segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Opinião do dia – Alexandre de Moraes*

"Não custa ao Estado respeitar o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Nenhum culpado, nenhum corrupto, nenhum criminoso deixará de ser condenado, se houver provas, se o Estado respeitar esses princípios constitucionais".

*Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em seu voto, na sessão de 26/9/2019 (quinta-feira).

Marcus André Melo* - Polarização afetiva

- Folha de S. Paulo

O affair Janot marca a escalada do conflito no ciclo da Lava Jato

A polarização afetiva que se assenta em emoções negativas (desconfiança, desprezo, aversão) dirigidas a grupos políticos rivais é fenômeno novo nas democracias, mas no Brasil adquiriu especificidades: ela foi magnificada devido ao cataclismo produzido pela exposição pornográfica da corrupção.

O debate sobre seus determinantes e sobre se ela é maior entre as elites ou massas produziu duas explicações rivais. A primeira é que a polarização é fundamentalmente um fenômeno das elites --um subproduto do acirramento da competição política.

A segunda é que a polarização é social e resulta da sobreposição de identidades: grupos homogêneos fazem escolhas que as alimentam ("partisan sorting"). Nos EUA, por exemplo, os afro-americanos e evangélicos têm optado pelo partido democrata e republicano, respectivamente, e essa superidentidade acaba influenciando outras escolhas.

Celso Rocha de Barros* - A crise da Lava Jato

- Folha de S. Paulo

Já está claro que Bolsonaro não tem o mais remoto interesse em brigar pela operação

A semana passada foi muito ruim para a Lava Jato, começando com a derrota, de efeitos práticos incertos, no STF (Supremo Tribunal Federal), passando por novas denúncias da Vaza Jato e culminando no episódio grotesco em que o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, declarou que quase matou Gilmar Mendes a tiros. O ex-senador tucano Aloysio Nunes declarou que a operação manipulou o Supremo durante o processo de impeachment. Enquanto escrevo, ouço que a força-tarefa da Lava Jato lançou a campanha "Lula mais ou menos livre", e pediu sua mudança para o regime semiaberto. Especula-se que seja uma estratégia para evitar a anulação da sentença contra o ex-presidente.

Se tudo isso tivesse acontecido em 2015, o país estaria em convulsão. O auge do lavajatismo passou quando Dilma caiu, mas houve um novo surto de entusiasmo com a eleição de Bolsonaro e a nomeação de Moro para o Ministério da Justiça.

Vou morrer sem entender por que, em algum momento, o Brasil achou que Jair Bolsonaro estava preocupado em combater a corrupção. O atual presidente da República sempre foi um político do baixo clero, nunca teve qualquer participação nas investigações de corrupção no Congresso (alguém se lembra dele se destacando em qualquer CPI?), foi um dos articuladores da campanha de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara e apoiava Picciani no Rio de Janeiro. Em algum ponto de nossa loucura recente, achamos que esse sujeito era o Batman.

Leandro Colon – Uma instituição em crise

- Folha de S. Paulo

Janot, Dodge, Deltan, entre outros, mostram que órgão precisa de reflexão profunda

O desatino de Rodrigo Janot em declarar que por pouco não apertou o gatilho para matar Gilmar Mendes nas dependências do STF jogou ainda mais luz sobre o Ministério Público Federal, instituição que precisa de uma reflexão profunda.

Muita gente em Brasília não acredita na história de faroeste contada por Janot. Mas nada muda se o fato ocorreu ou se o ex-PGR está blefando para promover seu livro (recheado de incoerências, segundo reportagem publicada pela Folha).

Até que se prove o contrário, vale a versão confessada por um ex-chefe da Procuradoria de que levou uma pistola ao STF para matar Gilmar, mas (ainda bem) fraquejou na hora.

Janot deixou a PGR em setembro de 2017 com um gol contra no final: a delação desastrada da JBS, em que ele atropelou a liturgia das investigações para tentar derrubar um presidente da República (Michel Temer).

Vinicius Mota - Impeachment de Trump é golpe?

- Folha de S. Paulo

Quem deslegitimou tentativa de depor Bill Clinton agora aplaude ação democrata

A Suprema Corte do Reino Unido saiu do seu retiro secular e mostrou cartão vermelho para a intenção do premiê Boris Johnson de deixar fechado o Parlamento por cinco semanas. Os progressistas de todo o planeta comemoraram.

A presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, a democrata Nancy Pelosi, rompeu um longo período de hesitação e instalou inquérito que pode levar ao impeachment de Donald Trump. Nova salva de palmas na centro-esquerda.

Os adeptos da conversa do “jogo pesado constitucional”, difundida pelo best-seller “Como as Democracias Morrem”, também se uniram ao coro. Desta vez está tudo certo, afirmaram. Quando os deputados republicanos tentaram o impeachment de Bill Clinton, em 1998, aí não podia.

Fernando Gabeira - Lobo e o cordeiro no STF

- O Globo

O primeiro grande golpe sofrido pelo sistema anticorrupção partiu de Toffoli em conluio com Bolsonaro

A semana que passou foi complicada demais para caber num só artigo. Começou com aquele discurso de Bolsonaro na ONU e, no final, nem se falava mais nele.

Estava no Ceará cobrindo um encontro dos povos do mar. Nele, discutia-se o conhecimento das populações litorâneas: cultivo de algas para cosméticos e alimentação ou mesmo fazer um bonito lustre com escamas de um peixe grande, chamado lá de camburubim. No final do encontro, as praias nordestinas foram invadidas por um vazamento de óleo, morte de tartarugas e tudo mais.

Bolsonaro voltou de viagem, e dela ficou apenas sua briga com o cacique Raoni e a adolescente sueca Greta Thunberg, atacada pela família presidencial.

O grande fato foi produzido pelo STF, que aplicou uma derrota na Operação Lava-Jato e todas as outras que combatem a corrupção no Brasil.

Alguns processos serão anulados por uma filigrana jurídica: o condenado não apresentou suas declarações finais depois dos delatores.

A discussão desse tema poderia aperfeiçoar as coisas daqui para a frente. Mas anular processos que desviaram milhões só por causa da ordem final é apenas o sinal do momento.

A conjuntura mudou. A correlação de forças é outra. Os vazamentos do Intercept enfraqueceram a Lava-Jato, da mesma forma que a eleição de Bolsonaro, embora o discurso seja outro, e ele tenha integrado Moro ao seu governo.

Cacá Diegues - Meu discurso na ONU

- O Globo

Qual dessas alternativas, a barbárie ou a civilização, cada país deve escolher para o presente e o futuro?

Se a mim coubesse discursar na abertura da 74ª Assembleia Geral da ONU, se eu tivesse essa honra por causa de nossos antepassados políticos que a mereceram por suas ideias, elegância e dignidade, evitaria levar comigo uma pobre moça com cara de indígena que serviria apenas para me filmar encantada, com seu celular progressista de homem branco. Eu não teria coragem de dizer que a menina representa os índios do meu país. Apenas uns poucos, já que o resto a gente massacrou devidamente no passado.

Começaria meu discurso mandando meus confrades do mundo inteiro aprenderem logo o português para lerem “Escravidão”, o livro do professor Laurentino Gomes. Ele nos conta como subjugamos com eficiência, desde o primeiro leilão dos cativos em 1444, uma outra etnia que trouxemos para cá, atravessando com eles um oceano, para que nos servissem e inventassem o país que agora os despreza e discrimina.

Eu também citaria a Bíblia, mas um outro versículo mais apropriado. Podia ser, por exemplo, o que está no Livro Sagrado em Lucas 12, 1-3, que aprendi com Frei Betto: “Tomem cuidado com o fermento dos fariseus, que é a hipocrisia”.

Em meu discurso, talvez fosse o caso de lembrar o que muita gente tenta esquecer ou negar: a ditadura no Brasil, de 1964 a 85. Ela está nas primeiras páginas dos jornais da época, mesmo dos que a apoiavam. Como na manchete de 26 de março de 1969, onde o presidente-general afirma: “O governo já cuida da volta à democracia”. (Ora, o que volta é porque já foi). Ou, em 19 de agosto do mesmo ano, a declaração de membro do triunvirato militar no poder: “Nosso objetivo é restaurar a democracia”. (Ora, só se restaura o que não é mais). O mesmo jornal dizia, três dias depois, que “o Exército está decidindo a sucessão”. Pode ser mais claro?

Ana Maria Machado - Livros livres

- O Globo

Livros devem ser livres. Plurais. Ideias alheias em confronto com as nossas nos enriquecem. Sem imposição de pensamento único. Mesmo se o que está escrito em algum livro for uma bobagem.

Algo alentador no país hoje é a sede de leitura. Apesar das dificuldades. O ensino é capenga. Bibliotecas desatualizadas, só abertas em horário comercial. Indústria livreira em crise. Grandes livrarias fechando. Compras governamentais para escolas suspensas.

Mas na contramão, há sinais animadores. Pequenas livrarias resistem. Clubes de livros e blogs literários proliferam. Professores insistem em explorar com seus alunos o potencial que pulsa na literatura. Festas literárias se multiplicam por incontáveis cidades no interior.

Livros nos dão modelos (como o “Rondon” de Larry Rother) ou mostram males a combater — da escravidão (na obra de Laurentino Gomes) ao autoritarismo (na de Lilia Schwarcz).

Não adianta vetarem Míriam Leitão e Sérgio Abranches em Jaraguá do Sul —isso lhes dá maior ressonância. Não adianta proibir uma HQ com beijo gay —isso faz 14.000 livros sobre o tema serem distribuídos de graça. Não adianta um diretor da Funarte ofender Fernanda Montenegro—o público a cobre de carinho, o apoio a nossa atriz maior viraliza nas redes. Avelha lição: “você corta um verso, eu escrevo outro.”

Simon Schwartzman - Nem CLT nem funcionário

- O Globo

Como quase tudo neste ambiente polarizado em que vivemos, a questão do regime de trabalho dos professores das universidades está sendo discutida como tendo duas únicas possibilidades: ou somos a favor das universidades públicas, e defendemos o atual regime de funcionalismo público para professores e funcionários, ou somos contra, e queremos transformar todas as universidades em empresas comerciais, cobrando matrículas e vendendo serviços.

Na verdade, não tem que ser assim. O atual regime das universidades federais — em que todos os professores são funcionários do Ministério da Educação, e não das universidades, têm a mesma carreira em todo o país e estabilidade desde o dia em que passam no primeiro concurso — é totalmente inadequado, inclusive porque vai contra o princípio da autonomia universitária, que supõe que elas devam administrar com independência seus recursos humanos.

O simples regime CLT — em que os contratos são precários, e o professor pode ser demitido a qualquer momento com ou sem justa causa, e que predomina na maioria das instituições de ensino privadas no Brasil, sobretudo as de fins de lucro —também não é adequado para instituições cujo principal acervo é a reputação, competência e o envolvimento de seus professores. Existe alguma alternativa?

Claro que sim. Nos países que têm universidades de qualidade, as contratações não são feitas por concursos formais e burocráticos, em que a universidade delega a um grupo de professores a decisão de quem vai ser admitido para o resto da vida, e sim por processos de busca com a participação de professores, dirigentes, alunos e avaliadores externos, em que os candidatos passam por entrevistas e busca-se um consenso sobre se eles são os melhores para as funções que precisam ser preenchidas.

Denis Lerrer Rosenfield* - O que é ser conservador?

- O Estado de S.Paulo

Significaria conservar os valores da família, a tradição libertina ou a liberdade de escolha?

Ser conservador encerra muitas significações, sem que, muitas vezes, se saiba ao certo do que se está falando. Ultimamente, no País, estamos presenciando uma onda dita conservadora, como se, com esse termo, uma acepção de todos conhecida pudesse ser facilmente percebida.

Ser conservador, à maneira de Edmund Burke, significava, na época, manter as tradições inglesas, a monarquia constitucional e os valores vigentes, dentre os quais seus preconceitos em relação ao capital financeiro, aos agiotas e aos judeus, que ele acreditava serem aqueles similares a estes. Conservar a tradição e os valores pode igualmente significar aceitação acrítica de toda uma História recebida. Sua repercussão deveu-se, sobretudo, à sua crítica à Revolução Francesa, à concepção democrática que então emergia e a seus excessos no Terror, à concepção jacobina, que terminou se estendendo até o século 20. São valores históricos que estão assim em pauta.

Ser conservador, no Brasil de hoje, coloca precisamente a questão dos valores e da tradição a ser preservada. O discurso político é fortemente contaminado pelo conservadorismo sem que sua acepção seja definida. Cobra-se apenas que o inimigo seja aquele que não a compartilha, sem que o compartilhado, contudo, seja explicitado. Evidentemente, não se pode seriamente cogitar de uma monarquia constitucional do tipo da inglesa, por mais que dom Pedro II tenha sido um grande imperador, ímpar em seu tempo. Essa tradição se teria perdido no período republicano, salvo se entendermos por ser conservador a restauração da monarquia brasileira. Não é essa, porém, a pauta do atual governo, centrado na figura de um presidente que procura impor suas concepções, sem recorrer à História do País.

Cida Damasco - Quem se arrisca?

- O Estado de S. Paulo

Investimento precisa de segurança, tudo que está em falta no Brasil

Foi uma semana de sustos após sustos até para quem se diz acostumado com as turbulências do Brasil dos últimos tempos. Começou com a estreia de Bolsonaro na ONU, desafiando líderes da comunidade internacional e atacando tudo e a todos, em um discurso sob encomenda para o eleitorado mais fiel. Terminou com Rodrigo Janot, ex-chefão da Procuradoria Geral da República, impedido de se aproximar dos ministros do Supremo, depois de ter revelado que planejou assassinar Gilmar Mendes e se suicidar.

Mais que uma frase de efeito, o comentário do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em seguida à confissão de Janot, dá o que pensar: “Quem vai querer investir num país desse?” Por mais que alguns empresários, executivos e investidores financeiros ainda tentem fechar os olhos para a balbúrdia que se instalou em várias áreas e prefiram concentrar a atenção na agenda ultraliberal da equipe econômica, não há como ignorar os riscos desse cenário. Insegurança é o que vem à cabeça de todos. E, como se sabe, trata-se de um motivo mais do que suficiente para pelo menos provocar dúvidas em quem está avaliando a possibilidade de colocar seu dinheiro no Brasil.

Fareed Zakaria* - Conduta do presidente americano segue padrão global

- The Washington Post, O Estado de S.Paulo

Desde 1995, cresce o número de pessoas que gostariam de ter um líder forte que não precisa se importar com um Parlamento ou eleições

Se você acha que foi uma transgressão passível de impeachment, devemos concordar que o que Donald Trump fez foi errado? Ele pressionou um governo estrangeiro a investigar um rival. Isto é bem diferente da investigação no caso da Rússia, para saber se Trump conspirou com o Kremlin. No caso da Ucrânia, o presidente é acusado de usar o poder dos EUA – que faz uma diferença de vida ou morte para a Ucrânia – para ganho pessoal.

Infelizmente, isto faz parte de um padrão de violações de normas democráticas. O relatório de Robert Mueller revela que Trump buscou restringir ou mesmo pôr fim à investigação do procurador especial. Trump ofereceu perdão para autoridades que infringiriam a lei, criticou agências de investigação do governo e as pressionou para investigarem seus oponentes.

Ele também ignorou convocações para depor no Congresso e recusou-se a entregar documentos, incluindo seu informe de imposto de renda, e enriqueceu suas empresas usando sua posição como presidente. Atacou o Judiciário e a mídia, chamando-a de “inimiga do povo.

Trump é um exemplo atroz, mas sua má conduta se insere num padrão global. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, se envolveu em manobras políticas que a Suprema Corte decidiu serem ilegais. O premiê indiano, Narendra Modi, tem aterrorizado as minorias do seu país e corroído sua cultura secular.

O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, elogia assassinatos extrajudiciais. E, em países como Turquia e Hungria, seus líderes, Recep Tayyip Erdogan e Viktor Orban, conseguiram mudar a Constituição para favorecer um governo de um único partido – ou um indivíduo.

Bruno Carazza* - A estratégia por trás do veto

- Valor Econômico

Bolsonaro beneficiou a si mesmo e ao Congresso

Na última sexta-feira Jair Bolsonaro vetou diversos dispositivos da reforma eleitoral aprovada pelo Congresso no âmbito da Lei nº 13.877. Atendendo à pressão das redes sociais, o presidente posicionou-se contra a possibilidade de aumento do fundo eleitoral, a eliminação de brechas para a não aplicação da Lei da Ficha Limpa e o retorno da propaganda partidária “gratuita” em rádio e TV - sem falar na farra que seria a permissão de adoção de sistemas de contabilidade paralelo à prestação de contas exigida pelo TSE.

Apesar de ter agradado àqueles que temiam que a sanção do projeto tal qual aprovado pela Câmara e pelo Senado contribuiria para a total degeneração da política em corrupção, o veto parcial de Bolsonaro merece ser analisado com bastante cuidado, pois revela uma bem arquitetada estratégia política.

Começamos pelo que não foi vetado. Bolsonaro fez vista grossa para três dispositivos relacionados ao uso do fundo partidário, uma bolada que gira em torno de R$ 1 bilhão de dinheiro público distribuída todo ano aos partidos. De acordo com a nova lei sancionada pelo presidente, os partidos agora poderão utilizar esses recursos para defender judicialmente seus membros em processos relacionados à eleição, para adquirir bens imóveis e móveis (inclusive veículos, jatinhos e helicópteros) e também no impulsionamento de conteúdo na internet.

Ricardo Noblat - O general e a “loura maluca”

- Blog do Noblat | Veja

A sensação do governo (no momento)

Gabinete de Segurança Institucional, apontado como o intelectual do governo e principal conselheiro do presidente Jair Bolsonaro. Até que Bolsonaro esvaziou os poderes de Heleno e, hoje, ele funciona apenas como conselheiro e acompanhante de luxo.

Depois foi o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro da Secretaria do Governo, amigo de Bolsonaro há mais de 40 anos, o único dos seus auxiliares que o chamava de “você” e o censurava se necessário. Santos Cruz foi abatido por mensagens disparadas no Twitter pelo vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois.

O sucessor de Santos Cruz, general Luiz Eduardo Ramos, também paraquedista como ele e Bolsonaro, é a nova sensação do governo. Simpatia em pessoa, com livre trânsito no Congresso, surpreende os que o conhecem pela franqueza e sem cerimônia com que se refere a alguns dos seus colegas. Sobra para quase todos.

Segundo a mais recente edição do TAG Reporter, das jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros, o ministro Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil da presidência da República, é um dos alvos preferidos do general que o critica por ter procedido mal ao fazer determinados acordos com partidos para a cessão de cargos.

Não escapa nem o ministro Paulo Guedes, da Economia. Para Eduardo Ramos, Guedes promete, promete, mas não entrega. Em reuniões com parlamentares, ele já usou a expressão “loura maluca” para bater na deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso. O general está com a língua solta.

Há pouco mais de 15 dias, durante um encontro com a bancada de parlamentares federais do Paraná, depois de fazer as restrições de praxe a seus colegas, o general ouviu do deputado Ricardo Barros (PP), ex-ministro da Saúde do governo Michel Temer:

– Presidente não demite deputado, mas deputado demite presidente.

O general engoliu a seco.

A dor de cabeça de Bolsonaro

Tem uma pedra no meio do caminho
Nem o candidato do PT, que só será conhecido em cima da hora, mas que poderá partir de um patamar de intenção de votos na casa dos 20%. Nem o candidato do PSDB, talvez – quem sabe? – João Doria, governador de São Paulo, que atrairia o apoio de siglas do Centrão, tais como o DEM, o PSD e outras menos votadas.

Tampouco o apresentador de televisão Luciano Huck, que mais uma vez poderá ficar onde está para não perder a montanha de dinheiro que ganha e não ter que enfrentar o desconhecido. Sérgio Moro seria um pesadelo indesejável, mas ele se verá tentado a aceitar a indicação para ministro do Supremo Tribunal Federal.

Por ora, o que mais incomoda e mete medo em Jair Bolsonaro é ter que disputar a reeleição tendo como um dos seus competidores o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC). O Rio é a principal base eleitoral dos dois. E Witzel, mais do que os outros, está sabendo se apropriar do discurso que rendeu muitos votos a Bolsonaro.

Sergio Lamucci - O Brasil e um mundo de juros baixos

- Valor Econômico

Guerra comercial entre EUA e China poderá levar o mundo a transitar de uma fase de taxas reais de equilíbrio baixas para uma etapa de taxas “ultrabaixas”

O mundo desenvolvido convive com juros baixos desde a crise financeira global de 2007 e 2008, e a tendência é que isso continue por um longo período. Hoje, mais de US$ 17 trilhões em títulos públicos e privados oferecem rendimento negativo, num cenário de elevada incerteza, desaceleração do crescimento mundial e mudanças demográficas e tecnológicas. Esse quadro causa desconforto nos países avançados, levantando dúvidas sobre a eficácia da política monetária para combater a próxima recessão global, uma vez as taxas já estão baixas demais.

Esse ambiente tem obviamente impacto no Brasil, contribuindo para reduzir por aqui o juro neutro (a taxa que permite que a economia cresça sem gerar pressões inflacionárias). Nas contas do economista-chefe do Banco Safra, Carlos Kawall, o juro real neutro (descontada a inflação) caiu de 5,5%, no período de 2008 a 2014, para 2,5% hoje. Um terço desse recuo, segundo Kawall, se deve à queda dos juros no cenário internacional.

Para ele, os outros dois terços decorrem de mudanças na política fiscal - como o teto de gastos e a reforma da Previdência - e também na política parafiscal, com a contenção dos empréstimos dos bancos públicos. Essa combinação de fatores internos e externos permite ao Brasil experimentar um nível de juro neutro ineditamente baixo, com implicações favoráveis sobre a retomada do crescimento, a dinâmica da dívida pública e o mercado de capitais, por exemplo.

Maia e centrais se antecipam à reforma sindical

Presidente da Câmara acerta com entidades apresentação de uma PEC para discutir tema

Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico

BRASÍLIA - Em mais uma disputa de protagonismo com o governo, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acertou com centrais sindicais, confederações patronais (como CNI, CNC, CNA e CNT) e federações, como a Febraban, a apresentação de uma proposta de emenda constitucional (PEC) para discutir a reforma sindical.

A intenção dos trabalhadores, ao procurar Maia, é se antecipar à reforma sindical em elaboração pelo secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho (PSDB) - principal responsável pela reforma trabalhista, que acabou com a contribuição sindical obrigatória e a tornou opcional.

Marinho montou um grupo de juristas, economistas e técnicos do governo para elaborar uma proposta até o fim do ano e deixou de fora sindicatos. O coordenador do grupo, o secretário do Trabalho, Bruno Dalcomo, prometeu aos sindicalistas ouvir sugestões, mas eles não terão direito a decidir na confecção do texto.

Marinho estaria se espelhando no modelo americano, de um sindicato para cada empresa, estrutura completamente diferente da brasileira, onde as entidades representam categorias por município ou região, como os metalúrgicos de São Paulo ou os motorista de ônibus do ABC. No modelo dos Estados Unidos, os funcionários do Banco do Brasil se uniriam em um sindicato exclusivo, por exemplo, sem a participação dos empregados de outros bancos.

“O governo sinalizou com o pluralismo por empresa. No Brasil vai haver milhões de sindicatos, vai ser pior do que era antes, e com um sindicalismo muito mais enfraquecido”, disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, que tem preferência pelo modelo alemão, de sindicatos nacionais por categoria.

Ainda não há uma definição consensual sobre o modelo a ser adotado, mas o fim da unicidade sindical (de um sindicato por município/ região), antes rechaçado no meio, agora já é aceito. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) já defendia a mudança nesse modelo, mas suas bases resistiam.

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

A resistência do populismo – Editorial | O Estado de S. Paulo

Mesmo com as dificuldades políticas que ora desafiam vários dos líderes populistas que chegaram ao poder nos últimos anos, o sentimento de desconforto de parte considerável da sociedade que alimentou o discurso desses demagogos, inclusive no Brasil, mostra-se ainda bastante vigoroso. Foi o que constatou uma ampla pesquisa do instituto Ipsos, de cujos resultados se pode depreender que eventuais reveses eleitorais de alguns populistas não significarão necessariamente o fim da onda que os impulsionou.

Realizada entre março e abril deste ano, a pesquisa ouviu 18.528 adultos em 27 países de todos os continentes, entre os quais o Brasil. No geral, 70% dos entrevistados consideram que a economia de seus países está capturada pelos interesses dos ricos e dos poderosos. Além disso, 66% entendem que a política tradicional ignora “pessoas como eu”, e 54% afirmam que a sociedade de seus países está “fraturada”. A região do mundo que teve os piores resultados nessas questões foi a América Latina.

No Brasil, 78% dos entrevistados disseram ver a sociedade “fraturada”, o segundo índice mais alto entre os países pesquisados – fica atrás somente da Polônia, com 84%, e muito à frente dos Estados Unidos (60%), país que tem apresentado forte polarização desde a campanha eleitoral à presidência que consagrou Donald Trump. Em 2016, ano do impeachment da presidente Dilma Rousseff, 77% dos brasileiros disseram considerar a sociedade “fraturada”. Ou seja, nada mudou de lá para cá.

Poesia | Fernando Pessoa - Natural que não se pense

Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa ...

Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas. . .
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente. . .

Que pensará isto de aquilo?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tiver, que a tenha...
Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos ...
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu.

Música | Ana Costa - Samba dos Ancestrais

domingo, 29 de setembro de 2019

Opinião do dia – Marco Aurélio Nogueira*

Palavras são palavras: têm mil e uma utilidades. Diante das tropas fanatizadas do bolsonarismo, servem para mobilizar. Sem elas a base se desmancha e a narrativa não se sustenta. O “mito” deve ser reposto dia após dia, para que sua demagogia populista e patrioteira sobreviva. É uma reposição que se faz com atos e decisões, mas também com palavras, que mobilizam e persuadem.

Palavras influenciam, organizam, são recursos de hegemonia. Podem educar, iludir, inflamar, envenenar. Precisam ser, por isso, decodificadas.

É preciso separar o caricato do substantivo, descobrir o que há por trás do palavrório de Bolsonaro. Sua narrativa funciona como um filtro que bloqueia a visão da paisagem. É tóxica, sobretudo, por isso. Desconstruí-la é recuperar uma perspectiva e um entendimento que se perderam pelo caminho.

*Professor titular de teoria política e coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da UNESP. ‘Atos e venenos’, O Estado de S. Paulo, 28/9/2018.

Eliane Cantanhêde - O Titanic Lava Jato

- O Estado de S.Paulo

Gilmar Mendes está na posição de ‘quem ri por último ri melhor’, mas...

Com a sucessão de eventos da semana passada, a Lava Jato começa a ir a pique como o Titanic. Hackers, The Intercept Brasil, Supremo, Congresso, Planalto e, agora, a absurda, inacreditável, chocante história do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que entrou armado na mais alta corte do País para assassinar o ministro Gilmar Mendes.

Depois das “flechadas” contra Michel Temer, Janot queria assassinar Gilmar a tiros. Não tirou o mandato de um nem a vida do outro, mas acaba de matar sua própria reputação. Procuradores são servidores públicos e ele não era apenas um procurador qualquer, era o procurador-geral e estava disposto a cometer não um crime qualquer, mas o mais grave de todos: assassinato. E de um ministro do Supremo!

Janot agia como justiceiro, Gilmar era o crítico mais feroz dos personagens, métodos e atos da Lava Jato. O procurador era endeusado e o ministro, trucidado, principalmente nas redes sociais. Mas a gangorra inverteu. Janot cai do pedestal, Gilmar está exultante e a maior operação anticorrupção da história afunda fragorosamente.

Com seu partidarismo, arrogância e falta de limites, Janot foi o pivô da gravação que Joesley Batista, da J&F, fez com o ex-presidente Michel Temer. O resultado foi uma conversa mole, induzida, picada, que não conseguiu derrubar Temer, mas derrubou a reforma da Previdência e a retomada do crescimento. O País pagou um alto preço.

A J&F virou gigante internacional com o ex-presidente Lula, mas Janot e sua turma atiraram em Temer. Como a gravação não ficou forte o suficiente, eles adulteraram a ordem das frases e correram ao STF sem aprofundar as investigações, seguir o dinheiro ou sequer fazer perícia no áudio. E que acordo camarada com os irmãos Batista! Foi, portanto, uma ação política, que fica ainda mais irritante com a confissão de Janot justamente na semana da inversão da gangorra também no STF.

Vera Magalhães - Dudu faz as malas

- O Estado de S.Paulo

Jogo combinado entre Bolsonaro e o Senado prepara terreno para o filho

A reforma da Previdência vira refém da conveniência de tempo e agenda dos senadores. Vetos são derrubados sem que o presidente que os proferiu nem sequer lamente. O líder do governo no Senado é investigado sob a acusação de ter recebido propina quando era, vejam só, ministro de ninguém menos que Dilma Rousseff.

A sequência de fatos, todos das últimas duas semanas, contraria dois pilares da campanha de Jair Bolsonaro, comprados pelo valor de face pelo eleitorado traumatizado pelo PT: a proposta liberal-reformista na economia e o combate implacável à corrupção e à velha política.

Pouco importa. Essas promessas e a fidelidade a uma parcela do eleitorado foram colocadas em segundo plano diante da prioridade do momento: preparar o terreno no Senado para o envio, mais de dois meses depois do primeiro anúncio, da indicação do terceiro filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, à Embaixada do Brasil em Washington.

Não que seja uma preparação de todo planejada, como nada é na parafernália de conceitos e métodos do bolsonarismo. Ao mesmo tempo em que é necessário fidelizar senadores para a aprovação de Eduardo, seu irmão Carlos fustiga o partido com a segunda maior bancada na Casa, o Podemos – pela primitiva razão de que a sigla cresce em cima do PSL e pode virar morada de algum adversário do pai em 2022, como o temido Sérgio Moro.

Luiz Carlos Azedo - As leis de Beccaria

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Estamos assistindo a uma grande colisão entre a alta magistratura brasileira, representada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato”

O milanês Cesare Beccaria, marquês de Beccaria, é considerado o pai do moderno direito penal. Educado por jesuítas, estudou literatura e matemática em Paris, em meados do século XVIII, e sofreu a influência dos pensadores enciclopedistas, principalmente Voltaire, Rosseau e Montesquieu. De volta a Milão, fundou uma sociedade literária de caráter iluminista e passou a escrever para o jornal Il Café, que circulou nos anos de 1764 e 1765. Na época, vigorava a tese de que as penas constituíam uma espécie de vingança coletiva, o que levava a aplicação de punições com consequências piores do que os males produzidos: torturas, penas de morte, prisões desumanas, banimentos, na maioria das vezes, com base em acusações secretas.

Beccaria se insurgiu contra isso e escreveu uma obra seminal, que todo estudante de Direito conhece: Dei Delliti e dele Pene (Dos delitos e das penas), fruto de suas discussões com os amigos, entre os quais os irmãos Pietro e Alessandro Verri. Para evitar perseguições, o livro foi impresso em Livorno, em 1764, anonimamente, com o cuidado de usar expressões vagas e imprecisas sobre assuntos que contrariavam magistrados e clérigos.

O tratado Dos Delitos e das Penas invoca a razão e o sentimento. Até os dias de hoje, é um libelo contra os julgamentos secretos, o juramento imposto aos acusados, a tortura, a confiscação, as penas infamantes, a desigualdade ante o castigo, a atrocidade dos suplícios. Separou a justiça divina e a justiça humana, os pecados e os delitos, condenou o direito de vingança e tomou por base a utilidade social para estabelecer o direito de punir. Classificou como inútil a pena de morte, assim como defendeu a separação do poder judiciário e do poder legislativo.

Aclamado em Paris, sobretudo pelos filósofos franceses, Beccaria foi acusado de heresia e sofreu forte perseguição em Milão. Entretanto, sua influência se espalhou pela Europa. A imperatriz Maria Teresa da Áustria, aboliu a tortura em 1776. Voltaire classificou seu livro como um verdadeiro código de humanidade. Catarina II ordenou a inclusão dos conceitos do livro no Código Criminal Russo de 1776. Em 1786, Leopoldo de Toscana adotou as reformas defendidas por Beccaria. Na Prússia, Frederico, o Grande, abraçou muitos de seus princípios.

Janio de Freitas - Sentenças sem defesa

- Folha de S. Paulo

Reconhecimento das garantias constitucionais foi ameaçado pelo Supremo

Mais uma vez, o Supremo Tribunal Federal mostra uma combinação de temor a reações da opinião pública, inclinações políticas e argumentos artificiosos no trato de questão essencial para o regime democrático.

É o que existe sob o louvado reconhecimento, já feito, de que às defesas cabe o último pronunciamento antes da sentença, para responder a denúncias novas ou a pendências remanescentes --direito desrespeitado em julgamentos na Lava Jato.

Na verdade, porém, o valor desse reconhecimento depende de uma definição que está ameaçada pelo próprio Supremo.

Ainda faltando os votos dos ministros Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli, que apenas antecipou sua opinião, a meio da semana ficava reafirmada, por 6 votos 3, a tese que levou à anulação da pena imposta por Sergio Moro a Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras.

Resultado que agora se estendia ao ex-gerente da empresa Márcio Ferreira. Mas a forçosa decisão incomodou vários ministros, dada a possibilidade de anular numerosas condenações da Lava Jato. Não tardou a aparecer o que foi chamado de "modulação" no reconhecimento do direito dos réus. Melhor diriam, no entanto, mutilação.

Luís Roberto Barroso, terceiro a votar, propôs que, se confirmada para o réu a última palavra, assim seja apenas daqui por diante. Logo, caso o Supremo declarasse incorretos os métodos condenatórios, a seu ver o incorreto deveria permanecer intocado. Nem ao menos era caso de regra nova e não retroativa. Azar o de quem não teve a defesa final e está na cadeia.

É interessante a virada de Barroso, que se mostrava de fino rigor legalista até que se viu sob críticas, por comprometer-se com a tese da prisão antes de concluídos os recursos de defesa. Sua reconhecida vaidade se teria magoado, e passou a responder com uma virada para a linha Fux.

Bruno Boghossian – Conversa de botequim

- Folha de S. Paulo

Sem enfrentar excessos, combate à corrupção ficará refém de paixões políticas

A Lava Jato é tema de conversa de botequim há mais de cinco anos, mas uma parte do país ainda se apavora quando surgem discussões sobre os abusos da operação. A fobia é reflexo das artimanhas dos poderosos para frear a turma de Curitiba, mas é também sinal de imaturidade de alguns de seus defensores.

Depois de 66 fases só no Paraná, há exemplos de sobra de que procuradores e juízes ultrapassaram os limites da lei mais do que um punhado de vezes. Além de insensato, o esforço para manter a Lava Jato intocada é um problema cada vez maior.

A tentativa de blindar a operação e barrar até a correção de seus excessos mais evidentes contaminou o debate público sobre esses casos. Provocou cegueira seletiva nos tribunais, produziu reações defeituosas e deu munição inclusive a réus incriminados sem sombra de dúvida.

Se o Brasil não tiver coragem de passar a Lava Jato a limpo para consertar suas arbitrariedades e estabelecer balizas claras, os esforços de combate à corrupção ficarão para sempre reféns de paixões políticas de momento, como se vê agora.

A névoa mantida nessa região de fronteira abre caminho para um Congresso que aprova, às pressas, uma lei de abuso de autoridade necessária, mas cheia de buracos. Cria condições também para que um presidente cite ações arbitrárias como justificativa para para interferir em órgãos de controle e proteger aliados.

Ruy Castro* - País de maus bofes

- Folha de S. Paulo

Autoridades escoiceando à solta estimulam a que seus esbirros façam o mesmo

Não sei bem o que significa perder as estribeiras, mas, seja o que for, o Brasil parece estar perdendo as suas. Pelo que podemos ver no noticiário e em nós mesmos, tornamo-nos 200 e tal milhões de sujeitos que passam o dia chutando baldes, rosnando ameaças e usando toda espécie de canal para destratar os inimigos, os adversários e até os simples desafetos. Ninguém mais tolera ninguém, ninguém admite um pensamento contrário. A continuar assim, vamos passar a nos esbofetearmos ou cuspir uns nos outros à guisa de bom-dia.

O exemplo vem de cima. Num país em que o presidente é o primeiro a não perder uma oportunidade de ejacular desaforos e descompor pessoas, inclusive ao microfone da ONU, como esperar moderação de seus chefiados? E, se esse presidente exerce a política da terra arrasada, da desarmonia entre os poderes e do desmantelamento das instituições, por que seus seguidores, dentro e fora do governo, fariam diferente?

O ministro da Educação, por exemplo, mesmo incapaz de tomar um ditado, não abre mão da arrogância. E dá-lhe de corte de verbas, desamparo a órgãos centenários e desprezo por funções que ele nem é capaz de entender, como a de professor universitário. E é contagioso. Uma autoridade escoiceando à solta estimula a que um esbirro do quarto escalão agrida uma heroína da cultura brasileira e fique por isso mesmo.

Hélio Schwartsman - Realismo democrático

- Folha de S. Paulo

Pleito após pleito, grande parte do eleitorado vai às urnas e repete o ciclo, na vã esperança de que, na próxima vez, algo diferente ocorra

Na linha “a democracia não é bem o que se imagina”, recomendo vivamente “Why Bother with Elections?” (por que se preocupar com eleições), do cientista político Adam Przeworski (NYU).

O livro é brutalmente realista. Diz logo de cara que a democracia é o regime da decepção. Um pouco menos da metade dos eleitores odeia o resultado da última eleição, e os cinquenta e poucos porcento que votaram no candidato vitorioso logo ficarão desapontados com sua performance. Ainda assim, pleito após pleito, grande parte do eleitorado vai às urnas e repete o ciclo, na vã esperança de que, na próxima vez, algo diferente ocorra.

Przeworski também deixa claro que eleições são incapazes de trazer uma solução para nossas ansiedades econômicas, imprimir racionalidade às decisões coletivas e ainda padecem de vieses graves, como a enorme vantagem que dão aos candidatos que já ocupam o cargo. De 2.949 pleitos registrados entre os anos de 1788 e 2008, os titulares venceram 2.949, ou 79%.

Vinicius Torres Freire – Poder aos Napoleões de hospício

- Folha de S. Paulo

Descrédito de procuradores aumenta crise institucional e anima autoritarismos

Um procurador-geral fantasia ou planeja o assassinato de um ministro do Supremo e considera cabível contar esse desvario ao público. Procuradores com altas responsabilidades fazem troça da morte de uma criança, neta do investigado-mor da República, Lula da Silva, entre outras vulgaridades teratológicas ou cruéis.

Os conluios e a politização da Lava Jato decerto causaram mais dano institucional. Mas arrivismos dinheiristas, piadas funéreas e delírios homicidas de procuradores dão o que pensar. De que gente é feito o Ministério Público?

A revelação do descalabro, seja moral, jurídico ou político, de qualquer modo contribui para a operação de revanche contra a Lava Jato. O movimento combina a reação de interesses corporativistas de políticos com a resposta de democratas à manipulação legal ou política de processos judiciais.

Nos tribunais ou no Congresso, o partido da Lava Jato sofre derrotas. A reação às extravagâncias desse movimento político-judicial, porém, não são sinal de restauração das funções do sistema político ou dos Poderes.

Por bem e por mal, a política da República de 1988 passou por um desmonte que se deveu, enfim e na prática, à Lava Jato. O acuamento do partido dos procuradores e do sistema de investigação em controle em geral não significa que o sistema está em obra de reconstrução. A Procuradoria é que entra no programa geral de demolição.

É um cenário favorável às piores tentações do bolsonarismo. O presidente e seu movimento têm as tintas de um cesarismo alucinado, para ser mais preciso de um bonapartismo, que não raro floresce nas paisagens com ruínas do descrédito de sistemas políticos.

Elio Gaspari* - A farra dos desembargadores

- Folha de S. Paulo | O Globo

Tribunal de SP quer construir novo prédio com custo estimado de R$ 1,2 bilhão

A menos de um quilômetro de distância do pedaço do Vale do Anhangabaú onde as filas de desempregados se formam ao amanhecer, o Tribunal de Justiça de São Paulo quer construir duas torres de 24 andares com seis subsolos para 1.300 vagas de estacionamento. Coisa estimada em R$ 1,2 bilhão.

Esse assunto rola desde 1975 e por ora o tribunal trata do projeto executivo da obra, que poderá custar até R$ 26 milhões. Deve-se à desembargadora Maria Lúcia Pizzotti o bloqueio da farra. Se ninguém mais puser a boca no mundo, esse negócio vai adiante. Vai aos poucos, mas vai.

Quem ouve falar em duas torres para o Tribunal de Justiça pode até achar que um país rico, em regime de pleno emprego, precisa de uma boa sede para o tribunal de São Paulo. Não é nada disso. Os edifícios destinam-se a abrigar apenas os gabinetes dos 360 desembargadores. Todo mundo pagará pela farra, mas as torres terão 28 elevadores e 12 serão privativos para desembargadores e juízes. Os doutores terão também um andar exclusivo para seu restaurante. Isso e mais um posto bancário só para desembargadores.

Merval Pereira – Reação prevista

- O Globo

Para Maria Cristina Pinotti, Mãos Limpas foi mutilada antes de seu final, e não cumpriu integralmente seu papel

Considerar que os delatores são auxiliares de acusação provocou uma repulsa grande ao Supremo, decisão que está sendo percebida pela população como ação contra a Lava-Jato. Utilizar-se do velho formalismo jurídico para anular a condenação de um corrupto por suposta falha técnica, que não está prevista em nenhuma legislação existente, é uma maneira de postergar a punição.

A modulação que será proposta pelo ministro Dias Toffoli, presidente do STF, deve definir que o julgamento volta às alegações finais, não havendo, portanto, o perigo de começar da estaca zero, o que vai certamente ser reivindicado pelos advogados de defesa.

Cumpridas as novas formalidades, o resultado do julgamento vai ser igual, não é possível acrescentar provas ou acusações. A questão mais grave é a da prescrição da pena, se houver possibilidade recursal de postergar o final do julgamento por qualquer outra mágica jurídica.

É possível que na decisão final fique definido que o prazo legal da prescrição permanece suspenso enquanto o processo retorna às alegações finais. As semelhanças com o caso das Mãos Limpas na Itália são muitas, mas, por enquanto, a popularidade da Operação Lava-Jato continua grande.

Na Itália, o combate à corrupção teve um apoio popular grande, que decaiu ao longo dos anos devido, principalmente, a diversas denúncias que ajudaram a gerar desconfianças na população, mesmo não tendo sido comprovadas.

A economista Maria Cristina Pinotti, estudiosa da Operação Mãos Limpas, coordenadora do livro “Corrupção: Lava Jato e Mãos Limpas”, relata que a reação do sistema político teve seu auge com a eleição de Silvio Berlusconi como primeiro-ministro, em 1994.

Bernardo Mello Franco - O peixe podre do impeachment

- O Globo

Beneficiário direto do impeachment, o ex-senador Aloysio Nunes agora diz que a Lava-Jato cometeu “ilegitimidades” para forçar a queda de Dilma Rousseff

Três anos depois, a história do impeachment de Dilma Rousseff continua a ser reescrita. Na sexta-feira, o tucano Aloysio Nunes afirmou que a Lava-Jato cometeu “ilegitimidades” e vendeu “peixe podre” para forçar a derrubada da ex-presidente. Ele se referia ao grampo do “Bessias”, vazado por Sergio Moro às vésperas da votação decisiva na Câmara.

O então juiz divulgou o diálogo na tarde em que Dilma nomeou Lula para assumir a Casa Civil. Com base no grampo, o ministro Gilmar Mendes anulou a posse. Alegou que o ex-presidente estava atrás do foro privilegiado para fugir da cadeia.

Graças ao Intercept Brasil, hoje se sabe que Moro e a Lava-Jato omitiram outras conversas gravadas no mesmo período. Elas sugerem que o principal objetivo da nomeação era blindar Dilma, e não Lula. A presidente apelava ao antecessor para recompor sua base no Congresso e salvar o próprio mandato.

“Quando você fala na divulgação do diálogo do Lula com a Dilma, evidentemente você tem uma manipulação política do impeachment”, disse o ex-senador Aloysio em entrevista à “Folha de S.Paulo”. “Não é uma coisa por inadvertência, foi de caso pensado”, acrescentou.

Ascânio Seleme – Viva o velho Brasil!

- O Globo

Até os eleitores mais fiéis de Bolsonaro devem estar com uma pulga atrás da orelha depois de todos os desdobramentos políticos e jurídicos que atingem com artilharia pesada a Lava-Jato, a mais importante e famosa operação anticorrupção do mundo, depois da Mani Pulite, a Mãos Limpas italiana. Os outros brasileiros, os infiéis ao presidente e todos os que nunca votaram e jamais votariam nele também devem estar abismados com a reviravolta que vai se consumando no Brasil. A grande lavagem da corrupção dentro da política brasileira está desaparecendo porque aos poucos vão sendo dela subtraídos sabão e água.

A mudança do clima em torno da Lava-Jato, outrora intocável, é mais do que visível. Os torpedos que vão sendo disparados do Congresso, do Supremo e até do Palácio do Planalto causam danos importantes à força tarefa, alguns insuperáveis. A situação chegou a esse ponto porque, primeiro, Sergio Moro aceitou o convite e virou ministro de Bolsonaro. Depois, as trocas de mensagens entre Moro e a turma do Ministério Público publicadas pelo Intercept conferiram a coragem que faltava a muitos dos homens que hoje manejam a artilharia e os torpedeiros.

O Congresso dispara contra a Lava-Jato de modo a se proteger. É de uma desfaçatez monumental. O STF a ataca muitas vezes incomodado com o seu sucesso e com a sombra que ela projeta sobre a casa suprema. Claro que os argumentos sempre são outros e fazem todo sentido jurídico. Limita-se a Lava-Jato atendendo a premissa constitucional de se oferecer ampla defesa a qualquer acusado. No caso dessa semana, o STF entendeu que a defesa é cerceada se o delator for julgado depois do delatado. É controverso, mas faz sentido em razão do atendimento ao processo legal. O que parece incabível mas pode acontecer é que a decisão coloque em liberdade diversos condenados. A decisão vai alcançar 150 condenados, segundo O GLOBO, entre eles o ex-presidente Lula.

Míriam Leitão - Supremo tem semana decisiva para o país

- O Globo

Supremo Tribunal Federal (STF) estará diante de quatro caminhos que farão completa diferença na vida do país e da Operação Lava-Jato

Na semana em que o ex-presidente Lula deve ser solto, para cumprir o resto da pena em casa, o Supremo Tribunal Federal (STF) estará diante de quatro caminhos que farão completa diferença na vida do país. O dilema da ordem em que devem ser feitas as alegações finais nos casos em que há delação premiada deixou o país em suspenso. É o fim da Lava-Jato? Ela está sendo abatida por uma filigrana jurídica ou o que está se discutindo é a garantia fundamental do direito de defesa? No Supremo há quem considere que se encontrará uma solução intermediária.

O STF poderá decidir que tudo o que foi feito até agora está anulado, dado que não foi observada a ordem de que o delatado é o último a falar. Essa posição extrema tem seus defensores, mas é difícil de se sustentar, até pelo fato de que o que está sendo levantado não está na lei. É apenas uma interpretação. “Uma interpretação importante”, pondera um ministro da Corte.

O caminho proposto pelo ministro Luiz Roberto Barroso é de que só se aplique aos casos que forem julgados futuramente. É difícil que seja seguido. A terceira saída sugerida pela ministra Cármen Lúcia é de rever caso a caso. A tese é de que isso dá mais trabalho, mas que em direito penal não se pode “passar a régua”, nem se pode descuidar, um milímetro que seja, do respeito ao direito de defesa. E há a proposta do ministro Alexandre de Moraes que é a de serem considerados apenas os casos em que, durante o processo, o réu pediu para ser ouvido por último e se disse prejudicado. Portanto, não há um tudo ou nada, segundo a explicação que ouvi dos juristas do Supremo, mas sim algumas alternativas em cima das mesas do Tribunal, que podem atenuar o cenário mais radical.

Dorrit Harazim - Caldeirão do Trump

- O Globo

Mesmo que a abertura do inquérito na Câmara não leve à aprovação do impedimento pelo Senado, de maioria republicana, é boa a hora de se relembrar o papel de whistleblowers

O que estará pensando Volodymyr Zelensky? Apesar da extraordinária versatilidade desse ucraniano camaleão de 41 anos — já foi ator e comediante de real sucesso, roteirista de TV e cinema, empresário cultural e produtor de filmes no eixo Rússia-Ucrânia —, nada o preparou para se ver catapultado a testemunha e coprotagonista de um enredo capaz de sacudir a história americana, e alterar a geopolítica mundial. Nem mesmo sua meteórica ascensão a sexto chefe de Estado da Ucrânia independente. Montado numa campanha eleitoral tipo blitzkrieg de apenas quatro meses, Zelensky conseguira saltar do papel de presidente ficcional em popularíssimo seriado de TV, “Servidor do povo”, para o de vencedor na vida real. Em abril, derrotara o presidente em exercício por 73% dos votos, e desde então vinha se equilibrando na complexa teia de relações com a sempre rombuda Rússia, e o guarda-chuva aliado dos países da Otan.

Esta semana, com a forçada divulgação do teor de um controverso telefonema confidencial entre Donald Trump e Zelensky, elemento central para o início do processo de impeachment do presidente americano pelo Congresso dos Estados Unidos, o ucraniano se vê num enredo para o qual não ensaiou. Para sorte dele, também é formado em Direito. Caberá à opinião pública de seu país avaliar se o novato no cargo defendeu ou entortou os interesses nacionais para os quais foi eleito.

A situação de Donald Trump é bem mais cabeluda. Em essência, ele agora passa a investigado por usar de seu poder na Casa Branca para pressionar Zelensky a fornecer informações sobre negócios envolvendo o filho do seu principal adversário à reeleição em 2020, Joe Biden. A moeda de troca seria o congelamento ou liberação de US$ 400 milhões em ajuda à Ucrânia.

Além do teor da carta Trump-Zelensky, o inquérito de impeachment tem embasamento num recheado relatório-denúncia de um informante (ainda) anônimo da CIA, que lista evidências de abuso de poder pelo ocupante da Casa Branca para ganho político pessoal. O relatório detalha desvios em série — do acobertamento de provas à alarmante participação do advogado pessoal do presidente, o casca-grossa Rudy Giuliani, na missão de pressão sobre a Ucrânia.

Bolívar Lamounier* - Pequim não crê em lágrimas

- O Estado de S.Paulo

Para se fazer presente no imenso mercado chinês, Hollywood terá de se reinventar

Meu artigo de hoje não é propriamente um artigo, é um relato sobre um artigo de Martha Bayles, professora do Boston College, publicado na edição digital da revista The Atlantic do dia 15 último. The Atlantic, para quem não sabe, é uma das revistas mais antigas e prestigiosas do mundo. Pratica o alto jornalismo há 160 anos, sem interrupção.

O grande salto para trás de Hollywood é o título sob o qual a professora Bayles aborda um assunto ainda pouco debatido mundo afora: o crescente risco que a liberdade de expressão está correndo em razão do apetite pecuniário da indústria cinematográfica americana pelo mercado chinês. Escusado dizer que meu texto acompanha de perto o da professora Martha Bayles.

Sob a orientação do primeiro-ministro Xi Jinping, o governo chinês concentrou e reforçou brutalmente uma habilidade que nunca lhe faltou: a de censurar tudo o que não lhe agrade.

Para situar o tamanho do problema, Bayle lembra o que se passou com a indústria editorial de Hong Kong. Quando a Grã-Bretanha se retirou e a China assumiu o controle de Hong Kong, os cidadãos daquela Nova York asiática receberam certas garantias, entre as quais avultavam as liberdades de expressão e de imprensa. Até aí, nada surpreendente. Bailey atesta que a poderosa indústria editorial lá sediada produzia uma enorme quantidade de livros, revistas e jornais, um vibrante espectro que tratava de cada aspecto da história, da política e da sociedade chinesas. Sem essa produção, não só os cidadãos de Hong Kong, mas também os da China continental saberiam muito menos do que passaram a saber sobre seu próprio país. Mas, claro, a nova orientação emanada de Pequim liquidou tudo isso e as referidas editoras praticamente deixaram de existir.

Presidente contra imprensa

Vitor Marques | Aliás / O Estado de S. Paulo

O ódio ao jornalismo não é algo novo. Tampouco é uma exclusividade da extrema-direita. Referirse à imprensa como “inimiga do povo”, por exemplo, é uma expressão atribuída a Josef Stalin. O que hoje gera extenso debate é o fato de que chefes de Estado e presidentes eleitos pelo voto, como o americano Donald Trump, atacam a imprensa como modus operandi do ato de governar. Para diversos autores, este é um comportamento que enfraquece a democracia liberal.

Recém-lançado no Brasil, o livro O Iimigo do Povo – Uma Época Perigosa para Dizer a Verdade, do jornalista da CNN Jim Acosta, vai além de relatar os bastidores e as disputas internas do governo Trump. Ao narrar sua experiência pessoal como correspondente chefe da emissora na Casa Branca, Acosta discute temas vitais para a democracia: a liberdade de expressão e de imprensa. Além disso, toca em outro ponto importante para o jornalismo: como os veículos de comunicação devem se comportar diante de um governo que, além de ser acusado de incitar o ódio, se tornou conhecido por disseminar notícias falsas?

A primeira mentira da era Trump, recorda Acosta, foi insistir que o número de pessoas que compareceram à posse do novo presidente era igual ou maior à quantidade de apoiadores que recepcionaram Barack Obama anos atrás. “Foi a maior plateia a testemunhar uma posse até hoje, tanto pessoalmente, quanto no planeta inteiro”, disse o então secretário de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, um dia depois da posse de Trump. Como relataram os canais de notícias, era mentira.

O livro abrange o período em que Acosta passa a cobrir, pela CNN, a campanha de Trump à Presidência, em 2016, até os desdobramentos do diálogo no qual o já presidente americano acusa o jornalista e a CNN de serem “inimigos do povo”. O episódio ocorreu durante uma entrevista coletiva na Casa Branca, em novembro de 2018, dias após o partido Republicano de Trump perder o controle da Câmara dos Representantes (Deputados).

O futuro da floresta

Zander Navarro, Alfredo Homma, Antônio José Elias A. De Menezes e Carlos Augusto Mattos Santana | O Estado de S.Paulo

A ‘floresta em pé’ como solução para Amazônia apresenta dificuldades em sua materialização

Há disseminada desinformação sobre as transformações em curso na Região Amazônica e, em particular, sobre o seu aspecto mais chocante: os incêndios que invariavelmente pulverizam partes da floresta e sua extraordinária biodiversidade. Nos últimos 40 anos a maioria dos brasileiros apagou de sua memória os fatos que convulsionaram o bioma, estendendo-se de Rondônia, passando pelo norte de Mato Grosso e o sul do Pará e seguindo pelo Maranhão, ao leste. Esse gigantesco arco territorial foi visceralmente alterado, primeiramente, pela devastação florestal, depois pela pecuária extensiva e, mais tarde, pelo avanço da produção de grãos, embora esta movida por uma novidade: a sua alta densidade tecnológica.

O mesmo desconhecimento prevalece sobre o rural brasileiro como um todo, comprovado por inúmeras ilustrações. Exemplos: um dos nossos alimentos básicos, o arroz, tem a sua eficiente produção cada vez mais concentrada nos dois Estados meridionais, depois distribuída para o restante do País. Aos poucos desaparecem antigas produções regionais, incapazes de competir com a oferta sulista. Já a multiplicação de motos nas regiões rurais, por sua vez, encurta distâncias e, particularmente, descortina o mundo urbano para os jovens que, assim, ampliam o desejo de abandonar suas precaríssimas comunidades do vasto interior, esvaziando o campo.

Desde 1993 o Pará lidera o cultivo nacional de mandioca, mas sua primazia secular como responsável pela maior área plantada foi perdida para a soja a partir de 2015. A virada tem agudas consequências para o campo paraense, pois sepulta a agricultura de subsistência de antanho e integra o Pará ao sistema agroalimentar global. O Pará é também o maior produtor nacional de cacau, abacaxi, dendê, pimenta-do-reino, açaí e bubalinos. E destaque em bovinos, coco, laranja e maracujá, entre outros. O açaí, um produto tipicamente extrativista, vem ampliando seus mercados pelo mundo por meio do manejo, inclusive lavouras plantadas, boa parte sob sistemas de irrigação.

O que a mídia pensa – Editoriais

- Leia os editorias de hoje dos principais jornais brasileiros:

Pragmatismo, afinal – Editorial | O Estado de S. Paulo

Desde sua posse, o presidente Jair Bolsonaro adotou o total distanciamento como modo de se relacionar com o Congresso. Talvez convencido de que seus mais de 50 milhões de votos fossem suficientes para tornar automaticamente legítimos todos os projetos do governo encaminhados ao Legislativo, cabendo aos parlamentares apenas aprová-los sem maiores discussões e sem necessidade de negociação, Bolsonaro descuidou da formação de uma base governista com um mínimo de articulação. O resultado foram as seguidas derrotas sofridas pelo governo nos mais diversos temas, cabendo-lhe o papel de simples figurante em votações importantes, como a da reforma da Previdência.

Ante a perspectiva de novos reveses, o governo Bolsonaro parece afinal ter-se rendido às evidências de que sua estratégia estava equivocada e decidido abrir negociação com parlamentares inclinados a apoiar o governo, oferecendo-lhes participação na administração, na forma de cargos.

Ao contrário do que apregoa o jacobinismo antipolítico que tomou o País há alguns anos - e que, diga-se, ajudou a eleger Bolsonaro -, esse tipo de negociação não é, em si, sinônimo de corrupção. Num regime presidencialista com as características do brasileiro, em que o partido do presidente normalmente não tem maioria no Congresso para servir de base, é preciso atrair o apoio de outros partidos. Isso pode ser feito de duas maneiras: a cada votação ou por meio da construção de uma coalizão. No primeiro caso, a incerteza quanto ao apoio é permanente, pois depende de circunstâncias que mudam ao sabor da política; no segundo, articula-se a base conforme objetivos em comum, agrupando votos razoavelmente seguros para aprovar a maioria dos projetos de interesse do Executivo, o que tende a conferir estabilidade ao governo.

Livro - Doce Armênio Guedes

Ancelmo Gois | O Globo

O ex-ministro Eros Grau está lançando, pela Editora Globo, o livro “Nosso Armênio”, sobre Armênio Guedes (19182015), jornalista e que durante sessenta anos foi importante dirigente do antigo Partido Comunista. Figura querida, o livro relembra histórias desse baiano de Mucugê, por meio de amigos como Elio Gaspari, Juca Kfouri e Zelita Viana.