O Estado de S. Paulo
O impulso inflacionário poderia ser menor, se
o governo freasse os gastos federais e aceitasse um desempenho econômico mais
contido
A primeira missa do novo papa foi seguida,
para os brasileiros, pela divulgação dos novos números da inflação: 0,43% em
abril; 2,48% neste ano; e 5,53% em 12 meses, taxa bem superior ao teto da meta
(4,50%) e muito acima do centro do alvo (3%). Em viagem à Rússia, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva celebrou os 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial,
distanciando-se, por um momento, da guerra diária de seus conterrâneos contra o
aumento de preços nos supermercados, nas lojas e nos serviços essenciais.
Para os otimistas, a notícia mais importante pode ser o declínio da inflação mensal. A taxa recuou de 1,31% em fevereiro para 0,56% e 0,43% nos dois meses seguintes. Mas a alta de preços acumulada em 12 meses foi 0,05 ponto superior à de março e ultrapassou todos os patamares alcançados desde o início do ano anterior.
Menos tolerante que o governo, o Banco
Central reagiu à disparada dos preços antes de ser divulgada a inflação de
abril. Além de aumentar os juros básicos de 14,25% para 14,75%, o Comitê de
Política Monetária (Copom) anunciou, no começo da noite de quartafeira, um
aperto prolongado.
O cenário, segundo nota do comitê, continua
“marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas,
resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho”. A
descrição corresponde a uma economia com muita vitalidade, mas o cenário é
sombreado pelo risco de um crescente desequilíbrio dos preços. A resposta, de
acordo com o informe, deve ser “uma política monetária em patamar
significativamente contracionista por período prolongado, para assegurar a
convergência da inflação à meta”.
O aumento dos juros, mais um desafio tanto
para os empresários quanto para os consumidores, era esperado por quem
acompanha os números de uma economia com baixo investimento e baixo potencial
de expansão. A novidade, se houver alguma, só pode ser a promessa de um aperto
prolongado, num “cenário de elevada incerteza”.
Esse detalhe, a grande incerteza, é comum à
maior economia do mundo, os Estados Unidos, e à maior da América Latina, o
Brasil. Além disso, nos dois países os bancos centrais apontam os governos como
responsáveis pelas tensões inflacionárias.
No caso americano, o risco de maior elevação
dos preços é vinculado às políticas do presidente Donald Trump, com novas
tarifas contra importações e menor atenção às contas públicas. No Brasil, as
pressões mais importantes são associadas à tendência gastadora do poder
federal, um efeito dos objetivos políticos do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. Problemas associados ao custo da alimentação, resultantes de fatores
climáticos, foram importantes no início do ano, mas devem, segundo se prevê,
ter menos peso na maior parte de 2025.
Por enquanto, as expectativas de inflação
permanecem, no mercado, bem acima das metas oficiais, como registra o Boletim
Focus, publicado semanalmente pelo Banco Central e elaborado com base em
projeções do setor financeiro. No boletim com data de 2 de maio, a mediana das
projeções aponta inflação de 5,53% em 2025, ligeiramente inferior à indicada
uma semana antes (5,55%). A taxa estimada para o próximo ano é menor (4,51%),
mas bate no teto da meta oficial. Como as expectativas tendem a afetar a
evolução dos preços, o relativo pessimismo do mercado já pode influenciar, em
boa parte, o quadro inflacionário do futuro próximo.
Esse efeito pode ser atenuado pela política
monetária, mas nem os dirigentes do Banco Central mostram segurança quanto à
eficácia do recente aumento de juros. Fontes do mercado dão como provável pelo
menos mais uma elevação da taxa, seguida por uma redução cautelosa. No Boletim
Focus, a taxa básica estimada para o fim deste ano já foi reduzida de 15% para
14,75%. Os juros básicos projetados para dezembro de 2026 permanecem, há
semanas, em 12,50%, uma taxa ainda bem alta pelos padrões internacionais.
O impulso inflacionário poderia ser menor, se
o governo freasse os gastos federais e aceitasse um desempenho econômico mais
contido. O avanço da produção estimado para este ano – de 2%, segundo projeção
do mercado – já é modesto para uma economia emergente. As projeções para 2026
apontam desempenho mais fraco, na vizinhança de 1,70%. Mas a disputa eleitoral
do próximo ano certamente dificulta, para o presidente, a decisão de conter o
crescimento neste ano para limitar a evolução dos preços.
Uma revisão orçamentária poderia, talvez,
diminuir as obrigações do governo e facilitar o controle de gastos. Recompor e
limitar as despesas pode envolver, no entanto, negociações complicadas com
outras áreas do poder central, da sociedade e também das administrações
estaduais e municipais. Negociações desse tipo tendem a ser mais fáceis e menos
custosas em momentos menos críticos, quando o Executivo é pouco pressionado por
problemas urgentes. A revisão crítica do Orçamento e das obrigações federais
poderia, no entanto, ser uma atividade normal e rotineira em Brasília, se a
qualidade e os custos da gestão pública fossem temas habituais no centro do
Poder Executivo.
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