O Globo
Ser solidário exige um engajamento mais sério
com a causa social, pois a pobreza não será vencida sem um esforço constante
No começo de maio, a Organização Mundial da
Saúde (OMS) declarou o fim da emergência provocada pela Covid-19, que passou a
ser considerada mais uma doença endêmica como tantas outras. Era, por assim
dizer, o fim “oficial” da pandemia.
Isso significa que 2023 foi o primeiro ano em
que pudemos realmente voltar à normalidade. É claro que, desde as bem-sucedidas
campanhas de vacinação, a crise sanitária já estava controlada. Desde o ano
anterior, vivíamos em clima de relativa normalidade, mas 2023 selou essa
conjuntura como primeiro ano pós-pandemia de fato.
Com isso, pudemos enfim respirar e atravessar
um período sem grandes crises humanitárias, certo? Infelizmente, não.
Ao menos duas tragédias ocorridas em 2023 ficarão na memória dos brasileiros: no feriado de carnaval, temporais devastaram o litoral paulista, com deslizamentos arrastando bairros inteiros de São Sebastião. Mais tarde, em junho, um ciclone extratropical atingiu os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, provocando alagamentos que se tornariam, segundo a Defesa Civil do RS, o maior desastre natural em quatro décadas.
Há mais: atravessamos uma onda de calor sem
precedentes, que impacta de maneira desproporcional quem vive em moradias
insalubres e bairros menos arborizados. Sem contar, é claro, nossos problemas
crônicos, como pobreza extrema, desigualdade, desemprego (sobretudo entre os
jovens), racismo e tantos outros.
Longe de mim ser um “estraga prazeres”, ainda
mais nesta época festiva do ano. Relembro esses fatos simplesmente para que
possamos tirar deles algumas lições valiosas neste momento de reflexão, de
fechamento de ciclo e preparação para o ano que chega.
Não podemos mais nos dar ao luxo de encarar
cada crise como um fato isolado. Os problemas sociais brasileiros são
históricos, estruturais e pedem soluções que mirem o longo prazo.
Se ainda havia alguma dúvida disso, as
mudanças climáticas adicionam uma nova camada de complexidade a nossos
desafios. Eventos climáticos extremos, como os que atingiram o litoral paulista
e a Região Sul, deixaram de ser esporádicos. As cidades brasileiras estão
preparadas para lidar com chuvas, ondas de calor, frentes frias e estiagens
mais ou menos regulares? E a favela, está preparada?
Todo o trabalho da Gerando Falcões ao longo
de 2023 se pautou por essa preocupação. Este é o espírito de um projeto como o
Favela 3D: reurbanizar o território das favelas e oferecer, em parceria com o
poder público e a iniciativa privada, uma trilha de superação permanente da
pobreza, um caminho de emancipação, não uma simples “ajuda”.
Creio que essa é, afinal, a grande lição dos
últimos meses: ser solidário significa mais que ajudar uma comunidade durante
crises agudas. Diante dos desafios econômicos e ambientais colocados, ser
solidário para valer exige um engajamento mais sério com a causa social, pois a
pobreza não será vencida sem um esforço constante, persistente, até teimoso por
parte de todos.
Nesta última coluna do ano deixo, portanto,
um convite: em 2024, transformar o impulso solidário em missão de vida.
Feliz Natal e tamojunto!
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