O Estado de S. Paulo
Onde há ambição pela Presidência, há maior coerência ideológica dos partidos
Partidos políticos brasileiros sempre foram
criticados por sua baixa definição ideológica e fraca aderência programática.
Suas campanhas, marcadas pelo personalismo, tendem a privilegiar conexões
diretas entre candidatos e eleitores, em detrimento de vínculos partidários
duradouros.
No entanto, tem-se observado uma inflexão:
partidos de direita vêm assumindo identidades ideológicas mais claras e
plataformas programáticas mais consistentes. Vêm se posicionando com mais
nitidez no espectro conservador e, cada vez mais, demonstram menor disposição
de negociar cargos e recursos em troca da diluição de seus princípios em
coalizões heterogêneas. O que explica essa mudança? A chave está na decisão
estratégica de disputar ou não a Presidência.
No presidencialismo multipartidário brasileiro, partidos que optam por lançar candidatura própria ao Planalto tendem a desenvolver um perfil ideológico mais definido. Ao buscar projeção nacional, são compelidos a oferecer programas de governo e a se diferenciar de seus concorrentes.
Em contraste, partidos que renunciam à
disputa presidencial e adotam uma estratégia estritamente legislativa têm
incentivos distintos. Coerência ideológica pode ser um fardo, não uma vantagem
– pois reduz sua flexibilidade para aderir a governos ideologicamente
distantes. Nesse contexto, ambiguidade programática torna-se uma estratégia
racional: permite manter portas abertas para futuras negociações.
A inelegibilidade de Jair Bolsonaro,
principal figura da direita, criou um vácuo que impulsiona os partidos
conservadores a se reposicionarem. Sem um candidato natural, abriu-se espaço
para o fortalecimento ideológico da direita – agora menos dependente da
liderança personalista e mais voltada à construção de plataformas próprias.
Já no campo da esquerda, a dominância do
presidente Lula tem interditado esse mesmo processo. Desde 1989, o PT tem
oferecido o candidato presidencial da esquerda. Com isso, os demais partidos
progressistas tornaram-se satélites do lulismo, com baixa autonomia
programática. Uma eventual saída de Lula da disputa em 2026 poderá alterar esse
quadro. Sem um candidato unificador, é provável que esses partidos abandonem
sua posição subalterna e passem a investir na construção de identidades mais
nítidas, inclusive com candidaturas próprias ao Planalto.
Disputar a Presidência define não só o
tamanho da ambição partidária, mas também o grau de coerência ideológica que o
partido irá adotar. No Brasil, a trajetória majoritária é a principal bússola
ideológica dos partidos. •
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