sexta-feira, 4 de julho de 2025

Campanha calça popularidade, leva conflito à rua e divide governo - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Congresso usou reação empresarial para arrancar demandas do governo, mas foi surpreendido pela reação das redes e recuou

As pesquisas diárias que o Palácio do Planalto faz para mensurar a avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostraram uma elevação de cinco pontos percentuais na sua popularidade desde o início da ofensiva do governo para caracterizar o embate em torno das medidas fiscais como uma batalha entre ricos e pobres.

Gabinetes da Avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, já estavam de posse do resultado desses “trackings” quando aconteceu a ocupação, por manifestantes da Frente Povo Sem Medo, do saguão do prédio que abriga o Itaú BBA na avenida Faria Lima, em São Paulo. Levavam as faixas com as mesmas palavras de ordem da campanha governista: “O povo não vai pagar a conta”, “Chega de mamata”, “Taxação dos super ricos já”. Os manifestantes permaneceram duas horas e depois deixaram o prédio.

Se as pesquisas colocam lenha na fogueira para a continuidade da campanha dos ricos x pobres, a ocupação jogou água no moinho daqueles que, dentro do governo, defendem mais moderação na ofensiva. Atribui-se à ala moderada a saída encontrada para o recurso governista ao Supremo contra o decreto legislativo que derrubou o aumento do IOF. Depois que o Psol entrou com a ação pela inconstitucionalidade do projeto de decreto legislativo que anulou o aumento, a Advocacia-Geral da União entrou com uma Ação Declaratória de Constitucionalidade em defesa do decreto do Executivo que estabeleceu a majoração e não com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que seria voltada contra o Congresso.

Se esta modulação no Supremo é fruto da intervenção dos moderados, o recuo dos presidentes da Câmara e do Senado é atribuída à ofensiva nas redes sociais que aumentou a pressão sobre o Congresso pela aprovação das medidas capazes de enquadrar a execução orçamentária nos ditames do arcabouço.

O recuo do Congresso foi simbolizado pelo encontro do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), com o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, e pelos sinais já emitidos pelo presidente da Câmara, Hugo Motta. O pacote do recuo vai além das emendas parlamentares mas não passa pelo veto do presidente da República ao aumento em 18 cadeiras na Câmara dos Deputados.

A reação da popularidade e este recuo do Congresso convergem para a manutenção da campanha, mas ninguém esperava que essa pressão saísse da bolha das redes e invadisse as ruas. Vai ficar difícil para o governo se dissociar da iniciativa desses ativistas uma vez que a Secretaria de Comunicação assumiu a coautoria desta campanha em dobradinha com o PT.

Ao emplacar a visão de que o Congresso é contra a taxação dos contribuintes de alta renda, o governo não apenas conseguiu emparedar os parlamentares como iniciou a “limpeza” da imagem de Fernando Haddad. Como o governo não foi capaz de desfazer o “Taxad”, a campanha joga para colar no ministro da Fazenda a imagem de “Taxad dos ricos”.

O impacto sobre a popularidade do presidente indica ainda que a campanha é bem-sucedida em caracterizar como uma ofensiva contra os contribuintes de alta renda quando, na verdade, seus impactos são muito mais amplos.

Tirando o aumento do Imposto de Renda de 15% para 20% dos Juros sobre Capital Próprio contido na medida provisória, o restante do pacote, incluindo todo o decreto do IOF, taxa os super ricos mas também a classe média que viaja ao exterior e faz compra com cartão de crédito, aplica em papéis como o LCA e LCI, que se destinam ao financiamento da agricultura e do mercado imobiliário ou, ainda, tem uma previdência privada.

Da campanha BBB (bilionários, bancos e bets) apenas este último alvo está preservado, pelo menos até aqui, na disposição do governo em prosseguir com o aumento da taxação de 12% para 18%. Isso porque não há majoração de imposto sobre bancos. O aumento da taxação do CSLL se restringiu às “fintechs”. Não se estendeu aos bancos porque a indústria financeira tradicional tem um estoque elevado de crédito tributário (cerca de R$ 150 bilhões) que pode ser usado para abater este imposto. Ou seja, do ponto de vista arrecadatório, o efeito seria minorado.

Foi assim que se chegou ao decreto do IOF, que não precisaria passar pelo Congresso e ainda renderia uma arrecadação efetiva para o Tesouro. Não contavam com a reação do empresariado e do Congresso que se valeu do queixume do setor privado para se voltar contra a mobilização do ministro Flávio Dino pela transparência das emendas parlamentares.

Se Alcolumbre e Motta dão sinais de recuo ainda querem podar Dino. A última investida pela limitação do acesso ao Supremo a partidos “acima da cláusula de barreira”, por exemplo, pode tirar a iniciativa do Psol nas emendas que têm ensejado as decisões do ministro no tema.

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