domingo, 21 de setembro de 2014

Opinião do dia: Luiz Werneck Vianna

As tramoias do destino, com a tragédia que vitimou Eduardo Campos, viraram, como se constata, de ponta-cabeça o cenário previsto para a competição, com o retorno à cena política da assombração do carisma, agora de saias, na pessoa da candidatura de Marina Silva, com sua história pessoal de superações e seu sobrenome tão comum aos "simples", com o dom de aliciar, por si só, empatia no mundo popular. Sua aparição, com seu discurso desconforme a "tudo isso que aí está" em nossas práticas políticas, trouxe de novo à ribalta o espírito dos idos de junho de 2013, que jazia embaixo do tapete, estranho aos discursos das três candidaturas originais, que tinham selecionado como mote os temas econômicos.

Luiz Werneck Vianna, professor pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio, em A sucessão presidencial e seus riscos. O Estado de S. Paulo, 20 de setembro de 2014.

Políticos veteranos lideram disputa pela Câmara Federal

• Desejo de renovação externado nas manifestações de junho de 2013 fica para trás: dos 90 candidatos a deputado federal mais lembrados pelos eleitores em 18 Unidades da Federação, só 3 são estreantes nas urnas e não vêm de famílias de homens públicos

José Roberto de Toledo, Rodrigo Burgarelli - O Estado de S. Paulo

Se 70% dos brasileiros afirmam esperar mudanças em relação ao próximo presidente, uma série de pesquisas Ibope indica que uma renovação expressiva dificilmente ocorrerá na Câmara dos Deputados. Dos 90 candidatos a deputado federal mais lembrados pelos eleitores em 18 unidades da Federação, apenas 3 são estreantes nas urnas e não vêm de famílias de políticos. Todos os outros 87 já têm um passado na política, seja por experiência própria ou pelo sobrenome.

Os dados foram calculados com base no resultado das pesquisas da série Deputados do Ibope, que pode ser contratada pelos próprios candidatos que desejam ver os cinco mais citados espontaneamente pelos eleitores nos maiores Estados, além da sua própria posição no ranking geral. A conclusão é de que o discurso da renovação, que ganhou força após as manifestações de junho de 2013 e, na corrida presidencial, se personalizou na liderança de Marina Silva (PSB) entre quem quer mais mudança que continuidade, não deverá se manifestar com tanta força na nova composição do Legislativo federal.

Dos 90 candidatos preferidos dos eleitores até agora, 83 já são políticos e foram eleitos para cargos eletivos em pelo menos uma ocasião anterior. A maioria - 51 nomes - já está na Câmara, e outros quatro estiveram em legislaturas passadas. Além deles, 17 são atualmente deputados estaduais, que tentam pela primeira vez chegar à esfera federal concorrendo para o cargo. O resto já ocupou mandato de vereador em alguma cidade importante do seu Estado ou cargos executivos, caso do ex-prefeito de Belém Edmilson Rodrigues (PSOL) ou do vice-governador de Mato Grosso Chico Daltro (PSD).

Novatos. Dos sete estreantes, quatro podem atribuir ao sobrenome o motivo para estar na lista dos preferidos do eleitorado. Dulce Miranda (PMDB) é ex-primeira dama de Tocantins, casada com Marcelo Miranda, ex-governador e candidato ao cargo. O alagoano Pedro Vilela (PSDB) carrega o sobrenome do ex-senador Teotônio Vilela, seu avô, e do governador Teotônio Vilela Filho, seu tio. Também em Alagoas concorre Nivaldo Albuquerque (PRP), filho do deputado estadual e ex-presidente da Assembleia Legislativa Antônio Albuquerque. Vicentinho Jr. (PSB-TO) só se difere do trio porque não precisa usar o sobrenome do pai, o senador Vicentinho Alves.

Restam os três estreantes que não são parentes de políticos, mas dois ocuparam cargos de confiança em gestões municipais: Tiago Adrino (PP) foi secretário em Palmas (TO) e Felipe Carreras (PSB), no Recife. Éder Mauro (PSD-PA) é um delegado com fama de linha-dura.

Em família. Quando se leva em conta todos os 90 candidatos, a taxa dos que têm parentes na política é considerada alta e chega a 44%. O Rio Grande do Norte chama a atenção nesse quesito: todos os cinco mais lembrados pelos eleitores vêm de famílias tradicionais da política no Estado.

A lista contém todos os sobrenomes mais importantes - Walter Alves (PMDB), filho do senador Garibaldi Alves Filho; Fábio Faria (PSD), filho do vice-governador e candidato a governador Robinson Faria; Felipe Maia, filho do senador José Agripino Maia; e Fafá (PMDB) e Sandra Rosado (PSB) - as duas são primas, vindas da família política mais importante de Mossoró.

Natália Alves, pesquisadora da Transparência Brasil, disse que a taxa de parentesco entre os candidatos é a mesma que a entidade já havia apurado para a atual legislatura da Câmara dos Deputados. “O discurso pela mudança é bastante forte, mas vários políticos tentam se apropriar disso para lançar parentes mais novos, que tentam se eleger com a bandeira da renovação”, afirmou. Segundo ela, a manutenção de clãs políticos no Congresso dificulta a realização de reformas abrangentes na legislação. “Passando o cargo de parente para parente, cria-se uma Câmara avessa a mudanças.”

Para Natália, é necessário mais pesquisas para entender a diferença de comportamento do eleitor ao decidir seu voto para presidente e para deputado. “Há diversas diferenças. No âmbito estadual, por exemplo, é mais fácil que as mesmas figuras se repitam, o que inibe a renovação. De qualquer maneira, não se pode cobrar coerência política do eleitorado.”

Para Aécio, investigação na Petrobras vai deixar ‘muita gente no PT com insônia’

• Em campanha no interior de Minas, candidato do PSDB prevê denúncias sobre ‘cabeças’ do esquema de corrupção na estatal

Maria Lima – O Globo

CORONEL FABRICIANO (MG) - O candidato do PSDB à presidência, Aécio Neves, comentou no final da manhã deste sábado, durante evento de campanha no interior de Minas Gerais, as novas acusações feitas pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa sobre a participação de mais duas diretorias dentro da estatal em contratos irregulares. Segundo Aécio, a presença de nomes como Renato Duque, indicado por José Dirceu para o comando da diretoria de Serviços, e ligado ao tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, e Nestor Cerveró, que tinha apoio do PT e do PMDB para comandar a diretoria Internacional, mostram que as denúncias estão se aproximando da ‘cabeça do partido’.

—Agora sim, estamos chegando próximo ao grande núcleo de corrupção daquela empresa. Estamos perto de chegar a cabeça do esquema. As investigações devem ser aprofundadas. Não podem ficar apenas nos diretores — disse Aécio.

Para o candidato tucano, o avanço nas investigações pode resultar em uma grande ‘dor de cabeça’ para os petistas.

— Se isso (novas denúncias) já está causando dor de cabeças e deixando muita gente sem dormir, as investigações sobre esse (Renato) “Duque” vai deixar muita gente do PT com grave insônia. Isso é crime de lesa pátria. Não é apenas um mal feito. É um crime que tem que ser punido — concluiu.

De acordo com matéria do jornal 'Folha de S. Paulo', as duas diretorias estão envolvidas com negócios investigados pela Polícia Federal. A diretoria internacional comandou a compra da refinaria de Pasadena, no Texas, na qual Paulo Roberto Costa disse ter recebido propina de R$ 1,5 milhão para facilitar o negócio. A diretoria de Serviços é investigada pelas obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Representação contra Dilma
Aécio confirmou, neste sábado, que o PSDB entrará com uma representação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e na Procuradoria Geral da República (PGR) contra a candidata do PT, Dilma Rousseff, em função do uso dos Correios para a distribuição de panfletos eleitorais.

Isso (envio de panfletos pelos correios) é um absurdo. Entraremos com denúncia na PGR e no TSE. A prática constitui crime de abuso de poder político e improbidade administrativa. Isso mostra a visão do PT que as empresa públicas são sua propriedade e isso tem que ter um fim.

Candidato pede apoio aos mineiros 
 Em dia de campanha em três cidades do interior de Minas — Coronel Fabriciano, Timóteo e Ipatinga —, Aécio pediu aos mineiros que 'iniciem o movimento de virada na corrida presidencial'.

— Eu faço um apoio ao povo de Minas Gerais. Que me ajude a virar essa eleição. Será a partir daqui que vamos iniciar esse movimento. Não podemos perder essa chance — disse ele.

Outro peixe grande na rede

• Paulo Roberto Costa revela que havia corrupção em outra diretoria da Petrobras e aponta o PT como beneficiário direto

Rodrigo Rangel – Veja

Paulo Roberto Costa, o ex-diretor da Petrobras que decidiu contar para as autoridades sua experiência na operação de um esquema bilionário de corrupção montado na maior estatal brasileira, ascendeu na hierarquia da companhia por força do Partido Progressista, o PP.

A sigla integrava a base aliada do governo Lula e, para manter seu apoio, exigiu que fosse aquinhoada com cargos relevantes e orçamentos polpudos. A diretoria de Abastecimento da Petrobras era um desses postos cobiçados em Brasília. Nomeado, Paulo Roberto foi tão eficiente que, como se sabe, logo passou a ter outros padrinhos poderosos. Virou homem de confiança de um consórcio de partidos que, além do próprio PP, incluía PT e PMDB — que se locupletaram de propinas arrecadadas entre as empreiteiras a serviço da Petrobras. É o exemplo mais espetacular do que está por trás da cobiça de algumas excelências.

Como VEJA revelou há duas semanas, a lista de beneficiários do esquema inclui algumas das autoridades mais importantes da República. A Petrobras, motivo de orgulho para os brasileiros, virou um poço sem fundo para a corrupção — e a diretoria de Paulo Roberto, segundo ele próprio, não era a única que servia ao propinoduto. Aos policiais federais e procuradores encarregados de ouvi-lo, o ex-diretor afirmou que outras áreas da empresa também eram usadas para arrecadar dinheiro para políticos e partidos. Ele citou, especificamente, a diretoria de Serviços, comandada por Renato Duque, ligado ao PT e indicado pelo ex-ministro José Dirceu, condenado como chefe do mensalão. Duque chegou à diretoria da Petrobras em 2003, no início do primeiro governo Lula, e, assim como Paulo Roberto, seguiu no posto após a posse da presidente Dilma Rousseff.

Se na diretoria de Abastecimento o esquema controlado por Paulo Roberto tinha de atender a uma trinca de partidos, na de Serviços o beneficiário era um só, o PT, com uma diferença importante que o ex-diretor fez questão de realçar: a diretoria comandada por Renato Duque tinha mais dinheiro para gastar do que a dele. Paulo Roberto deu aos investigadores indicações de que, na "diretoria do PT",

a administração das comissões pagas pelas empresas era feita diretamente pelo tesoureiro nacional do partido, João Vaccari Neto, que nega. Como se não estivesse cristalino que o dinheiro saía das empreiteiras contratadas, cinicamente Vaccari justifica que empresas públicas como a Petrobras não podem fazer contribuições de campanha. Renato Duque não foi localizado.

A primeira etapa dos depoimentos prestados por Paulo Roberto como parte do acordo de delação premiada foi encerrada. Na semana passada, o Jornal Nacional, da Rede Globo, revelou que o ex-diretor admitiu ter recebido 1,5 milhão de reais de propina pela compra da refinaria americana de Pasadena, negócio que deu um prejuízo bilionário à Petrobras — VEJA havia antecipado que o ex-diretor confessara às autoridades que a transação serviu para desviar dinheiro. As revelações de Paulo Roberto atemorizam e também confundem a cabeça de alguns políticos. O ex-presidente Lula, por exemplo, liderou um ato público em frente à sede da companhia, no Rio, para "defender a empresa". Vestindo uma jaqueta laranja dos funcionários da petroleira, Lula atacou a investigação, principalmente a parte que cabe ao Congresso: "Tenho a impressão de que essas pessoas pedem CPI para, depois, os empresários correrem atrás delas e achacarem esses empresários para ganhar dinheiro". No mesmo dia em que Lula bradava contra os "inimigos da Petrobras", o ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli, nomeado por ele e responsável pela companhia durante boa parte do período em que a corrupção corria solta, prestava depoimento à Justiça. O ex-presidente não deu nome aos achacadores. A lista deve ser extensa demais.

PT deve fazer autocrítica antes de atacar Marina, diz Feldman

• Para coordenador geral da campanha da pessebista, governo tem comprometido ganhos ao país obtidos recentemente

Juliana Granjeia – O Globo

CAMPINAS - Coordenadores de campanha da candidata à Presidência Marina Silva (PSB) rechaçaram as críticas que o presidente nacional do PT, Rui Falcão, coordenador da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff, fez ao programa de governo socialista. Walter Feldman, coordenador geral da campanha de Marina Silva, afirmou que o PT deve fazer uma autocrítica antes de apontar aos demais.

- Eu acho que o Rui não leu o programa, não fez nenhum comparativo com a situação atual. A atual política econômica do governo federal tem levado à crise que temos hoje de alta inflação, altos juros e crescimento quase zero. É muito importante que o Rui Falcão, antes de analisar nosso programa, que é um programa de retomada de crescimento, faça uma autocrítica do que eles estão fazendo. O PT está comprometendo os ganhos obtidos recentemente, que estão sofrendo retrocesso. Se há alguém que não tem condições hoje de fazer uma análise critica de qualquer plano econômico é a atual gestão - disse Feldman.

O prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB), que também atua na coordenação da campanha de Marina, afirmou que o PT está "desesperado":

- O PT não quer assumir que eles estão desesperados. Os números mostram uma probabilidade de segundo turno muito acirrado. Pela primeira vez teremos um segundo turno realmente disputado. Os ataques estão sendo feitos, palavras estão sendo manipuladas. Por que o PT não apresenta plano de governo? Ao invés de criticar o programa da Marina, eles deveriam apresentar o programa deles. Eles atuam em duas frentes: uma falando que a crítica é política e a outra nas redes sociais fazendo a crítica sórdida, anônima.

Em Campinas para participar de um ato da candidata Marina com a militância, a deputada Luiza Erundina (PSB), também integrante da coordenação da campanha, afirmou que Marina é como massa de pão: "quanto mais bate, mais ela cresce".

Acompanhada de seu marido e de uma de suas filhas, durante seu discurso, Marina voltou a repetir que oferece a outra face aos adversários. Questionada sobre o o erro cometido pelo IBGE na recente divulgação de dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a candidata disse que não faz com seus adversários o que eles fazem com ela:

- Não sou de fazer pré-julgamentos. Não faço com os meus adversários aquilo que eles têm feito comigo. O que eu posso dizer é que instituições que antes eram respeitadas no atual governo no atual governo estão sendo completamente depreciadas. É o que aconteceu com a Petrobras. A mesma coisa está acontecendo com o IBGE, uma instituição importante para o planejamento, para o desenvolvimento de políticas para o nosso país, que tem pessoas dedicadas, comprometidas, éticas, mas que, infelizmente, por má gestão, está submetida a esse tipo de situação.

Também em Campinas, Marina afirmou que vai aumentar os investimentos do Produto Interno Bruto (PIB) em Ciência e Tecnologia.

- Nós vamos sair dos atuais 1,1% para 2% em quatro anos. Essa é nossa meta - disse a candidata que argumentou que o aumento dos investimentos no setor é fundamental para reverter o cenário de perda de empregos na indústria.

Dilma diz que rivais vão acabar com Bolsa Família

• Durante comício na capital paulista, presidente vocaliza estratégia da campanha petista e vincula fim do programa à eleição de seus adversários

Pedro Venceslau, Ana Fernandes - O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff disse ontem, em comício na zona sul de São Paulo, que o programa Bolsa Família vai acabar se seus adversários forem eleitos. A duas semanas da votação em 1.º turno, a petista vocalizou uma estratégia de sua campanha.

“Faltam poucos dias para a eleição e, neste momento, o clima fica um pouco quente e nós sabemos que começa uma série de mentiras e boatos falsos por aí”, disse a presidente no palanque. “Tem uns que dizem que o Bolsa Família, nosso programa mais importante, o programa que nós consideramos o mais forte para reduzir pobreza e desigualdade, junto com emprego e aumento de salário, vai acabar. Vai acabar se eles forem eleitos”, afirmou Dilma.

Nos programas eleitorais na TV, a campanha petista tem colocado mensagens indicando que adversários podem acabar com o Bolsa Família, em especial Marina Silva (PSB), mas esse discurso geralmente não aparece na boca de Dilma. Marina chegou a responder com uma peça que reproduz um recente discurso em Fortaleza (CE). Com a voz embargada e lágrimas nos olhos, a candidata do PSB conta um episódio de sua infância, no qual passou fome, e se dirige a Dilma, afirmando que, por isso, jamais acabaria com o programa.

Em Campinas, onde cumpriu agenda ontem, Marina voltou a garantir que, se eleita, não vai acabar com os programas sociais do atual governo, como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida.
“Nós vamos manter as coisas boas, mas não vamos ser complacentes com o que está errado, como a corrupção, o apadrinhamento político.”

‘Soy yo’. Dilma participou pela manhã de uma passeata no bairro Santo Amaro, na zona sul da capital com candidatos petistas no Estado. Ela voltou a insinuar que os adversários estariam dispostos a flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A deixa para falar sobre o assunto partiu de um questionamento de uma repórter da campanha petista sobre se, no caso da vitória dos rivais, os direitos trabalhistas estariam ameaçados. “São conquistas históricas, algo que conquistamos e que vamos defender.”

Ao chegar, a presidente foi ao encontro da imprensa. Quando os jornalistas tentaram fazer a primeira pergunta, ela interrompeu: “Meu querido, quem começa falando soy yo. O primeiro minuto é meu e vou falar sobre educação infantil.” Após uma fala que durou cerca de 20 minutos, disse que estava à disposição dos repórteres, mas a única pergunta respondida foi a da jornalista da campanha. 

O falso debate sobre a CLT: O Estado de S. Paulo - Editorial

Fiel à estratégia de atribuir a seus adversários ideias e propostas que eles não defenderam, a presidente Dilma Rousseff insinuou que a candidata Marina Silva (PSB), ao pregar mudanças na legislação trabalhista, pretende cassar direitos consagrados, como férias e décimo terceiro salário. Esse tipo de comportamento serve apenas para confirmar a opção de Dilma e dos petistas pelo discurso do medo - deixando em segundo plano o debate de um tema de grande importância para o País, pois o anacronismo da legislação trabalhista engessa o mercado de trabalho e dificulta o empreendedorismo.

Na terça-feira passada, Marina disse em encontro com empresários que é favorável a uma atualização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ciente de que poderia ser mal interpretada, a candidata enfatizou, "para que não fique nenhuma dúvida", que não se trata de promover mudanças em "prejuízo das conquistas que os trabalhadores a duras penas alcançaram".

A claque petista na internet imediatamente passou a reproduzir a fala de Marina como prova de que sua candidatura pretendia extinguir direitos dos trabalhadores. No dia seguinte, com o tom agressivo que tem marcado seus discursos, Dilma também defendeu a atualização da legislação para atender às novas relações de trabalho, mas declarou: "Agora, vamos ter clareza disso, (mudar) décimo terceiro, férias e hora extra, isso eu não mudo. Eu não mudo direitos na legislação trabalhista".

Sua resposta, dada a um empresário que lhe indagara sobre suas propostas para a modernização da legislação, foi muito além do que havia sido perguntado, deixando no ar que seus adversários - principalmente Marina, que falara do assunto um dia antes - têm a intenção de acabar com aqueles direitos.

Os petistas são craques nessa artimanha, que visa a criar confusão e a obrigar os adversários a passar a campanha justificando posições que eles nunca tiveram. No segundo turno da campanha de 2006, por exemplo, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, acusou o adversário tucano, Geraldo Alckmin, de planejar privatizar a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. "Não há nenhuma linha do meu programa de governo que diga isso", tentou responder Alckmin, em vão. Ele teve de passar todo o resto da campanha negando o que nunca dissera e chegou a vestir um casaco e um boné com marcas de estatais para tentar desfazer o estrago.

Em campanhas eleitorais, como ensinou a própria Dilma, há quem se prontifique a fazer "o diabo" para ganhar. Mesmo assim, espera-se um mínimo de racionalidade - para não falar em respeito a princípios éticos - nos debates entre os candidatos, especialmente da parte de quem já ocupa a Presidência da República. Além disso, o tema das mudanças na legislação trabalhista não pode ser tratado dessa forma leviana.

É bom que se frise que nenhum dos três principais candidatos deixou claro quais são suas propostas a esse respeito. Marina, por exemplo, admite que ainda não definiu o que pretende mudar. "É uma discussão delicada e ainda não está resolvida dentro da nossa aliança", disse ela. Essa indefinição trai o receio de ser vista como algoz dos trabalhadores.

O problema é que o algoz dos trabalhadores e do mercado de trabalho é justamente a inadequação da CLT aos novos tempos. Herança do Estado Novo varguista, essa legislação encarece a contratação de mão de obra, dificulta as negociações salariais e não reconhece vínculos empregatícios distintos dos tradicionais. É também essa legislação, tratada como texto sagrado pelos tribunais e por alguns sindicatos, que impede que empresas e empregados acertem as condições de trabalho que considerem mais adequadas. Não raro, acordos que, por exemplo, flexibilizam horários de expediente são rejeitados na Justiça do Trabalho com base na CLT.

O eleitor, seja ele trabalhador ou empresário, tem o direito de saber o que pensam os candidatos a respeito desse assunto. Mas parece que a mistificação vai, de novo, prevalecer.

Mudança de maré

• De volta ao patamar que ocupava quando estava em segundo lugar na corrida eleitoral, o tucano Aécio Neves comemora o crescimento da "onda da razão". Dá tempo de virar?

Bela Megale – Veja

Num encontro só com mulheres, Aécio Neves começou seu discurso na quarta-feira passada, em São Paulo, comemorando o que batizou de "onda da razão". No dia anterior, o Ibope havia apontado um aumento de 4 pontos nas intenções de voto a seu favor. Voltou à casa dos 19 pontos, número similar ao que ostentava como segundo colocado nas pesquisas antes de Marina Silva entrar na disputa. Na sexta-feira, o Datafolha mostrou que o tucano tem a menor rejeição de todos os candidatos, com 21% (Dilma permanece no topo, com 33%, seguida de Marina, com 22%). Por fim, Aécio recebeu a notícia de que o instituto GPP, que em duas rodadas de pesquisas qualitativas com 3800 eleitores havia concluído, vinte dias atrás, que a maioria do eleitorado reconhecia em Marina Silva a "candidata da mudança", agora apontou que o quadro se alterou — Aécio é o mais citado como o melhor para mudar, com cerca de 60% das menções. Com isso, o ex-governador de Minas deu por encerrada a pior fase de sua campanha, iniciada no dia 13 de agosto, com a morte de Eduardo Campos.

O dado que mais animou a tropa tucana foi que dobrou o número de eleitores que rejeitam Marina. De 11%, taxa que ela tinha na primeira pesquisa após a morte de Campos, o número foi para 22%. No mesmo período, o índice do mineiro subiu apenas 3 pontos. Na avaliação dos tucanos, o crescimento da rejeição da ex-senadora indica que a estratégia de mostrá-la como "uma continuidade do PT" está funcionando. Pesquisas qualitativas da legenda revelam que o que tira mais votos da ex-ministra de Lula não é a suposta incoerência de propostas ou a falta de equipe credenciada, mas sua ligação de vinte anos com o partido de Dilma Rousseff.

Ao atingir as metas de estancar a sangria e voltar ao patamar próximo dos 20% nas pesquisas, o partido conseguiu afastar, ao menos por enquanto, seu pior fantasma: o medo de se perder entre os nanicos no fim da corrida eleitoral e passar a imagem de que o PSDB "morreu". Agora, para continuar crescendo, a campanha vai redobrar esforços para conquistar o voto antipetista. Aécio dirá que há dois PTs na disputa, um representado por Dilma e outro por Marina. "A campanha vai mostrar que quem tem força para enfrentar o partido que está há doze anos no poder é Aécio", diz um integrante da equipe de marketing. Além de peças publicitárias, o candidato continuará a explorar dados econômicos negativos do governo, como o baixo crescimento do PIB. O senador porá a culpa em Dilma e a incapacidade de resolver o problema em Marina, como vem fazendo.

A campanha vai fugir de assuntos controversos. A ideia de lançar o programa de governo no início deste mês num grande evento foi suspensa após as críticas que rondaram o documento do PSB. Além de evitar assuntos espinhosos, o programa, de caráter "generalista", segundo um de seus formuladores, só será apresentado ao público às vésperas da eleição, para dar pouco espaço para julgamentos. O tucano continuará avisando ao eleitor que, se perder, estará na oposição, de forma a esvaziar o discurso de Marina de que governará "com os melhores". A decisão, no entanto, divide o partido. Nomes como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o governador paulista Geraldo Alckmin e o governador de Goiás, Marconi Perillo, já deram sinais de que embarcariam numa aliança. O candidato a vice Aloysio Nunes e o coordenador do programa de governo Arnaldo Madeira estão no polo oposto. A semana termina menos mal para Aécio. Sua ida para o segundo turno continua sendo improvável. Mas deixou de ser inimaginável.

A emoção vai ao palanque

• Marina saca da arma que era uso exclusivo do PT e expõe a trajetória sofrida para estancar a queda nas pesquisas e brigar pela última cota de eleitores disponíveis, a dos chamados volúveis

Mariana Barros e Pieter Zalis - Veja

O contra-ataque veio na forma que o PT mais temia. Depois de sofrer a Blitzkrieg dilmista por vinte dias ininterruptos, Marina Silva sacou do coldre uma arma cujo poder de fogo seus adversários conhecem bem: o apelo emocional. Em um vídeo gravado durante um comício em Fortaleza e levado ao ar no seu programa eleitoral de terça-feira, a candidata dizia que passou fome e viu seus pais deixarem de comer para que os filhos pudessem dividir um ovo — e que alguém que passou por uma experiência assim jamais iria acabar com o Bolsa Família. A voz embargada da ex-senadora, as pausas estratégicas de sua fala, a eloquência da frase final ("Isso não é um discurso, isso é uma vida") e os olhos marejados das pessoas no palanque produziram um vídeo de alta voltagem dramática — foram os dois minutos de maior impacto nas quase doze horas de programa eleitoral presidencial veiculadas na TV até aquela data, como mostrou o número de visualizações do filme na internet (67000 até sexta-feira, recorde na campanha).

O uso da emoção em campanhas eleitorais está longe de ser algo novo, mas, no caso de Marina, ele embute um significado extra. Ao rebater os ataques do adversário com sua história de vida — menina negra e pobre, nascida em um seringal do Acre e alfabetizada aos 16 anos de idade —, ela tira do PT o monopólio da emoção e inicia um perigoso avanço no território inimigo, ao mesmo tempo em que enfraquece o discurso do medo usado pelo PT. A disseminação do boato de que Marina acabaria com o Bolsa Família — motivo do seu discurso em Fortaleza — foi parte do bombardeio petista cujos resultados apareceram na última pesquisa do Datafolha, divulgada na sexta-feira.

Pelo levantamento, a presidente e candidata à reeleição pelo PT, Dilma Rousseff, abriu 7 pontos de vantagem sobre a ex-senadora no primeiro turno e diminuiu de 10 para 2 pontos a diferença no segundo. Aécio Neves, do PSDB, que chegou a ter 20 pontos a menos que Marina, agora está separado dela por 13 (veja a reportagem sobre o tucano ©). Na campanha de Dilma, o marqueteiro João Santana comemorou: "A Marina está derretendo".

As pesquisas internas do governo já mostravam que a estratégia de atacá-la a todo custo havia dado resultado. Para o diretor-geral do instituto, Mauro Paulino, a queda de Marina era esperada. "Pelo volume de ataques que ela sofreu, seu patamar não mudou muito." Ele disse acreditar que o vídeo de Fortaleza deverá ter impacto junto ao eleitor, mas seus efeitos só serão sentidos na próxima pesquisa (as entrevistas do Datafolha foram feitas entre a última quarta e quinta-feira).

Se a emoção do filme foi genuína, o uso do material foi calculado. Há pelo menos duas semanas, o marqueteiro do PSB, Diego Brandy, tinha avaliado que era preciso um programa na TV que causasse impacto no eleitorado de municípios com menos de 100 000 eleitores. É nesse segmento que se concentram os maiores beneficiados pelo Bolsa Família — e onde Dilma detém seu voto mais cristalizado. O relato de Marina sobre as agruras de sua infância já havia chamado a atenção de assessores em um comício há duas semanas. Assim, os marqueteiros da campanha não hesitaram em usar a fala quando ela voltou ao assunto no discurso de sexta-feira. Assessores da candidata ficaram empolgados quando viram a versão final do vídeo e chegaram a cogitar colocá-lo imediatamente na internet, mas a equipe de Brandy decidiu segurar o filme para o horário eleitoral. Um dia antes de a peça ir ao ar, a candidata a viu. Elogiou: "Isso é forte mesmo".

Agora, o PSB deve insistir nessa trilha. A campanha tem pronto o roteiro de outro programa, ainda não aprovado por Marina, que usará fórmula similar para abordar a má qualidade dos serviços de saúde pública no país. Ele se baseia num texto que Marina colocou em seu blog em 2010, escrito em forma de carta à filha Shalom, hoje com 33 anos. Nele, ela conta que, quando a menina nasceu, era estudante do curso de história em Rio Branco, no Acre. "Não tinha salário, nem carteira assinada, nem plano de saúde, nem previdência", diz. "Você nasceu num hospital público, onde me registraram na categoria chamada de "indigente"." Ela diz ainda que havia uma única enfermeira para atender todas as parturientes e que ela e Shalom quase morreram. Diz um integrante da campanha: "Tudo o que for referente à vida de Marina será explorado para criar uma empatia com a população mais pobre".

Marina vai enveredar pela picada aberta por Lula. "Ela pode fazer isso porque tem o "direito". Sua história é verdadeira, não soa artificial de forma nenhuma", diz o marqueteiro Duda Mendonça, que comandou a campanha que levou à primeira vitória do ex-presidente.

Enquanto isso, Dilma se prepara para dobrar a carga. Na semana passada, a presidente tentou associar a ex-senadora a uma suposta suspensão de direitos trabalhistas. Aproveitando-se de uma promessa feita pela ex-senadora de "atualizar" a legislação, a petista adiantou-se dizendo que "nem que a vaca tussa" permitirá que os trabalhadores "sofram perdas" em suas conquistas. Os governistas querem ganhar o primeiro turno por uma vantagem de pelo menos 10 pontos porcentuais. Isso aumentaria a expectativa de vitória de Dilma entre os eleitores e poderia influenciar os indecisos a optar por ela no segundo turno, além de facilitar a conquista de apoios.

A briga entre os três principais candidatos agora se concentra no voto de 41,5 milhões de brasileiros que já escolheram em quem votar, mas ainda consideram mudar de decisão. São os eleitores que os estrategistas chamam de "volúveis" e representam 29% do eleitorado. Como a taxa de indecisos e de quem afirma que votará nulo ou em branco está em torno de 6%, o patamar histórico de outras eleições, o cenário só se alterará se um candidato conseguir roubar votos de outro.

Com base em dados do Datafolha e do Ibope, VEJA traçou um perfil do tipo de eleitor que Dilma, Marina e Aécio têm mais chance de conquistar para subir nas pesquisas. São eleitores de grupos nos quais os candidatos já têm um desempenho acima da sua média geral e que por algum motivo não votam neles, mas ainda admitem mudar de ideia.

A duas semanas do primeiro turno, a pesca dos indecisos é crucial para os candidatos — e, para isso, nenhuma isca pode ser desprezada. Diz-se que, na campanha americana que elegeu Dwight Eisenhower para presidente, em 1956, o candidato Adiai Ewing Stevenson, famoso pela oratória, foi abordado por uma eleitora que lhe disse: "Governador, todas as pessoas pensantes vão votar no senhor". Ao que Stevenson teria respondido: "Madame, isso não é suficiente. Eu preciso da maioria".
As varas estão lançadas.

*Celso Lafer: Democracia, eleições e DNA de partidos

- O Estado de S. Paulo

As eleições são um grande momento da vida democrática. Decidem pela regra da maioria quem vai governar. A democracia é um regime político que delibera quem vai governar contando cabeças, e não cortando cabeças, para lembrar uma fórmula de Bobbio. As eleições, no entanto, por si sós não definem a democracia, que se diferencia de uma autocracia eletiva, como a de Putin na Rússia ou a implantada por Chávez na Venezuela, por ter notas identificadoras do como se governa e de como são conduzidas as eleições. A política na democracia não é um jogo de soma zero no qual "quem ganha fica com tudo"; tem regras, que são a expressão de valores. Daí a importância de relembrá-las na antevéspera das eleições, o que farei inspirado na lição de Bobbio e pensando na realidade brasileira.

1) Todos os cidadãos devem usufruir os direitos políticos, ou seja, o direito de exprimir a sua opinião e escolher quem a expresse.

2) Os votos de todos os cidadãos devem ter peso igual.
Essas duas regras corporificam, com o reconhecimento da igual dignidade política de todos os indivíduos, o valor da igualdade. Daí o tema da inclusão política, da extensão do voto e da ampliação da cidadania.

3) Todos devem ter a liberdade de votar segundo sua própria opinião e esta deve ser a mais livre possível; essa liberdade passa pela existência de grupos políticos organizados que atuam numa concorrência pluralista.
Assim, regimes de partido único, como o de Cuba, não são democráticos.

4) Os cidadãos devem ser livres também no sentido de que podem escolher entre soluções diversas, vale dizer, os partidos políticos que disputam a eleição devem ter programas diversos e alternativos.
No Brasil, as eleições estão sendo substantivamente disputadas por três propostas diversas: uma de continuidade do atual governo e duas de oposição a ele.

A de Marina Silva, em sintonia com a visão de Eduardo Campos, é a expressão de significativa dissidência do arco de apoio ao PT e parte de uma avaliação do esgotamento do modelo petista.

A de Aécio Neves tem a consistência oposicionista do PSDB ao modo de governar do PT e aos seus desmandos, o compromisso histórico do PSDB com a estabilidade, o desenvolvimento econômico do País e a inclusão social, além de contar com a credibilidade dos seus quadros técnicos. A isso acrescento, na perspectiva de quem endossa a candidatura do PSDB, que os valores da democracia, relacionados com a afirmação dos direitos humanos, são constitutivos do DNA do PSDB. É o que corporifica Aécio na sua trajetória de parlamentar e governador de Minas Gerais, em sintonia com o legado político de Tancredo Neves e em convergência com a herança bendita do governo Fernando Henrique Cardoso.

As regras 3 e 4 afirmam o valor da liberdade como autonomia, a capacidade de cada um de definir suas próprias opiniões e escolhas políticas. Daí, para a sua efetivação, o papel da liberdade pessoal, de opinião, de reunião e de associação; a importância do pluralismo informativo, que dá sustento a essas liberdades, e o princípio da transparência, da visibilidade no exercício democrático do poder, no seu como governar, pois o que é do interesse de todos deve ser do conhecimento de todos. Daí deflui o direito à informação, antídoto aos abusos do poder, em especial a mentira e a corrupção, que minam a confiabilidade das instituições - tema importante do sistema político brasileiro atual, a partir do julgamento do mensalão.

Na correlação liberdade/igualdade e para atender às exigências da inclusão, destaco o papel dos direitos econômicos, sociais e culturais, que ensejam as condições materiais para que todos os indivíduos estejam em condição de ser livres. Esse processo foi reforçado pelos benefícios de estabilização econômica propiciada pelo governo do PSDB e por suas políticas sociais, patamar a partir do qual as gestões petistas vêm trabalhando, inclusive o Bolsa Família.

5) Nas eleições, assim como nas decisões coletivas, deve prevalecer a regra da maioria.

Daí o papel do segundo turno e a importância da lisura no processo eleitoral, pelo qual zela a Justiça Eleitoral.

6) Nenhuma decisão tomada pela regra da maioria deve limitar os direitos da minoria e, muito especialmente, o direito de se tornar maioria em igualdade de condições.

É por essa razão que a China, ainda que aberta para o potencial de liberdade do mercado, não é uma democracia.

Aos valores da igualdade e liberdade inerentes a essas regras se acrescentam valores a elas implícitos que justificam por que a democracia é um regime político preferível aos demais. O primeiro é o ideal da não violência, da civilidade pacífica na solução dos conflitos sociais. Por isso a ação direta, o terrorismo e a conduta de black blocs e assemelhados são práticas antidemocráticas que, pela violência, destroem o poder, mas não criam poder.

O segundo é a convicção de que o caminho de renovação da sociedade se faz por meio do livre debate das ideias, da mudança de mentalidades. O Brasil é um país melhor e mais justo depois da redemocratização e da Constituição de 1988. Este é um fato reconhecido pelas candidaturas de Aécio e de Marina, mas denegado pelos governos do PT, que se autoproclamam o marco zero da História brasileira.

O terceiro é a tolerância em relação aos Outros, o reconhecimento e a aceitação do diverso e do diferente no pluralismo de uma sociedade complexa como a brasileira.

Observo, concluindo, que é o valor da tolerância que faz da democracia um regime no qual, na arena política, existem adversários, e não inimigos a serem destruídos. Esse é um valor que não faz parte do DNA do PT, que, no seu modo de governar e nas suas campanhas, resvala com frequência na antidemocrática intolerância da desqualificação, por todos os meios, dos seus opositores.

*Professor emérito do Instituto de Relações Internacionais da USP, foi ministro das Relações Exteriores no governo FHC

Merval Pereira: Uma eleição diferente

- O Globo

Ao contrário da eleição anterior, em que sua votação era fundamental para determinar se haveria um segundo turno em que ela não concorreria, a hoje candidata do PSB Marina Silva está com um pé no segundo turno contra a presidente Dilma Rousseff, mas vê nos últimos 15 dias de campanha o candidato do PSDB Aécio Neves aproximar-se.

Na eleição de 2010 a votação de quase 20% de Marina foi fundamental para que o tucano José Serra fosse para o segundo turno. Hoje, quem está com cerca de 20% é o candidato tucano, mas não há dúvidas de que haverá segundo turno, por que a presidente Dilma está com uma votação abaixo da média do PT nas eleições anteriores.

Diferentemente de outras eleições, hoje existem dois candidatos de oposição disputando uma vaga do segundo turno, que, juntos, são majoritários. Em 2002 e 2006, a maioria dos adversários de Lula no primeiro turno aderiu à sua candidatura: em 2002, Garotinho, do PSB, teve 17,8% dos votos e Ciro do PPS 11,9%; em 2006, foi a vez de Cristovam Buarque do PDT (2,6%) e Heloisa Helena do PSOL (6,8%).

Em 2010, Marina, pelo Partido Verde, se absteve de apoiar alguém no segundo turno, mas hoje ela dependerá do apoio do PSDB para vencer a eleição, se for para o segundo turno contra a presidente Dilma. Não que os eleitores tucanos não estejam propensos, em sua maioria, a votar nela para derrotar o PT, mas ela precisará mais que os votos.

Vai ter que negociar um apoio programático para dar segurança ao eleitorado de que terá condições de governar o país nos próximos quatro anos. Um acordo em grande estilo com partidos que hoje estão na oposição poderá representar para Marina num provável segundo turno o que a Carta aos Brasileiros representou para Lula em 2002.

Antes, porém, precisa chegar na frente de Aécio Neves, e não é à toa que os dois dizem a mesma coisa a esta altura da campanha: não há mais tempo para ser sutil, é preciso ser explícito para que o eleitor entenda logo a mensagem. Por isso, a campanha de Marina decidiu, a partir deste fim de semana, denunciar o que chama de mentiras da campanha de Dilma Rousseff.

E o candidato do PSDB Aécio Neves está partindo para convencer o eleitor de que votar em Marina é a mesma coisa que votar no PT. Ao mesmo tempo, ele está se dedicando a Minas, jogando em cima do eleitor mineiro a responsabilidade de levá-lo à presidência do Brasil. Ele acredita que se crescer em Minas, ultrapassando a presidente Dilma na corrida para a presidência, ele aumentará as chances de eleger Pimenta da Veiga governador, e de ir para o segundo turno.

Em tese, ele tem também espaço para crescer em São Paulo, onde Marina abriu uma liderança implausível e Dilma Rousseff mantém-se bem votada, apesar de o PT estar mal no Estado. Na pesquisa recente do Datafolha, a diferença de 20 pontos para Marina no levantamento anterior reduziu-se para 13; no Ibope, essa distância era de 16 pontos e caiu para 11.

O comando da campanha de Aécio Neves tem o objetivo de chegar a 25% das intenções de votos na última semana da campanha, um crescimento de seis a oito pontos nas próximas pesquisas, o que significaria que Marina Silva sairia da casa dos 30% para ficar em empate técnico com o candidato do PSDB.

Se isso acontecer, segundo o diretor do Datafolha Mauro Paulino, Aécio teria crescido além de seu limite máximo, que é de 21% hoje, e Marina teria caído abaixo de seu piso, que se encontra em 27% dos votos segundo aquele instituto. Assessores de Aécio argumentam que esses limites são móveis, e mudam de acordo com a votação dos candidatos. Portanto, a evolução da campanha é que os dita, à medida que os fatos acontecem.

Uma análise da votação por regiões do Datafolha mais recente mostra mudanças significativas a esta altura da campanha. Na região que tem o maior número de eleitores, o Sudeste, Dilma conserva os mesmos 28% de pesquisas anteriores. Já Marina teve uma queda de quatro pontos, caindo de 37% para 33%. Parte dessa queda foi para Aécio, que subiu de 18% para 20%.

No Sul, enquanto Dilma se mantém estacionada em 35%, Aécio subiu 6 pontos, indo de 16% para 22%, aumentando mais do que a queda de Marina, que foi de 5 pontos, de 30% para 25%. No Nordeste, a candidata do PT garante uma grande votação, na casa dos 50%, e Marina continua em segundo lugar com 32%. O candidato Aécio Neves cresceu um pouco, de 5% para 8%.

A Região Norte, com o menor eleitorado, é onde existem as maiores mudanças nos últimos 15 dias: Dilma subiu de 38% para 49%; Marina caiu de 32% para 28%, e Aécio também caiu de 14% para 9%. O norte e o nordeste continuam sendo os grandes bastiões da candidatura Dilma, e é onde o candidato tucano tem sua pior performance. E Marina continua à frente de Aécio em todas as regiões, mesmo onde está em queda.

Dora Kramer: Reverso da fortuna

- O Estado de S. Paulo

Ainda que o PT consiga renovar sua permanência por mais quatro anos no Palácio do Planalto, o partido não será o mesmo depois dessa eleição. Sairá dela menor do que entrou.

Talvez não de maneira significativa do ponto de vista do número de deputados e senadores, mas certamente sob o aspecto político e principalmente no que diz respeito à meta que o PT se impôs quando, em outubro de 2002, ganhou nas urnas seu primeiro passaporte de acesso ao poder central.

A ideia era construir uma hegemonia política de forma a que o partido fosse o centro desse universo em torno do qual as legendas ditas aliadas girassem sem brilho próprio nem força suficiente para sobreviver de maneira independente. A oposição, pelo plano, deveria ser reduzida a uma insignificante formalidade para assegurar a aparência democrática.

Graças à firmeza das instituições, à liberdade de imprensa, ao excesso de sede ao pote que levou o PT a escancarar demais seus projetos de controle provocando reação contrária e à ambição que despertou revolta nos partidos da coalizão, o projeto não prosperou conforme o esperado.

Isso se expressa na dificuldade que a candidata à reeleição está enfrentando e aparece também no quadro das disputas estaduais. Dos 26 Estados e mais o Distrito Federal, o PT está em primeiro lugar em apenas quatro deles, sendo que só um (Minas Gerais) tem peso político e densidade eleitoral.

Tal fragilidade vai se refletir no Congresso. Se ganhar a Presidência, os atritos que arrumou com os parceiros na tentativa de fazê-los submissos apresentarão a fatura. Se perder, deve se preparar para enfrentar a fuga daqueles que aderiram por interesse e não são adeptos da dieta de pão e água.

Cenografia. Os Poderes Executivo e Legislativo insistem em importunar o Judiciário com essa história de pedir acesso aos depoimentos de Paulo Roberto Costa no acordo de delação premiada antes de concluído o inquérito e, se for o caso, oferecida a denúncia pelo Ministério Público.

A Polícia Federal já negou a solicitação, a Procuradoria-Geral da República também. Agora o assédio é sobre o Supremo Tribunal Federal. Na sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff anunciou o envio do pedido ao ministro Teori Zavascki.

"Eu quero saber", disse ela. Antes, quando a revista Veja publicara alguns nomes de políticos citados por Costa, a presidente havia se aborrecido com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, porque ele não a informara sobre o que estava sendo dito nos depoimentos iniciados no dia 29 de agosto.

A presidente critica com veemência o vazamento de informações, mas o que ela pediu ao ministro, à PF, à Procuradoria e agora ao STF é que essas instâncias quebrem o segredo de Justiça. Isso não é possível. Tanto a presidente quanto os deputados e senadores sabem disso.

Portanto, se insistem, é porque fazem jogo de cena. Pretendem passar a ideia de que tomam providências, quando não tomaram quando estas estiveram ao seu alcance. O governo fez vista grossa ao esquema de corrupção na Petrobrás agora delatado e depois usou a base governista como tropa de choque para impedir as investigações no Congresso.

Os parlamentares aliados, que nesta semana farão o teatro do pedido de liberação no gabinete do presidente do Supremo Tribunal Federal, tampouco fizeram a sua parte quando ainda era tempo. Agora é tarde.

O silêncio do ex-diretor da estatal na sessão da CPI semana passada falou por si. Quando esteve lá em junho, logo depois de libertado e ainda sem saber que seria preso de novo e corria o risco de ser condenado a pesadas penas, Paulo Roberto falou. Disse que nada havia de errado na companhia. Na versão dele à época, um primor de correção à prova de qualquer auditoria.

Agora calou em público para preservar o valor do que diz em segredo de Justiça, seu único trunfo.

Eliane Cantanhêde: Gatos e ratos

- Folha de S. Paulo

"Não é função da imprensa fazer investigação", decretou a presidente e candidata Dilma, numa das suas entrevistas diárias no Alvorada a uma multidão de representantes da própria imprensa.

No fundo, Dilma queria dizer: "A função da imprensa é publicar as versões oficiais, as declarações que eu quero e tudo o que contribui com a minha campanha e atrapalha a dos os meus adversários".

Não chegou a tanto, mas disse que nenhum órgão da imprensa tem o status da Polícia Federal, do Ministério Público e do Supremo, esses, sim, aptos a investigar e/ou julgar. E o PT, tem ou não?

O partido nasceu, cresceu, encorpou e ganhou a Presidência, entre 1980 e 2002, justamente em aliança com a PF, o MP e... a imprensa, vasculhando tudo e todos e criando duas categorias de políticos no país: "nós, os puros e éticos, e todos os outros, impuros e antiéticos".

Quem comandou as investigações e a CPI que aniquilaram Collor, hoje amigão de Lula e aliado de Dilma? Quem esteve por trás da divulgação dos escândalos envolvendo qualquer um não petista? O PT, que entrou para a história como o grande partido ético e o grande partido de oposição.

Era ele quem, infiltrado em diferentes instâncias da máquina pública, levantava as suspeitas, fazia dobradinha com policiais e procuradores e pautava os jornalistas. Eles iam à luta, confirmavam a veracidade, colhiam os detalhes e faziam as manchetes. Ou seja, investigavam.

O PT não resistiu à mudança de posição. O gato virou rato, e a imprensa, de "amiga", passou a "inimiga", quando não foi e não é nem uma coisa nem outra. Apenas deve cumprir o seu papel, inclusive o de investigar.

Graças a ela, o país soube dos escândalos dos governos de Sarney, FHC, Lula e Dilma. Entram aí o mensalão, o doleiro camarada, os Correios, o Banco do Brasil, a Petrobras.

Não seja ingrata, presidente! O Brasil precisa cada vez mais dos jornalistas investigativos.

João Bosco Rabello: Uma semana decisiva

- O Estado de S. Paulo

A semana que começa amanhã é decisiva para a candidatura do PSDB, que nas últimas pesquisas registrou movimento mais expressivo na campanha, até aqui liderada pelas candidatas Dilma Rousseff e Marina Silva.

O senador Aécio Neves cresceu nas duas pesquisas, Ibope e Datafolha, retornando ao patamar de 20%, dentro da margem de erro, e apresentando a menor rejeição, enquanto suas adversárias caíram, mais ou menos, com Dilma mantendo o índice de rejeição mais alto, de 35% e Marina dobrando o seu, de 11% para 22%.

As duas pesquisas permitem a leitura de uma tendência de crescimento da candidatura do PSDB, o que anima os tucanos a manter a linha crítica às duas candidatas, dosando e diferenciando tom e conteúdo.

O PSDB tem se beneficiado do embate entre Dilma e Marina, que lideram a disputa, porque poupa Aécio Neves de ataques mais duros à ex-senadora, de quem pretende recuperar os votos perdidos após a morte de Eduardo Campos.

Parte desse contingente, acredita o PSDB, é de eleitores de Aécio que migraram para a candidata socialista por entender que ela tem mais chance de tirar o PT do poder.

A avaliação interna indica que o caminho mais simples para alcançar o objetivo de diferenciar Marina de Aécio - já que o PSB defende um programa econômico semelhante ao dos tucanos -, é mostrar que, se eleita, ela não se distanciará ideologicamente do partido que a abrigou durante toda a sua carreira política.

Alcançado o patamar entre 23% e 25% por Aécio, avaliam os tucanos que na semana seguinte esse fluxo aumenta criando uma reação do candidato na reta final da campanha.

Em tal contexto, a estrutura partidária do PSDB passa a fazer diferença na disputa em relação a Marina, cujo PSB é bem mais frágil e menos influente nos cenários regionais.

A rigor, é uma aposta na redução do aspecto emocional que alavancou a candidatura de Marina após a morte de Campos. Os debates e a luta renhida com Dilma humanizaram a candidata, desmistificando a personagem.

Por isso, a crítica a Marina insistirá na sua origem petista, na imprevisibilidade de seu governo, e na contradição de incluir o PSDB na "velha política", mas contando com seus quadros para dar qualidade a eventual gestão socialista.

Já em relação a Dilma, tom e conteúdo continuarão em alta.

Além dos péssimos resultados, o governo do PT exibe cada vez menos transparência, com dados inconfiáveis, inconstância e manipulação, o que já faz a oposição temer pelo êxito da futura fase de transição entre o governo eleito e o que deixa o Planalto, em caso de derrota de Dilma.

Sérgio C. Buarque: Frei Betto e falsas motivações do voto

revista Será?

Frei Betto é um homem culto, sério e informado. Mas a paixão política parece leva-lo a cometer vários equívocos e impropriedades quando manifesta sua posição política nas próximas eleições para presidente da República. Em texto escrito no dia 10 de setembro último e divulgado na rede social, o ilustre e respeitável Frei Betto apresenta 13 motivos pelos quais votará em Dilma Rousseff. Para estimular o debate, comento e questiono os seus argumentos equivocados ou inapropriados para defesa do voto na candidata do PT.

1. Apesar das mazelas e contradições do PT e do atual governo, votarei em Dilma para que se aprimorem as políticas sociais que, nos últimos 12 anos, tiraram da miséria 36 milhões de brasileiros.

As políticas distribuição de renda tiveram pouco efeito na redução da pobreza, por mais que se tenha difundido o contrário. O principal determinante da redução da pobreza e das desigualdades sociais do Brasil nas últimas décadas foi a forte mudança demográfica: o muito baixo crescimento da população em idade ativa e a drástica redução do tamanho das famílias. No ano 2000, as famílias tinham, em média, 2,4 filhos, caindo para apenas 1,9 filhos, em 2010, o que corresponde a famílias com média de apenas 3,3 membros. Mesmo com um aumento do PIB muito baixo, a pressão no mercado de trabalho levou à expansão dos salários médios. Simples assim: foi mais o mercado (mercado de trabalho) que o Estado o responsável pela melhoria social. Quem mostra isso é um estudo de Marcelo Neri, atual ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE): a contribuição da Bolsa Família, segundo o estudo, para o crescimento da renda domiciliar per capita no Brasil foi muito pequena, apenas 0,93%. E o aumento do salário real dos trabalhadores (não o salário mínimo) foi responsável por 71,16% do resultado social O que aconteceu foi uma queda do chamado “exército industrial de reserva”, para usar um conceito de Marx, que minguou porque a população em idade ativa se arrasta em torno de 1,2% ao ano (2005 a 2010). Ou seja, até com um crescimento medíocre da economia, com vivemos no governo Dilma, a demanda por trabalho tende a ser menor que baixa oferta de emprego. Isso explica também porque o desemprego está baixo enquanto a economia patina.

2. Votarei para que o Brasil prossiga independente e soberano, livre das ingerências do FMI e do Banco Mundial, distante dos ditames da União Europeia e crítico às ações imperialistas dos EUA.

A orientação destas instituições tem sido no sentido de gerar um superávit primário para reduzir o estoque da dívida pública. No governo Lula, ainda sob a condução de Antônio Pallocci, foi gerado um superávit primário de mais de 3%, superior ao que recomendava o FMI e que foi alcançado no governo de Fernando Henrique Cardoso. No que, aliás, fez muito bem. Sabiamente e sem precisar de ditames de fora, o governo apertou os gastos para gerar este superávit. O governo do PT diz que pagou a dívida brasileiro ao FMI para não sofrer “ditames”, mas seguiu as regras do fundo; e, pior, pagou divida barata com financiamento caro dos títulos da dívida pública. Marketing puro. Agora, no governo Dilma, a gastança voltou e não tem conseguido um superávit adequado, o que tem contribuído para pressão inflacionária. Não é preciso “ditames” de ninguém para saber que os gastos correntes do governo não podem crescer mais que o PIB-Produto Interno Bruto, a não ser com o aumento da carga tributária que parece já sufocante.

3. Votarei pela integração latino-americana e caribenha; pelo solidário apoio aos governos de Cuba, Venezuela, Bolívia, Equador e Uruguai; pela autonomia da CELAC e do Mercosul.

A política externa de uma nação tem que ter princípios e buscar a defesa dos interesses nacionais e os acordos e cooperação internacional não podem ser guiados pela ideologia de plantão no governo. Contaminada pela ideologia terceiro-mundista, velha de 60 anos, o governo brasileiro ficou refém do MERCOSUL, contido por dois países em crise, incluindo a Venezuela, que entrou no bloco pela porta dos fundos numa manobra muito pouco diplomática.

4. Votarei pelo respeito ao direito constitucional de greves e manifestações públicas, sem criminalização dos movimentos sociais e de seus líderes.

Quem criminalizou ou quem poderá vir a criminalizar os movimentos sociais? Marina? Uma política originada dos movimentos sociais, muito mais identificada com estes movimentos sociais que a candidata do PT cuja história política está mais liga aos aparelhos partidários que aos movimentos sociais. E Aécio, como governador de Minas Gerais por 8 anos não tomou nenhuma decisão de desrespeito ao direito constitucional nem de criminalização dos movimentos sociais.

5. Votarei pela Política Nacional de Participação Social; pela manutenção de cotas em universidades; pelo Enem, o Pronatec e o ProUni; e pelo aumento do percentual do PIB aplicado em educação.

Nenhum candidato discorda dessas políticas e medidas. Vale dizer que, em Minas Gerais Aécio Neves deu uma grande prioridade à educação, tanto que tem o maior IDEB do Brasil. E Marina se inspira na estratégia de Eduardo Campos para a educação que levou Pernambuco a ter o maior crescimento da nota do IDEB, subindo do 12º para o 4º lugar no ranking dos Estados brasileiros. Mas o que não se pode escamotear é que no quesito educação, depois de 12 anos do governo do PT, a nota do PISA, que mede o desempenho dos alunos de 65 países, o Brasil ficou em 55º lugar.

6. Votarei a favor do Programa Mais Médicos que, graças à sua ação preventiva, fez decrescer a mortalidade infantil para 15,7 em cada 1.000 nascidos vivos.

A redução da mortalidade infantil é bem anterior ao Programa “Mais médicos” e, portanto, não tem nada a ver com esta iniciativa que, diga-se de passagem, é carregada de efeito publicitário para dizer, depois das manifestações do ano passado, que estavam resolvendo as péssimas condições de saúde do Brasil. O dado utilizado para a mortalidade infantil (15,7 em cem mil nascidos vivos) é de 2012 (IBGE) e, portanto, ainda não tinha sido inventado o tal programa. E a verdade é que a saúde no Brasil continua na UTI. O programa “Mais médicos” não está errado mas é vendido como a solução para os problemas de saúde do Brasil numa clara mistificação.

7. Votarei pelo crédito facilitado e o reajuste anual do salário mínimo, de modo a ampliar o poder aquisitivo das famílias brasileiras, a ponto de viagens aéreas deixarem de ser um luxo das classes abastadas.
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O reajuste anual do salário mínimo é absolutamente inquestionável. Algum presidente da República pode acabar com o aumento do salário mínimo que, aliás, está regulamentado por lei? E o crédito? O crédito parece que foi facilitado demais a julgar pelo alto nível de endividamento das famílias que dificulta agora a expansão do consumo. A economista presidente achou que bastava aumentar o consumo que a economia deslanchava; esqueceu que o crescimento da economia depende mesmo é de investimento. Sem investimento, as políticas expansionistas do governo Dilma aumentaram a inflação, que representa a mais perversa forma de redução do poder aquisitivo da população de média e baixa renda. Pelo visto, o governo dá com uma mão e toma com a outra.

8. Votarei para que o trabalho escravo em fazendas do agronegócio seja severamente punido e tais propriedades confiscadas em prol da reforma agrária.

Desde o governo de Fernando Henrique Cardoso o Ministério do Trabalho combate o trabalho escravo e, principalmente, o trabalho infantil. Lembram do PETI-Programa de Erradicação do Trabalho Infantil?

9. Votarei para que a Polícia Federal prossiga apartidária, efetuando prisões até mesmo de membros do governo, combatendo o narcotráfico, o contrabando, a corrupção e a atividade nefasta dos doleiros.

Duvido que qualquer dos outros candidatos pensem em impedir esta atividade da Polícia Federal. Contudo, só agora a candidata Dilma está falando em cooperação com os Estados e foi leniente no controle de trafico de armas e droga na fronteira. Desconfio que esta declaração tenha implícita a ideia, que está sendo difundida pela candidata, de que a corrupção não cresceu nos governos do PT, o que houve foi aumento da investigação. Parece que as duas coisas cresceram muito nos últimos anos porque, por mais que se investigue os governos passados, nunca se viu nada parecido com o mensalão e que ganha novas proporções com a Petrobrás. Vale considerar que o mensalão foi muito mais que corrupção, foi uma desmoralização da política e do Congresso brasileiro.

10. Votarei para que a inflação seja mantida sob controle e, no Brasil, o crescimento do IDH seja considerado mais importante que o do PIB. Se nosso PIB cresce pouco, nosso IDH é o segundo do mundo, atrás apenas dos EUA, se considerarmos o tamanho da população.

Quem decide votar com o objetivo de conter a inflação não pode votar em Dilma. Além da retomada da inflação nestes últimos anos do seu governo, ela está deixando armadilhas inflacionárias para serem desmontadas pelo futuro presidente, entre as quais, o represamento dos preços administrados, particularmente, combustível e energia elétrica.
E a informação sobre o IDH está totalmente equivocada. O Brasil está muito, muito longe de ser o segundo do mundo. O PNUD informa que, em 2013, o Brasil estava em 79º lugar, bem atrás da Argentina, do Uruguai, do Chile, do México, da Costa Rica e até da Venezuela, para citar apenas países da América Latina. Não existe nenhuma comparação lógica com o tamanho da população até porque, uma das variáveis do IDH é a renda per capita, além da educação e saúde. A informação sobre os Estados Unidos serem o primeiro do ranking também está errada: EUA estão em 5º lugar.

11. Votarei para que a nossa diplomacia permaneça independente, aliada às causas justas, sem tirar os sapatos nas alfândegas usamericanas e endossar o terrorismo bélico dos EUA, que dissemina lágrimas e sofrimentos em tantas regiões do planeta.

A política externa brasileira tem tido, ao longo de décadas, uma postura independente em relação às grandes potencias, parte dos princípios diplomáticos do Itamaraty, com algumas exceções em períodos da ditadura. Como disse o deputado José Genoíno, em 1999, o governo de Fernando Henrique Cardoso, que o PT tanto critica, teve como meta constante da sua politica externa “refundar a credibilidade externa sobre a estabilidade interna”. De qualquer forma, cabe a pergunta: quais são essas causas justas que os governos do PT defendem? As ditaduras africanas às quais perdoou dívidas? À Venezuela com a aventura populista de Chavez? Cuba? Os governos anteriores do PSDB defenderam o fim do embargo dos Estados Unidos e não creio que nenhum outro candidato rejeite esta tese. O que não parece ser uma postura independente é a forma como o Brasil trata os prisioneiros políticos de Cuba. Numa das passagens de Lula por Havana, um preso político em greve de fome estava morrendo (e morreu quando ele ainda estava lá), e o presidente brasileiro ignorou e ainda comparou os presos comuns do Brasil. Lula: “Greve de fome não pode ser usada como um pretexto de direitos humanos para libertar pessoas. Imagine se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrassem em greve de fome e pedissem libertação”.

12. Votarei pela preservação do Marco Zero da internet, sem ingerência das gigantes de telecomunicações, interessadas em mercantilizar as redes sociais e manter controle sobre a comunicação digital.

O marco regulatório da internet foi aprovado no Congresso com o voto da grande maioria dos parlamentares dos partidos do governo e da oposição. Que presidente eleito vai modificar este marco regulatório?

13. Votarei, enfim, por um Brasil melhor, mesmo sabendo que o atual governo é contraditório e incapaz de promover reformas de estruturas e punir os responsáveis pelos crimes da ditadura militar. Porém, temo o retrocesso e, na atual conjuntura, não troco o conhecido pelo desconhecido.

Não existe nada mais conservador e reacionário do que preferir o conhecido ao desconhecido na medida em que, este sim, pode conter mudanças e inovações. O “mais do mesmo” é uma aposta no descontrole econômico, no voluntarismo irresponsável, no aparelhamento do Estado com a utilização dos cargos públicos para garantir o poder e comprar a adesão dos partidos e parlamentares, e na desestruturação do sistema elétrico, A maioria da população que pede mudança, como mostram as pesquisas de opinião, não pode preferir este conhecido que, de fato, é “incapaz de promover reforma de estruturas”.

Conclusão: Se Frei Betto decidiu votar em Dilma Rousseff, o que respeito e entendo como uma adesão ideológica, não pode explicar sua escolha pelos 13 argumentos apresentados como se fosse um diferencial positivo da candidata à reeleição, exceto o temor reacionário da mudança que o leva a “não trocar o conhecido pelo desconhecido”. Quase todos os 13 argumentos são infundados ou levam a preferir um candidato da oposição.

* Gaudêncio Torquato: As redes sociais e as eleições

- O Estado de S. Paulo

Três em cinco eleitores brasileiros estão nas redes sociais, algo em torno de 84 milhões de votantes. O dado é expressivo. Indica que a campanha eleitoral entrou bem nos corredores eletrônicos. De julho até dias atrás o Facebook registrou 58 milhões de mensagens relacionadas às eleições, propiciando curtidas, compartilhamentos, comentários a favor e contra. O monitoramento tem sido acompanhado pela cientista política norte-americana Katie Harbath, estudiosa do uso das redes em campanhas políticas, em passagem pelo País. A situação merece destaque pela introdução das ferramentas da era tecnotrônica em nossa seara política, até então afeita a rudes costumes e velhas práticas, particularmente na metodologia de cooptação eleitoral. Do centro aos confins do território, que ainda dão guarida ao balcão de recompensas para obter o voto, a chave eletrônica começa a abrir a mente de um eleitor cada vez mais antenado nas maravilhas do aparato ao seu redor, a começar do celular.

A par da planilha de grandes números, como 9 milhões de interações com conteúdo relativo aos últimos dois debates entre presidenciáveis, convém destacar os significados que esse novo ciclo expressa na vida das nações, como explica Zbigniew Brzezinski, ex-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA e mentor de planos da CIA, no livro A Era Tecnotrônica, cujas características comportam a escalada das classes médias, a expansão do setor terciário, o gigantismo dos núcleos universitários, as indústrias de ponta, o incentivo às modernas tecnologias e os trabalhadores bem formados e informados, entre outras. A importância da absorção do ferramental tecnológico pela política, em estágio avançado por aqui - eis que o Brasil está entre os cinco principais consumidores mundiais das redes -, reside no fato de que esse aparato eletrônico funciona como extensão da liberdade de expressão, um pulmão a oxigenar os fluxos institucionais, ampliando os circuitos da participação social, propiciando o deslocamento do discurso eleitoral para a esfera dos participantes.

Sob esse aspecto, ajuda a reforçar a expressão individual, valor central da democracia, e a dar vazão às demandas dos novos polos de poder que se formam na sociedade, no caso, as entidades de intermediação que se formam na esteira do declínio dos mecanismos tradicionais da política (parlamentos, representantes, etc.). A crise da democracia representativa, cujos sinais aparecem até no estrambótico desfile de pedintes de votos nos programas eleitorais, acaba promovendo a descrença social. Uma locução de indignação emerge. As manifestações das ruas traduzem esse espírito. As redes sociais, nesse vácuo, constituem o ancoradouro natural para acolher o clamor geral, as pontuações de um eleitor que se acha mal representado, a insatisfação do pagador de impostos que cobra pelos serviços que o Estado lhe deve. Descobre ele que pela via eletrônica sua voz pode chegar aos ouvidos de milhares de outros. Ancorado no valor da pertinência social, exige o que é seu, defende pontos de vista, manifesta opinião sobre fatos, atos e, neste momento, sobre os candidatos, com direito de ser até malcriado. Mais um dado citado pela pesquisadora Katie Harbath explica o estrondoso sucesso da rede no Brasil: registra-se uma média de 1 bilhão de visualizações diárias, 65% das quais por internet móvel.

Não é de admirar que as redes se transformem em correias de transmissão do clima social. A linguagem é a das ruas, até no palavrório desbocado, nas interpretações maldosas de situações, na defesa, nos xingamentos e acusações a candidatos, o que deixa transparecer exércitos de um lado e de outro a puxarem (sob soldo?) o cabo de guerra de candidaturas. Nesta fase de experimentação, exacerbam-se os ânimos e o verbo resvala pelo terreno da calúnia e difamação, a demonstrar que se há certo descontrole nos meios tradicionais - como programas eleitorais no rádio e na TV - imagine-se a falta de controle nas novas mídias, mesmo sabendo que há mais de cem solicitações exigindo a remoção de conteúdos nas redes. As trombadas, pois, fazem parte deste iniciante ensaio que se desenvolve nas diferentes redes sociais e mídias, particularmente pelos jovens, que registram elevado índice (85% deles) de consumo da internet. É evidente que a maior parcela dessa participação se dá na vertente da distração e do entretenimento, e não na vereda da política. Mas não é desprezível o contingente de usuários que sobem à tribuna eleitoral para acusar, defender, fazer campanha aberta por seus candidatos.

Se a lengalenga nas redes não chega a alterar os mapas eleitorais - são poucos os que mudam de posição -, ao menos consegue salpicar o desértico jardim político com respingos de querelas entre grupos. O ensaio de politização nas redes é um bom sinal, a indicar que a política está mexendo com o ânimo social. Já os candidatos precisam aprender a usar melhor os canais tecnológicos. Em vez de autoglorificação, deveriam propor-se a interagir com os eleitores e a debater ideias com adversários. É possível supor que na próxima campanha o confronto entre candidatos seja intenso, mais frequente e direto. Um benefício que a eletrônica oferecerá à democracia, como se constata nos EUA.

Qualquer movimento na direção da meta de amplificar a locução social merece reconhecimento. Urge, como diz a expressão, "democratizar a democracia", ou seja, fazer um esforço para aperfeiçoar os mecanismos de participação social no processo decisório; propiciar o encontro da democracia representativa com a democracia participativa; revigorar os instrumentos por esta usados (plebiscito, referendo, projeto de iniciativa popular); fortalecer os novos núcleos de poder (entidades de intermediação social); e incentivar novas modalidades de comunicação. A engrenagem democrática, aqui e alhures, é um permanente exercício de retoque em suas ferramentas e peças.

*Jornalista, professor titular da USP,

Luiz Carlos Azedo: O tour de force

• Marina enfrenta uma onda de boatos disseminados pelo PT de que pretende acabar com os programas Bolsa Família, Mais Médicos e Minha Casa, Minha Vida, além de aumentar os preços da conta de luz e dos combustíveis

- Correio Braziliense

Com Marina Silva (PSB) no pelourinho, sob duros ataques de Dilma Rousseff (PT) e do tucano Aécio Neves (PSDB), a disputa para saber quem vai para o segundo turno nas eleições tornou-se mais dramática.

Afora a falta de tempo de televisão, de estruturas robustas de poder, de recursos financeiros e de apoio políticos, a candidata de PSB cometeu erros que abalaram o favoritismo dela nas simulações de segundo turno.

Além dos fatores objetivos acima, a maior fragilidade de Marina se revelou quanto ao discurso político. Os adversários se aproveitaram de polêmicas criadas por Marina ou seus porta-vozes, como as relativas ao casamento gay, à independência do Banco Central, à exploração do pré-sal, ao controle da inflação e à legislação trabalhista.

Sob duros ataques do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marina enfrenta uma onda de boatos disseminados pelo PT de que pretende acabar com os programas Bolsa Família, Mais Médicos e Minha Casa, Minha Vida, e também aumentar os preços da conta de luz e dos combustíveis.

Sem tempo de televisão para se defender de forma satisfatória, o bombardeio mexeu com as pesquisas: Dilma manteve-se estável, com 36%, Marina resiste nos 30% e Aécio, com 17%, registra recuperação.

Há troca de eleitores entre Dilma e Marina e entre Marina e Aécio, porém, confirma a volatilidade do ambiente eleitoral. A rejeição a Marina subiu para 22% e a capacidade de resistência dela passará por dura prova nesta reta final da eleição.

Segundo turno
O voto consolidado de Dilma é da ordem de 33% do eleitorado, que nela votariam “com certeza”. Isso lhe garante presença certa no segundo turno, a não ser que ocorra algo de muito extraordinário. Dos 25% que votam “com certeza” em Marina, porém, 24% admitem que também poderiam votar na petista.

Vem daí o risco de Marina perder mais terreno para Dilma e, simultaneamente, abrir espaço para Aécio na reta final da campanha. O tucano ainda tem esperança de recuperar o segundo lugar perdido após a tragédia que tirou da disputa o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos.

A queda de Marina somada ao crescimento de Aécio reduziu de 18 para 13 pontos a distância entre os candidatos do PSB e PSDB. Marina manteve a liderança no Sudeste, mas caiu de 36% para 32% nas intenções de voto da região. Dilma ficou estável em 28%, e o tucano oscilou dois pontos pra cima (18% para 20%).

Considerando-se a situação de Minas Gerais, onde as pesquisas não refletem o potencial eleitoral de Aécio, um tour de force do candidato tucano no estado pode mudar o cenário. O senador mineiro cresceu no Centro-Oeste (16% para 23%) e no Sul (20% para 22%), o que corrobora a tese de que a travessia do chamado Triângulo das Bermudas — São Paulo, Minas e Rio De Janeiro — é o caminho crítico para Aécio sonhar com o segundo turno.

É no Sudeste, principalmente, que Marina sustenta sua candidatura, pois cedeu terreno no Sul (28% para 25%), no Centro-Oeste (35% para 31%), no Norte (32% para 28%) e no Nordeste (31% para 32%). Dilma permaneceu estável em praticamente todas as regiões. No Sul, tinha 35% e manteve o índice. No Nordeste, oscilou positivamente de 47% para 48%. No Centro-Oeste de 30% para 32% e no Norte de 48% para 49%.

À soviética
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) corrigiu na sexta-feira os dados que constavam na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) referente a 2013, divulgada na última quinta. Enquadrada pelo Palácio do Planalto, a presidente do instituto, Wasmália Bivar, pediu desculpas por erros “extremamente graves”. O equívoco afetou diversos índices divulgados, como analfabetismo e o Coeficiente de Gini, que calcula o nível de desigualdade no país. Resultado: os dados oficiais do governo estão sob suspeita de manipulação.

Miriam Leitão: Erros sem conta

- O Globo

Tomara que o próximo governante saiba como resolver o nó energético do país, porque até agora o debate passou apenas pela superfície de uma crise que não tem tamanho. O governo ficou tão temeroso de admitir riscos de falta suprimento em ano de eleição que aprofundou o problema. Se tivesse havido esforço para economizar energia, a tarifa a pagar em 2015 seria menor.

Com campanhas de redução de consumo de luz, racionalização de uso, o país teria diminuído o consumo de energia em 2014. Isso teria poupado água nos reservatórios e menos termelétricas teriam sido usadas. Com menos geração térmica, a conta a pagar seria menor. Porque é assim: quanto mais se usa hoje, mais se paga amanhã. Pelas normas da Aneel, o custo de um ano vai para o seguinte.

A teimosia do governo aumentou a conta do futuro. O especialista Mário Veiga alertou para isso em entrevista que me concedeu no começo deste ano: como choveu bem menos que a média histórica todos os meses, o mais correto do ponto de vista da gestão do setor elétrico seria reduzir o consumo para poupar o bolso e para se prevenir contra o cenário pior.

Quanto maior o consumo das famílias e das empresas, maior é a necessidade de se usar térmicas. Isso eleva o custo das empresas distribuidoras na compra da energia. Outro problema é o das geradoras. Como choveu pouco, as hidrelétricas tiveram menos água nos reservatórios. O ONS mandou que elas gerassem o pico da sua capacidade, mas elas não conseguiram, por falta de água, e foram obrigadas a comprar das térmicas e arcar com a enorme diferença de custos.

O governo é culpado pelo agravamento da crise, por vários motivos. Primeiro, reduziu o preço da energia no momento errado e pelos motivos errados; segundo, adiou o programa de bandeiras tarifárias que entraria em vigor este ano. Será só no ano que vem, porque o governo não quer dar má notícia ao eleitor. O sistema de bandeiras tarifárias funcionaria como um sinal amarelo, o preço subiria quando fosse usada mais energia térmica, que é mais cara. Terceiro, em vez de avaliar sinceramente a grave crise financeira das distribuidoras, preferiu inventar a fórmula do empréstimo via CCEE para empurrar o problema para a conta do ano que vem; quarto, foi ele que, por imperícia nos leilões, deixou empresas descontratadas. Quinto: um empréstimo de R$ 10 bilhões dado pelo Tesouro em 2013 às distribuidoras deveria ter sido pago em 2014, mas foi adiado para depois da eleição.

Ficou conta demais para depois das eleições. As tarifas terão que compensar o empréstimo do Tesouro, os dois empréstimos tomados pela CCEE, os aumentos de custos das empresas e, além disso, entrará em vigor o sistema das bandeiras tarifárias. Como desarmar essa bomba? Ela foi jogada no colo de quem governar o Brasil a partir de 2015.

As geradoras estão arcando com um custo despropositado por não poderem gerar o que lhes manda o ONS. Elas simplesmente não têm água para gerar. E o custo delas não poderá ser repassado porque não está previsto em lei. O governo disse que faz parte do “risco do negócio”. Ora, nenhum setor tem que arcar com um rombo que pode chegar a R$ 20 bilhões por problemas que não foram criados por ele. Isso não é risco do negócio, é erro de gestão governamental.

O Brasil está em uma situação esquisita. Apesar de não ter crescido, foi o país no qual mais aumentou a taxa de carbono na economia, segundo uma pesquisa da consultoria PwC, que acompanha há anos seis anos o grau de “carbonização” dos países. A carbonização da economia brasileira aumentou 5,5% entre 2012 e 2013, pelo uso maior das térmicas, que já começou no ano passado. A nossa matriz está ficando mais suja, apesar de o Brasil estar crescendo pouco.

É muito mais fácil para o governo dizer que tudo que está acontecendo é provocado pela falta das chuvas. A imprevidência da gestão hídrica provocou problemas de abastecimento de água em São Paulo na administração tucana, e isso calou uma parte da oposição. De qualquer maneira, no pouco tempo de um debate, em uma entrevista ou na propaganda eleitoral, é difícil explicar a sucessão de erros do governo na área de energia. Esses quatro anos de Dilma deixam uma pesada herança que será um desafio enfrentar.