Brasil precisa ser realista sobre presidência
do G20
O Globo
Embora liderar o bloco traga visibilidade, é
difícil haver avanço em toda a agenda defendida por Lula
O Brasil acaba de
assumir, pelo período de um ano, a presidência rotativa do G20. Trata-se de um
espaço especial. O G20 congrega as principais economias do mundo, incluindo
países de todos os continentes. Durante o mandato à frente do bloco, o
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva quer levar três itens para a agenda de discussões: combate à fome e à
desigualdade, desenvolvimento sustentável e reforma da governança global. Há, é
certo, uma impossibilidade prática de converter as intenções em realidade. Mas
isso não justifica que se abandone a defesa de boas ideias.
O primeiro item é aquele em que parece haver mais consenso. Ninguém discorda de que seja preciso acabar com a fome e melhorar o padrão de vida da população mundial. Tais temas são sempre levantados por Lula, ainda que o fim da miséria no planeta dependa de transformações nas regiões afetadas, nem sempre ao alcance de organismos multilaterais. Os esforços terminam canalizados para ações assistencialistas, também necessárias, mas raramente suficientes. Para o discurso não se tornar vazio e repetitivo, a pregação contra a fome e a miséria precisa apontar as barreiras que impedem o crescimento econômico e a distribuição de renda nas regiões mais pobres.
O segundo item — desenvolvimento sustentável
— é aquele em que o Brasil tem mais a contribuir. Não que tenha um modelo
perfeito para conter os gases causadores do aquecimento global. A principal
fonte brasileira de emissões é o desmatamento — relacionado à agropecuária de
baixa produtividade —, concentrado na Amazônia e no Cerrado. Mas a contribuição
brasileira para que a temperatura global não chegue ao final do século mais de
1,5 °C acima da era pré-industrial não é difícil de atingir se houver combate
determinado à devastação das florestas. A vantagem brasileira é ter uma matriz
energética limpa, baseada sobretudo em hidrelétricas, com contribuição notável
de fontes alternativas como solar e eólica. Biocombustíveis também oferecem a
possibilidade de troca de experiências no âmbito do G20.
Por fim, Lula tentará aproveitar a
presidência do G20 para defender a reforma da governança das Nações Unidas,
tema mais controverso e com menor chance de avanço. É antiga a reivindicação,
que inclui a ampliação do Conselho de Segurança, com um assento permanente para
o Brasil.
O principal argumento é o desequilíbrio nas
decisões da ONU, que espelha a realidade do final da Segunda Guerra. Em quase
80 anos, houve transformações que, segundo os defensores da ampliação, deveriam
se refletir nas instâncias multilaterais. Como a mudança não interessa aos
países que hoje mantêm poder de veto, continua improvável que a reivindicação
prospere.
É preciso ser realista com a presidência do
G20. Faz pouco tempo o Brasil, também para cumprir uma escala, passou pela
presidência do Conselho de Segurança e precisou lidar com o conflito entre
Israel e o grupo terrorista Hamas. A diplomacia brasileira se desdobrou para
elaborar uma proposta para evitar a escalada do conflito, mas esbarrou no poder
de veto dos Estados Unidos. Essa é a vida real. Na ONU e em outros organismos
multilaterais como o G20.
Trabalho infantil não será erradicado apenas
por meio do assistencialismo
O Globo
Para evitar que crianças e jovens trabalhem,
são necessárias políticas eficazes que os mantenham na escola
O trabalho infantil sempre foi um desafio
para governos, mas a pandemia fez com que voltasse a aumentar. É apenas
permitido o trabalho a partir dos 14 anos como aprendiz, com carteira assinada,
nunca de maneira informal. Mas, de
acordo com o IBGE, no ano passado 1,9 milhão, ou 5%, das crianças e
adolescentes brasileiros exerciam alguma forma de trabalho fora das condições
legais. Trata-se do percentual mais alto desde 2017, quando
esse contingente começou a cair. A mesma pesquisa constatou que 77% dos
adolescentes de 16 a 17 anos, ou 810 mil jovens, trabalhavam em 2022 sem
carteira assinada.
O drama social tem resistido às iniciativas
bem-intencionadas de governos. A necessidade das famílias pobres de ter mais
fontes de renda força crianças e adolescentes a entrar no mercado de trabalho
precocemente, em geral pela porta da informalidade. Entrar no mercado de
trabalho de forma precoce contribui para a evasão escolar, impedindo o
desenvolvimento físico e intelectual do jovem e bloqueando as oportunidades de
ascensão social trazidas pela educação. Assim ele tem maior propensão a
reproduzir a vida dos pais e a transmitir o mesmo destino aos filhos no futuro.
Dessa maneira, a pobreza é transmitida de geração a geração num ciclo vicioso,
de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Em muitos casos, a criança ou adolescente
vive situação híbrida: estuda e trabalha. Em algum momento, acabam forçados a
optar pelo trabalho, abandonando a escola, único meio que os qualificaria para
sobreviver sem a ajuda do Estado. Reportagem do
GLOBO relatou a rotina de um jovem de 16 anos, de João Pessoa (PB), que desde
os 6 ajuda os pais, vendedores ambulantes, e ainda tenta frequentar a escola. Começou
auxiliando nas compras, na manutenção da barraca e no atendimento da clientela.
Não parou mais. Tal realidade mostra que não basta o legislador proibir o
trabalho infantil. Não há como resolver um problema social dessa dimensão por
meio de uma lei.
Para sair dessa armadilha, os formuladores de programas sociais como o Bolsa Família idealizaram condicionantes para o benefício. Uma delas é a frequência escolar dos filhos dos beneficiários. A medida atenuou o trabalho infantil, mas não o eliminou. Até porque os políticos parecem mais preocupados com os efeitos eleitorais do programa do que com sua eficácia para romper a cadeia intergeracional de pobreza e miséria. A via do assistencialismo não ataca a raiz do problema: para ascender socialmente, as famílias precisam não apenas de apoio financeiro, mas de educação de qualidade e saúde para os filhos.
Ambiente arejado
Folha de S. Paulo
Ano tem saldo positivo com retomada da pauta
verde no Planalto e na diplomacia
O ano de 2023 principiou, no Brasil, com boas
novas para o meio ambiente. Marina Silva retornou à Esplanada e deslanchou
medidas que derrubariam o desmatamento na Amazônia; o garimpo na Terra Indígena
Yanomami passou a ser reprimido; o Itamaraty retomou sua trajetória na
diplomacia climática, truncada no quadriênio de negacionismo antiglobalista sob
o governo de Jair Bolsonaro (PL).
Após 12 meses, o panorama doméstico e externo
se anuviou um tanto. A COP28 admitiu, com
três décadas de atraso, que combustíveis fósseis turbinam o aquecimento global,
mas sem detalhar como será a proeza de cortar 43% as emissões de carbono, até
2030, para cumprir-se o Acordo de Paris.
E isso num ano que
caminha para se tornar o mais quente em 125 milênios. Eventos
climáticos extremos se avolumam, com rios amazônicos transformados em bancos de
areia, cidades do Sul convertidas em lagos e a safra de soja interrompida pela
ausência de chuva na época esperada.
Faltam urgência e coerência à maioria dos
governos. No Brasil, seguindo a manada fóssil, o Planalto comemorou a adesão à
Opep+ na mesma semana em que o Consenso de Dubai era manietado na sede de um
petroestado.
Não bastasse o tropeço, ato contínuo realizou
um megaleilão de blocos petrolíferos e de gás natural. Nada se aprendeu em
Brasília com as promessas descumpridas do pré-sal em que se lambuzara Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) noutro mandato. A miragem desenvolvimentista agora
ressurge na margem equatorial da Amazônia.
Para cada passo em frente, dá-se um para
trás. O garimpo volta a infernizar ianomâmis e outros povos originários.
Dominado pela ala do centrão ligada ao agronegócio, o Congresso ressuscita a
controversa tese do marco temporal, se contrapondo à decisão do STF.
Mais que derrubar o desmatamento, o
Ministério do Meio Ambiente assiste ao seu deslocamento
da Amazônia (9.001 km² derrubados) para o cerrado (11.012 km²), um
bioma com metade da extensão da floresta tropical. Para complicar, a
agropecuária pujante do Centro-Oeste constitui importante celeiro da ideologia
antiambiental bolsonarista.
Apesar dos percalços, a situação do ambiente
no Brasil, hoje, está sobejamente melhor. Sua preservação enfrenta
resistências, porém o embate por políticas públicas pró e contra a natureza ou
o clima transcorre na arena pública democrática, não em reuniões palacianas sem
transparência.
O ano de 2024 será decisivo para fazer a
pauta amadurecer e evitar que o país passe vergonha na COP30, a realizar-se em
Belém do Pará no ano seguinte.
Inflação sob controle
Folha de S. Paulo
Relação entre Lula e BC autônomo será testada
com freada no PIB e novo chefe
Seria otimismo excessivo ou ingenuidade
imaginar que o convite ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto,
para a confraternização de fim de ano de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na
noite de quinta-feira (21), selou a paz entre o governo e a instituição.
O gesto ao menos tem importância simbólica
porque proporcionou uma manifestação
pública de civilidade e racionalidade do ministro Fernando Haddad,
da Fazenda, segundo o qual críticas e cobranças relativas aos juros não devem
ser entendidas como ataques ao presidente ou à autonomia do BC.
Infelizmente, não foi esse o padrão seguido
por Lula e o PT neste primeiro ano de governo —e é difícil crer que o Planalto
serviria churrasco a Campos Neto se o crescimento do PIB e a geração de
empregos não tivessem superado as expectativas em 2023.
Os méritos econômicos devem ser creditados ao
desempenho excepcional da agropecuária, ao trabalho do BC autônomo, que
controlou a inflação, e ao de Haddad, que se contrapôs aos impulsos mais
doidivanas do presidente da República e de seu partido.
Em outro cenário, é provável que Campos Neto
—escolhido por Jair Bolsonaro (PL) e primeiro chefe da autoridade monetária com
autonomia formal assegurada por mandato fixo— continuasse tratado como inimigo
e bode expiatório.
O primeiro encontro entre Lula e o economista só
ocorreu em setembro, o que marcou o início de uma distensão —da qual
o PT, entretanto, não participou, mantendo a retórica beligerante em documento
partidário recente.
A relação entre governo e BC autônomo passará
por um teste crucial no ano que está prestes a começar. Salvo mais uma surpresa
positiva, a economia deverá mostrar desaceleração, com riscos para os já
modestos índices de popularidade de Lula e o desempenho de aliados nas eleições
municipais.
Mais importante, o mandato de Campos Neto se
encerrará no final de 2024, e indicados pelo governo petista passarão a compor
a maioria do Comitê de Política Monetária (Copom), colegiado responsável pela
definição dos juros.
Se Lula e o PT insistirem no discurso demagógico contra as taxas, como se elas pudessem cair à base de mero desejo político, estará criado um obstáculo contra o próprio governo —pois um BC de credibilidade abalada submeterá o país a custos maiores para manter a inflação sob controle.
Os mais excluídos dos excluídos
O Estado de S. Paulo
O aumento da população de rua é uma
hemorragia civilizacional que clama aos céus. Mas o problema é multidimensional
e o Estado precisa enfrentá-lo em suas múltiplas dimensões
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada, em 10 anos a população de rua no Brasil aumentou 211%. A calamidade é
global. Há anos, nas metrópoles de países ricos e pobres, de San Francisco ao
Cairo, de Pequim a Paris, dormem a cada noite mais miseráveis nas ruas.
Esse desamparo pandêmico sugere distúrbios
socioculturais profundos: desintegração de laços comunitários, famílias
desestruturadas, solidão, transtornos mentais, álcool, drogas. Todos esses
fatores são pressionados por falhas de mercado. Sobretudo, o custo de moradia.
Uma pesquisa estatística em Nova York sugeriu que uma queda de 10% nos custos
de aluguel resultaria num declínio de 8% no número dos sem-teto. Um dos motivos
pelos quais Tóquio quase não tem moradores de rua é a moradia barata. Como em
outros países, no Brasil os custos têm aumentado. Metade das famílias que vivem
com até três salários mínimos consome mais de um terço da renda com aluguel.
Além de políticas para gerar emprego, reduzir
a pobreza e baratear a moradia (como adensamentos urbanos, habitações sociais
ou aluguéis subsidiados), nas políticas focadas nos sem-teto há uma disputa
entre duas estratégias: “moradia primeiro” ou “cuidado primeiro”. Para a
primeira, a solução é instalar os sem-teto em moradias subsidiadas, sem
pré-qualificações como sobriedade ou tratamentos psiquiátricos. Para a segunda,
é preciso abrigálos em alojamentos temporários, condicionando moradias
permanentes a compromissos de reabilitação. Para os partidários da primeira, a
maior evidência é a Finlândia, o único país da Europa que reduziu sua população
de rua. Os críticos contrapõem casos como o da Califórnia. O Estado mais rico
dos EUA investiu bilhões em Housing First, mas em cinco anos, enquanto a
população de rua no país cresceu 6%, a da Califórnia cresceu um terço. Com 12%
da população do país, o Estado contabiliza quase metade dos americanos semteto.
O contraste pede cautela. Talvez nenhum dos dois lados deva ter primazia,
porque ambos devem vir primeiro, cada um em cada situação.
A população dos sem-teto é complexa. Há quem
passe temporariamente pelas ruas e há quem viva permanentemente nelas. Há quem
esteja momentaneamente sem condição de trabalhar e gerar renda e quem é parcial
ou totalmente incapacitado por limitações físicas ou cognitivas; e há quem caia
no relento por algum comportamento antissocial e autodestrutivo. Para estes,
distúrbios mentais, abuso de entorpecentes e delinquências são a porta de
entrada das ruas. Para os outros, as ruas podem ser a porta de entrada para delinquências,
abusos e distúrbios. Todos esses casos pedem o cuidado do Estado de Bem-Estar
Social. Mas de modos diferentes.
O modelo de “moradia primeiro” deveria
priorizar famílias e pessoas em situação de rua por pura pobreza. Em São Paulo,
o programa De Braços Abertos pagou moradias a dependentes químicos e
psicóticos. Várias foram destruídas. Muitos voltaram a viver nas ruas, alguns
morreram de overdose. São pessoas sem autonomia, que precisam ser abrigadas em
comunidades e tratadas por profissionais antes de assumir um lar.
Entre 1995 e 2020 a pobreza extrema no Brasil
caiu de 15% para 5%. Nos últimos cinco anos, o orçamento do Bolsa Família
saltou de R$ 30 bilhões para R$ 175 bilhões. Mas o aumento exorbitante da
população de rua sugere que os programas de transferência de renda não estão
devidamente focados e são insuficientes sem outras formas de assistência. Além
disso, boas intenções intoxicadas por romantismos podem, à custa de combater
excessos, produzir outros piores. O movimento antimanicomial começou
denunciando condições desumanas de hospitais psiquiátricos, mas, ao invés de
humanizá-los, lutou por aboli-los. Hoje a disponibilidade de leitos no Brasil é
90% menor que a média da OCDE.
O aumento explosivo da população de rua é um
fracasso cívico. Mas a solução pede menos voluntarismo e mais ciência, menos
utopias e mais pragmatismo. O problema é multidimensional e o Estado precisa
enfrentá-lo em suas múltiplas dimensões.
Descaso com a cidade de São Paulo
O Estado de S. Paulo
Câmara foi descuidada ao aprovar a Lei de
Zoneamento. Lidar com o gabarito de construções, com a ocupação do solo e com o
patrimônio da cidade é lidar com a vida das pessoas
A Câmara Municipal foi descuidada, para dizer
o mínimo, ao concluir a votação definitiva da Lei de Parcelamento, Uso e
Ocupação do Solo de São Paulo, a chamada Lei de Zoneamento, no dia 21 de
dezembro. Com 46 votos favoráveis e 9 contrários, a Casa aprovou o texto
substitutivo apresentado pelo relator, o vereador Rodrigo Goulart (PSD), apenas
horas antes da votação em plenário. Ou seja, é lícito inferir que muitos
vereadores votaram a favor de uma matéria sobre a qual não tiveram tempo hábil
para avaliar com a devida atenção.
Pode-se argumentar que os vereadores tenham
acertado entre si o teor do texto aprovado, que modificou sensivelmente o
projeto original, fazendo da votação mera formalidade. O placar é eloquente
nesse sentido. Os munícipes, porém, ficaram às escuras. Afinal, a serviço de
quem – ou de quê – estão os vereadores? De nada adianta o relator Rodrigo
Goulart argumentar que os termos da Lei de Zoneamento passaram por “várias
audiências públicas” se, ao fim e ao cabo, o substitutivo que agora vai à
sanção do prefeito Ricardo Nunes (MDB) era desconhecido da população até pouco
tempo antes da votação.
Não foram alterações triviais do projeto. Uma
das mais nefastas para o interesse público, sem dúvida, foi o esvaziamento do
Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental
(Conpresp), órgão responsável pela preservação da memória da cidade, pela
proteção de seu patrimônio cultural e ambiental. De acordo com a nova Lei de
Zoneamento, a decisão final sobre tombamentos passa a ser da Câmara Municipal,
não mais do Conpresp. Isto é, uma decisão que deve ser eminentemente técnica –
o conselho envolve especialistas de várias áreas do conhecimento – passa a se
submeter à lógica da política. É um disparate. Uma reflexão sobre o que haveria
de ser perene dá lugar à fugacidade dos interesses de ocasião.
Além dessa, outra mudança significativa foi a
autorização para a verticalização dos chamados “centrinhos” e dos “miolos” dos
bairros, aumentando o limite de altura das construções nas Zonas de
Centralidade e nas Zonas Mistas, que, juntas, formam a maior parte da área da
metrópole. Na prática, isso significa que poderão ser construídos edifícios de
até 60 m de altura nos “centrinhos” e de até 42 m nos “miolos”, mesmo que esses
prédios estejam afastados dos eixos de transporte coletivo. Arquitetos e urbanistas
ouvidos pelo Estadão alertaram para os impactos que essa decisão terá sobre a
temperatura, o trânsito e as emissões de poluentes na cidade. O prefeito
Ricardo Nunes sinalizou que vetará esse trecho da Lei de Zoneamento.
Não bastasse tudo isso, os vereadores também
aprovaram a construção de moradias populares em parte das Zonas Especiais de
Proteção Ambiental (Zepams), que foram convertidas em Zonas Especiais de
Interesse Social (Zeis). A Câmara Municipal também aprovou a inclusão de
shopping centers e templos religiosos de grande porte no rol de exceções que
não precisam obedecer a limites de construção em relação ao tamanho máximo do
terreno, como cemitérios e bases militares.
Decerto há pontos positivos e negativos na
nova Lei de Zoneamento. Segmentos da sociedade paulistana podem se sentir
atendidos ou não por seus dispositivos. A questão de fundo é que não houve um
debate aprofundado sobre a matéria que restou aprovada. É preciso dizer o
óbvio: a Lei de Zoneamento não é uma lei trivial. Lidar com gabarito de
construções, com permissões para ocupação do solo e com patrimônio cultural e
ambiental da cidade é, fundamentalmente, lidar com a vida que as pessoas vão
viver por muitos e muitos anos. Isso impõe ao legislador não apenas cuidado,
mas elevado espírito público. Nem uma coisa nem outra parece ter havido naquela
açodada votação.
A Câmara Municipal deu mostra de que se fecha
cada vez mais à cidade, decidindo sobre questões de interesse direto dos
paulistanos sem transparência. Não é assim que se faz política pública. Não é
assim que se faz planejamento urbano – menos ainda na maior cidade da América
Latina, a quarta maior cidade do mundo.
Uma bolsa promissora
O Estado de S. Paulo
Poupança Ensino Médio é boa ideia para
combater o abandono e a evasão escolar entre estudantes mais pobres
Num país onde apenas 7 a cada 10 alunos
concluem a educação básica, são bemvindas quaisquer iniciativas para evitar o
abandono escolar e contribuir para que os estudantes tenham um futuro
auspicioso. Melhor se for uma ideia bem desenhada, com foco em quem, de fato,
precisa. O Brasil teve um exemplo de política dessa natureza com a aprovação,
pelo Congresso, de um incentivo financeiro a 2,5 milhões de alunos de baixa
renda matriculados no ensino médio. Depois de consenso construído na Câmara e
no Senado em torno da proposta do governo, a chamada Poupança Ensino Médio foi
à sanção do presidente Lula da Silva.
O programa merece aplausos porque, primeiro,
olha para o público certo: estudantes pobres da rede pública, com prioridade
para aqueles cuja renda familiar é de até R$ 218 mensais por pessoa. Além
disso, a seleção dos alunos obedecerá a critérios de inscrição no Cadastro
Único para Programas Sociais do Governo Federal, o CadÚnico, até aqui a melhor
base de informações sobre a parcela da população que precisa do apoio do
Estado.
Pela forma como está desenhada, a Poupança
Ensino Médio é meritória também porque exibe alguns dos elementos que tornaram
políticas similares bem-sucedidas mundo afora: clareza sobre o indicador que se
deseja impactar; foco nos estudantes em situação de maior vulnerabilidade;
condicionalidades associadas aos objetivos do programa; recursos repassados
diretamente aos estudantes; e combinação de pagamentos recorrentes com
incentivos adicionais – há previsão de um aporte anual à poupança a ser
resgatado após a conclusão do ensino médio.
A experiência ensina que, seguindo as
premissas acima, poupanças do gênero funcionam no combate ao abandono e à
evasão escolar. O abandono escolar é caracterizado quando um estudante deixa de
frequentar a escola durante o ano letivo. Na evasão escolar, o estudante,
aprovado ou reprovado, não realiza a matrícula no ano seguinte. O Brasil vai
mal nas duas coisas quando o assunto é ensino médio, a etapa mais crítica da
educação básica do País – ainda que venha melhorando indicadores desde os anos
2000. No ano passado, a taxa de abandono escolar foi de 6,5%, ou quase 445 mil
estudantes, índice que não passou de 0,5% nos anos iniciais do ensino
fundamental e de 2,2% nos anos finais. Mais de 31,5% dos jovens de 19 anos não
concluíram o ensino médio, com patamares maiores entre estudantes pretos e
pardos e também entre os 20% mais pobres (52,2%), enquanto entre os 20% mais
ricos o índice de conclusão foi de 85,5%.
São números que reafirmam alguns dos mais graves problemas e desigualdades do ensino médio. A poupança, claro, não é uma panaceia para todos os males da etapa, e nem assim imaginam seus formuladores. Mudar de verdade uma etapa que hoje é desinteressante e inadequada para milhões de jovens brasileiros da rede pública ainda exigirá mexer no currículo e na gestão, pontos que o chamado Novo Ensino Médio altera, assim como uma profunda revisão de rota na maneira como formamos e valorizamos a carreira de professores.
Imagine o mundo sem guerras
Correio Braziliense
Isso só será alcançado se os países e os
líderes globais se comprometerem a resolver suas diferenças por meio do diálogo
e do respeito mútuo, criando, como cantava John Lennon, uma irmandade
"Imagine que não há países / Não é
difícil / Nenhum motivo para matar ou morrer / E nenhuma religião também /
Imagine todas as pessoas/ Vivendo a vida em paz." Os versos
inconfundíveis são da canção Imagine, de John Lennon, lançada em 1971 e que
logo se tornou um dos maiores sucessos da carreira solo do ex-Beatle.
Acompanhada apenas pelo piano, a letra da música traz uma mensagem simples, com
um pedido de paz pelo mundo e que, mais de 50 anos após o seu lançamento, ainda
soa atual, principalmente na época do Natal.
Afinal, o mundo atravessa um período de
tensão elevadíssima com dois confrontos armados em andamento. Na Europa, onde a
Ucrânia enfrenta uma invasão da Rússia desde fevereiro de 2022, o balanço é
terrível. Até o momento, são centenas de milhares de mortos dos dois lados —
incluindo civis —, milhões de refugiados, bloqueios navais que dificultam o
comércio global e, claro, o risco sempre iminente de uma escalada que leve a
alguma reação com armamento nuclear.
No Oriente Médio, na terra em que Jesus
nasceu, o confronto entre Israel e Hamas passou da dezena de milhares de
mortes, a imensa maioria de civis. A guerra também vem mostrando uma drástica
falência da Organização das Nações Unidas (ONU) e do seu Conselho de Segurança,
incapaz de chegar a uma solução para o conflito.
Não é só. Na América do Sul, os ânimos se
acirraram com um plebiscito na Venezuela que determinou que o país deve anexar
a região do Essequibo, atualmente parte do território da Guiana. O Brasil, como
potência regional, tem promovido a diplomacia e atuado como mediador nas
negociações, mas que seguem com resultado incerto e o clima de tensão elevado.
Esses conflitos se somam a outros andamento pelo mundo, como as guerras civis
no Iêmen, em Myanmar, na Síria, na Somália e no Sudão, além de outros confrontos
em países como México, Haiti e El Salvador.
É uma tragédia que reside não apenas nos
números alarmantes de mortes, mas também nas cicatrizes emocionais e
psicológicas que esses conflitos deixam nas vidas das pessoas. A perda de
familiares, a destruição de lares e o trauma moldam o cotidiano daqueles que
vivem nas áreas de conflito. Nesses locais, o direito à vida, à segurança e à
dignidade são constantemente violados, enquanto a promessa de um futuro melhor
é constantemente adiada. Em suma: o mundo ainda está longe da visão de Imagine,
com todas as pessoas vivendo em paz.
A data de hoje leva, sempre, a algumas
reflexões. É um momento em que o mundo cristão celebra a união, o amor, o
perdão e a esperança, e renova seus compromissos com esses sentimentos. Que
este dia de Natal seja, portanto, mais do que apenas uma comemoração, e sim o
início de uma virada, pavimentando um caminho para uma resolução dos conflitos
que tanto afligem o mundo.
É a hora de estender a mão aos outros, praticar a generosidade e, acima de tudo, buscar a paz. Isso só será alcançado se os países e os líderes globais se comprometerem a resolver suas diferenças por meio do diálogo e do respeito mútuo, criando, como cantava John Lennon, uma irmandade em que todas as pessoas estão compartilhando o mundo. Somente assim será possível honrar o espírito natalino e construir um futuro em que a harmonia prevaleça sobre a guerra, com a luz da paz nos corações de todos.
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