Toffoli tornou a conta da fraude no INSS ainda maior
O Globo
Além de contribuinte arcar com custo da
roubalheira, exclusão dos gastos do arcabouço deteriora contas públicas
É justo que os aposentados e pensionistas lesados no escândalo do INSS sejam ressarcidos dos descontos indevidos. Mas foi um erro o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, ter autorizado que a despesa fique fora dos limites do arcabouço fiscal — como se não representasse mais gastos para um governo que se revela incapaz de controlar suas despesas. Na quinta-feira, ele homologou o acordo de ressarcimento proposto pelo governo federal. Embora a decisão tenha efeito imediato, ainda será analisada pelo plenário da Corte.
A estimativa do Planalto é que a devolução
comece de forma escalonada em 24 de julho, para 1,5 milhão de beneficiários que
sofreram descontos não autorizados entre março de 2020 e março de 2025, com
valores corrigidos pela inflação. O INSS diz ter recebido 3,6 milhões de
contestações de segurados. Em 2,16 milhões, os sindicatos e entidades
associativas acusados das fraudes nem sequer responderam, por isso o
ressarcimento será imediato. Em 828 mil casos, as entidades apresentaram
documentos que dizem comprovar a autorização, mas há denúncias de que essa
documentação também pode ter sido fraudada, por isso ela está sob análise.
Não se sabe o total da devolução. O ministro
da Fazenda, Fernando Haddad, estima que fique em R$ 2 bilhões. Não está claro
também de onde virão os recursos. A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu à
Justiça o bloqueio de bens de entidades e responsáveis acusados das fraudes. A
operação da Polícia Federal que expôs a roubalheira apreendeu carros de luxo,
joias, quadros e outros bens. Mas decerto não serão suficientes para cobrir o
ressarcimento e, ainda que fossem, seu uso com esse fim dependeria de processos
morosos, enquanto a devolução aos lesados tem de ser imediata.
Os aposentados são os únicos inocentes na
história. Muitos nem tinham noção dos descontos ilegais. Segundo as
investigações, as entidades associativas fraudaram documentos para justificar
os descontos, e o INSS foi logrado. Isso aconteceu desde antes de 2019, mas
ganhou vulto no governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando sindicatos
inescrupulosos se sentiram à vontade para aproveitar o esquema. Não dá para
dizer que o governo tenha sido surpreendido. São inúmeros os relatos de que
autoridades foram alertadas sobre o comportamento atípico dos descontos
associativos, que cresciam havia anos sem explicação. A despeito dos avisos, o
INSS não agiu para interromper o descalabro. O escândalo levou à queda do
ministro da Previdência, Carlos Lupi, e do então presidente do INSS, Alessandro
Stefanutto.
As demissões não resolvem o rombo no bolso dos aposentados, por isso é justo que o governo — responsável final pelo processamento e pagamento de pensões e aposentadorias — providencie a devolução. Mas o Planalto deveria tirar o dinheiro de outras despesas. Infelizmente, a resistência do governo a promover cortes ou adotar medidas estruturais que contenham os gastos públicos leva à tentativa de excluir todo tipo de despesa extraordinária das regras fiscais. Com sua decisão, Toffoli endossa a incúria. Como não dispõe de recursos — dentro ou fora do arcabouço —, o Tesouro terá de ir ao mercado tomar mais dinheiro emprestado, pressionando juros já nas alturas. Os contribuintes acabarão arcando com o custo da roubalheira duas vezes: no ressarcimento e na dívida mais alta.
Decisão de Moraes traz oportunidade para resolver conflito em torno do IOF
O Globo
Ao suspender decretos do Executivo e do
Legislativo, ministro abre caminho para pacificação entre os dois Poderes
Foi sensata a decisão do ministro Alexandre
de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF),
no impasse envolvendo Palácio do Planalto e Congresso Nacional em torno do
aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Em despacho publicado
nesta sexta-feira, Moraes determinou a suspensão dos decretos do Executivo
elevando alíquotas do imposto e do Legislativo revogando as medidas. O IOF
permanece como antes do aumento.
O maior mérito da decisão é contribuir para
apaziguar os ânimos no confronto entre os Poderes. A escalada institucional só
prejudica o Brasil. Moraes designou uma audiência de conciliação para o próximo
dia 15, com as presidências da República, do Senado, da Câmara, além de
Procuradoria-Geral da República, Advocacia-Geral da União (AGU)
e partes envolvidas. Somente depois dessa audiência ele analisará se mantém a
liminar, que ainda será submetida ao plenário da Corte.
Moraes agiu corretamente ao adotar o melhor
caminho para superar o impasse: a conciliação. O vaivém do IOF, disse ele,
causou “indesejável embate entre as medidas do Executivo e do Legislativo”. O
recado parece ter surtido efeito. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB),
elogiou a decisão, dizendo que ela “evita o aumento do IOF em sintonia com o
desejo da maioria do plenário da Câmara
dos Deputados e da sociedade”. Afirmou ainda estar aberto ao diálogo.
O advogado-geral da União, Jorge
Messias, afirmou valorizar a proposta.
A relação entre Executivo e Legislativo se
deteriorou depois que a Câmara derrubou o decreto do presidente Luiz
Inácio Lula da
Silva aumentando o IOF. O governo pretendia arrecadar R$ 10 bilhões com a
iniciativa e não esperava tal reação, com voto contrário de vários
parlamentares da base aliada. A resposta foi pior: a AGU entrou com ação no
Supremo pedindo que o decreto fosse declarado constitucional. O Legislativo viu
a atitude como afronta.
Em meio ao clima beligerante, as redes
sociais foram inundadas de vídeos com o objetivo de atacar o Congresso, em
especial Motta. Diante da crise, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi
Hoffmann, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), e o
líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), tiveram de vir a público
repudiar os ataques.
Não interessam ao Brasil esses confrontos,
principalmente quando agravados pela guerra suja que antecipa o clima
eleitoral. O país atravessa uma crise fiscal crítica. Qualquer saída pra a
crise precisa ser pensada em conjunto. Planalto, Câmara e Senado deveriam
articular medidas sensatas para tirar o país do buraco. Aumentar impostos não é
uma delas. A sociedade já está sobrecarregada de tributos. Moraes apontou o
caminho viável e, mais que isso, demonstrou que o Judiciário também sabe ser
comedido quando necessário. Executivo e Legislativo já conseguiram feitos
notáveis em conjunto, como a aprovação da reforma tributária, empacada havia
décadas. Para haver convergência, só é preciso que os Poderes demonstrem
disposição política e abertura ao diálogo.
Agruras da política externa de Lula
Folha de S. Paulo
Brasil evita diálogo com Milei e cúpula do
Brics se esvazia; diplomacia expõe cacoete ideológico e ignora cenário global
A esquiva de Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) ao diálogo
com o argentino Javier Milei,
como se viu na reunião de cúpula do Mercosul na
quinta (3), não é de interesse do país.
Tal comportamento não é um ponto fora da
curva da política externa brasileira, que agora tem pela frente um encontro
do Brics esvaziado
de lideranças neste final de semana no Rio de Janeiro.
Seria difícil imaginar diretriz coerente para
a diplomacia do país após os dois mandatos problemáticos de Lula na seara
internacional. A reedição da política "ativa e altiva" poderia ao
menos levar em conta a conjuntura mundial diversa e munir-se de prudência. Não
é o que acontece.
Lula deixou Buenos Aires sem ao menos uma
conversa reservada com Milei, sabidamente resistente ao diálogo. Preferiu afrontar
o anfitrião com uma visita a sua aliada de longa data, a ex-presidente
Cristina Kirchner, ícone da oposição peronista que cumpre pena em prisão
domiciliar após ser condenada por gestão fraudulenta em novembro.
A afonia bilateral só fomenta a discórdia
entre as duas economias mais integradas da região. Na cúpula, o Brasil pode ter
contentado a Casa Rosada ao acatar a ampliação da lista de exceções da união
aduaneira. Mas faltou entendimento sobre a incerta preservação da Argentina no
bloco.
Na condição de presidente do Mercosul neste
semestre, Lula não facilita o cumprimento da promessa de efetivar o acordo
comercial com a União
Europeia. A fragilidade da união aduaneira e a ameaça de debandada de
Buenos Aires podem municiar os europeus contrários ao tratado.
Menos promissora mesmo parece a reunião do
Brics, fórum criado com ajuda do empenho do petista a partir de uma
perspectiva ideológica obsoleta baseada em antiamericanismo. Não à
toa, o grupo é visto como antagonista ao Ocidente.
O cenário convulsivo no Oriente Médio e
descompassos nas agendas podem justificar o esvaziamento —além, é claro, da
ordem internacional de prisão contra o russo Vladimir
Putin. Não explicam, porém, a ausência de Xi Jinping.
A China,
maior economia do bloco, prioriza neste momento a contenção de atritos
comerciais com os Estados
Unidos.
Não passa despercebida a complacência do
Brasil com Moscou —incoerente
com sua condenação à invasão russa da Ucrânia— e com
o Irã,
teocracia que desafia a aversão brasileira à proliferação de armas nucleares.
Tampouco são ignoradas a crescente diluição
do diálogo com os EUA e a resistência em recompor relações com Israel, canal
indispensável até mesmo para atuar em favor dos palestinos.
Não deixa de ser sintomático que o Itamaraty tenha
caído no ridículo, nesta semana, de contestar
formalmente um texto da revista britânica The Economist sobre
a distância entre as ambições da política externa de Lula e sua real
importância no mundo. É exatamente o que está sendo demonstrado agora.
Sensatez de Barroso
Folha de S. Paulo
À Folha, presidente do STF aponta que excesso
de proteção prejudica trabalhadores quando impede criação de vagas formais
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministro Luís
Roberto Barroso, dá mostra de sensatez ao apontar a necessidade de adaptar
a legislação trabalhista às transformações tecnológicas e sociais, sem perder
de vista a proteção aos trabalhadores.
Em
entrevista ao C-Level, videocast da Folha, o magistrado argumentou que
a figura do empregado celetista, com jornada de oito horas, carteira assinada e
benefícios tradicionais não é a única realidade. Cumpre considerar outras
modalidades, casos do empreendedorismo individual e de empregos temporários,
que exigem contratos mais flexíveis.
A reforma
trabalhista de 2017, chancelada pelo STF, foi um marco nesse processo.
Embora não se possa afirmar causalidade plena, é digno de nota que tem se
mantido robusta a criação de empregos —graças também, é claro, ao bom ritmo de
crescimento econômico após a pandemia. A taxa de desocupação, de 6,2%, está nos
menores patamares da série iniciada em 2012.
Tal contexto sugere que a flexibilização de
regras, como a permissão da terceirização em
atividades-fim e a regulamentação do trabalho intermitente, contribuiu para a
geração de empregos.
Barroso, com razão, defende que a
terceirização regulamentada e fiscalizada é preferível a práticas informais que
operam à margem da lei. E também reconhece que o excesso de proteção, por bem
intencionada que seja, pode desproteger quando impede a criação de vagas
formais.
Em vez de retroceder a normas arcaicas, o
desafio é como oferecer seguridade
a trabalhadores de plataformas digitais, como motoristas de aplicativos e
entregadores, e outras atividades com relação contratual mais fluida.
Há sempre duas variáveis nessa equação
—empresas que agem de má-fé e portanto devem ser penalizadas, de um lado, e
do outro a indústria de processos que infelizmente ainda tem guarida
excessiva na Justiça do Trabalho.
A alta litigiosidade nessa área, com 3,45
milhões de ações em 2024, mesmo depois da reforma, eleva custos para
empregadores e desincentiva contratações formais. Medidas como a homologação
judicial de acordos de rescisão celebrados pelas partes buscam reduzir
controvérsias, protegendo bons empregadores e promovendo segurança jurídica.
O aperfeiçoamento da legislação precisa
continuar, sem abrir mão de proteções fundamentais e em busca de solucionar
questões como a contribuição à Previdência
Social. Velhos tabus dos primórdios da octogenária CLT, felizmente, vão
sendo superados.
Não há paz fora do império da lei
O Estado de S. Paulo
Tarcísio erra ao defender, em nome da
‘pacificação’, a anistia aos golpistas eventualmente condenados. A paz só
existe quando os que atentam contra a democracia são devidamente punidos
O governador de São Paulo, Tarcísio de
Freitas (Republicanos), decidiu comparecer à mais recente manifestação
convocada por Jair Bolsonaro sob o mote “Justiça já”. Não nos interessa aqui
comentar a conveniência política do sr. governador, que decerto tem suas razões
para, mais uma vez, deixar-se associar a um réu em ação penal que, se condenado
pelos gravíssimos crimes dos quais é acusado pela Procuradoria-Geral da
República (PGR), pode passar muito tempo atrás das grades. Bem mais importante
é apontar para a falaciosa associação feita por Tarcísio de Freitas entre o
ideal de paz e uma eventual anistia aos golpistas.
Do alto do carro de som na Av. Paulista, no
dia 29 passado, o governador de São Paulo afirmou que estava ali para “pedir
anistia e pacificação”. Sob aplausos de uma base bolsonarista escassa, porém
radicalizada, Tarcísio de Freitas vocalizou a retórica da conciliação nacional.
Na prática, contudo, o que defendeu foi a impunidade para todos os que, segundo
a PGR, teriam tramado um golpe de Estado em 2022 que previa até o assassinato
do então presidente eleito, Lula da Silva, entre outras autoridades. Se esse
comportamento se alinha às pretensões eleitorais do governador, o tempo irá
dizer. Para a biografia de quem pretende ser visto como um genuíno democrata,
porém, o sinal emitido não poderia ser pior.
Desde o início da Ação Penal 2.668, no
Supremo Tribunal Federal (STF), a defesa da anistia passou a ser
instrumentalizada por aqueles que buscam apagar os fatos que precederam o
infame 8 de Janeiro. Sob a aparência de um gesto nobre, magnânimo, esconde-se
uma manobra perigosa para encobrir o real objetivo de seus defensores: a
impunidade dos que tramaram contra o Estado Democrático de Direito no País e a
consequente reabilitação jurídica e política de Bolsonaro. É disso que se
trata, não de “paz”.
O instrumento constitucional da anistia serve
para extinguir a punição por crimes de caráter político, e de fato seu espírito
é promover a pacificação do País em momentos de profunda crise política e
social. Definitivamente, no entanto, esse não é o caso do atual momento. Salvo
na cabeça desmiolada dos bolsonaristas radicais, não há crise que justifique o
apagamento dos malfeitos de Bolsonaro e sua trupe. A despeito dos percalços de
sempre, vivemos em plena democracia – que só foi perturbada quando o bolsonarismo
rosnou diante da vitória de Lula da Silva na disputa presidencial de 2022. Ou
seja, não cabe falar em anistia nesse caso. Ao contrário. Se estivesse
interessado realmente em pacificação, Tarcísio defenderia a punição exemplar
dos golpistas.
No caso específico dos réus da Ação Penal
2.668, paz não é anistia, paz é justiça. Os únicos instrumentos de que o regime
democrático dispõe para se proteger dos ataques de seus inimigos são a força e
a efetividade das leis e a punição, após o transcurso do devido processo legal,
de qualquer cidadão que delas se desvie. Vale dizer, anistiar os eventuais
condenados pelo STF por tentativa de golpe de Estado, entre outros crimes, é
sinalizar que o regime das leis eventualmente pode ser atacado por meios violentos.
Em que lugar do mundo isso pode ser associado à mera ideia de paz?
Paz não é conceder aos que tentaram tomar à
força aquilo que não conquistaram pelo voto. Paz não é esquecimento. Paz é a
certeza de que nenhum projeto de poder está acima da Constituição e só poderá
ser levado a cabo se legitimado pela supremacia da vontade popular. O
fortalecimento da democracia brasileira depende fundamentalmente dessa
compreensão.
Mais bem dito: tanto mais perto da paz social
o País estará quanto mais capazes forem as instituições republicanas de
responsabilizar cada um dos que a ameaçaram em nome de seus delírios de poder.
É nisso que consiste a verdadeira pacificação. Não em esquecer, mas em lembrar
para que jamais uma aventura liberticida desse jaez se repita. Não há
estabilidade política, social e econômica sem justiça. E não haverá paz nem
justiça sem respeito às leis e à Constituição.
Driblar o Orçamento é vocação petista
O Estado de S. Paulo
Governo Lula quer ampliar atendimento médico
especializado, uma medida louvável, mas, de novo, ignora o Congresso e o
arcabouço fiscal ao turbinar gastos fora das regras republicanas
O governo Lula da Silva anunciou recentemente
que hospitais privados e filantrópicos que queiram aderir ao Programa Agora Tem
Especialistas poderão abater até 50% das dívidas que possuem com a União. A
ideia é recuperar parte dos R$ 34 bilhões devidos por essas instituições com a
prestação de serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS) até 2030. Serão gerados
créditos de R$ 2 bilhões por ano para atendimento nas áreas de oncologia,
ginecologia, cardiologia, ortopedia, oftalmologia, otorrinolaringologia e saúde
da mulher.
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha,
revelou, em entrevista exclusiva ao Estadão, que os planos de saúde também
poderão trocar suas dívidas com a União para atender à demanda do SUS, no
montante de até R$ 2,5 bilhões. Essas dívidas, que surgem quando um cliente de
uma operadora é atendido na rede pública, hoje somam R$ 9 bilhões. O governo
está de olho nesse dinheiro para turbinar o programa que pode, na avaliação de
aliados, ajudar a estancar a crise de popularidade.
O Agora Tem Especialistas é uma promessa de
campanha e visa a ampliar a oferta de consultas, exames e cirurgias. Embora o
governo não tenha divulgado dados sobre a demanda reprimida, algo necessário
quando se discute, elabora e executa uma política pública, não restam dúvidas
de que a população carece desse atendimento no SUS, uma vez que apenas 10% dos
especialistas trabalham exclusivamente na rede pública. A iniciativa é
meritória. O problema é que, para contornar esse cenário de filas, o governo
lulopetista recorreu a uma estratégia bastante arriscada.
De acordo com Padilha, o programa vai
mobilizar R$ 16 bilhões, já consideradas as verbas do Orçamento destinadas ao
Ministério da Saúde e os valores abatidos das dívidas de hospitais e planos de
saúde. Para isso, o presidente Lula da Silva assinou recentemente uma medida
provisória (MP), subscrita também pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a
fim de “legalizar” esse desenho do programa.
O governo cria um instrumento que amplia na
prática os recursos para a pasta da Saúde sem submeter essa decisão ao processo
orçamentário, que inclui a elaboração de uma proposta de lei bem mais complexa
do que uma MP. Isso ocorre porque o atual governo, além de ser fraco
politicamente, tem uma dificuldade imensa para cortar gastos. Optou-se pela
“criatividade fiscal”, como escreveu o pesquisador associado do Insper Marcos
Mendes, em recente coluna no jornal Folha de S.Paulo.
De acordo com Mendes, os hospitais serão
pagos com um “vale” em troca da quitação das suas dívidas sem que consultas,
exames e cirurgias entrem na conta de “serviços médicos” no Orçamento, em um
evidente drible também ao arcabouço fiscal, que, em tese, deveria resultar em
alguma racionalidade às contas públicas. O arcabouço, cujo objetivo final é
frear a trajetória de alta da dívida pública, será maquiado.
Trata-se de uma manobra na âncora fiscal, o
que infelizmente tem se mostrado recorrente no governo lulopetista. São
inúmeras as iniciativas de criatividade fiscal adotadas, a exemplo do que já
foi visto no passado com as pedaladas fiscais de Dilma Rousseff. A reincidência
no erro é método, do contrário o atual governo não teria driblado o Orçamento,
e por consequência o arcabouço fiscal, ao lançar o Pé-de-Meia, ao socorrer o
Rio Grande Sul das enchentes nem ao usar dinheiro da Usina de Itaipu para bancar
obras da COP-30 em Belém, a milhares de quilômetros de Foz do Iguaçu, no
Paraná. Sem contar as manobras com o dinheiro de fundos públicos ou privados
que nunca volta ao Tesouro.
Sem dinheiro para gastar, sem prioridade para
governar na escassez, sem critério para cortar o que não dá resultado e sem
competência para escolher o que é importante para o Brasil, a gestão
lulopetista repete os erros pretéritos, aprofunda a deterioração das contas
públicas e oferece serviços tardios e precários à população. Pode até dar voto,
mas é péssimo para o País.
Licença para matar
O Estado de S. Paulo
Movida pelo populismo penal, comissão do
Senado amplia hipóteses de legítima defesa
A Comissão de Segurança Pública, do Senado,
aprovou recentemente dois projetos de lei que ampliam as hipóteses da legítima
defesa. Um deles inclui um dispositivo no Código Penal que concede esse direito
a policiais que agirem em um conflito armado ou na iminência de um confronto. O
outro diz que os donos de imóveis poderão reagir com o uso de arma de fogo em
casos de invasão de sua propriedade, estando autorizados, inclusive, a
espalharem armadilhas, em uma espécie de ação preventiva, mas não menos letal.
A atual legislação, em vigor desde os anos
1940, prevê duas hipóteses pelas quais os agentes das forças de segurança ou os
cidadãos podem invocar esse direito. Segundo o Código Penal, configura-se a
legítima defesa quando uma pessoa usa moderadamente os meios necessários para
afastar uma injusta agressão a um direito seu ou de uma outra pessoa, ou quando
um policial age para repelir agressão ou risco de agressão a um refém.
São duas hipóteses bastante amplas, que, por
óbvio, não se reduzem a duas situações. Na prática, elas são capazes de abarcar
infinitas possibilidades de casos concretos que batem à porta da Justiça, desde
um tiroteio entre policiais e bandidos que resulta na morte de um criminoso até
a reação de um dono de uma casa ou um sítio a uma invasão em que o agressor
acabe morto. Mas há senadores insatisfeitos, entre eles os autores das
iniciativas, Wilder Morais (PL-GO) e Carlos Viana (Podemos-MG), e o relator dos
dois projetos e presidente da comissão, Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
É de questionar por que os senadores
elaboram, discutem e aprovam projetos cujos regramentos já estão previstos na
lei penal. Ao discursar, Flávio Bolsonaro esclareceu suas intenções. Segundo
ele, quem tem o domicílio violado, “ao repelir com força letal a invasão”,
protegerá seu patrimônio e a vida das pessoas que estão no local. O relator
afirmou ainda que “não se pode deixar que o policial, cumprindo seu dever,
atuando em nítida legítima defesa, venha a ser injustamente investigado,
processado e até mesmo punido”.
Não há notícia de que a lei ou a Constituição
tenham dado carta-branca para quem quer que seja matar. No Estado Democrático
de Direito, ninguém está acima da lei de modo que possa se esquivar de
responder por seus atos perante a Justiça. Todos os cidadãos e todos os agentes
do Estado podem ter seus atos escrutinados, submetendo-se a investigações,
processos e eventuais punições. Por óbvio, tudo isso deve ocorrer respeitando o
devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, que são direitos e garantias
fundamentais.
Projetos de lei como esses aprovados na Comissão de Segurança Pública servem apenas para disseminar o populismo penal, cuja sanha punitivista confunde justiça com sede de vingança. Seria melhor que ficassem esquecidos em algum escaninho do Congresso, mas é bem mais provável que prosperem, porque abundam parlamentares para os quais a solução para a segurança pública é dar aos policiais e aos cidadãos liberdade para matar.
Investigação sobre preço de combustíveis precisa ser levada a sério
Correio Braziliense
É fundamental que o pedido da Advocacia-Geral
da União (AGU) para apuração da nova suspeita de práticas anticoncorrenciais no
preço dos combustíveis não seja apenas um gesto simbólico.
A recente redução nos preços do petróleo e
dos derivados anunciada pela Petrobras deveria ter proporcionado alívio
imediato ao bolso do consumidor, mas não é o que acontece. Os valores
praticados nas bombas de combustíveis seguem em patamar elevado em diversas
regiões do país, em especial no Distrito Federal. E a discrepância entre os
preços na refinaria e nas bombas levanta sérias dúvidas sobre a existência de
práticas anticoncorrenciais no setor de distribuição e revenda de combustíveis.
Trata-se de uma prática recorrente. Em março
de 2024, a Petrobras anunciou uma redução de R$ 0,30 no litro do diesel A,
aquele derivado diretamente do processo de refino do petróleo, ainda sem adição
de biodiesel. Na bomba, em várias capitais, a queda foi inferior a R$ 0,10 — e,
em alguns postos, não houve redução alguma. Alegaram estoques antigos com
preços mais altos. Em junho de 2023, a Petrobras havia reduzido a gasolina em
R$ 0,14 por litro nas refinarias. Em Belo Horizonte e Brasília, por exemplo,
postos mantiveram os preços inalterados por mais de 10 dias, apesar das
notificações dos Procons.
O mesmo tipo de prática ocorreu quando houve
redução do ICMS dos combustíveis a 17%, em junho de 2022, quando os preços
deveriam ter sido reduzidos em R$ 1,00 por litro. Também nas safras recordes de
etanol em 2023, o preço nas usinas de São Paulo caiu 20%, mas, nas bombas, a
redução não passou de 8%.
Defasagens podem ter causas legítimas, como
logística ou estoques antigos, mas sua repetição sistemática e o padrão de não
repasse imediato sugerem mecanismos de retenção de margem, concentração de
mercado ou práticas anticoncorrenciais, especialmente quando se observa
uniformidade de preços entre concorrentes locais. Esses exemplos reforçam a
urgência de ação coordenada dos órgãos públicos para proteger o consumidor e
garantir que as quedas anunciadas cheguem, de fato, ao bolso da população.
É fundamental que o pedido da Advocacia-Geral
da União (AGU) para apuração da nova suspeita de práticas anticoncorrenciais no
preço dos combustíveis não seja apenas um gesto simbólico. A Polícia Federal
(PF), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), os Procons e demais
órgãos competentes precisam agir com celeridade e rigor, especialmente em
regiões em que há histórico de suspeitas de cartelização, como o Distrito
Federal. Não é a primeira vez que se levanta a hipótese de conluio entre postos
para manipular preços em prejuízo direto à população.
A transparência na formação dos preços de
combustíveis é vital para a credibilidade do mercado e para a proteção dos
consumidores. A omissão das autoridades apenas perpetua um ciclo de abusos que
compromete a confiança pública e agrava os efeitos da inflação sentida nas
famílias brasileiras. A atuação coordenada entre os órgãos de controle é não só
desejável, mas urgente.
Também é papel do Congresso Nacional propor medidas que ampliem a concorrência e a fiscalização no setor, reforçando o marco regulatório e garantindo meios para evitar a concentração indevida do mercado. O consumidor, já pressionado por uma carga tributária elevada e pelos custos de vida crescentes, não pode ser feito refém de práticas lesivas.
Mais agilidade para julgar crimes contra as
mulheres
O Povo (CE)
Uma fisioterapeuta de Várzea Alegre relatou,
em uma rede social, as agressões que sofreu do ex-companheiro: "Foram
horas de tortura, minha roupa rasgada, faca nas minhas partes íntimas, socos e
enforcamentos"
A Semana Estadual do Júri, realizada pelo
Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), em sua oitava edição, terminou com um
saldo de mais 170 casos julgados e outros 70 marcados para datas próximas. A
iniciativa busca conferir celeridade aos processos, tendo como prioridade os
casos de agressões contra as mulheres e feminicídio. Quanto a esse tipo de
crime, foram 15 julgamentos, mas o TJCE não deu informações sobre a quantidade
de condenações.
A iniciativa dá continuidade às ações que
o TJCE mantém para combater a violência contra a mulher, reforçadas a
cada gestão. É uma atividade importante para imprimir rapidez aos julgamentos e
pela divulgação alcançada, tornando-se exemplo de que a violência de gênero não
resultará impune. Assim, seria importante que o tribunal fornecesse informações
mais detalhadas sobre os resultados da campanha.
Na ocasião da posse dos novos dirigentes do
Tribunal de Justiça, no início do ano, o desembargador Heráclito Vieira, que
assumia a presidência, foi enfático ao dizer que sua administração daria
atenção especial aos casos de violência de gênero.
De fato, esse é um tema de relevância, que
precisa de ações rápidas para pôr fim à barbárie que atinge as mulheres, que
não se sentem segurança nem em suas próprias casas. Para isso, a necessidade de
investigações e julgamentos céleres.
Em nove estados monitorados pela Rede de
Observatórios da Segurança verificou-se que, a cada 17 horas, uma mulher morreu
em razão do gênero em 2024. Os estados verificados são: Amazonas, Bahia, Ceará,
Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo, nos quais foram
registradas 531 vítimas de feminicídios no ano passado.
Em 75,3% dos casos, os crimes foram cometidos
por pessoas próximas da vítima. Considerando-se somente parceiros e
ex-parceiros, o índice é de 70%. Nessa lista de brutalidades, o Ceará
ocupa a terceira posição, com 297 agressões e 45 feminicídios, tendo à frente
Amazonas e Bahia.
Um caso, que veio à tona esta semana,
demonstra a selvageria desse tipo de crime. Uma fisioterapeuta de Várzea
Alegre relatou, em uma rede social, as agressões que sofreu do
ex-companheiro: "Foram horas de tortura, minha roupa rasgada, faca nas
minhas partes íntimas, socos e enforcamentos". Felizmente, ela conseguiu
escapar com vida.
O agressor, vereador Maiko do Chapéu,
voltou à Câmara depois de cumprir afastamento de 60 dias, determinado pela
Comissão de Ética. Essa inaceitável tolerância corporativa, com um
comportamento de tamanha gravidade, é um incentivo à violência. Submeter o
vereador a um julgamento rápido, aplicando todo o rigor que a lei permite,
ajudaria a reparar o erro parlamentar.
Esse fato destaca a importância do projeto do TJCE, em dar agilidade aos processos que envolvem violência contra a mulher.
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