O risco da falta de comedimento no Supremo
O Globo
Decisões contra Google e Telegram destoam
do ideal democrático que a Corte sempre defendeu
Ninguém em sã consciência pode negar o
papel fundamental do Supremo Tribunal Federal (STF) desde que o governo Jair
Bolsonaro passou a atacar direitos básicos garantidos pela Constituição. Da
obrigatoriedade da vacinação contra Covid-19 a limites à política armamentista,
a Corte foi um dique eficaz contra os desvarios do Executivo entre 2019 e 2022.
Os ministros do STF foram, sobretudo,
primordiais para que as eleições de 2022 transcorressem sem sobressaltos. À
frente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tomaram todas as medidas
necessárias para garantir a lisura do pleito. Depois da tentativa de golpe no 8
de Janeiro, o STF novamente agiu de modo ágil e oportuno. Graças à Corte, nossa
democracia resistiu aos ataques.
A ação diligente do Supremo, porém, não o torna imune a críticas. Acompanhar atentamente as decisões da Corte constitucional é dever da sociedade e da imprensa. Depois do turbilhão do governo Bolsonaro, o Brasil precisa restabelecer a normalidade institucional, cuidando para que os ritos e direitos previstos em lei sejam respeitados.
Causam preocupação, por isso, as decisões
recentes do ministro Alexandre de Moraes, no âmbito do inquérito que investiga
notícias fraudulentas, ordenando a remoção de anúncios e conteúdos veiculados
por plataformas digitais contra o Projeto de Lei (PL) das Fake News. Não se
nega que essas empresas têm contribuído para enfraquecer as instituições
democráticas em todo o mundo, mas não se justificam as punições cautelares
contra elas por terem usado seus canais para dar destaque a suas posições,
contrárias ao PL.
Evidentemente é preciso investigar os
abusos atribuídos ao Google, acusado de privilegiar conteúdos contra o PL em
seu mecanismo de busca. Também não tem cabimento o Telegram disseminar mentiras
sobre o assunto a seus usuários. Mas não cabe ao STF regular o discurso. Não há
lógica em crer que as mentiras de uma empresa contra um projeto de lei em
debate no Congresso representem risco à democracia. Mentiras devem ser
combatidas com a verdade, não com decisões da Justiça que carregam o DNA da
censura.
A discussão sobre o PL das Fake News está
avançada no Congresso. Na essência, ele acaba com a norma legal que exime as
plataformas de responsabilidade por todo conteúdo que veiculam e as torna corresponsáveis
quando usadas para crimes já previstos em lei. Embora erradas, elas têm direito
de discordar desse novo modelo legal e de expressar sua posição. Se, na defesa
dessa posição, violarem a lei ou causarem danos, a própria lei prevê os
remédios cabíveis: os responsáveis responderão pelos eventuais crimes
cometidos, além de terem de indenizar os prejuízos que provocarem.
Dentro das suas competências, o próprio
Supremo pode declarar a inconstitucionalidade do artigo do Marco Civil da
Internet que concede a injustificada imunidade às plataformas pelos danos que
causarem. O julgamento do caso já está pautado.
Ao agir por voluntarismo, mesmo em defesa
da democracia, o Supremo cria riscos para si e para a própria democracia. O
combate legítimo aos excessos das plataformas digitais não vale o risco de
desviar da legalidade. O STF precisa manter o comedimento e zelar pela aplicação
estrita da lei. Só assim evitará que as recentes aventuras golpistas deixem
marcas permanentes em nossa democracia.
Lei Geral do Esporte é avanço contra a
violência e o preconceito no futebol
O Globo
Para funcionar, porém, será preciso que
clubes, federações e autoridades se empenhem em cumpri-la
A Lei Geral do Esporte, aprovada pelo
Senado na semana passada, representa um passo importante para enfrentar atos de
violência, preconceito e intolerância que continuam a contaminar estádios do
país, a despeito das inúmeras campanhas de conscientização. Considerada um novo
marco regulatório do esporte no Brasil, a nova legislação, que depende de
sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estabelece multas de R$ 500 a
R$ 2 milhões para torcedores e clubes que praticarem atos de racismo,
homofobia, sexismo ou xenofobia.
Não se pode fazer vista grossa para
atitudes inaceitáveis como a presenciada na arquibancada da Arena da Baixada,
em Curitiba, no jogo entre Flamengo e Athletico Paranaense no último
domingo. Vídeos
comprovam que um torcedor do clube paranaense provocou os adversários imitando
um macaco. Além de inaceitável, é criminoso.
E está longe de ser caso isolado. No mesmo
fim de semana, segundo o Observatório da Discriminação Racial no Futebol,
houve pelo menos outros dois episódios, embora não tenham ganhado os holofotes.
Um jogador do CSA disse ter sofrido injúria racial na partida contra o
Ypiranga, pela Série C, e um atleta do Hercílio Luz afirmou ter sido vítima de
ofensas racistas durante o jogo contra o Aimoré, pela Série D. Não são menos
importantes porque aconteceram nas divisões inferiores. De acordo com o
Observatório, em 2021 foram registrados 158 casos de discriminação em arenas
esportivas (não só de futebol), 137 no Brasil e 21 com atletas brasileiros no
exterior.
A nova legislação, que unifica todas as
normas esportivas num único texto, também tenta coibir a violência nos
estádios. Torcidas organizadas que promoverem pancadarias, invasão de campo ou
discriminação poderão ser banidas por até cinco anos. Nos últimos meses, cenas
lamentáveis de selvageria têm ganhado mais repercussão que as disputas nos
gramados. Em março deste ano, torcedores de
Flamengo e Vasco transformaram as imediações do Maracanã num cenário de guerra. No
mesmo mês, depois da eliminação do Internacional no Campeonato Gaúcho, um
torcedor invadiu o campo com uma criança pequena no colo e agrediu um jogador
do Caxias.
Outro aspecto positivo diz respeito aos
casos de corrupção. Tentativas de obter vantagens indevidas no esporte serão
punidas com penas de dois a quatro anos de prisão. A medida é oportuna para
coibir esquemas de manipulação de resultados que favorecem apostas
fraudulentas, em expansão no país. O Ministério Público de Goiás investiga
indícios de fraudes em campeonatos das Séries A e B do Brasileirão e regionais,
e a Polícia
Federal também abriu inquérito sobre o tema.
Embora a lei sirva de base para coibir práticas nefastas, só terá efeito se aplicada. Não basta existir base jurídica para punição. Com raras exceções, há leniência demasiada de federações, clubes e autoridades para identificar agressores, afastá-los dos estádios e puni-los. Não será tarefa fácil mudar o comportamento de torcedores sem mudar também o dos cartolas.
Avanço estatal
Folha de S. Paulo
Crédito sobe em bancos públicos, com
distorção que reduz eficácia de ação do BC
Pela primeira vez desde o início de 2016,
os bancos
públicos expandiram o crédito em velocidade superior à observada nas
instituições nacionais privadas —13,8% contra 10,9% nos 12
meses até março.
É notável a inversão em relação a meados de
2021. Naquele momento, o ritmo de aumento no sistema privado correspondia a
cerca de duas vezes e meia o das instituições financeiras estatais.
Diante das claras intenções do governo Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) de expandir os gastos públicos e promover maior
ativismo dos bancos oficiais, tal evolução reforça temores de que sejam
repetidos erros graves do passado.
Sob a petista Dilma Rousseff, a
multiplicação de crédito subsidiado —com participação de mercado do sistema
estatal chegando a superar 50%, ante 43% hoje— resultou em graves
desequilíbrios.
Naquele momento, Banco do Brasil e Caixa
Econômica Federal foram pressionados a atuar fora de suas especialidades, e o
BNDES recebeu quase 10% do PIB em dinheiro público para repasses a taxas
favorecidas e custeadas pelo Tesouro.
Além de contribuir para o rombo das
finanças públicas e beneficiar setores a partir de critérios duvidosos, o
aumento do crédito direcionado provocou redução da eficácia da política
monetária.
Quanto maior o volume de empréstimos e
financiamentos a juros insensíveis às ações do Banco Central, maior precisa ser
a taxa Selic para o controle da inflação, prejudicando em demasia as famílias e
empresas que dependem das linhas convencionais.
Tais fenômenos são bem documentados, embora
deva-se ter em mente que os dados ainda não permitem inferir que o
comportamento dos bancos públicos já resulta de nova orientação.
A ampliação das operações decorre
justamente do peso do crédito direcionado. Nessa modalidade, a alta foi de 14%
nos 12 meses até março e de 1,9% no primeiro trimestre ante o anterior.
Há forte aumento do financiamento agrícola, por exemplo, dados os resultados da
safra de grãos.
Em paralelo, o aumento do custo vem
contendo o crédito livre, que teve variação de 10,5% e -0,5% nas mesmas bases
de comparação.
O que ocorrerá daqui para a frente vai
depender da ação do governo. Sem novos subsídios, o crescimento mais forte do
crédito favorecido tende a ser passageiro, conforme o Banco Central reduza a
taxa básica, algo que se
espera para o segundo semestre.
Há ensaios de retrocesso, em especial no
BNDES, cujo comando indica o intento de interromper o processo de ajuste dos
últimos anos. Mesmo que não se retome o ativismo tresloucado dos anos Dilma, a
ideia é temerária.
Armas na mira
Folha de S. Paulo
Reverter política bolsonarista no setor
traz de volta sensatez à gestão pública
Em apenas quatro anos, Jair Bolsonaro (PL)
logrou colocar um milhão de armas nas mãos de caçadores, atiradores e
colecionadores (CACs) —um aumento de
187% em relação a 2018. Tal feito impõe danos à segurança pública, e
revertê-lo não será tarefa fácil.
Ao tomar posse, Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) assinou medidas para suspender registros de armas de uso restrito para
CACs e particulares, paralisar a concessão de novos certificados a CACs e
clubes de tiro e limitar o número de armamentos e munições permitidas.
Flávio Dino, ministro da Justiça, pretende
entregar um novo decreto regulamentando o Estatuto do Desarmamento —lei
corroída pelos dispositivos de Bolsonaro.
Além do risco inerente em aumentar a posse
de armas, a política anterior nem sequer contava com uma base sólida de dados.
Em 2022, o Exército admitiu ser incapaz de
pormenorizar os tipos de artefatos em circulação de forma precisa, devido à
ausência de padronização do Sistema de Gerenciamento Militar de Armas.
Diante deste cenário, o principal desafio é retomar o monitoramento e a
rastreabilidade de armas e munições no país.
Lula estuda passar para a
Polícia Federal a responsabilidade, hoje do Exército, de emitir certificado de
registro e cadastro de armas para CACs e de fiscalizar clubes
de tiros.
Nessa mesma direção, em fevereiro o governo
determinou que todas as armas fossem registradas no sistema da PF. Fortalecer a
capacidade institucional de fiscalização e averiguar as lacunas no
monitoramento feito pelo Exército são medidas urgentes.
Um arsenal sem controle facilita o acesso
de criminosos a armamentos. Em junho de 2021, um membro da facção criminosa
Primeiro Comando da Capital (PCC) chegou a obter do Exército o registro de CAC,
mesmo com uma ficha corrida de 16 processos criminais.
O Tribunal de Contas da União já mostrou
como a fiscalização é frágil. Em casos flagrantes de ilegalidade levantados
pelo tribunal, o Exército apenas abriu processo administrativo, sem acionar a
PF.
A gestão bolsonarista, como em outas áreas, era regida por negacionismo e ideologia. Pesquisas internacionais mostram que facilitar o armamento civil não gera benefícios para a segurança pública. As medidas ora tomadas pelo novo governo são o primeiro passo para que a sensatez volte a nortear as políticas do setor.
Presidencialismo de comercialização
O Estado de S. Paulo
A reciclagem do orçamento secreto para
garantir apoio a projetos ruins em troca de gastos ruins expõe a hipocrisia de
Lula e derruba os mitos do ‘grande articulador’ e da ‘frente ampla’
O presidente Lula da Silva liberou R$ 9
bilhões em emendas negociadas pelo antecessor, Jair Bolsonaro, a serem
repassadas sem transparência e a conta-gotas, conforme o resultado das votações
e a fidelidade dos parlamentares. Em outras palavras, trata-se da reciclagem do
orçamento secreto.
O esquema consistiu na hipertrofia das
emendas do relator do Orçamento (RP9). Originalmente uma parcela marginal de
recursos para ajustes contábeis, a RP9 cresceu para R$ 19 bilhões, distribuídos
a aliados sem critérios técnicos nem transparência.
É uma violência aos princípios da
publicidade, da impessoalidade e da eficiência. Só quem vota com o governo é
beneficiado e os municípios sem padrinho no Congresso são punidos. Além de
distorcerem a competição eleitoral e a representação democrática, os recursos não
só são mal distribuídos, como, repassados abaixo do radar, abrem margem à
corrupção. Há muitos indícios de gastos superfaturados.
A ampliação, a imposição e a diversificação
das emendas parlamentares cresceram exponencialmente nos governos Dilma Rousseff
e Jair Bolsonaro. Ambos iniciaram seus mandatos tentando impor seu voluntarismo
ao Congresso. À medida que sua credibilidade derretia, as hostes clientelistas
farejaram uma oportunidade de chantageá-los e o Orçamento foi loteado em troca
de sustentação. As emendas individuais e de bancadas foram engordadas e
tornaram-se impositivas. Mas essas ao menos são distribuídas com algum controle
e equidade. Já as emendas de relator e as “transferências especiais” (ou
“cheque em branco”), realizadas diretamente pelos parlamentares a seus currais
eleitorais, são repassadas de maneira totalmente arbitrária e opaca.
Nas eleições, Lula disse que o orçamento
secreto foi o “maior esquema de corrupção da história”. Numa tacada, sua
reciclagem expõe a hipocrisia do chefão petista e deita por terra dois mitos
sobre ele: o do “grande articulador” e o do líder da “frente ampla
democrática”. Fosse um líder sincero e um articulador competente, Lula
reconheceria que a margem de votos nada ampla que lhe deu a vitória sinaliza menos
um endosso ao programa petista que o receio de um novo mandato de Bolsonaro.
Tanto que os partidos de sua base eleitoral conquistaram pouco mais de 130
cadeiras na Câmara. Uma articulação republicana implicaria fazer concessões e
negociar projetos com a maioria conservadora no Congresso, distribuindo
condizentemente o poder.
Lula, porém, concentrou o núcleo do poder
no PT, acreditando que garantiria a governabilidade mercadejando cargos de
segundo escalão na Esplanada dos Ministérios. Mas justamente os poderes
orçamentários acumulados pelo Parlamento tiraram poder dos ministérios, que
hoje são uma desvalorizada moeda de troca. Longe de matizar seu voluntarismo
ideológico e negociar conteúdos programáticos, Lula tenta enfiar goela abaixo
do Congresso as ideias fixas e retrógradas do PT, revertendo decisões do
Parlamento (como o Marco do Saneamento ou a privatização da Eletrobras) à base
de decretos e ações judiciais. A retaliação veio a galope e o custo da
governabilidade aumentou.
“O povo brasileiro vai escolher se quer
orçamento feito pelo relator, distribuído pelos deputados e senadores, ou a
volta do mensalão”, disse com assustadora franqueza, no ano passado, o
presidente da Câmara, Arthur Lira. “São as duas maneiras de cooptar apoio no
Congresso.” O povo não precisa fazer essas escolhas, pois ambas são
inconstitucionais, como já determinou o Supremo. Já o governo, prisioneiro do
voluntarismo de Lula e submetido à lógica desse presidencialismo de
comercialização descrito por Lira, pode começar a trabalhar de verdade para
construir uma base confiável, unida por propósitos políticos comuns, ou pode se
deixar submeter a esse presidencialismo de comercialização, em que cada voto
deve ser comprado com emendas parlamentares sem controle nem transparência.
Aparentemente, Lula já fez sua escolha.
Política industrial para os novos tempos
O Estado de S. Paulo
Debate sobre política de estímulos ao
segmento deve mirar modelo com forte investimento tecnológico e melhor índice
de produtividade; exemplo pode ser encontrado no agronegócio
Simultaneamente às críticas ao elevado
nível dos juros no País, empresários estão reclamando do governo a adoção de
uma política industrial. Eles acreditam que medidas de estímulo possam fazer
com que o setor fabril se recomponha das suas muitas fragilidades e da
dificuldade para competir nos mercados doméstico e do exterior e volte a
crescer.
Não há dúvidas sobre a perda de importância
comparativa da indústria no País – e globalmente. Dados do IBGE mostram que o
setor, no Brasil, continua 1,3% abaixo do seu patamar pré-pandemia, apesar da
expansão de 1,1% em março.
No debate, está fazendo falta, no entanto,
uma definição mais clara de qual modelo de indústria se quer no País.
No mundo, o setor industrial passa por uma
profunda revolução tecnológica, com prioridades contemporâneas, como a questão
climática e a valorização da inovação e da diversidade. Não faz sentido mais a
concepção de um segmento com fábricas poluentes, com baixos índices de
produtividade e produtos que não atendem mais aos desejos dos consumidores.
É hora, pois, de repensar minuciosamente
como deve funcionar o setor industrial no País. Apostar simplesmente na
concessão de incentivos que mirem um modelo anacrônico seria desperdiçar
talento e inventividade, além de tempo e recursos – escassos no Orçamento da
União e caros na tomada de empréstimos bancários.
Alguns, como o vice-presidente e ministro
da Indústria e Comércio (MDIC), Geraldo Alckmin, falam agora não mais em
reindustrialização, mas sim em neoindustrialização, um conceito que englobaria
também diversificação da matriz energética e a busca por sustentabilidade
ambiental. Se isso é sério, como deveria ser, não faz sentido, por exemplo, a
informação de que o governo federal pretende retomar a ideia de estimular
novamente a produção do chamado “carro popular” – naturalmente mais poluente e
menos tecnológico. Além de atentar contra o meio ambiente, a retomada do
incentivo para carros baratos é um paliativo arcaico que não pode ser chamado
de política industrial.
Um aspecto da política industrial a ser
contemplado no debate é a possibilidade de as novas medidas resultarem em
aumento na oferta de emprego – em geral as fábricas pagam melhores salários que
outros setores da economia para os trabalhadores com carteira assinada. O
secretário executivo do MDIC, Márcio Elias Rosa, informou recentemente ao
Estadão que vai se buscar sustentabilidade, inclusão e descarbonização – e
geração de emprego.
A questão é polêmica. “A reindustrialização
no sentido de aumentar a participação do emprego na indústria de maneira
significativa e sustentável me parece muito difícil, se não impossível”, disse
o economista Dani Rodrick, da Universidade Harvard, em entrevista a este
jornal. Sua opinião ganha força quando se lembra que ele é defensor de
políticas públicas, inclusive industrial.
O presidente da Fiesp, Josué Gomes da
Silva, defende a ideia de um mecanismo de apoio ao seu setor equivalente ao
Plano Safra. Segundo ele, a Fazenda teria se comprometido a alocar recursos
para a indústria no próximo Orçamento da União. “É inconcebível que a gente não
possa ter algo semelhante. Por que tem no setor agrícola e não tem algo
equivalente para a indústria de transformação?”
O exemplo do agronegócio é bemvindo ao
debate. Ao longo das últimas décadas, foi extraordinário o processo de mudança
por que passaram os métodos de produção agrícola e pecuária no Brasil,
explicando o sucesso das exportações do País desses itens. Como se sabe, as
vendas ao exterior do agronegócio crescem de forma consistente, ganhando espaço
na pauta da balança comercial. No ano passado, as exportações desse setor
econômico representaram quase 50% do total vendido pelo Brasil – foram exatos
47,6%.
Investir em tecnologia, em atender aos
desejos dos compradores e inovar os produtos estão sendo diretrizes seguidas
por muitos empresários do agronegócio. Incorporar esses parâmetros ao projeto
de indústria que se deseja é essencial.
Floresta em pé, um tesouro
O Estado de S. Paulo
A preservação da Amazônia é vantajosa
inclusive do ponto de vista econômico
Um estudo recém-divulgado pelo Banco Mundial
mostra que a sustentabilidade é bem mais que uma boa causa. Afora todos os
motivos para o País proteger o meio ambiente, o relatório apresenta estimativas
quanto ao valor econômico da conservação da Amazônia Legal. Como noticiou o
Estadão, as projeções indicam que a
floresta em pé vale até sete vezes mais que os ganhos obtidos com sua
exploração econômica, seja na agricultura, na indústria madeireira ou na
mineração. Mais um incentivo para que o País reforce os cuidados com a
preservação da natureza.
A Amazônia é uma riqueza por si só, e isso
fica mais evidente a cada dia no mundo inteiro. Trincheira contra o aquecimento
global e verdadeiro tesouro da biodiversidade, sua mera existência tem valor
estimado em mais de US$ 317 bilhões por ano − o equivalente a R$ 1,5 trilhão −,
segundo o relatório.
O cálculo, como tudo que envolve a
Amazônia, considera variáveis de magnitude extrema. Entre elas, a contribuição
do ecossistema amazônico para o regime de chuvas na América do Sul, essencial
para o êxito da agricultura no subcontinente, e seu papel como sumidouro de
carbono, função cada vez mais valiosa na luta para diminuir o ritmo das
mudanças climáticas.
Eis a dimensão econômica do patrimônio
natural ameaçado pelo desmatamento. O xis da questão, porém, extrapola o
diagnóstico desse valor universal e incontestável da maior floresta tropical do
planeta. Como bem lembra o estudo do Banco Mundial, a Amazônia Legal tem 28
milhões de habitantes, um território maior que o da União Europeia e níveis
alarmantes de pobreza.
Faz-se necessário, então, fomentar o
crescimento econômico, elevando o padrão de vida da população ao mesmo tempo
que se reforçam os cuidados com o meio ambiente. Daí por que a agenda verde
deve conciliar desenvolvimento e preservação. Em outras palavras, encarar o
desafio da sustentabilidade, com fórmulas capazes de transformar o trilionário
tesouro apontado pelo Banco Mundial em recursos que melhorem as condições de
vida das populações locais.
Ao se debruçar sobre o tema, o relatório
Equilíbrio delicado para a Amazônia Legal Brasileira − um memorando econômico
sinaliza que tamanho esforço exige repensar o modelo de desenvolvimento da
região. De um lado, é preciso reforçar a fiscalização e o controle do
desmatamento ilegal. Mas corre-se o risco de enxugar gelo, se não forem tomadas
medidas estruturais para criar oportunidades e incentivar atividades que não
impliquem devastação ambiental.
Ao chamar a atenção para a grandeza
econômica da Floresta Amazônica, o Banco Mundial amplia o debate e abre espaço
para soluções que primem pela sustentabilidade. O fato de que a floresta em pé
tem valor econômico descomunal há de contribuir para a sua preservação − e isso
é uma boa notícia. Melhor ainda será o dia em que toda essa riqueza significar
mais comida na mesa e melhores condições de vida para toda a população. Sem a
derrubada de árvores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário