- Globo
É curiosa a frase do americano Roger von Oech, especialista em inovação: “Só quem gosta de mudança é bebê molhado.” Os brasileiros, enojados com a maioria dos políticos, estão divididos entre a indiferença e o desejo de transformação. No Tocantins, há dois meses, no segundo turno da eleição tampão para governador do estado, venceu a indiferença, o “não voto”. As abstenções, votos brancos e nulos atingiram 51,83%, superando a soma dos votos dos dois candidatos.
“É tudo farinha do mesmo saco. Nada vai mudar”, é o que dizem. De fato, as regras eleitorais favorecem de forma escancarada os que já detêm mandatos e frustram o desejo de renovação dos brasileiros. Os fundos Partidário e Eleitoral, que somados custam aos cidadãos R$ 2,6 bilhões, são distribuídos em parcelas maiores para os grandes partidos, e os dirigentes rateiam a bolada entre eles. Uma centena de parlamentares fará de tudo para ser reeleita com medo da Lava-Jato. Os já conhecidos também serão favorecidos pela redução dos tempos de campanha e de propaganda eleitoral. No horário eleitoral gratuito, o espaço para a divulgação das campanhas também é muito maior para os tradicionais partidos. Nos debates na televisão, os candidatos com percentuais pequenos de votos nas pesquisas eleitorais não têm chance de crescer porque sequer são convidados.
As vantagens não param aí. Um deputado federal tem até 25 assessores, e um senador chega a ter cem subordinados, agora transformados em “cabos eleitorais”, pagos pelo Erário. Outra vantagem é os parlamentares continuarem com o mandato até o dia das eleições. Como estão em campanha eleitoral, pouco aparecem no Congresso, mas continuam usufruindo da verba indenizatória para bancar escritórios, automóveis, gasolina, refeições, telefones, impressos etc. Enfim, é um jogo desigual. A estimativa é que de cada cem deputados federais que tentarão a reeleição, 80 consigam permanecer na Casa.
Nesse cenário, como mudar o país? Para 87,3% dos brasileiros (pesquisa FGV), para o Brasil mudar, é preciso que o povo se mobilize. A boa notícia é que a sociedade está a cada dia mais participativa e criando mecanismos para ampliar a consciência coletiva. A título de exemplo, no aplicativo Detector de Ficha de Político você poderá encontrar a folha corrida dos atuais parlamentares. Ou conhecer as ações a que eles respondem na Justiça no Ranking dos Políticos. No Capital dos Candidatos (http://eufiscal.org), o eleitor verá em quanto aumentou o patrimônio dos políticos entre eleição e reeleições. Além de sites e aplicativos, já existem cerca de 130 observatórios sociais e aproximadamente 1.300 vigilantes da gestão, indivíduos não governamentais que fiscalizam as prefeituras. Mobilizar é preciso.
O movimento Unidos Contra a Corrupção publicará em seu site as fotos dos candidatos que têm passado limpo, compromisso com a democracia e que apoiam as novas 70 medidas contra a corrupção, lançadas há dois meses por entidades da sociedade civil. Entre outras propostas estão a redução do foro privilegiado de 55 mil para apenas 16 cargos, a alteração da forma de indicação de ministros do STF e dos tribunais de contas, a exigência de ficha limpa para todos os cargos públicos e a transparência dos partidos políticos. O eleitor pode se cadastrar e apoiar esse movimento, que já tem mais de 300 mil assinantes!
Vale a pena lembrar que a Lei da Ficha Limpa começou assim, com a coleta de assinaturas para algo que parecia impossível. Dois meses após a enorme manifestação popular de junho de 2013, surgiu a lei que instituiu a delação premiada, instrumento que contribuiu, até agora, para 204 condenações contra 134 pessoas, contabilizando 1.983 anos de penas! Muitos já foram encarcerados, e outros tantos estão na fila, se Deus e o STF quiserem.
A par do que os políticos combinam entre si, há cinco palavrinhas mágicas em ascensão: contribuinte, consumidor, eleitor, cidadão e... mobilização. O Brasil é um bebê molhado que quer mudanças. Nós podemos e devemos trocar as suas fraldas.
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