quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Opinião do dia - Friedrich Hegel*

Marquem bem isso, vocês, orgulhosos homens da ação! Vocês são, no final, nada mais que instrumentos inconscientes dos homens que pensam.

*Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770 -1831), foi um filósofo germânico. É unanimemente considerado um dos mais importantes e influentes filósofos da história.

Luiz Carlos Azedo - Reforma audaciosa

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“A proposta de Paulo Guedes transfere para estados e municípios a responsabilidade principal pelas políticas sociais e foca a ação do governo na gestão da economia”

A proposta de reforma administrativa entregue ontem ao Congresso, pelo presidente Jair Bolsonaro, é a maior mudança na estrutura administrativa do país já feita num ambiente de liberdade. As grandes reformas administrativas anteriores ocorreram durante o Estado Novo e o regime militar. Mesmo no governo de Fernando Henrique Cardoso, que fez uma grande reforma patrimonial, a reforma administrativa não teve a mesma ambição. Por mais que haja entendimento entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), será muito difícil a conclusão da reforma ainda neste ano, pois serão necessárias três emendas constitucionais.

Existe massa crítica no Congresso para a realização de uma reforma administrativa ampla, que reequilibre as relações entre a União, estados e municípios. Isso ficou demonstrado pela aprovação da reforma da Previdência. São três propostas básicas: PEC do Pacto Federativo, que dá mais recursos e autonomia financeira para estados e municípios; PEC Emergencial, que cria mecanismos emergenciais de controle de despesas públicas para União, estados e municípios; e a PEC dos Fundos Públicos, que extingue a maior parte dos 281 fundos públicos e permite o uso de recursos para pagamento da dívida pública.

A ideia de estabelecer mecanismos de controle da dívida pública de estados e municípios, e dar a eles mais autonomia para aplicação dos recursos, tem ampla aceitação no Congresso, mas envolve muitos interesses corporativos e cartoriais, que tendem a se mobilizar durante a discussão das propostas. Uma das principais medidas é a alteração no processo de distribuição dos recursos do pré-sal, o que resultará na distribuição, aos estados e municípios, de R$ 400 bilhões a mais em 15 anos. A expectativa do governo é de que esses repasses, nos próximos anos, encerre a disputa judicial sobre a Lei Kandir entre os estados e a União. O governo federal não pagou as compensações por perdas nos últimos anos com a desoneração das exportações.

A PEC do Pacto Federativo prevê a criação de um Conselho Fiscal da República, que se reunirá a cada três meses para avaliar a situação fiscal de União, estados e municípios. Participam do Conselho: Presidência da República, Câmara, Senado, Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal de Contas da União (TCU), governadores e prefeitos. A proposta é polêmica: teria o objetivo de padronizar os mecanismos de controle fiscal em todo o país. O pacote também extingue o Plano Plurianual (PPA); limita a criação de despesas, por leis e decisões judiciais, à previsão orçamentária; e reavalia benefícios tributários a cada quatro anos, limitando-os a 2% do PIB a partir de 2026.

Entrevista: Monica de Bolle: Paulo Guedes está preso nos anos 70

A economista afirma que as políticas do ministro da Economia, de defesa de um estado mínimo, não são condizentes com as necessidades do Brasil

Por Lucas Amorim | Exame

A economista Monica de Bolle, diretora de estudos-latino americanos e mercados emergentes da universidade americana Johns Hopkins, não pode ser acusada de defender as políticas econômicas de Dilma Roussef. A economista lançou, em 2016, o livro Como Matar a Borboleta Azul, uma crítica acabada do modelo de estado máximo e descontrole econômico da ex-presidente. Por isso, suas observações ao programa econômico do atual ministro da Economia, Paulo Guedes, ganham especial relevância. Nos últimos meses, De Bolle tem sido elogiada e cobrada nas redes sociais por críticas cada vez mais incisivas ao ministro. Nesta terça-feira, mesmo dia em que Guedes anunciou um superpacote econômico para enxugar o estado e estimular a economia, a economista publicou, no Twitter, que “está na hora de o ministro sair dos anos 60 e 70”. De Bolle concedeu a seguinte entrevista a EXAME, por telefone.

• Por que a senhora afirma que o ministro Paulo Guedes tem uma desconexão da realidade atual?

Seu foco, desde a campanha, é de transformar o Brasil numa espécie de estado mínimo tupiniquim. Mas não dá muito para imaginar como isso cabe em nossa Constituição de 88, que prega um estado de bem estar social. Até por isso ele vem articulando reformas por meio de PECs [proposta de emenda constitucional]. Mas a estratégia chega a ferir normas democráticas. Ele fala em novo pacto federativo, mas não ouve a população. No limite, esse tipo de discussão deveria ser feita em uma assembleia constituinte.

• O que o Brasil tem a aprender com o Chile, país com a melhor economia da região e constantemente apontado como modelo por Guedes?

As manifestações recentes no Chile sublinham o tamanho do problema. No Brasil, com pobreza extrema, é ainda pior. Não se atenua a pobreza e a desigualdade sem um estado atuante. É preciso ter redes de proteção social fortes. O mercado não resolve sozinho, como já foi mostrado de todo jeito. O Paulo Guedes está preso nos anos 70 do Chile e dos “Chicago boys”. Além disso, ele nunca foi um formulador de políticas públicas, nem precisou de um entendimento mais profundo de políticas públicas sobre a dinâmica da pobreza na vida das pessoas. O Chile passa por uma convulsão pela ausência de bem estar social a despeito de todas as reformas. Estive recentemente com um embaixador chileno que reconheceu a falha do país em não ter gasto para ter uma rede de bem estar social. O governo Piñera, pelo menos, percebeu que também é responsável, e pela primeira vez um governo de direita está preocupado com questões sociais na região. Espero que dê certo, porque daria um recado muito importante.

• Mas o estado brasileiro está nas cordas. Não fazer as reformas não é pior?

Concordo que o estado é pesado e ineficiente, e que há muita coisa a ser feita. E alguma das medidas, como as restrições para funcionários públicos, são importantes. Mas não dá para o estado brasileiro ser reduzido a ponto de só oferecer o básico do básico. O pensamento macroeconômico moderno, que tem sido construído mundo afora, é o estado precisa mirar as tensões sociais. Não é uma coisa ou outra, nem uma primeiro e outra depois. Até porque a insegurança política e social no Brasil não vai permitir esse tipo de mudança.

• O governo Bolsonaro é liberal?

Ser liberal não pressupõe só estado mínimo, mas sim um estado de tamanho ótimo. Na visão liberal, o estado pode, sim, atacar problemas sociais e dar ao mercado as condições de fazer outras coisas. Não há nada de heterodoxo nisso. No Chile, por exemplo, o sistema tributário é baseado em IVA [imposto sobre valor agregado], que incide sobre o consumo e, portanto, é muito regressivo. É um dos focos de insatisfação. Mas, em vez de reduzir o IVA, o Chile poderia criar mecanismos de transferência, como os adotados na Europa, na Austrália, no Japão.

O ministro Paulo Guedes disse à Folha de S. Paulo que, após 30 anos de políticas econômicas de “centro-esquerda” é preciso esperar quatro anos de um liberal-democrata. A senhora concorda?

É uma falácia que precisamos sair de um extremo para o outro. Assim, vamos oscilar como um pêndulo a cada ciclo de governo e aí é que a economia não deslancha mesmo. O único jeito de ir para o centro é ir para o centro. Em 2019 há no Brasil uma impressão de que a economia é a única coisa que funciona, e que a equipe precisa de tempo para trabalhar. Mas o governo defende uma política de país com estado mínimo que não vai funcionar.

Ricardo Noblat - Guedes, a opção a Bolsonaro

- Blog do Noblat | Veja

Moro corre por fora

O Congresso mais reformista de todos os tempos, pelo menos assim o enxerga Davi Alcolumbre (DEM-AP), seu presidente, dará um jeito de desidratar ao extremo o pacote de medidas econômicas levadas em mão, ontem, pelo presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes, o todo poderoso xerife da Economia. Sem chances de elas serem aprovadas tal qual.

De fato, não se trata de um pacote como tantos que o país já viu. Trata-se da proposta mais ampla e irrestrita de redesenho do Estado, algo a provocar uma ruptura que só seria possível a princípio mediante a convocação de uma Assembleia Constituinte. A última foi de 1988. Não há sinais de que se tenha outra em breve.

Assim como não é um pacote, também não é um programa de governo para ocupar apenas os anos que faltam para que se esgote o mandato de Bolsonaro. Como pareceu a senadores e a deputados experientes, estaria mais para a apresentação de quem se oferece desde já como uma nova perspectiva de poder. Quem? Guedes.

Bolsonaro não está nem aí para essas coisas. Quer apenas que a economia deslanche para que ele possa lutar melhor pela reeleição. O atual é um governo dividido em dois: o de Bolsonaro, ocupado em assombrar o país com o fantasma da volta da esquerda, e o de Guedes preocupado em fazer valer as suas ideias.

Bernardo Mello Franco - Festival de autoelogios

- O Globo

Bolsonaro completou 300 dias no poder, mas ainda não desceu do palanque. Ontem ele ocupou o Planalto com mais uma solenidade marcada por autoelogios

Jair Bolsonaro completou 300 dias no poder, mas ainda não desceu do palanque. Ontem ele abriu o palácio para mais uma solenidade marcada por autoelogios. Em discurso, voltou a exaltar a própria gestão e a atacar o jornalismo profissional.

O presidente disse que a imprensa “não colabora com o Brasil”. A frase mostra que ele não sabe conviver com críticas —e continua a confundir os interesses do país com os interesses de sua família.

Bolsonaro acusou o jornalismo de tentar “colocar em seu colo” o assassinato de Marielle Franco. Mais uma distorção. Na verdade, o Jornal Nacional informou que ele foi citado no depoimento de uma testemunha, o que obrigou o Ministério Público a submeter o caso ao Supremo Tribunal Federal.

Em outro momento, o presidente saiu em defesa do filho Eduardo, alvo de pedidos de cassação. Disse que ele não merece perder o mandato por causa de suas declarações a favor de um “novo AI-5”. “Em todos os momentos a Câmara respeitou o sagrado direito de opinião, seja ela qual for”, afirmou.

Antônio Rangel Bandeira* - A ameaça do porte de armas

- Folha de S. Paulo

Governo confirma a nossa vocação à insensatez

Como dizia o inesquecível Stanislaw Ponte Preta, “as três coisas mais perigosas na vida são croquete de botequim, mulher dos outros e arma de fogo”. Pois em todo o mundo avança o controle de armas, principal medida preventiva para reduzir a violência. Até mesmo a Suíça, celebrada pelos armamentistas, teve 63,2% do eleitorado exigindo controle no último plebiscito.

Trabalhando para a Nações Unidas no treinamento de policiais e militares de 19 países, pude constatar como essa política se expande, desde que foi proposta pela Conferência da ONU em 2001.

O Brasil vinha progredindo nesse sentido, diante do descalabro de ter 3% da população mundial, mas responder por 14% dos homicídios com arma de fogo. Enquanto o Japão, que proíbe o seu uso por civis, teve três homicídios dessa natureza em 2017, o Brasil registrou 47.500, média de 130 por dia. Mas nosso país reagiu, aprovando em 2003 uma lei de controle moderna e democrática, elogiada nos fóruns internacionais.

O Estatuto do Desarmamento fez desabar essa tendência. Se nos 14 anos anteriores à lei a média anual de crescimento desses homicídios era de 5,5%, nos 14 anos posteriores despencou para 0,85% —ou seis vezes menos, segundo Daniel Cerqueira, do insuspeito Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Bruno Boghossian – O governo esculhamba a CPI

- Folha de S. Paulo

Sessões são marcadas por bate-bocas, discussões ideológicas toscas e até notícias falsas

Alguns integrantes da CPI criada para investigar fake news decidiram se inspirar no pandemônio das redes sociais. As últimas sessões da comissão foram marcadas por bate-bocas, ideias radicais, discussões ideológicas toscas, desinformação e, ironicamente, notícias falsas.

A missão dos parlamentares era apurar ataques contra a democracia, a influência de perfis falsos sobre as últimas eleições e o funcionamento de milícias digitais alinhadas ao governo. Os trabalhos, no entanto, mal arranharam a superfície.

A tropa de choque de Jair Bolsonaro trabalha para esculhambar e enterrar a CPI. Deputados usaram a reunião desta terça (5) para dar palanque a apoiadores do Planalto, difundir teorias conspiratórias, louvar o polemista Olavo de Carvalho e atacar a imprensa profissional.

Elio Gaspari - De J.Portela@edu para Heleno@mil

- Folha de S. Paulo | O Globo

Sei como se fez o AI-5, não há receita, mas passo-lhe ingredientes de 1968

Caro general,
Outro dia o senhor falou das dificuldades para se baixar um Ato Institucional nº 5 no Brasil de hoje. Nas vossas palavras: “Essas coisas, hoje, num regime democrático... é complicado. Tem de passar em um monte de lugares. Não é assim. (...) Tem de estudar como vai fazer, como vai conduzir”.

Para se fazer o AI-5 era preciso destruir a ordem constitucional da Carta de 1967, e posso dizer que vi a arquitetura desse desmanche. Eu, Jaime Portela de Melo, general, paraibano, chefe do Gabinete Militar do presidente Costa e Silva, estive em todas as encrencas militares do meu tempo.

Acho que o senhor, ou qualquer outra pessoa disposta a estudar como se pode conduzir o Brasil para um AI-5, deve entender que faltam diversas condições. Hoje não há uma esquerda assaltando bancos, sequestrando aviões, matando militares e planejando guerrilhas rurais. 2019 não é 1968, a Venezuela não é Cuba e a China não é o Vietnã. Tínhamos também um ministro do Exército vaidoso, vazio e vacilante.

De qualquer forma, quero mostrar os ingredientes que foram adicionados à crise.

Fernando Exman - Uma fórmula binária de fazer política

- Valor Econômico

Pacote coloca articulação política de novo à prova

O presidente Jair Bolsonaro alcançou o trecentésimo dia de seu mandato começando a colher os resultados de um programa econômico assertivo, embora ainda batalhe para superar as incertezas provocadas pela maneira como exerce o poder e pela forma de conduzir a interação entre o Executivo e Parlamento.

O Congresso pegou a reforma da Previdência pelas mãos e conseguiu carregá-la até a promulgação, enquanto um novo lote de medidas econômicas começa a tramitar no Legislativo. Até agora, contudo, no campo político o presidente tem mais se caracterizado por sua disposição de partir para o embate total com quem entra na sua lista de opositores.

Bolsonaro trata desafetos como adversários, e não diferencia adversários de inimigos.

Esse atributo pôde ser observado diversas vezes durante sua atuação parlamentar, nos inúmeros embates que protagonizou em plenário, no salão verde da Câmara e no Judiciário. Longe dos olhares de espectadores, militantes e internautas, até que Bolsonaro mudou em alguns aspectos.

Não são poucos os relatos de deputados e senadores filiados a partidos achincalhados em público que, depois de se reunirem com ministros palacianos, foram levados ao gabinete presidencial para conversar com o próprio Bolsonaro. Surpreenderam-se com a receptividade, mas não saíram convencidos de que há uma transformação em curso na forma de fazer política do outro lado da Praça dos Três Poderes.

Afeito a gestos simbólicos, gosta de atravessar a rua e entregar pessoalmente ao Legislativo propostas de impacto. Depois, terceiriza responsabilidades durante a tramitação e alimenta a imagem de presidente que vai conseguindo atingir as promessas feitas na campanha, apesar dos políticos e da política.

Merval Pereira - Mexendo nas estruturas

- O Globo

Reformas tentam tirar do papel o slogan vitorioso da campanha presidencial ‘mais Brasil, menos Brasília’

O Congresso mais reformista da história, como disse o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, tem pela frente a tarefa de aprovar a mais abrangente das reformas, que mexe na estrutura de um Estado patrimonialista e elitista.

Assim como a reforma da Previdência tocou, embora ainda não tão profundamente quanto requerido, na desigualdade dos benefícios dos servidores públicos em contraste com os do regime geral (INSS). O mesmo espírito de criar um sistema previdenciário sustentável no longo prazo, e mais equânime, rege as reformas apresentadas ontem pelo presidente Bolsonaro, que as levou pessoalmente ao Congresso, realçando sua importância.

Politicamente delicadas, pois mudam critérios legais guiados por interesses políticos, como a criação de municípios, as reformas da equipe econômica de Paulo Guedes tentam tirar do papel o slogan vitorioso da campanha presidencial “mais Brasil, menos Brasília”.

Para isso, é preciso criar estruturas novas que sejam sustentáveis. O novo pacto federativo propõe mais dinheiro para estados e municípios, mas também faz exigências maiores para a gestão desses entes federativos. A previsão é que até R$ 500 bilhões possam ser transferidos nos próximos 25 anos com as novas regras de divisão de recursos do petróleo, podendo até 70% dos royalties da exploração do petróleo e do gás serem transferidos para estados e municípios, que ficarão ainda com a totalidade do salário-educação.

Míriam Leitão - Falta testar viabilidade das ideias

- O Globo

Há várias boas ideias no pacote do governo de ajuste fiscal, mas são menos grandiosas do que as prometidas pelo ministro Paulo Guedes

As ideias por trás das propostas apresentadas ontem pelo governo são ótimas. O Brasil de fato precisa descentralizar recursos, cortar gastos quando houver uma emergência fiscal, acabar com municípios sem viabilidade, usar o dinheiro que está empoçado em fundos públicos, reduzir os subsídios e isenções e dar mais liberdade ao administrador público nas despesas de pessoal. Tudo certo. A dificuldade no atual governo é separar fato de ficção.

O discurso do ministro Paulo Guedes tem sempre planos grandiosos. A medida acaba saindo bem menor. E depois será preciso verificar se é factível. Guedes falou que a ordem autoritária centralizou os recursos. Foi isso mesmo que a ditadura fez. “E a democracia não descentralizou.” Verdade. Mas o que foi proposto foi apenas que um percentual maior dos recursos de futuros leilões de petróleo ficará com estados e municípios. Ele calcula em R$ 400 bilhões o que será distribuído em 15 anos. Em troca, os estados terão que abrir mão da velha demanda que eles têm de serem compensados pelas isenções dadas de ICMS nas exportações de semimanufaturados, a famosa Lei Kandir.

Vera Magalhães - 300 dias

- O Estado de S.Paulo

Reformas liberais disputam espaço com laivos autoritários e espuma ideológica

Jair Bolsonaro fez ontem, com uma semana de atraso, a pajelança para marcar os 300 dias de seu governo. Houve uma parte da comemoração substantiva, representada por um importante e complexo conjunto de mudanças na estrutura do Estado e do Orçamento de todos os entes da Federação, e outra marqueteira, marcada pela bateção de bumbo e um preocupante símbolo do “infinito” a designar os dois zeros do número 300.

A divisão de atos é bastante ilustrativa do que tem sido a dinâmica do governo nesses dez primeiros meses: de um lado, a equipe de Paulo Guedes propondo medidas liberalizantes, que foram prometidas na campanha e que podem, se aprovadas, levar à superação do quadro de profundo desacerto fiscal e levar a um crescimento mais vigoroso, e Bolsonaro e a ala mais ideológica, de outro, promovendo polêmicas estéreis, brigando com Deus e o mundo e, aqui e ali, deixando escapar laivos autoritários.

Guedes fez uma longa explanação sobre as razões intrínsecas ao conjunto de medidas que finalmente chega ao Congresso. A ideia de repactuar a relação entre União, Estados e municípios ao mesmo tempo em que se flexibiliza a aplicação dos recursos e se rediscute a estabilidade do funcionalismo é um todo que faz sentido dentro da ideia liberal de que o Estado deve ser menor para gastar menos consigo mesmo e mais com a sociedade.

João Domingos - Pacote terá problemas no Congresso

- O Estado de S. Paulo

O governo pode se preparar. O Congresso não aprovará as propostas do Plano Mais Brasil do jeito que foram entregues. Em alguns casos, haverá resistências intransponíveis, como a extinção de cerca de 1,2 mil municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação menor do que 10% da receita total. Em outros, os projetos serão tocados, mas com mudanças. A única parte com chance de andar, talvez com votação em pelo menos uma das Casas este ano, é a que trata dos gatilhos para reduzir gastos.

O Congresso é formado na sua maioria por parlamentares que se dizem municipalistas. E, mesmo que nem todos saibam direito o que isso significa, sabem que precisam do apoio dos prefeitos para garantir a eleição. Acabar com mais de mil municípios é acabar com mais de mil cargos de prefeito e outro tanto de vices, além de cerca de 12 mil mandatos de vereador, todos cabos eleitorais importantes. Sem contar os servidores, eleitores que podem perder o emprego.

Para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tudo leva a crer que essa iniciativa tem cheiro de jabuti em cima de uma árvore. “Tem segunda intenção por parte desse projeto”, disse Maia a este repórter ontem.

Vinicius Torres Freire* - Bolsonaro propõe revolução constitucional para arrochar gasto no país todo

- Folha de S. Paulo

Emendas constitucionais limitam despesa de alto a baixo na República e nos Poderes

Jair Bolsonaro propôs uma revolução nas regras do gasto público. O governo, Paulo Guedes e seus economistas, apresentaram nesta terça-feira (5) uma espécie de mini-Constituinte fiscal. Apenas não se pode chamá-la de pacotaço porque tudo depende do Congresso.

As emendas constitucionais disciplinam de modo drástico não apenas a despesa e a dívida federais, atuais e futuras, mas também os gastos de prefeituras, estados e dos demais Poderes, Judiciário e Legislativo. Há uma vaga promessa de repassar mais recursos federais para governadores e prefeitos, mas, na verdade, o pacote de emendas centraliza e escreve em pedra, na Constituição, as normas da despesa pública da Federação inteira.

É promessa de atritos políticos sérios e variados, dezenas. O que vai sair do Congresso é um mistério.

Em um resumo precário, quase uma enumeração caótica de tantas medidas, conviria prestar atenção no seguinte, para começar.

Enquanto o governo federal tiver déficit em valor maior que o de seus investimentos "em obras" (que ora mínguam), serão vedados aumentos de gastos em geral, com servidores em particular, que poderão ainda ter seus vencimentos reduzidos em até 25%. Dada a situação das contas públicas, é difícil que o governo saia dessa situação de emergência e arrocho antes de 2024.

Legislativo e Judiciário serão obrigados a acompanhar o arrocho do governo, do Executivo.

Governos de estados e municípios terão de seguir os critérios federais de contabilidade e de explicação de gastos (hoje, é uma farra de criatividade contábil. Caso governos regionais burlem as regras nacionais e os Tribunais de Contas de estados e municípios façam vista grossa, serão enquadrados pelo Tribunal de Contas da União.

A dívida pública federal terá um limite fixado em lei complementar (mais uma regra para limitar o gasto público, pois). O Orçamento federal passa a programar despesas por vários anos (mais um limite para gastos futuros).

A partir de 2026, ficam proibidos empréstimos, renegociações de dívida e outras mumunhas de crédito entre governo federal e estados e municípios.

Paulo Hartung* - Aglutinação de muitos tópicos na mesma medida gera risco de paralisação do debate

- Folha de S. Paulo

Distribuição de royalties para estados e municípios, na medida em que isso pode promover a expansão de despesas permanentes, a partir da troca de fontes, tal como já ocorreu no passado

No meu último mandato de governador do Espírito Santo (2015 a 2018), um dos desafios foi a luta pelo ajuste fiscal. Sempre acreditei que estados e municípios devem ter capacidade de compatibilizar suas despesas a suas receitas. Mas o modelo de estrutura pública adotado historicamente no Brasil, e cristalizado na Constituição de 1988, gerou uma máquina governativa insustentável, cara e com baixa capacidade de entrega.

Observamos a União quebrar repetidamente a regra de ouro, que proíbe o uso de operações de crédito para cobrir despesas correntes. São 12 estados com gastos de pessoal acima dos limites da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).

O Rio de Janeiro está no regime recuperação fiscal, e outros três estados, Minas, Goiás e Rio Grande do Sul, tentam o ingresso no regime. Por isso, o lançamento das medidas do governo federal traz elementos importantes para a gestão fiscal do país, tanto no que diz respeito à União quanto para estados e municípios.

Podemos destacar a proposição de instrumentos para os gestores realizarem os ajustes necessários, inclusive com medidas que defendo há muitos anos. Dentre elas, a possibilidade de ações que controlem o crescimento de despesas obrigatórias com redução de jornada de trabalho e ajuste proporcional de vencimentos, isso se for constatada uma situação de crise fiscal, com despesas acima de 95% das receitas correntes.

Outro elemento importante é a maior flexibilidade trazida pela possibilidade de um mínimo conjunto pela saúde e educação, que hoje soma 37% para estados e 40% para municípios, permitindo que as alocações de recursos tenham melhor aderência às necessidades da população.

Hoje, no Brasil, a taxa de natalidade vem caindo, enquanto a expectativa de vida aumenta, alterando as prioridades de investimentos.

Pacote de Bolsonaro e Guedes propõem reforma radical do Estado brasileiro

Economistas veem novo marco na gestão financeira; pacotaço já enfrenta resistência no Senado

- Folha de S. Paulo*

BRASÍLIA E SÃO PAULO - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ministro da Economia, Paulo Guedes, enviaram nesta terça-feira (5) ao Senado um pacote de medidas que propõe a mais profunda reestruturação do Estado brasileiro em décadas, na avaliação de economistas.

Bolsonaro entregou ao presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), três PECs (Propostas de Emenda à Constituição): a PEC do Pacto Federativo (para dar maior flexibilidade ao Orçamento e aumentar repasses de recursos a estados e municípios); a PEC da Emergência Fiscal (que institui gatilhos para conter gastos públicos em caso de crise orçamentária de União, estados e municípios) e a dos Fundos Públicos (que revisa 281 fundos).

O conjunto busca reduzir o tamanho do Estado e dá início à implementação do plano defendido por Guedes de a gestão das finanças públicas ter “mais Brasil, menos Brasília”.

O governo ainda vai encaminhar proposições à Câmara, como a PEC da reforma administrativa, que remodela o serviço público de todos os entes, além de um projeto de lei que traz um novo modelo de privatizações.

Oficialmente, o pacotaço foi batizado de Plano Mais Brasil e recebeu como slogan “A Transformação do Estado”.

Como fez ao enviar a PEC da Previdência, em fevereiro deste ano, Bolsonaro foi a pé ao Congresso, acompanhado por Guedes e pelos ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil).

“Temos a certeza de que, em pouco tempo, talvez no início do ano que vem, meados do ano que vem no máximo, essa proposta se tornará realidade”, disse o presidente.

Após a entrega dos projetos, Guedes e sua equipe econômica apresentaram as propostas. O ministro, no entanto, ficou apenas no início e deixou a entrevista alegando ter uma reunião. Diante da insistência dos jornalistas, respondeu a algumas perguntas e se retirou.

“Essa transformação é um ato de crença no fortalecimento da Federação. É o primeiro governo em 40 anos que fala em descentralizar recursos”, afirmou Guedes.

41 senadores assinam carta a Toffoli pela manutenção da prisão em 2ª Instância

Quarenta e um parlamentares afirmam que revisão de jurisprudência levaria ao 'risco da liberação em massa de inúmeros condenados por corrupção'

Paulo Roberto Netto | O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Um grupo de 41 senadores assinou carta dirigida ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, a favor da manutenção da possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância. (veja abaixo a carta e a lista dos assinantes),Os senadores afirmam que a prisão em segunda instância ‘tem sido fundamental para combater o sentimento de impunidade presente na sociedade’ e que a revisão do entendimento seria ‘grave’ para a ‘segurança jurídica’.

A Corte deve se debruçar sobre a questão nesta quinta, 7, quando o Plenário retoma julgamento de três ações que põem em xeque a medida. O placar está 4 a 3 pela prisão em segundo grau. A tendência é a revisão do entendimento do próprio Supremo que, desde 2016, autoriza prisão em segundo grau judicial. Se o Supremo derrubar a prisão na segunda instância, o cumprimento da pena somente valerá após todos os recursos, o chamado trânsito em julgado.

Há, no entanto, a possibilidade de um “voto médio” por parte de Toffoli, estipulando a prisão após condenação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), considerada a “terceira instância”.

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A prudente distância dos militares – Editorial | O Estado de S. Paulo

Diante de um governo que não poupa esforços em criar polêmicas, acirrar ânimos e provocar adversários, é meritório o empenho das Forças Armadas, bem como dos militares da reserva que integram o governo, para não se imiscuírem nas picuinhas políticas, evitando, assim, criar novos atritos. Confirma-se uma vez mais que, à diferença de alguns civis, os militares têm sido exemplares no respeito à Constituição de 1988. Os arroubos autoritários a que vez ou outra o País assiste, como, por exemplo, manifestações pedindo fechamento do Congresso, ou a reedição do AI-5, ou achacando ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), não nascem nas casernas.

Nesse quadro de saudável distanciamento por parte dos militares das polêmicas do presidente Jair Bolsonaro e de seu entourage, cabe ressaltar uma exceção. Nos últimos meses, o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, tem se aproximado da chamada ala ideológica do governo Bolsonaro. Na semana passada, por exemplo, o general Heleno foi uma das raras vozes que apoiaram a manifestação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) favorável a “um novo AI-5” para conter uma possível “radicalização” da esquerda no País.

Poesia | Vinicius de Moraes - Pátria Minha (vídeo)

Música | "Bella Ciao" - Orquestra Filarmônica no Teatro Colón