segunda-feira, 6 de março de 2017

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna

Os idos do regime militar têm lições que merecem ser lembradas, talvez principalmente pela militância petista e seu amplo círculo de simpatizantes entre os intelectuais. Nos primeiros tempos daquele regime, esquerda e setores democráticos se fixaram no diagnóstico equívoco de que sua derrota se explicaria por uma conspiração do imperialismo em conluio com setores internos a fim de barrar o processo de desenvolvimento do País. Na compreensão da época, o desenvolvimento estaria animado por uma lógica interna tendente a nos levar a um governo nacional-popular sob hegemonia da esquerda.

O trancamento desse processo pela via da violência política foi então interpretado por uma parcela da esquerda como se não lhe restasse outra solução senão a da luta armada, desertando do campo da política. Esse caminho se sustentou numa narrativa escorada numa teoria, a do foco, inspirada no modelo cubano e nos escritos de Régis Debray. A recusa a esse caminho exigia a desconstrução do que suportava essa alternativa, que, longe de abalar o regime ditatorial, o reforçava.

*Luiz Werneck Vianna, sociólogo, PUC-Rio. “A retomada das atividades reflexivas”, O Estado de S. Paulo, 5/3/2017

Para relator, Odebrecht se apropriou do poder público

Herman Benjamin, do TSE, ficou impressionado com depoimentos de delatores e grau de acesso à cúpula do poder que empreiteiro contou ter, apurou o ‘Estado’

Luiz Maklouf Carvalho | O Estado de S. Paulo

O ministro Herman Benjamin, relator no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do processo que pede a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, considerou os depoimentos de Marcelo Odebrecht e de dois outros ex-executivos da empreiteira – tomados na quarta e na quinta-feira passadas – como os mais importantes de todos os 50 que já colheu desde que assumiu o caso em agosto do ano passado, segundo apurou o Estado.

A oitiva do ex-presidente da empreiteira, Marcelo Odebrecht, preso desde junho de 2015 na operação Lava Jato, deixou Benjamin particularmente impressionado, como perceberam advogados presentes.

Primeiro, pelo grau de acesso e de domínio que o empresário contou ter ao topo da cadeia de poder, sugerindo a impressão de apropriação do poder público pelo poder privado.

Segundo, pelo valor de caixa 2 – R$ 180 milhões –, desproporcionalmente gigantesco em relação às doações oficiais. O ministro batizou de caixa 3, ou barriga de aluguel, a doação da Odebrecht para uma outra empresa o Grupo Petrópolis, da cervejaria Itaipava fazer o repasse, modalidade que considerou uma novidade no esquema de corrupção.

Reforma eleitoral será acelerada

Andrea Jubé | Valor Econômico

BRASÍLIA - Muito além da reforma da Previdência, a agenda legislativa de real interesse dos políticos que miram as eleições de 2018 é a reforma eleitoral. Presidentes dos maiores partidos estão engajados em uma articulação intensa de bastidores para aprovar, até setembro, um fundo bilionário para o financiamento das campanhas, anistia ao caixa dois, fim das coligações proporcionais e criação da cláusula de desempenho.

Ganha corpo a proposta de criação de um fundo eleitoral, irrigado com recursos públicos, para financiamento das campanhas. O valor não foi definido, mas fala-se em até R$ 4 bilhões, que sairiam dos cofres do Tesouro. Ele funcionaria independentemente do fundo partidário, que tem dotação orçamentária para 2017 de R$ 728,5 milhões, distribuídos entre 35 legendas.

Fundo para campanhas e anistia a caixa 2 são prioridades no Congresso
Muito além da reforma da Previdência, a agenda legislativa de real interesse dos políticos que miram as eleições de 2018 é a reforma eleitoral. Presidentes dos maiores partidos estão engajados em uma articulação para aprovar, até setembro, um fundo bilionário para o financiamento das campanhas e uma anistia ao caixa dois. O pacote ainda prevê o fim das coligações proporcionais e a cláusula de desempenho.

Suposta intermediadora financiou 329 candidatos

Por Ricardo Mendonça | Valor Econômico

SÃO PAULO - Citada em depoimentos como intermediária de entregas de dinheiro ilegal da Odebrecht para campanhas, a cervejaria Petrópolis, fabricante da marca Itaipava, aparece nos registros oficiais da Justiça Eleitoral como doadora de R$ 88,2 milhões em 2014 para 329 candidatos de 23 partidos. Foi a sexta maior financiadora.

Embora só tenha plantas industriais em cinco Estados (Bahia, Mato Grosso, Pernambuco, Rio e São Paulo), as doações registradas em nome da cervejaria beneficiaram candidatos de 14 unidades da federação.

Conforme os dados disponíveis na plataforma Às Claras, projeto da Transparência Brasil alimentado com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as doações da empresa nas últimas eleições beneficiaram 5 presidenciáveis, 14 candidatos aos governos estaduais, 5 postulantes ao Senado, 106 candidatos a deputado federal e 199 inscritos nas disputas por vagas de deputado estadual.

Temer intensifica ofensiva por reforma

Por Raymundo Costa | Valor Econômico

BRASÍLIA - Um jantar hoje à noite no Palácio do Alvorada marca o início de uma ampla ofensiva do governo para votar e aprovar a reforma da Previdência ainda neste semestre. O encontro vai reunir os novos líderes do governo com os líderes partidários e o novo ministro da coordenação política Antônio Imbassahy (Secretaria de Governo). Amanhã, terça-feira, o presidente reúne o Conselhão, pela manhã, e à tarde empossa dois novos ministros, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) no Ministério da Justiça, e o senador Aloysio Nunes Ferreira Filho (PSDB-SP) no Ministério das Relações Exteriores.

A dança das cadeiras na Esplanada dos Ministérios foi articulada com o objetivo de assegurar maioria para o governo na votação das reformas, especialmente a da Previdência. Não foi por outro motivo que o presidente Michel Temer optou por um deputado e um senador para a Justiça e a Chancelaria, respectivamente. A indicação de Serraglio serviu para atender a bancada do PMDB da Câmara, indócil com a perda da Secretaria de Governo para o PSDB. Nunes Ferreira foi avalizado para Relações Exteriores pelo presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), e pelo antigo titular do cargo, o senador José Serra (SP).

Planalto entra em alerta por reforma

Prevendo dificuldade para aprovar a reforma da Previdência e sem o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), seu principal negociador com o Congresso, o governo montou um grupo, liderado pelo próprio presidente Michel Temer, para tentar passar a mudança constitucional. A tarefa mais complicada é aprovar a reforma com o mínimo de alterações ao texto original e, assim, consolidar os sinais de melhora da economia brasileira.

Operação reforma

Sem Padilha, na mira da Lava-Jato, governo monta força-tarefa para mudar Previdência

Júnia Gama, Geralda Doca, Catarina Alencastro Simone Iglesias | O Globo

-BRASÍLIA- Preocupado com a forte resistência entre parlamentares aliados à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da Previdência e sem seu principal negociador com o Congresso, o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), o governo montou uma força-tarefa para viabilizar a aprovação da medida até meados deste ano. O objetivo no Palácio do Planalto é evitar problemas na base, em função do vácuo provocado pela ausência de Padilha, e impedir que tramitação da proposta emperre no Legislativo.

O alerta de que seria preciso agir rapidamente ficou mais intenso nos últimos dias, considerando não só o afastamento por motivos médicos, mas o enfraquecimento político do chefe da Casa Civil, citado nos depoimentos da Odebrecht. O próprio presidente Michel Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, estão na linha de frente do grupo que pretende assegurar a aprovação da reforma, em meio ao pânico generalizado no Congresso pelos desdobramentos da Lava-Jato.

Em jogo, a consolidação dos sinais de melhora

Reforma da Previdência, que afeta 80% da força de trabalho, desafoga contas de União e estados

Geralda Doca | O Globo

A aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, que altera o regime de aposentadoria dos brasileiros pelo Congresso Nacional, é indispensável para consolidar os sinais de recuperação da atividade econômica — um dos trunfos do governo do presidente Michel Temer. Por isso, a reforma é prioridade número 1 da equipe econômica. Junto com a implementação do teto para o gasto público, ela vai permitir a sustentabilidade da política fiscal, trazendo de volta a confiança dos investidores na economia brasileira. Se a reforma não passar, os sinais de recuperação da economia se perdem.

Segundo estimativas oficiais, a reforma da Previdência vai gerar uma economia de R$ 678 bilhões em dez anos e, mesmo assim, será necessário cortar outras despesas da União nesse período. Mas, sem ela, o teto não se sustenta. Esse é o principal argumento do governo.

Temer torce por dia sem surpresas no TSE

Advogados do presidente já registraram em ata protesto contra intimação de ex-executivos da Odebrecht

Simone Iglesias e Jailton de Carvalho | O Globo

-BRASÍLIA- Depoimentos de ex-executivos da Odebrecht, previstos para ocorrer hoje no processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), podem definir se os advogados do presidente Michel Temer pedirão ou não a nulidade dos interrogatórios de ex-diretores da empreiteira. A decisão dependerá do teor das respostas que serão dadas ao relator do processo no TSE, ministro Herman Benjamin.

Estão marcados os depoimentos de Cláudio Melo Filho, cujo testemunho para formalizar a delação premiada se tornou público, com uma lista de dezenas de nomes de políticos que, em algum momento, teriam recebido dinheiro para atender aos interesses da Odebrecht, e de Alexandrino Alencar, ex-diretor de Relações Institucionais. O relator do processo quer que os ex-executivos, delatores da operação Lava-Jato, detalhem o repasse de recursos da empreiteira à chapa Dilma-Temer nas eleições de 2014.

Mercado reforça projeção para inflação, juro e câmbio, traz Focus

Por Ana Conceição | Valor Econômico

SÃO PAULO - Os analistas do mercado financeiro não mudaram suas estimativas para inflação, juros e câmbio, de acordo com o último boletim Focus do Banco Central (BC). Havia uma expectativa em torno das novas projeções após a divulgação da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), na semana passada, que reforçou a ideia de que o BC poderia acelerar a queda do juro básico, dependendo de variáveis como a expectativa de inflação.

No Focus apresentado nesta segunda-feira, foi mantida a projeção de alta de 4,36% no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2017 e de 4,50% em 2018.

Os analistas fizeram uma ligeira revisão para baixo na expectativa para o resultado do IPCA de fevereiro, que será divulgado nesta semana, de 0,44% para 0,43% de aumento.

Para a Selic, as previsões de taxa a 9,25% ao fim deste ano e a 9% no encerramento de 2018 também seguiram as mesmas. A taxa está, atualmente, em 12,25%.

1817: Revolução com as cores de Pernambuco

A Revolução 1817 completa dois séculos, nesta segunda (6), mas ainda é episódio pouco explorado na história do Brasil

Diogo Guedes e Marcela Balbino | Jornal do Commércio (PE)

Eram 10h da manhã do dia 6 de março de 1817 e o clima no Recife parecia calmo. Sinais de insatisfação com a Coroa Portuguesa vinham sendo emitidos, mas nem de longe se tinha a sensação de que estava prestes a irromper um dos movimentos mais emblemáticos da história pernambucana. Uma hora depois a aparente tranquilidade foi cortada com golpe de espada. O sangue derramado sobre o peito do brigadeiro Manoel Joaquim Barbosa de Castro foi o estopim para o início da revolução, que vinha sendo maturada em fogo brando, mas que explodiu antes da data prevista. Pela cidade, ressoavam os gritos de “Viva a Pátria! Mata Marinheiro!”. Era desse modo que os brasileiros se referiam aos portugueses. A essa altura, nos primeiros disparos, o governador da província já tinha fugido para se abrigar no Forte do Brum, de onde sairia direto para o Rio de Janeiro. Os revoltosos montaram um governo provisório e deram a chance ao governador de sair da província sem confronto. Apesar de registros o apontarem como bom administrador, a coragem não era traço marcante da personalidade de Caetano Pinto.

O relato da cena foi contado há 200 anos pelo comerciante francês Louis-François Tollenare, que viveu no Recife entre 1816 e 1818. Nesta segunda-feira (6), a revolução completa dois séculos, mas ainda é um episódio pouco explorado na historiografia brasileira.

Tempos de mudança - Roberto Freire

- Folha de S. Paulo

Em qualquer setor de atividade, um processo de mudança pode gerar reações da velha ordem estabelecida. O desconforto em relação ao novo é próprio do ser humano e, em certos momentos, expressa-se de forma virulenta.

Aqueles que, como eu, estão há muito tempo na vida pública têm de lidar frequentemente com o comportamento agressivo e exacerbado de alguns. De todo modo, é mais saudável e democrático preservar um diálogo civilizado, respeitoso e intelectualmente honesto com o interlocutor -especialmente quando dele se diverge no campo político.

Há mais de 40 anos participando da vida política brasileira, sempre me mantive na trincheira democrática. Lutei contra a ditadura militar, em defesa da liberdade de expressão, de organização e dos direitos civis e políticos.

Flecha sem volta – Aécio Neves

- Folha de S. Paulo

Há semanas, fiz um alerta para a atualidade de um antigo debate: o da verdade contra a mentira. Infelizmente, hoje, tudo se embaralha. E perde-se a noção de onde terminam os fatos e começam as versões que não guardam qualquer parentesco com a realidade.

Meu nome esteve em evidência nos últimos dias associado aos depoimentos de executivos da Odebrecht ao TSE.

As afirmações de Marcelo Odebrecht, de que as doações feitas à minha campanha em 2014 foram legais, foram ignoradas. Da declaração dele, de que eu teria solicitado apoio de R$ 15 milhões e que esse apoio não foi efetivado, foi divulgada apenas a primeira parte.

Democracia ameaçada - Ricardo Noblat

- O Globo

“Numa democracia pressupõe-se que o príncipe também se submeta às leis”. SÉRGIO MORO, juiz da Lava-Jato

Fica combinado com o PT: o que Marcelo Odebrecht disse sobre Temer, Padilha e Aécio é verdade, mas o que disse sobre Dilma, Palocci e Guido Mantega não é. Com o PMDB: Padilha pode ter recebido dinheiro de caixa dois, mas jamais contou a Temer, nem ele quis saber. Com o PSDB: Aécio pediu dinheiro para financiar campanhas, mas dinheiro declarado à Justiça. Com o distinto público: bem, deixa pra lá...

DEIXA PRA LÁ também a combinação sugerida por Henrique Eduardo Alves, ex-ministro de Dilma e Temer, a propósito da descoberta de que ele tinha uma conta secreta na Suíça. Eduardo Alves admite que abriu uma conta por lá e que não a declarou por aqui. Mas quer que acreditemos que os US$ 833 mil encontrados na conta não foram depositados nem movimentados por ele. Foram por quem então?

Manifestações e delações - Denis Lerrer Rosenfield

- O Estado de S. Paulo

As delações da Odebrecht, que começam a aparecer sob a forma de depoimentos prestados ao Tribunal Superior Eleitoral, são estarrecedoras. Até o mais cético pergunta-se como pudemos ter chegado lá, com o Estado tendo sido tomado de assalto por uma organização criminosa. Foi o esplendor dos governos lulopetistas.

A abrangência, contudo, destes depoimentos e delações, mostra que a praga, capitaneada pelo PT, não se restringiu a este partido, tendo contaminado profundamente o PMDB, o PP, o PDT e, agora, o PSDB, além de outros partidos. É praticamente toda a classe política que foi posta em questão.

A questão política tornou-se uma questão policial, tendo como pano de fundo uma profunda recessão e um amplo desemprego produzidos pelos sucessivos governos petistas. O desmonte foi total, tendo atingido empresas estatais, como a Petrobras, que se tornou instrumento de corrupção e propina, sustentando um projeto de Poder e enriquecendo políticos e funcionários. Empresas “vermelhas”, como a Odebrecht, foram colaboradoras entusiastas e aproveitadoras do projeto socialista.

A estatização da bondade humana - Paulo Delgado

- O Globo

A filantropia é o oposto do egoísmo. Em quase mil municípios brasileiros, a única instituição de saúde é a filantrópica

Cozida no caldeirão dos mágicos do Supremo, humilhada por portarias no Executivo e esquartejada por almas mortas do Congresso, a Constituição brasileira agoniza diante da desarmonia entre Poderes. E a moda de fazer lei avança na direção errada. Atenção: a política pretende estatizar a compaixão.

A filantropia é o caminho dos otimistas. Nasceu da moral privada das pessoas de bem. E só, muito depois, contaminou a ética pública dando origem ao estado de bem-estar social e os regimes democráticos. No Brasil, chegou com as Santas Casas de Misericórdia, ainda no período colonial. Muito antes da Independência e da Proclamação da República.

Funed, patrimônio da saúde pública mineira - Marcus Pestana

- O Tempo (MG)

A Fundação Ezequiel Dias (Funed) é uma instituição centenária que tem papel central no sistema público de saúde. Acumulou larga tradição na produção de soros contra picadas de animais peçonhentos. Desenvolveu um importante setor de produção de medicamentos de base química. É o centro de pesquisas e desenvolvimento tecnológico do SUS-MG. E opera como laboratório central de retaguarda para as ações de vigilância em saúde.

Quando assumi a Secretaria de Estado de Saúde, a Funed vivia uma crise profunda. O orçamento anual era de pouco mais de R$ 50 milhões, a autoestima de seus servidores estava entre o taco e o carpete, a produção era errática e sem sentido estratégico, e o desabastecimento de matérias-primas era pleno. Tínhamos dois caminhos alternativos: fechar as portas ou desencadear um ousado plano de mudanças.

Lara e o dogma - Fernando Limongi

- Valor Econômico

Debate sobre juros parece não ter fim

Os artigos de André Lara Resende sobre juros, publicados aqui no Valor Econômico, continuam a gerar polêmica. O debate parece não ter fim. Boa parte da discussão é inacessível aos não versados nas sutilezas das fórmulas matemáticas. Na realidade, a discussão teórica e propostas concretas acerca dos juros não estão no centro da mesa. Em última análise, o eixo que move o debate são as convicções e a fé no poder das políticas ortodoxas de austeridade fiscal. Pode-se questionar o dogma?

Lara foi criticado, senão censurado, por falta de senso político e de oportunidade. Suas dúvidas foram vistas como devaneios próprios ao mundo acadêmico, mas trazê-las ao grande público, questionando convicções arraigadas, comportaria um grande risco. No momento, flertar com alternativas heterodoxas municiaria os adversários do ajuste fiscal. Não haveria outra saída senão engolir a pílula amarga, purgar os pecados e pagar as contas contraídas.

Da omertá a murici – Dora Kramer

- Veja

Fazer tudo errado esperando que sempre dê certo é um risco. A tal história: o crime compensa até o dia em que a legalidade vai buscar sua recompensa e desorganiza o cenário, aturde os personagens, desnorteia a direção. Assim está o ambiente no Planalto Central, adjacências, ou em qualquer parte por onde circulem excelências da política e habitantes do mundo de negócios escusos.

O atordoamento atinge em especial o coração do governo. Aquilo que de maneira horrível se convencionou chamar de “núcleo duro”. Ali reina a mais absoluta confusão, a despeito da calma aparente do senhor presidente. Estivesse realmente tranquilo, a cuidar da economia e a administrar com a eficácia dos experts uma base de proporções amazônicas no Congresso, Michel Temer não teria permitido que o amigo José Yunes lançasse ao mar o penúltimo sobrevivente do time de ministros da estrita confiança, deixando-o a mercê da segunda divisão e só0 a ponto de depender de uma história mal contada para tentar tirar o corpo fora,

O Congresso governo – Vinicius Mota

-Folha de S. Paulo

A ansiedade que antecede a divulgação da nova lista de investigados ilustres do procurador Janot agita a República. A torcida ao redor dos defenestrados pelo impeachment aproveita a oportunidade e amplia o coro "Fora, Temer".

Os profissionais da política, contudo, já entenderam a natureza do jogo. A Lava Jato tem baixa probabilidade de dissolver, até o pleito de outubro do ano que vem, o amálgama deste governo de transição.

O foro privilegiado garante uma longa sobrevida aos implicados. Em março de 2015, a primeira lista de Janot foi divulgada pelo Supremo com dezenas de investigados. Dois anos depois, nada de notável aconteceu na corte, a não ser a abertura de processo contra Eduardo Cunha.

Lavagem eleitoral – Leandro Colon

- Folha de S. Paulo

Caixa um, caixa dois e uma modalidade híbrida foram os mecanismos de doação eleitoral citados pelo empresário Marcelo Odebrecht no depoimento de quatro horas que deu ao ministro Herman Benjamin, do TSE, na quarta (1º).

O grupo Petrópolis, que faz a cerveja Itaipava, é o personagem central da terceira categoria de repasse.

Segundo Odebrecht, a cervejaria do Rio serviu como laranja para esconder milhões de reais destinados pela empreiteira à eleição de 2014.

Esperança lá fora - Cida Damasco

- O Estado de S. Paulo

Há quem sonhe com a volta da exuberância das commodities da era Lula

Aqui dentro, como todos podem ver, as coisas continuam difíceis. É verdade que, aos poucos, vão se enfraquecendo algumas amarras à atividade econômica, com a ajuda da queda da inflação, da derrubada dos juros, que ainda passa ao largo dos pobres mortais, e de alguns incentivos pontuais, como a liberação das contas inativas do FGTS.

Mas outras tantas resistem. A mais visível é, sem dúvida, a persistência do desemprego, que atua para inibir a volta dos consumidores às compras e, por tabela, mantém os negócios em fogo brando.

'Lista de Janot' ameaça dividendos da inflação - Angela Bittencourt

- Valor Econômico

'Lista de Fachin' pode gerar tensão entre Poderes

Habituado a lidar com más notícias, o Banco Central enfrenta, neste início de ano, o desafio de evitar que um bom problema se transforme em um tormento futuro. A trilha que a inflação ensaiava percorrer em direção aos 4,5% da meta desbarrancou e o indicador poderá deslizar para menos de 4% neste ano e ter dificuldade para se reerguer no próximo.

Inflação rastejante é tudo o que brasileiro pediria a Deus se o governo não pedisse antes. Mas o risco do processo de desinflação tornar-se artificial - a partir de um ponto que ninguém sabe exatamente qual é __ coloca o BC de prontidão. E por pelo menos um bom motivo: retrocesso, não raro, impõe elevado prejuízo às economias que mal se põem de pé.

Questão de lógica – Editorial | O Globo

Permitir que patrões e empregados se entendam, em defesa do emprego, é um avanço civilizatório
Reformas costumam ser determinadas por crises profundas. Faz sentido, porque é nestes momentos que se pode viabilizar politicamente mudanças necessárias há muito tempo, mas que só têm chance de ser aprovadas no Congresso sob pressão da vida real. Há sempre interesses políticos e corporativos que se beneficiam de distorções causadas por leis e arranjos que se tornam anacrônicos.

Foi assim no lançamento do Plano Real, em 1994, no governo Itamar Franco, e levado adiante pela gestão tucana de FH. Debelada a superinflação e ganha a eleição presidencial por Fernando Henrique Cardoso, foi possível iniciar-se reformas que reduzissem a distância do Brasil em relação à modernidade, por meio da atenuação do modelo autárquico de capitalismo de Estado seguido pelo getulismo e revigorado pelos generais — principalmente Geisel —, na ditadura militar.

O grande temor da oposição – Editorial | O Estado de S. Paulo

O grande temor da oposição vai-se tornando realidade: a plena consolidação do governo do presidente Michel Temer. Os apoiadores de Dilma Rousseff almejavam que a força da Constituição não fosse suficiente para sustentar Temer no cargo presidencial e que o discurso repetitivo do golpe maculasse a legitimidade do governo. Nada disso ocorreu.

Da mesma forma como havia ocorrido com Fernando Collor, o impeachment de Dilma Rousseff deixou claro que existe lei no País e que ela vale para todos, também para os que estão no cume da hierarquia do poder público.

A consolidação do governo de Michel Temer vai, no entanto, além da questão meramente institucional. Ela é decorrência direta de um governo que, se não isento de erros, até o momento vem mostrando disposição de acertar. Logicamente, há ainda muito a ser corrigido, começando por retirar do governo pessoas que devem antes prestar esclarecimentos à população e, em alguns casos, à Justiça.

Taxação dissimulada – Editorial | Folha de S. Paulo

Conforme tese reiterada pelo ministro Henrique Meirelles, da Fazenda, a aprovação de um teto para as despesas públicas eliminaria a necessidade de aumento da carga tributária nacional. Louvável por certo, tal compromisso pode não ser inteiramente factível.

Neste momento a equipe econômica dá mostras de que cogita elevar -ainda que de maneira indireta- a taxação sobre salários e outros rendimentos individuais, ao manter inalteradas as faixas de incidência do Imposto de Renda das pessoas físicas.

Combate à corrupção, fator de instabilidade e amadurecimento – Editorial | Valor Econômico

Para o presidente Michel Temer, a investigação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre uso de dinheiro desviado da Petrobras na campanha da reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff se transformou em mais um "fator de instabilidade" na já volátil conjuntura política do país. Temer é parte interessada no caso. Se a ação for considerada procedente, o presidente perde o cargo e Dilma, os direitos políticos surpreendentemente preservados pelo Senado na votação do impeachment. Mas a reflexão de Temer, um presidente no olho do furacão da crise, merece análise cuidadosa, sobretudo a partir dos recentes desdobramentos da investigação no TSE.

Na última quinta-feira, por exemplo, o ministro Herman Benjamin, relator do processo no TSE, tomou o depoimento do ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura , Benedito Júnior, mais conhecido pela sigla BJ. Ao falar, o executivo, em vez de se concentrar em esclarecer seu papel no financiamento da chapa vitoriosa em 2014, formada por Dilma Rousseff e Michel Temer, preferiu rasgar o verbo sobre um suposto pedido de caixa 2 feito por Aécio Neves, o candidato do PSDB na mesma eleição, que chegou em segundo lugar e disputou com Dilma o segundo turno.

O Engenheiro - João Cabral de Melo Neto

A luz, o sol, o ar livre
envolvem o sonho do engenheiro.
O engenheiro sonha coisas claras:
Superfícies, tênis, um copo de água.

O lápis, o esquadro, o papel;
o desenho, o projeto, o número:
o engenheiro pensa o mundo justo,
mundo que nenhum véu encobre.

(Em certas tardes nós subíamos
ao edifício. A cidade diária,
como um jornal que todos liam,
ganhava um pulmão de cimento e vidro).

A água, o vento, a claridade,
de um lado o rio, no alto as nuvens,
situavam na natureza o edifício
crescendo de suas forças simples.

Tom Jobim - Chega de saudade