O Globo
Tributos aumentam porque gastos aumentam. O
governo federal bate recordes de arrecadação, e ainda falta dinheiro
O assunto está certo: o desastroso sistema tributário brasileiro. O debate tem muita coisa errada. Começando pelo IOF, Imposto sobre Operações Financeiras. Os ricos certamente pagam IOF quando compram um carrão importado ou torram uma nota no cartão de crédito internacional. Logo, aumentar esse imposto é uma medida de justiça tributária, certo? Errado. Quem está enrolado numa dívida de R$ 300 no cartão de crédito também paga IOF. Ou quem compra uma blusinha no cartão de débito também morre com imposto.
No geral, o IOF incide sobre as operações de
crédito. Logo, aumentar esse imposto prejudica quem está endividado, certo?
Certo. E quem está mais endividado? Os mais pobres. Alguns dados, recolhidos de
pesquisa da Confederação Nacional do Comércio: entre as famílias na faixa de
renda de 0 a três salários mínimos, 81% estão endividadas. Entre quem ganha
acima de dez salários mínimos por mês, 67% têm dívidas. E entre os que têm
dívidas atrasadas? De novo, os mais pobres são a maioria, proporcionalmente: 37%
estão inadimplentes. Os mais ricos? Quinze por cento de inadimplentes.
Logo, aumentar o custo do crédito, via IOF,
prejudica todo mundo que toma dinheiro emprestado. Só que o peso das despesas
com empréstimos é maior entre as famílias mais pobres. Na verdade, o problema
principal do Brasil está na elevada carga tributária. Aqui, os impostos pagos
por pessoas físicas e empresas somam 34% do PIB. Na média dos países
latino-americanos, a carga fica em torno dos 20%.
Na cobrança de impostos, o Brasil parece os
países europeus mais ricos. Na distribuição — nos gastos públicos e serviços
prestados pelo governo — parece o Brasil mesmo que a gente conhece. Isso é
custo Brasil, o preço de fazer negócios por aqui. Brasileiros pagam muito
imposto no consumo. Nos meios gastronômicos e no setor da indústria de bebidas,
costuma-se dizer que o vinho brasileiro tem um grande inimigo, os impostos.
Somando as taxas estaduais e federais, dá uns 60% do preço de venda ao
consumidor. Dirão: azar dos ricos que tomam vinho, especialmente os que
consomem o estrangeiro, a que se acrescentam IOF e imposto de importação. Mas e
os impostos sobre o consumo de cerveja e chope? Nada menos que 55%.
Está em curso no Brasil uma reforma
tributária, que muda — e melhora — o sistema de cobrança dos impostos sobre
consumo. Mas a carga elevada se mantém, porque desde o início dos debates se
considerou que o governo, nos três níveis, não poderia perder receita. E não
poderia mesmo, porque os gastos têm aumentado todos os anos. Esse o problema
central. Os impostos aumentam porque os gastos aumentam. O governo federal bate
recordes de arrecadação, e ainda falta dinheiro.
Há também outro problema importante, que leva
a distorções. Dividendos recebidos por acionistas de empresas não são taxados,
mas os lucros das empresas são pesadamente taxados antes da distribuição aos
acionistas. Nos países com sistemas tributários mais equilibrados, é o
contrário. A empresa, a pessoa jurídica, paga bem menos que no Brasil. Em
compensação, o acionista, pessoa física, morre com imposto pesado. Por que o
Brasil adotou sistema diferente? Um motivo é óbvio: é mais fácil cobrar de uma
empresa que de muitos e muitos acionistas individuais.
Hoje, com os meios eletrônicos da Receita
Federal, já é possível fazer a reforma completa: taxar mais os acionistas e
menos as empresas. Reduziria o custo Brasil. Enfim, há muito mais que IOF nessa
história. História, aliás, longe do fim. Ontem, o ministro Alexandre
de Moraes suspendeu tanto o aumento do IOF decretado pelo governo como
o ato do Congresso que cancelou o decreto do Executivo. Zerou o jogo e chamou
todos para uma conversa.
No que vai dar isso? Provavelmente em aumento
de outros impostos. Há demanda por gastos em todo o setor público — Executivo,
Legislativo e Judiciário. E o pessoal não vê outra saída senão arrecadar mais.
E, por falar nisso, e em apostas, a Caixa acaba de aumentar o preço de suas
loterias. Essa bet pode, não é mesmo?
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