influência para atrair votos.
Dentro da mesma linha de raciocínio, o professor de Filosofia da East China Normal University (ECNU) Tong Shijun, fez na recente reunião da Academia da Latinidade em Kuala Lumpur uma análise sobre a importância do "soft power", uma terceira dimensão do poder, superando em certas ocasiões o econômico e o militar, para a expansão da cultura chinesa pelo mundo dentro do atual "século chinês".
Num mundo multipolar, esse “poder suave” nas relações com aliados, na assistência econômica e em intercâmbios culturais, resultaria em uma opinião pública mais favorável e maior credibilidade externa.
Segundo Tong Shijun, a importância do "soft power" chegou ao Congresso do Comitê Central do Partido Comunista Chinês em 2007, e no ano passado, o próprio presidente chinês Xi Jinping afirmou em um discurso que "para fortalecer o "soft power" do país devemos fazer nosso melhor esforço para aperfeiçoar nossa capacidade na comunicação internacional".
A definição do "socialismo com características chinesas" engloba não apenas a economia de mercado como a democracia e o Estado de Direito, mas promovidos pelo Partido Comunista.
Fonte: O Globo
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