Revista Será?
O governo de Lula chegou a um ponto de
confronto com seus adversários no Congresso e isso poderá mudar o clima
político brasileiro?
A chamada traição do presidente da Câmara
Hugo Motta, em conluio com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, convocando
na calada da noite os parlamentares para rejeitarem o decreto do governo de
aumentar os impostos nas operações financeiras de capitais, IOF, poderá criar o
clima político reclamado por lideranças de esquerda descontentes com a chamada
submissão ou concertação do presidente com seus inimigos na Câmara e no Senado.
Uma reação com resultados agora imprevisíveis, podendo mesmo levar a um impeachment, se os movimentos sociais, identitários de esquerda e petistas não conseguirem recuperar o espaço perdido nas eleições parciais do próximo ano. Existe também um risco exterior, representado pela proximidade dos governos de Trump e Milei, identificados com o abandono das bandeiras sociais, mas não parece haver outra opção viável.
Até agora, algumas redes sociais de esquerda
têm lamentado uma falta de informação junto ao povo das iniciativas do
presidente Lula, em outras palavras, a falta de uma certa publicidade capaz de
fazer frente à campanha constante, nas redes sociais, de desmoralização pessoal
do presidente e do seu governo, bancada por grupos bolsonaristas de influência
evangélica, ainda ativos.
Esses grupos utilizaram ao máximo em seu
favor, distorcendo os fatos, o escândalo dos descontos indevidos do INSS nas
aposentadorias.
Diante da próxima conclusão do processo
contra militares e políticos golpistas, falando-se na prisão, já em outubro, do
ex-presidente Jair Bolsonaro, é normal um clima de excitação geral e de
passagem de armas na direita e extrema direita, com a substituição do chefe e
sacralização do governador Tarcísio de Freitas como seu sucessor, que promete
um indulto a Bolsonaro e, sem dúvida, aos seus cúmplices, depois de sua eleição
a presidente em 2026, considerada como certa.
Como se houvesse uma barreira inexpugnável de
desinformação, uma grande parcela do povo parece ignorar os bons índices do
governo, prejudicados pelo aumento de preços provocados por fatores externos ou
por uma intenção de descredibilizar o governo.
Um exemplo gritante são os comentários
publicados no site da CNN, logo após a decisão do presidente Lula de
judicializar a questão, recorrendo ao Supremo Tribunal Federal, diante da
rejeição do decreto IOF, aumentando o imposto sobre transações de capitais
pertencentes a titulares da classe média para cima.
Uma parte dos comentários é contra o decreto,
por achar que o povo não aguenta mais imposto e quer diminuição, ignorando que
o IOF, permitirá a isenção de impostos para a grande parte do povo vivendo com
baixos salários. Uma parcela da população trabalhadora, mal informada, parece
desconhecer esse pormenor e corre o risco de defender as transações de capitais
de pessoas abastadas em detrimento do seu pequeno salário.
Entretanto, enquanto a desinformação sobre o
governo de Lula vinha funcionando nas redes sociais, reforçando uma espécie de
oposição populista, pela primeira vez, surgem indícios de uma conscientização
popular provocada por mais um abuso dos parlamentares criando mais 18
cargos de deputados.
Uma espécie de manifesto contra os abusos dos
parlamentares, seus salários e seus privilégios começou a circular pela
Internet. Insensíveis até agora aos argumentos, as chamadas camadas populares
bolsonaristas parecem sensíveis aos números dos abusos. Teremos chegado ao
ponto de uma inversão de tendências, no qual o pastor Henrique Vieira trará
para si os fanáticos seguidores de Silas Malafaia?
A esquerda e os petistas voltarão às ruas,
tomando os lugares deixados vazios pelo recuo dos bolsonaristas, numa retomada
das praças por um populismo de esquerda? Ficção política ou reviravolta do
possível?
A decisão do presidente Lula de recorrer ao
STF, contra a derrubada do aumento do imposto sobre operações financeiras,
levou o líder da oposição a declarar guerra contra Lula.
*Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e
ex-Estadão, exilado durante a ditadura
Publicado Revista Será? (4 de Julho, 2025)
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