DEU EM O GLOBO
Desde José sabemos pelo Livro que há tempos de vacas gordas e tempos de vacas magras. Nos tempos de vacas magras não há necessidade de muita sabedoria. É no tempo das vacas gordas, portanto, que residem os perigos.
Um perigo tangível é a imprevidência.
Agir como a cigarra e não como as formigas ou, em versão mais elaborada, deixar de aproveitar os bons momentos para levar a boas transformações, fazer reformas, melhorar enfim.
Mas há também um perigo intangível e de consequências igualmente ruinosas quando finalmente chegarem as contas dos tempos mais difíceis: o pensamento fica obliterado pelo bem-estar generalizado e passa a pensar o futuro com as lanternas da popa. Em um país diagnosticado certa vez pelo genial Tom Zé como de “doentia autocomplacência”, pode ser tão perigoso como dirigir na estrada olhando apenas pelo retrovisor.
Os avanços da sociedade brasileira nos últimos 16 anos nas áreas econômica, social e institucional eram e continuam a ser dívidas do século XX. O desenvolvimento nos próximos anos e décadas depende de uma agenda distinta e de uma trama que será representada em um ambiente altamente competitivo.
No clássico “Formação econômica do Brasil”, Celso Furtado escreveu um capítulo com um nome que gerou uma expressão consagrada na historiografia econômica do século XX : o deslocamento do centro dinâmico.
Em suas palavras: “Ao manter-se a procura interna com maior firmeza que a externa, o setor que produzia para o mercado interno passa a oferecer melhores oportunidades de inversão que o setor exportador. Criase, em consequência, uma situação praticamente nova na economia brasileira, que era a preponderância do setor ligado ao mercado interno no processo de formação do capital.” A substituição de importações associada à urbanização e ao crescimento do mercado interno assegurou altas taxas de crescimento do PIB no Brasil por décadas. O modelo exauriu-se com a globalização acelerada e a revolução tecnológica das ultimas décadas do século passado e naufragou de vez com a leniência com o endividamento crescente e com a inflação.
Os anos de crescimento da economia mundial até a grande crise de 2008, somados à colheita dos frutos da abertura e modernização da economia e do êxito do combate à inflação e das políticas de responsabilidade fiscal e de inclusão social, permitiram a incorporação de vastos contingentes da população ao mercado interno, impulsionando o crescimento e dotando-o de resiliência frente aos impactos da crise mundial.
Mas é um grande equivoco imaginar que esse é o caminho para a sustentabilidade do desenvolvimento brasileiro. Essa é uma dívida com a agenda do século passado. A agenda macroeconômica até que tem sido objeto de debates, incluindo o indispensável aumento da taxa de poupança interna e as questões demográficas e previdenciárias.
Mas pouco tem sido observado sobre o verdadeiro desafio que está colocado para a competitividade da economia brasileira. Há um novo deslocamento do centro dinâmico. O dinamismo da economia brasileira, para além dos fatores conjunturais, dependerá de sua capacidade de enfrentar a mais ampla e acelerada transição tecnológica da história econômica : aquela que irá levar as sociedades desenvolvidas do planeta da civilização dos combustíveis fósseis à economia de baixo teor de carbono nas próximas décadas.
Para ser incisivo, cito as palavras de alguém muito mais conhecido pelo pragmatismo do que pela militância ambiental, o ex-ministro Delfim Netto: “É uma grande ilusão imaginar que o Brasil estará entre as cinco maiores economias do mundo na década atual se não realizar investimentos pesados num novo padrão de energia independente da utilização do petróleo” (“CartaCapital”, 15/01/2010).
A necessidade de evitar os piores cenários do aquecimento global, a firme disposição dos EUA e da União Europeia em conquistar segurança e maior autonomia energética e os custos ambientais crescentes da exploração das novas reservas de petróleo tornam a descarbonização da economia mundial uma solução robusta, sendo incerta, entretanto, a velocidade com que as decisões necessárias serão tomadas no plano global e nas economias nacionais.
O Brasil tem vantagens comparativas importantes, mas que dependem de muito trabalho, planejamento e conhecimento aplicado para que se tornem vantagens competitivas. O deslocamento do centro dinâmico do século XXI está visível no horizonte.
Saberemos pegar o bonde certo?
Desde José sabemos pelo Livro que há tempos de vacas gordas e tempos de vacas magras. Nos tempos de vacas magras não há necessidade de muita sabedoria. É no tempo das vacas gordas, portanto, que residem os perigos.
Um perigo tangível é a imprevidência.
Agir como a cigarra e não como as formigas ou, em versão mais elaborada, deixar de aproveitar os bons momentos para levar a boas transformações, fazer reformas, melhorar enfim.
Mas há também um perigo intangível e de consequências igualmente ruinosas quando finalmente chegarem as contas dos tempos mais difíceis: o pensamento fica obliterado pelo bem-estar generalizado e passa a pensar o futuro com as lanternas da popa. Em um país diagnosticado certa vez pelo genial Tom Zé como de “doentia autocomplacência”, pode ser tão perigoso como dirigir na estrada olhando apenas pelo retrovisor.
Os avanços da sociedade brasileira nos últimos 16 anos nas áreas econômica, social e institucional eram e continuam a ser dívidas do século XX. O desenvolvimento nos próximos anos e décadas depende de uma agenda distinta e de uma trama que será representada em um ambiente altamente competitivo.
No clássico “Formação econômica do Brasil”, Celso Furtado escreveu um capítulo com um nome que gerou uma expressão consagrada na historiografia econômica do século XX : o deslocamento do centro dinâmico.
Em suas palavras: “Ao manter-se a procura interna com maior firmeza que a externa, o setor que produzia para o mercado interno passa a oferecer melhores oportunidades de inversão que o setor exportador. Criase, em consequência, uma situação praticamente nova na economia brasileira, que era a preponderância do setor ligado ao mercado interno no processo de formação do capital.” A substituição de importações associada à urbanização e ao crescimento do mercado interno assegurou altas taxas de crescimento do PIB no Brasil por décadas. O modelo exauriu-se com a globalização acelerada e a revolução tecnológica das ultimas décadas do século passado e naufragou de vez com a leniência com o endividamento crescente e com a inflação.
Os anos de crescimento da economia mundial até a grande crise de 2008, somados à colheita dos frutos da abertura e modernização da economia e do êxito do combate à inflação e das políticas de responsabilidade fiscal e de inclusão social, permitiram a incorporação de vastos contingentes da população ao mercado interno, impulsionando o crescimento e dotando-o de resiliência frente aos impactos da crise mundial.
Mas é um grande equivoco imaginar que esse é o caminho para a sustentabilidade do desenvolvimento brasileiro. Essa é uma dívida com a agenda do século passado. A agenda macroeconômica até que tem sido objeto de debates, incluindo o indispensável aumento da taxa de poupança interna e as questões demográficas e previdenciárias.
Mas pouco tem sido observado sobre o verdadeiro desafio que está colocado para a competitividade da economia brasileira. Há um novo deslocamento do centro dinâmico. O dinamismo da economia brasileira, para além dos fatores conjunturais, dependerá de sua capacidade de enfrentar a mais ampla e acelerada transição tecnológica da história econômica : aquela que irá levar as sociedades desenvolvidas do planeta da civilização dos combustíveis fósseis à economia de baixo teor de carbono nas próximas décadas.
Para ser incisivo, cito as palavras de alguém muito mais conhecido pelo pragmatismo do que pela militância ambiental, o ex-ministro Delfim Netto: “É uma grande ilusão imaginar que o Brasil estará entre as cinco maiores economias do mundo na década atual se não realizar investimentos pesados num novo padrão de energia independente da utilização do petróleo” (“CartaCapital”, 15/01/2010).
A necessidade de evitar os piores cenários do aquecimento global, a firme disposição dos EUA e da União Europeia em conquistar segurança e maior autonomia energética e os custos ambientais crescentes da exploração das novas reservas de petróleo tornam a descarbonização da economia mundial uma solução robusta, sendo incerta, entretanto, a velocidade com que as decisões necessárias serão tomadas no plano global e nas economias nacionais.
O Brasil tem vantagens comparativas importantes, mas que dependem de muito trabalho, planejamento e conhecimento aplicado para que se tornem vantagens competitivas. O deslocamento do centro dinâmico do século XXI está visível no horizonte.
Saberemos pegar o bonde certo?
Nenhum comentário:
Postar um comentário