terça-feira, 15 de julho de 2025

Tríplice aliança pela reeleição tem contrapartida de Lula - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Reação interna de Lula para recompor forças passou por um encontro com Alexandre de Moraes

Donald Trump, Jair Bolsonaro e Tarcísio de Freitas uniram-se para reeleger Lula, mas a atuação da tríplice aliança teve contrapartida nacional. O pacote da reação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao tarifaço Brasil envolveu um freio de arrumação na sua relação com os Poderes que teve início algumas horas depois do anúncio do tarifaço de Trump.

Lula tratou de recompor o eixo depois do estranhamento provocado pela suspensão do decreto do IOF por Alexandre de Moraes. O ministro do Supremo Tribunal Federal foi recebido no Palácio do Alvorada, encontro sobre o qual nenhuma das partes se pronuncia.

Chegara aos ouvidos de Lula que sua opção pela ministra-substituta do TSE, Vera Lúcia Santana, para uma das duas vagas de titular em disputa, atendendo ao movimento negro, ao Prerrogativas e ao gabinete da primeira-dama, havia deixado o STF em polvorosa e o ministro Flávio Dino, ausente de Brasília na semana passada, particularmente preocupado.

Ex-chefe de Estela Aranha no Ministério da Justiça, Dino uniu-se à ministra Cármen Lúcia, presidente do TSE, a Moraes, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin e a quase toda a Esplanada para levá-la à Corte. A presença da ex-secretária de direitos digitais do Ministério da Justiça no TSE seria importante não apenas para a batalha de 2026 como para a manutenção da inelegibilidade de Jair Bolsonaro.

A nomeação de Estela Aranha e a recondução do ministro Floriano de Azevedo Marques, indicado de Moraes, para mais um mandato no TSE reequilibrou o jogo. O encaminhamento do IOF poderá sinalizar se o Executivo acumulou créditos na relação, mas o prumo se alinhou.

No dia seguinte, Gilmar Mendes autorizou o acesso aos celulares do deputado federal Júnior Mano (PSB-CE), cujas emendas são a ponta mais visível de uma investigação sobre a lavagem de dinheiro, via Congresso, do crime organizado.

No pacote de nomeações, a escolha da procuradora do MP de Alagoas, Marluce Caldas pacificou a política daquele Estado e abriu o caminho do deputado federal Arthur Lira (PP-AL) ao Senado. Dois dias depois, Lira apresentou o relatório para a reforma do IR com a taxação da alta renda.

Para arrematar a retomada da ofensiva governamental, Lula fechou a semana com a edição da medida provisória que cria um teto para os subsídios no setor elétrico invalidando parte dos jabutis que haviam sido inseridos pelo Congresso no marco das eólicas “offshore” (em alto mar).

Lula assumiu o comando da mesa do pôquer. Como o jogo tem o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), poderá ceder pontualmente, como no Ministério das Minas e Energia.

A mesa também tem o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), cuja condição de alvo da campanha petista “pobres x ricos” nas redes mostra o baixo cacife com o qual enfrenta este momento do jogo.

O espaço de Lira, que deixou o poder mas, além do futuro no Senado, mantém todos os cargos, Caixa e BB, entre eles, é um dos motivos de aborrecimento do sucessor. Motta herdou o cargo sem suas benesses e foi convencido pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI) a ir à luta.

É com este jogo reconfigurado que Lula deve receber Alcolumbre e Motta para uma conversa. Já não precisará gastar todo seu latim para conseguir a aprovação de projetos no Congresso. A expectativa do entorno presidencial é de que é sobre os parlamentares que recairá o ônus da não aprovação.

Tome-se, por exemplo, a MP do setor elétrico. Se não for aprovada, Lula poderá depositar o aumento da conta de energia no colo do Congresso sem ser contestado. Ou ainda o tema da vez, a inteligência artificial, que deu sinais de sair do berço esplêndido em que dormitava.

Se é verdade que as “big techs” foram, em última instância, a pressão mais decisiva para o tarifaço de Trump, sua atuação deve-se, em menor grau, à moderação de conteúdo exigida pelo STF e, mais decisivamente, à expectativa do que este precedente pode abrir para a inteligência artificial.

Este é, de fato, o grande foco da indústria de tecnologia americana, que ganhou todas nesse novo orçamento. Não vão conseguir desmontar o Estado, como pretendia Elon Musk, mas com o reforço do caixa do Departamento de Defesa, programas de cybersegurança, o uso softwares no planejamento de deportações e drones militares, serão vitaminados.

Antes mesmo do tarifaço, as “big techs” já atuavam no Congresso Nacional, pressionando empresários de “datacenters” (processadores de dados) e eólicas por outra tríplice aliança contra a regulamentação da inteligência artificial. O discurso é de que, se o setor for regulamentado não haverá investimento em “datacenters”, cujo provimento de energia e transmissão de dados se daria por eólicas.

O problema é que agora o Congresso, que se viu atingido pela propaganda governista, feita por inteligência artificial, passou a se interessar por uma regulamentação do tema. O que acabou por jogar água no moinho de Lula.

Está claro que o vice Geraldo Alckmin, com o protagonismo nesse enfrentamento do tarifaço, ganha força para permanecer na chapa da reeleição. O PT pressiona para que dispute São Paulo, ampliando a votação de Lula no Estado e abrindo a chapa para composição.

Sua presença na chapa manteria viva a ideia da frente ampla, que respirava por aparelhos quando foi resgatada pela tríplice aliança, mas nunca se pode desprezar a capacidade de o governo remar contra uma maré a favor.

 

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