quarta-feira, 14 de maio de 2025

Um ponto de partida para a CPI Mista do INSS - Fernando Exman

Valor Econômico

Requerimento de informações da Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara de abril de 2023 já levantava suspeita de fraude

Cerca de 50 dias atrás, conta um líder da oposição, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) alertou alguns interlocutores no Congresso que um escândalo na Previdência Social estava para eclodir e poderia abalar a República.

Paulinho da Força já havia apresentado reclamações a autoridades do governo, apontando que associações estavam descontando indevidamente recursos dos aposentados. Em resposta, relata, ouviu que o problema já havia sido resolvido. Insatisfeito com o retorno, também procurava integrantes do Tribunal de Contas da União (TCU). Tentava, sem sucesso, que a análise do caso avançasse na Corte de Contas desde 2023.

Em abril daquele ano, a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, presidida pela oposição, aprovou um requerimento de informações para provocar oficialmente o TCU sobre o tema. A intenção, aliás, era que o processo fosse remetido ao ministro Aroldo Cedraz, pois ele já cuidava de casos envolvendo supostas irregularidades praticadas na concessão de crédito consignado ofertado a aposentados.

Quase dois anos depois, ainda existem nesse requerimento algumas pistas que podem ser exploradas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) cujo pedido de abertura foi protocolado na segunda-feira (12).

De autoria de Gustinho Ribeiro (Republicanos-SE), o documento apontava que chegara ao conhecimento da comissão “um escandaloso caso de irregularidade” envolvendo o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), entidades sindicais e associativas, além de instituições bancárias. E acrescentava que dele resultava um indevido desvio da aposentadoria de milhões de pessoas para beneficiar, de forma ilícita, as entidades sindicais envolvidas no suposto esquema.

Segundo o requerimento de informações, também havia suspeitas de manipulação dos aposentados que procuram instituições bancárias em busca de empréstimo consignado. No ato da contratação do crédito, aposentados, sobretudo idosos com dificuldades de compreensão de determinadas informações, eram induzidos a anuir com adesões a determinadas entidades sindicais sob o argumento de que a medida seria “indispensável ou mais vantajosa para a contratação do empréstimo consignado”.

Esta era uma mentira, claro, mas que viabilizava a cobrança de anuidades por essas associações. Naquela época, falava-se em venda casada e parceria suspeita entre instituições financeiras e sindicais. A cifra citada era de R$ 1,5 bilhão em descontos indevidos.

De lá para cá, contudo, o caso ganhou um contorno ainda mais grave. Há suspeitas de falsificação de assinaturas, por exemplo. Segundo o próprio governo federal, o universo potencial alcançado pelas fraudes é de R$ 6,3 bilhões. Não se sabe o valor exato do escândalo nem de onde sairão todos os recursos para o ressarcimento das vítimas. O plenário do TCU tem questionado, em acaloradas discussões, o motivo de o caso não ter recebido a devida atenção.

A CPMI pode descobrir se houve algum mecanismo dentro da máquina pública federal para beneficiar entidades específicas. E apontar os eventuais responsáveis. Ex-dirigentes do INSS devem ser chamados para explicações, além da antiga cúpula do Ministério da Previdência Social. Uma pista a ser verificada é o ritmo de crescimento no número de associados de cada uma das instituições citadas.

Em relação a uma delas, a pergunta inevitável será se seus dirigentes promoveram internamente um irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, inclusive sem a ciência de autoridades do Executivo e do próprio Lula, para tentar uma blindagem das investigações que avançavam. Outro caminho a ser percorrido pela oposição deve ser como o movimento social do campo se insere nos atos apurados.

A CPMI tornou-se uma oportunidade única para que adversários busquem o enfraquecimento de Lula antes do início da campanha à reeleição. Se de fato instalada, a CPI Mista pode ocupar grande parte do segundo semestre ou avançar sobre o calendário de 2026: seu requerimento de criação pede que os trabalhos sejam realizados durante 180 dias.

Além disso, diz um líder da oposição, por se tratar de um tema como a Previdência Social, esta comissão parlamentar de inquérito tem a especificidade de ultrapassar os limites impostos pela polarização política. Prova disso é a adesão de deputados e senadores do PSB, aliado tradicional do PT e partido do campo progressista.

Acrescente-se a essa equação o fato de que o escândalo alcança diretamente uma parcela mais pobre da população, nordestinos e mulheres, segmentos do eleitorado majoritariamente favoráveis a Lula e que asseguravam algum alívio ao presidente nas pesquisas de avaliação.

O governo deve insistir na argumentação de que as fraudes tiveram início em administrações anteriores. Sustentará, também, que coube à Controladoria-Geral da União (CGU) e à Polícia Federal (PF) desmantelar o esquema em nome da atual gestão, e não da oposição.

É verdade. Mas, ainda assim a aposta de uma parte da oposição é que o Planalto enfrentará severas dificuldades para montar uma tropa de choque na CPMI. Outros adversários do PT discordam nesse ponto: “Sempre tem um pessoal fanático”, diz um deputado crítico ao governo que se prepara para o embate. O consenso, entre adversários e aliados, é que o governo ainda não conseguiu estancar a sangria provocada pelo escândalo.

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