Valor Econômico
Congresso usou reação empresarial para
arrancar demandas do governo, mas foi surpreendido pela reação das redes e
recuou
As pesquisas diárias que o Palácio do
Planalto faz para mensurar a avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostraram
uma elevação de cinco pontos percentuais na sua popularidade desde o início da
ofensiva do governo para caracterizar o embate em torno das medidas fiscais
como uma batalha entre ricos e pobres.
Gabinetes da Avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, já estavam de posse do resultado desses “trackings” quando aconteceu a ocupação, por manifestantes da Frente Povo Sem Medo, do saguão do prédio que abriga o Itaú BBA na avenida Faria Lima, em São Paulo. Levavam as faixas com as mesmas palavras de ordem da campanha governista: “O povo não vai pagar a conta”, “Chega de mamata”, “Taxação dos super ricos já”. Os manifestantes permaneceram duas horas e depois deixaram o prédio.
Se as pesquisas
colocam lenha na fogueira para a continuidade da campanha dos ricos x pobres, a
ocupação jogou água no moinho daqueles que, dentro do governo, defendem mais
moderação na ofensiva. Atribui-se à ala moderada a saída encontrada
para o recurso governista ao Supremo contra o decreto legislativo que derrubou
o aumento do IOF. Depois que o Psol entrou com a ação pela
inconstitucionalidade do projeto de decreto legislativo que anulou o aumento, a
Advocacia-Geral da União entrou com uma Ação Declaratória de
Constitucionalidade em defesa do decreto do Executivo que estabeleceu a
majoração e não com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que seria voltada
contra o Congresso.
Se esta modulação no Supremo é fruto da intervenção dos moderados, o recuo dos presidentes da Câmara e do Senado é atribuída à ofensiva nas redes sociais que aumentou a pressão sobre o Congresso pela aprovação das medidas capazes de enquadrar a execução orçamentária nos ditames do arcabouço.
O recuo do Congresso foi simbolizado pelo
encontro do presidente do Senado, Davi
Alcolumbre (União-AP), com o secretário-executivo do Ministério
da Fazenda, Dario
Durigan, e pelos sinais já emitidos pelo presidente da
Câmara, Hugo Motta. O
pacote do recuo vai além das emendas parlamentares mas não passa pelo veto do
presidente da República ao aumento em 18 cadeiras na Câmara dos Deputados.
A reação da
popularidade e este recuo do Congresso convergem para a manutenção da campanha,
mas ninguém esperava que essa pressão saísse da bolha das redes e invadisse as
ruas. Vai ficar difícil para o governo se dissociar da iniciativa desses
ativistas uma vez que a Secretaria de Comunicação assumiu a coautoria desta
campanha em dobradinha com o PT.
Ao emplacar a visão de que o Congresso é
contra a taxação dos contribuintes de alta renda, o governo não apenas
conseguiu emparedar os parlamentares como iniciou a “limpeza” da imagem de
Fernando Haddad. Como o governo não foi capaz de desfazer o “Taxad”, a campanha
joga para colar no ministro da Fazenda a imagem de “Taxad dos ricos”.
O impacto sobre a popularidade do presidente
indica ainda que a campanha é bem-sucedida em caracterizar como uma ofensiva
contra os contribuintes de alta renda quando, na verdade, seus impactos são
muito mais amplos.
Tirando o aumento do Imposto de Renda de 15%
para 20% dos Juros sobre Capital Próprio contido na medida provisória, o
restante do pacote, incluindo todo o decreto do IOF, taxa os super ricos mas
também a classe média que viaja ao exterior e faz compra com cartão de crédito,
aplica em papéis como o LCA e LCI, que se destinam ao financiamento da
agricultura e do mercado imobiliário ou, ainda, tem uma previdência privada.
Da campanha BBB (bilionários, bancos e bets)
apenas este último alvo está preservado, pelo menos até aqui, na disposição do
governo em prosseguir com o aumento da taxação de 12% para 18%. Isso porque não
há majoração de imposto sobre bancos. O aumento da taxação do CSLL se
restringiu às “fintechs”. Não se estendeu aos bancos porque a indústria
financeira tradicional tem um estoque elevado de crédito tributário (cerca de
R$ 150 bilhões) que pode ser usado para abater este imposto. Ou seja, do ponto
de vista arrecadatório, o efeito seria minorado.
Foi assim que se chegou ao decreto do IOF,
que não precisaria passar pelo Congresso e ainda renderia uma arrecadação
efetiva para o Tesouro. Não contavam com a reação do empresariado e do
Congresso que se valeu do queixume do setor privado para se voltar contra a
mobilização do ministro Flávio Dino pela transparência das emendas
parlamentares.
Se Alcolumbre e Motta dão sinais de recuo
ainda querem podar Dino. A última investida pela limitação do acesso ao Supremo
a partidos “acima da cláusula de barreira”, por exemplo, pode tirar a
iniciativa do Psol nas emendas que têm ensejado as decisões do ministro no
tema.
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