Hugh Carnegy, Kathrin Hille e Peter Spiegel | Financial Times
PARIS, MOSCOU e BRUXELAS - Os esforços diplomáticos do Ocidente em retaliação à ocupação da Crimeia pela Rússia sofreram múltiplos reveses ontem, depois que o Kremlin recusou-se a conversar com o novo governo ucraniano e os próprios aliados não conseguiram chegar a um acordo sobre a posição a ser tomada em relação ao governo russo.
A recusa de Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, de se encontrar com o chanceler ucraniano lançou uma sombra sobre as negociações em Paris, nos Estados Unidos e a primeira reunião de cúpula da Rússia desde a intensificação da crise na semana passada.
"Eles terão que engolir um remédio amargo", disse uma autoridade de alto escalão da França. "Eles negam que invadiram a Crimeia e não reconhecem o governo [interino] ucraniano."
Ao mesmo tempo, um esforço liderado pelos EUA por um acordo aliado que imponha sanções à Rússia deparou-se com a resistência da Alemanha, que se diz preparada só para suspender a liberação de vistos e as negociações para um acordo comercial com a Rússia.
No topo da agenda de uma reunião de emergência marcada para hoje em Bruxelas estará a capacidade dos governos europeus que estão adotando uma postura mais dura - sobretudo membros da União Europeia que pertenciam à ex-União Soviética - de convencer Berlim. "Eles temem que se fizermos alguma coisa os russos responderão", disse ontem uma autoridade graduada da UE envolvida no planejamento da reunião.
Os países europeus que estão resistindo mais à imposição de sanções à Rússia, como Itália e Holanda, são aqueles que possuem os maiores laços econômicos com Moscou, que pela primeira vez sinalizou que uma retaliação econômica pode estar sendo preparada.
Entre as sanções defendidas por alguns governos do Leste europeu estão a proibição de viagens de autoridades russas e um embargo a componentes de armas necessários para a fabricação de armas russas de tecnologia avançada.
O senador russo Andrei Klishas disse estar preparando medidas defensivas que poderão entrar em vigor se sanções forem impostas à Rússia. A legislação proposta "nos permitirá congelar ativos de empresas europeias e americanas, incluindo as de capital privado, que atuam em nosso país", disse ele ao jornal "Izvestia", pró-Kremlin.
Num sinal do endurecimento da posição russa, Sergei Shoigu, ministro da Defesa, disse que não há "absolutamente nenhum" soldado russo na Crimeia, repetindo a afirmação do presidente Vladimir Putin de que os homens armados que cercavam bases militares ucranianas na Crimeia na semana passada eram unidades regionais de autodefesa.
Diante desse quadro, os aliados ocidentais aceleraram os esforços para apoiar com mais convicção o novo governo ucraniano, que assumiu após a deposição do presidente pró-russo Viktor Yanukovich há dez dias. A União Europeia anunciou uma ajuda de € 11 bilhões, incluindo um financiamento fiscal de curto prazo de € 1,6 bilhão, e o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento disse que está pronto para investir € 5 bilhões na Ucrânia até 2020.
A Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa enviou 35 observadores militares desarmados ao porto ucraniano de Odessa, no Mar Negro, como parte de um esforço para convencer Moscou a trocar suas próprias forças por monitores internacionais.
A recusa de Lavrov de se encontrar com Andriy Deshchytsia, o novo ministro do Exterior da Ucrânia, forçou os dois signatários restantes de um pacto ucraniano de segurança firmado em 1994, o Reino Unido e os Estados Unidos, a se reunirem com Deshchytsia por conta própria.
Um comunicado emitido pelos três ministros do Exterior - o senador John Kerry, dos EUA, William Hague, do Reino Unido, e Deshchytsia - repetiu a condenação à ocupação russa e pediu "discussões diretas entre a Ucrânia e a Rússia" para resolver o conflito.
Mais cedo, ontem, o banco central russo revelou que gastou US$ 11,3 bilhões em suporte ao rublo no começo da semana, depois que investidores começaram a tirar dinheiro da Rússia com a escalada da crise na Ucrânia no fim de semana. O tamanho da intervenção de segunda-feira ficou acima das estimativas da maior parte dos operadores de câmbio.
Fonte: Valor Econômico
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