O fim do recesso parlamentar não resultou na retomada da votação de propostas importantes para o país. O Senado resolveu adiar a apreciação dos projetos de lei da cessão onerosa dos campos do pré-sal e da venda das distribuidoras da Eletrobras para depois das eleições. Oficialmente, governo ainda manifesta esperança de que os dois temas de sua lista de prioridades não serão postergados. Mas o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), disse com todas as letras que os dois assuntos deveriam ser apreciados apenas após a escolha do futuro presidente.
Cunha Lima justificou que "recomenda o bom senso" que os dois assuntos somente sejam apreciados quando se souber quem será o novo presidente. Em defesa pouco crível dos interesses da nação, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) disse não ver sentido em o governo "correr contra o tempo na reta final para se desfazer do patrimônio público a preço de banana".
Na verdade, são temas importantes e deveriam ser debatidos levando em conta o interesse da nação e não do governo do momento. Somente o leilão dos seis blocos da cessão onerosa pode render mais de R$ 100 bilhões e garantir importantes investimentos e ajustes em outras áreas; e a venda das distribuidoras pode livrar o governo e a população de pesados encargos em um ano em que a meta fiscal prevê um déficit de R$ 159 bilhões. Além disso, não foi bem pensando nos interesses do governo que o Congresso aprovou uma série de projetos em comissão e até mesmo em plenário, que vão acarretar pesada conta, especialmente para o próximo presidente.
A greve dos caminhoneiros parece ter sido a senha. Pressionado por 11 dias de paralisação que levou à falta de alimentos, combustíveis e até medicamentos, e imobilizou a produção do país, o governo de Michel Temer fez várias concessões que resultaram em um custo inicial de R$ 13,5 bilhões, entre subsídio ao preço do diesel, perdão para multas e isenção de pedágio. Para compensar essas concessões, o governo buscou economizar retirando benefícios de outros setores. Foi quando ficaram mais evidentes os problemas com o Congresso. Uma dessas medidas, a retirada dos benefícios à produção de refrigerantes na Zona Franca de Manaus, com a qual esperava ganhar R$ 1,7 bilhão, foi derrubada pelo Congresso.
Na votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias foram desfechados vários golpes. O Congresso reintroduziu o reajuste do salário do funcionalismo público em 2019, com custo estimado em R$ 4,4 bilhões. São muitos os exemplos. Tramita projeto que obriga a União a transferir R$ 39 bilhões para os Estados como compensação pelas perdas de arrecadação do ICMS causadas pela Lei Kandir que, em 1996, desonerou desse imposto a exportação de produtos primários e semielaborados. Outro caso é a transferência de funcionários públicos de Roraima, Rondônia e Amapá para a responsabilidade do governo federal, a um custo de R$ 2 bilhões. São tantas as armadilhas que algumas só vêm à tona meses depois como foi o caso da Emenda Constitucional 99, que obriga a União a criar linha de crédito subsidiada para Estados e municípios pagarem precatórios judiciais. Aprovada em dezembro, surgiu como uma "surpresa" recente.
Outras vezes, os congressistas insistem em obter vantagens apesar dos vetos do governo, contando com algum "cochilo". É o caso do refinanciamento das dívidas previdenciárias de produtores rurais, cujo custo havia sido reduzido a R$ 1,6 bilhão pelo governo dos R$ 14 bilhões propostos inicialmente, e acabou virando R$ 17 bilhões no relatório apresentado na semana passada.
Os autores das propostas de gastança nem mais se preocupam em seguir a Lei de Responsabilidade Fiscal, que obriga a definição de uma fonte de recursos quando o projeto implica maiores gastos. Final de mandato e proximidade das eleições são períodos muito propícios para as chantagens aos governantes e ofertas de pacotes de bondade aos grupos de pressão.
Já faz parte da história a ação do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que soube operar bem os projetos que oneravam os cofres federais no jogo contra a gestão de Dilma Rousseff. No início de 2016, Cunha desengavetou projetos que geravam um custo aproximado de R$ 200 bilhões, já chamados de pautas-bomba. Naquela época, o então vice-presidente Michel Temer era o responsável pela articulação política do Executivo e não foi muito bem-sucedido em driblar as pautas-bomba. Agora, tornou-se o mais novo alvo do esquema, que ganha força diante da sua baixa popularidade.
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