quarta-feira, 9 de julho de 2025

Presente de gringo - Bernardo Mello Franco

O Globo

Republicano presenteou petista com bandeira de defesa da soberania nacional

Desde que Donald Trump se elegeu, Jair Bolsonaro estava ansioso. O capitão sempre acreditou que só poderia escapar da cadeia com ajuda dos Estados Unidos. Em apuros no Brasil, clamava por uma boia lançada pela Casa Branca.

Depois de meses de expectativa, o republicano finalmente falou —ou melhor, tuitou. Trump descreveu Bolsonaro como vítima inocente de uma “caça às bruxas”. Acrescentou que ele não seria culpado de nada, exceto de ter “lutado pelo povo”.

O capitão ficou eufórico, mas alguém precisa avisá-lo que a declaração não deve surtir muito efeito fora da bolha da extrema direita. Bolsonaro é réu por tentativa de golpe e se complicou ainda mais ao ser interrogado no Supremo. Os ministros não varrerão as provas para baixo do tapete para agradar Trump.

Nas urnas, o efeito pode ser o contrário do que o bolsonarismo espera. Ao tentar ditar regras ao Brasil, o republicano deu um presente para Lula: o discurso de defesa da soberania nacional. No encerramento da cúpula do Brics, o petista disse que o Brasil não aceita interferência ou tutela estrangeira. Abraçou uma bandeira poderosa, com potencial para ajudá-lo a recuperar a popularidade perdida.

Trump é um cabo eleitoral às avessas. Em abril, suas ameaças ao Canadá prejudicaram a direita local, que liderava as pesquisas com mais de 20 pontos de vantagem. O Partido Liberal caminhava para a derrota, mas surfou a onda nacionalista e conseguiu virar o jogo.

O discurso de Lula esbarra na incoerência. Ele já palpitou sobre a política interna de outros países e acaba de sair em defesa de Cristina Kirchner, presa por ordem da Suprema Corte da Argentina. Mas é exagero comparar sua visita à peronista à pressão do homem mais poderoso do mundo sobre as instituições brasileiras.

Em maio, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, ameaçou impor sanções a Alexandre de Moraes caso Bolsonaro seja condenado. A ação movida pela Trump Media contra o ministro indica que a ofensiva não deve ficar só na retórica.

Nenhum comentário: