O Globo
Meio profeticamente, antes das eleições,
previ que nos livraríamos do horror e cairíamos na mediocridade
O Brasil de hoje me entristece. Macunaíma
sentiria apenas preguiça. Os grandes escândalos de corrupção se sucedem. É
triste ver os velhos roubados por entidades-fantasmas, com descontos em sua
aposentadoria, roubados nos empréstimos consignados, cartão de crédito e quase
roubados com a promessa de devolução rápida do dinheiro roubado.
Viramos o paraíso do estelionato. Neste momento, recebo ligações com a voz da assistente digital do banco, falando de uma absurda compra numa loja de construção. Disque 1 para confirmar, dois para rejeitar. Disco coisa nenhuma porque sei que é golpe. Nas cadeias e nas ruas, centenas de golpistas inventam formas de lesar. Tenho amigos que perderam suas economias. Os bancos são implacáveis, não devolvem 1 centavo.
O espectro de golpes é tão amplo que há
listas deles na internet, desde as falsas centrais de atendimento até falsos
motoboys. Eu mesmo já comprei um tênis para presentear a filha: jamais chegou.
Leio que a indústria hoteleira está alarmada
com os golpes de falsas reservas em hotéis. Só em São Paulo foram R$ 25 bilhões
perdidos, diz a notícia. Isso sem contar as passagens de avião baratas que você
compra e não vai a lugar nenhum: golpe.
O Congresso maneja bilhões em emendas, e
muitas delas são ainda secretas. Os juízes ganham mais que o teto legal de
salários, e o presidente viaja com volumosas comitivas pelo mundo. Nos últimos
dias, esteve ao lado de Putin, que invadiu e massacra a Ucrânia, que envenena
opositores, que persegue gays, que apoia os partidos de extrema direita na
Europa.
Há um lado positivo a consignar: o ministro
Haddad tenta atrair centrais de dados para o Brasil, oferecendo energia barata
e sustentável. Haddad fala num futuro verde e digital, felizmente.
Subimos cinco posições na pesquisa sobre IDH
no mundo. Ainda estamos atrás de México, Colômbia, Chile, Peru, Argentina e
Uruguai. Batemos Bolívia e Venezuela. Estamos estagnados no quesito educação.
A política em Brasília, esta entristece e dá
preguiça. Lula trocou um desconhecido ministro das Comunicações por outro
desconhecido. O primeiro era conhecido demais pela polícia. Trocou o Lupi
acusado de omissão na Previdência pelo secretário executivo do Ministério,
encarregado de executar a omissão.
Às vezes, penso em me tornar cronista
esportivo, apesar da idade. Mas há escândalos na CBF, golpes nas apostas, e o
futebol brasileiro me parece pouco intenso e burocrático. Não há para onde
escapar. A direita, com tantos erros do governo, pode ganhar força e reassumir.
Uma terceira força dificilmente quebra a polarização. O mais provável é que
Lula continue até 2030, tem recursos políticos e saúde para isso.
Eu é que não tenho. Não suporto ver o país
tão distante de seu potencial. Analisar a política é tirar leite das pedras.
Não há o que analisar, exceto contar segredinhos de bastidores. Não me
interessa a intimidade de pessoas que, na maioria, considero tediosas e pouco
inspiradas.
Com tantos golpes, ainda não roubaram
totalmente minha esperança. Resta a poesia capaz de fazer nascer uma flor no
asfalto. Meio profeticamente, antes das eleições, previ que nos livraríamos do
horror e cairíamos na mediocridade.
Os governistas não precisam comer meu fígado
por essa profecia. O Brasil se configura de tal forma, são tantas as seduções
do poder que é fácil se julgar realizando uma tarefa histórica, quando se está
apenas navegando no pântano.
Quem vencer em 2026 encontrará todos estes
probleminhas pela frente: a Justiça continuará muito dispendiosa, o Congresso
se perpetuará apoiado nos bilhões das emendas, a educacão continuará empacada,
o crime organizado mais forte e a epidemia de golpes revitalizada pela
inteligência artificial.
Ainda bem que não desistimos nunca.
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